Nasce um novo sistema de pagamentos
no Sul Global
– Mudança de jogo
decisiva
– Desafio ao sistema monetário ocidental: rumo a um novo sistema de pagamentos
do Sul Global
– Contornar e ultrapassar o dólar americano
Pepe Escobar [*]
Através do seu organismo regulador, a
Comissão Económica Eurasiática (CEE),
a EAEU acaba de estender uma proposta muito séria às nações BRICS (Brasil,
Rússia, Índia, China e África do Sul) que, crucialmente, já estão a caminho de
se tornarem BRICS+:
uma espécie de G20 do Sul Global.
O sistema incluirá um único cartão de
pagamento – em concorrência direta com o Visa e o Mastercard – fundindo o já
existente MIR russo, o UnionPay da China, o RuPay da Índia, o Elo do Brasil,
entre outros.
Isto representará um desafio direto e
frontal ao sistema monetário de concepção (imposta) ocidental. E vem nos
calcanhares dos membros dos BRICS já a efetuarem o seu comércio bilateral em
moedas locais e a contornarem o dólar americano.
Esta união EAEU-BRICS esteve em construção
durante longo tempo – e agora também irá avançar no sentido de prefigurar uma
nova fusão geoeconómica com as nações membros da Organização de Cooperação de
Xangai (SCO).
A EAEU foi criada em 2015 como uma união
aduaneira da Rússia, Cazaquistão e Bielorrússia, à qual se juntaram um ano mais
tarde a Arménia e o Quirguistão. O Vietname já é um parceiro de comércio livre
da EAEU e o Irão, membro recentemente consagrado da SCO, está também a fechar
um acordo.
A EAEU foi concebida para implementar a
livre circulação de bens, serviços, capitais e trabalhadores entre os países
membros. A Ucrânia teria sido um membro da EAEU se não fosse o golpe de Maidan
em 2014, engendrado pela administração Barack Obama.
Vladimir Kovalyov, conselheiro do
presidente da CEE, resumiu tudo isto ao jornal russo Izvestia. O
objetivo é estabelecer um mercado financeiro comum e a prioridade é desenvolver
um "espaço de intercâmbio" comum: "Fizemos progressos
substanciais e agora o trabalho está centrado em sectores como a banca, os
seguros e o mercado de ações".
Em breve será criado um novo organismo
regulador para o proposto sistema financeiro conjunto EEU-BRICS.
Entretanto, a cooperação comercial e
económica entre a EAEU e os BRICS aumentou 1,5 vezes só na primeira metade de
2022.
A quota dos BRICS no volume total de
negócios do comércio externo da EAEU atingiu 30 por cento, revelou Kovalyov no
Fórum Internacional de Negócios BRICS na passada segunda-feira em Moscovo:
"É aconselhável combinar as potencialidades dos BRICS e das
instituições de desenvolvimento macrofinanceiro da EAEU, em particular o BRICS
New Development Bank, o Asian Infrastructure Investment Bank (AIIB), assim como
as instituições nacionais de desenvolvimento. Isto permitirá alcançar um efeito
sinergético e assegurar investimentos sincronizados em infraestruturas
sustentáveis, produção inovadora e fontes de energia renováveis".
Aqui vemos mais uma vez o avanço da
convergência não só dos BRICS e da EAEU, mas também das instituições
financeiras profundamente envolvidas em projetos no âmbito das Novas Rotas da Seda,
lideradas pela China, ou Iniciativa Cinturão e Estradas (BRI).
Pôr um fim à era da pilhagem
Como se tudo isso não bastasse, o
Presidente russo Vladimir Putin está a aumentar as apostas com o apelo a um
novo sistema de pagamento internacional baseado na blockchain e
nas moedas digitais.
O projeto de tal sistema foi recentemente
apresentado no 1º Fórum Económico Eurasiático em Bishkek (Quirguistão).
No fórum, a EAEU aprovou um projeto de
acordo sobre a colocação e circulação transfronteiriça de títulos nos estados
membros e alterou regulamentos técnicos.
O próximo grande passo é organizar a
agenda de uma reunião crucial do Supremo Conselho Económico da Eurásia, a 14 de
Dezembro, em Moscovo. Putin estará presente – pessoalmente. E não há nada que
ele gostasse mais do que fazer um anúncio de mudança de jogo.
Todos estes movimentos adquirem ainda mais
importância à medida que se ligam a um comércio em crescimento rápido e
interligado entre a Rússia, China, Índia e Irão: desde o impulso da Rússia para
construir novos gasodutos que sirvam o seu mercado chinês – até à Rússia,
Cazaquistão e Uzbequistão, a discutirem uma união gasista tanto para
fornecimentos internos como para exportações, especialmente para o principal
cliente, a China.
Lenta mas seguramente, o que está a
emergir é o Grande Quadro de um mundo irremediavelmente fraturado com um duplo
sistema de comércio/circulação: um estará a revolver-se em torno dos restos do
sistema do dólar, o outro está a ser construído centrado na associação dos
BRICS, EAEU e SCO.
Avançando mais longe na estrada, a recente
metáfora patética cunhada por um vulgar patrão eurocrata: a "selva"
está a separar-se do "jardim" com uma vingança. Que a fratura possa
persistir, pois um novo sistema de pagamento internacional – e depois uma nova
moeda – terá como objetivo travar definitivamente a Era da Pilhagem centrada no
Ocidente.
30/Novembro/2022
[*] Analista geopolítico independente.
O original encontra-se
em thecradle.co/Article/Columns/18975.
Este artigo encontra-se
em resistir.info
3 comentários:
Que assim seja!
Um grande desafio que porá fim ao poder unipolar e o fim do neoliberalismo.Bjo.
O desafio não é grande, é ENORME!
Abraço!
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