terça-feira, agosto 31, 2010

Festa do Avante! 2010

Apesar de continuar a "postar" sobre a Festa, como me der nas ganas, deixo esta ligação para a página da Festa, porque... não há página como aquela:

Festa do Avante! 2010 - 2

Não há Festa como esta!


Estamos na semana da FESTA!
Um post por dia. Mas... que escolher?

Vou começar pelos debates. Até porque para dois deles ando a preparar-me. São uma das tarefas (sim!, porque, depois da construção, da venda de EPs e essas coisas, e antes da desconstrução, em que todos trabalhamos, há muita tarefa durante a Festa...).
Os debates! Primeiro, estes do Espaço Central (nenhum dos dois em que participarei será aqui).

"Portugal a produzir"

Uma campanha patriótica
apresentada, ontem, em conferência de imprensa.
Para ser lançada na FESTA!
Leia quem queira

Tomar partido! (estatísticas, necessidades, pauperismo)

Há que tornar muito claro que, a partir da nossa base teórica, não se podem menosprezar as representações (estatísticas, ou outras como as artísticas) da realidade, bem como os métodos quantitativos e o cálculo. Elas são necessárias, indispensáveis. Só que são representações super-estruturais, reflectindo o estádio da luta de classes.
Com o keynesianismo em socorro do capitalismo, as representações estatísticas, podiam, por exemplo, aproximar um cálculo da repartição do Rendimento Nacional (categoria macroeconómica-chave em Keynes) entre capital e trabalho, no entanto ideologicamente enquanto factores de produção, e não no quadro de uma relação social de exploração.
Essa transposição para conceitos da nossa base teórica de expressões estatísticas da realidade tornou-se mais difícil com o neo-liberalismo económico, com a lenta recuperação do espaço pela economia de mercado ideologicamente antagónica da intervenção do Estado na economia a não ser (e determinantemente) para apoiar os grandes grupos financeiros. Também com o desaparecimento da União Soviética e a perda de, entre tanta coisa, de trabalhos em curso na sua Academia de Ciências Sociais.
Mas não se tornou menos necessária. Até mais indispensável.
Fechando este parêntese, negar a separação dos dois momentos da relação trabalho/capital é o mesmo que dizer que custos unitários de mão-de-obra se podem confundir, por substituição e apagamento, com o que, na base teórica em que assenta o nosso tomar partido!, é fundamental, o valor da força de trabalho que, enquanto valor de troca, permite o acesso ao salário e aos produtos que satisfazem necessidades.
Por outro lado, insisto na necessidade de colocar no nosso temário as necessidades (não estou a ser tautológico por distracção ou menos cuidado na escrita…). E, para reforçar esta insistência, (ou insistir na insistência...) recorro ao Manifesto (de 1848), em que Marx e Engels, na página final do capítulo I, abrem debate sobre um tema-conceito que pouco tem sido debatido, o do pauperismo ou pauperização.
«… o operário moderno, em vez de se elevar com o progresso da indústria, afunda-se cada vez mais abaixo das condições da sua própria classe. O operário torna-se num indigente [Pauper] e o pauperismo [Pauperismus] desenvolve-se ainda mais depressa do que a população e a riqueza.»
Ora, para esse debate há que ter em conta a evolução das necessidades. Hoje, em 2010, os pobres, os indigentes, mostram o vazio do seu frigorífico e eu, que sendo avançado na idade ainda estou dentro do prazo de validade, lembro que atravessei toda a minha juventude sem ter frigorífico em casa dos meus pais. E nunca fui/fomos indigente/s. A evolução das forças produtivas (e algumas instrumentos e derivas ideológicos, como a publicidade) é que, neste curto espaço de tempo (historicamente falando), tornou hoje necessidade o que ontem não era!

segunda-feira, agosto 30, 2010

L'affiche rouge

Aragon - Ferré cantam 23 resistentes fuzilados na frança ocupada



Festa do Avante! 2010 - 1

Esta é a semana da Festa.
Da Festa de todos os anos. Da Festa que desde 1976, é a nossa Festa. Desde há 20 anos, aqui!, ainda mais nossa. Que é de todos que o queiram. Porque a abrimos porque assim queremos que seja. Porque assim queremos a nossa Festa.
Festa de luta. Porque a luta não tem tréguas. Porque contra a Festa há quem lute com as armas da insídia e da pulhice.

Esta é a semana da Festa. Da Festa de todos os anos. Que, para alguns camaradas, não são só três dias no ano. Para alguns, é tarefa de todos os dias. E que todos os dias a fazem, a constroem, a desconstroem, a recomeçam a construir. Para que seja como é. E tantos são os que se lhe juntam para que haja Festa.
Esta Festa do Avante! A FESTA!

Tomar partido! (momentos da troca trabalho-capital e necessidades)

Esquematizem-se os dois momentos atrás referidos:
Momento 1
Os trabalhadores trocam a sua força de trabalho (FT) com os detentores de capital-dinheiro (D). Há uma compra e uma venda – M(FT)-D. Dispondo desse dinheiro, que passou a ser seu!, os trabalhadores trocam-no por aquilo de que precisam para satisfazer as suas necessidades, de recuperação, manutenção, valorização da sua força de trabalho. Há, portanto, no momento 1, dois movimentos - sendo o segundo D-M -, que se desenrolam na esfera da circulação simples de mercadorias, e em que o dinheiro não é mais que um intermediário para facilitar as trocas.
A fórmula geral é M(FT)-D-M(bens de consumo)
Momento 2
Os capitalistas, que compraram força de trabalho, utilizam os valores de uso desta, e o processo de produção arranca quando se incorpora a mercadoria-força de trabalho nas mercadorias de que os capitalistas disponham por terem trocado capital-dinheiro por mercadorias-meios de produção de que se servem como capital constante (C). Neste momento 2, a força de trabalho incorpora-se no capital e torna-o produtivo ao ser “usada” como capital variável (V). Está-se no ciclo de produção, em que o capital passou a ser capital-produtivo: …P…=C+V. Ao terminar o ciclo, os detentores do capital tornam-se proprietários das mercadorias produzidas (M’), produto de C+V acrescido de mais-valia (MV) – C+V+MV -, que procurarão metamorfosear (realizar), o mais rápido possível, em capital-dinheiro (D’).
Já não se trata de circulação simples, de trocas entre equivalentes. O dinheiro figura no inicio e no fim do processo, que é de valorização do capital na forma de dinheiro. A fórmula geral é D-M…P…M’-D’ (> D).
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Isto pode ser formulado de muitas maneiras, e todas elas terão algo de novo, algo em que se aprende (assim me aconteceu...). E abrem-se portas para a realidade e a sua compreensão.
Inserido nesta série sobre a base teórica em que assenta tomar partido!, faz-se a ligação às necessidades e, além de se comprovar que elas apenas aparecem no momento 1, quando os trabalhadores trocam o preço que lhes foi pago nesse momento pelas mercadorias que lhes satisfaçam as necessidades, mas estas não são (ou deixaram de ser, nas relações de produção do capitalismo) o início e o fim do processo de produção. No momento 1, na operação de compra e venda, para o trabalhador que vende a mercadoria força de trabalho, trata-se de acção vital pois com essa venda passará a dispor do que lhe é indispensável para satisfazer as suas necessidades, e estas são diferentes segundo o tempo e o lugar, segundo a história e a cultura; para o comprador será um custo que é sempre preciso baixar…
Aqui, abro parênteses, e deixo uma pista para mais tarde: nesta formulação detecta-se a dificuldade em encontrar a realidade representada nas estatísticas. Quem quiser fazer a análise da realidade a partir das suas representações, encontrará dados sobre custos unitários de mão-de-obra e só com verdadeiros malabarismos se conseguirá uma aproximação à quantificação das necessidades do “proprietário” da força de trabalho, e da mais-valia que foi criada no processo produtivo e apropriada. Estamos no terreno da luta ideológica!

domingo, agosto 29, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 14 (Aragon)

Aragon. Um dos meus poetas! A Festa do L'Humanité de 1972, em que foi lançado Ferrat chante Aragon (Le malheur d'aimer ou ... a felicidade de ter vivido o momento!).
Como não o "cucar"? De uma coisa linda chamada Il ne m'est Paris que d'Elsa, tirei um excerto e adaptei-o à minha maneira, ao meu momento.


À maneira de
Louis Aragon

Fou d'Elsa
(nascer segunda vez no meio-dia da vida!)

É preciso tempo para que as imagens que são tomem o lugar das que foram,
para que um livro ou um objecto banal deixe de fazer sangrar a ferida aberta.
É um trabalho de paciência ao inverso do tecer da aranha,
é preciso tempo para desenovelar a teia consigo mesmo e com o mundo.
Custa aceitar a morte quando ela é inesperada,
a morte dos jovens para que nada (mas nada!) estávamos preparados.
Quando são os velhos – os da nossa idade – é tão diferente:
não morrem, partem…
E é como, na estação final da vida, num cais, o lenço que se acena num adeus.
Até breve!

O “Estado Social” e a sua insustentabilidade, como "eles" dizem...

No sistema capitalista (modo de produção/formação social) o que desfruta do dogma da intocabilidade é… o capitalismo, as relações sociais de produção que o definem, é a exploração do trabalho, ou seja, dos trabalhadores como sumo e resumo. Mais: o dogma é o da indiscutibilidade. É assim, e só pode ser assim.
No sistema capitalista (modo de produção/formação social) o que há que mudar, e o mais urgentemente quanto a relação de forças na luta de classes o permitir é o “Estado Social”, as conquistas que, após duras lutas num modo de produção do trabalho/trabalhadores, minoram a exploração ou, aparentemente, a humanizam.
Assim o dizem os “sábios” economistas que por ministros de economia (capitalista) ou das finanças (capitalistas) passaram, em trânsito para outros lugares.

Tomar partido! (necessidades e troca trabalho-capital)

As necessidades humanas não se podem desligar do processo histórico. Pelo contrário, e a economia política marxista tem de ser clara: as formas subjectivas que as necessidades humanas revestem neste ou naquele processo social, são determinadas pelas condições objectivas da sua existência. As condições objectivas, que determinam a formação das necessidades, estão ligadas à evolução do ser humano e da sociedade, no plano individual – o que implica uma gama de bens materiais e culturais, históricos –, e ao desenvolvimento da produção social que engendra, sem cessar, novos produtos e novas/outras necessidades.
E se terminei o anterior tomar partido! com a promessa (?!…) de vir a citar Marx, aí vai:
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«As próprias necessidades naturais [naturlichen], como alimentação, vestuário, aquecimento, habitação, etc. são diversas segundo as peculiaridades climáticas e outras peculiaridades naturais de um país.
Por outro lado, o âmbito d{ess}as chamadas necessidades imprescindíveis, assim como a maneira da sua satisfação, são eles mesmos um produto histórico e dependem, portanto, em grande parte do estádio de civilização de um país (…) Por oposição às outras mercadorias, a determinação de valor da força de trabalho contém, pois, um elemento histórico e moral.»*
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Insistindo (no contexto destes textos): até em razão das necessidades resultantes da “primeira natureza” (animal) do ser humano a sua força de trabalho, ao contrário de todas as outras mercadorias, tem valores diferentes de lugar para lugar. Muito mais ainda diferem no que respeita às necessidades de “segunda natureza” (social), que são, por definição e processo, necessidades históricas, culturais, também de lugar para lugar, e ainda dentro do mesmo país, por pequeno que ele seja.
Mas citar Marx é um perigo! Logo outras citações se impõem (e tantas ficarão por fazer!), até porque ele se repete… nunca se repetindo, mas reforçando e completando.
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«O valor da força de trabalho, tal como o de qualquer outra mercadoria, é determinado pelo tempo de trabalho necessário para a produção – portanto, também reprodução - desse artigo específico. Enquanto valor (…) O tempo de trabalho necessário para a produção da força de trabalho resolve-se, pois, no tempo de trabalho necessário para a produção desses meios de vida ou: o valor da força de trabalho é o valor dos meios de vida necessários para a conservação do seu possuidor.»**
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Assim se pode chegar à questão crucial da “relação de troca entre o trabalho e o capital”, que tem dois momentos: um, em que o trabalhador troca a sua mercadoria, o valor de uso da força de trabalho, por uma certa quantidade de valores de troca – por uma certa quantidade de capital-dinheiro –, com o possuidor de capital-dinheiro; outro, em que este recebe, em troca, a mercadoria força de trabalho para conservar e valorizar o seu capital, primeiro sob a forma mercadoria que, depois, pretende metamorfosear na forma (mais) capital-dinheiro.
São dois momentos! Inseparáveis mas separados, embora
.
“O capitalista - e ainda mais o seu tradutor teórico, o economista político -, porém, só dificilmente pode desistir da imaginação de que o dinheiro pago ao operário continua a ser dinheiro do capitalista." ***.


(isto dá pano para tantas mangas…)
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*- O Capital, edições avante!, Livro primeiro, Tomo I, p. 198 – os parênteses [] são do tradutor (Barata-Moura), os {} são meus.
**- ibidem, p. 197/8
***- idem, tomo V, p. 477

Os herdeiros Feteira

Tenho lido e ouvisto muito sobre o caso da enorme fortuna Feteira e os seus vários putativos herdeiros, e sobre o assassinato de uma senhora com quem o centenário vivia há anos ou décadas. Não faltará, decerto, quem com este rico (e triste) material faça romance, filme, telenovela, o que fôr...
Mas há uma coisa que me espanta. No mundo pôdre e criminoso em que tudo isto se move e no leque de herdeiros com origem em várias origens e cama(da)s, há uma questão que escapa e há uns herdeiros, porque fautores da fortuna, de que ninguém fala.
Esta herança enorme também é de falências de empresas e de negócios volumosos à beira de falências.
Entre os herdeiros, faltam os trabalhadores que sofreram essas falências e que não beneficiaram desses negócios. Trabalhadores que estão, sem qualquer dúvida, na origem da dita fortuna que despoletou estes escândalos e crimes (pelo menos um é conhecido, sem que, por enquanto, se conheçam os criminosos, executores e mandadores).
Sim!, porque essa fortuna não nasceu por obra e graça de espíritos santos, embora alguns destes possam ter ajudado a acrescê-la.

sábado, agosto 28, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 13 (Rafael Alberti)


Enquanto é Agosto e o nosso (con)viver está cheio dos que abalaram e agora, em Agosto, vieram minorar saudades. Alguns, talvez, preparar o regresso definitivo, (quase) sempre adiado. São os nossos emigrantes!
Enquanto é Agosto, estes três curtos poemas do desterro e da espera, “cucados” dos poemitas 1, 2 e 14 dos 19 de El Otoño otra vez, de Rafael Alberti.




À maneira de
Rafael Alberti

Também eu ladrava! Quem não ladra
depois de tantos anos a falar sozinho
e tão cansado do linguajar estrangeiro?
Acaso com outros idiomas
poderiam entender-me melhor,
porque este que de mim se escapa
já não me serve para dar mais luz
ao que quero dizer.

Este bosque, esta floresta
é igual aos outros bosques.
E, apesar disso, como eu queria
estar em outros bosques,
estar nos pinhais da minha terra.

É muito triste esperar que chegue o verso,
que apareça o poema
e, em vez disso, morrer um amigo
ou, no lugar do verso, algo acontecer
que para sempre do verso nos afasta.

Telegramas a partir de uma "revista de imprensa"

Duas notas telegráficas:

A.
A prova de rendimentos dos beneficiários que recebem apoios sociais vai passar a ser entregue obrigatoriamente pela Internet.
Se a intenção fosse a de apanhar e/ou evitar as fraudes seria estúpida!... porque os que, eventualmente. as estivessem praticando facilmente arranjam modo de enviar essa prova pela net; se a intenção é a de, com cortes nesses apoios, poupar uns cêntimos para equilibrar o desequilibrado orçamento é anti-social, é desumana pois os que mais precisarão desses apoios são, também, info-excluídos e a dificuldade de fazer prova pela net vai penalizar os que mais precisam desses cêntimos.

B.
A ler o espesso semanário que me ocupa o (in)ócio, entre muita coisa que, inevitavelmente, passará por esta via de comunicação, tropecei numa frase que me parece elucidativa de uma assumida e quase assustadora cegueira ideológica: « (...) A ganância, como se vê, não é mal próprio de um regime, de um estilo, do capitalismo ou do neo-liberalismo (...).
Do capitalismo OU do neo-liberalismo como exemplos de regimes, de estilos? Então, desculpem lá..., o neo-liberalismo não é capitalismo?! É o quê?
Pois eu diria que a ganância é um mal próprio do capitalismo*, em todos os seus estilos, regimes, etapas, fases, tais como o neo-liberalismo.
___________________________
* - antecipando-me: não escrevi mal exclusivo!...

Anedota com apropósito

Num concurso realizado para se apurar em definitivo qual a mais velha profissão do mundo, chegaram à final, o médico e o economista.
Argumentou o médico, a quem saiu, por sorteio, a primazia:
- A profissão do médico é não só a mais antiga como a mais importante: a criação da sociedade humana foi precedida de uma operação cirúrgica que retirou uma costela do homem para se criar a mulher!
Contrapôs o economista, muito seguro de si:
- Pois... mas antes dessa operação cirúrgia, e antes mesmo de Adão, já existia o caos. E mais: ele continua a existir... não estamos permanentemente em crise económico-financeira?
Nem precisou de dizer mais. O juri, formado por representantes da sociedade capitalista em caos, atribuiu à profissão de economista o título e, na acta, foi justificado por ser a profissão que mais contribuiu para a desordem e para a impotência do ser humano perante os elementos.
.
É injusto porque na profissão (como nos partidos!) não são todos iguais... mas tem graça (terá?)

Tomar partido! (citações sobre necessidades)



Do livro com que fecho o anterior apontamento - de uma autora húngara, Agnes Heller, de 1974 - por mim comprado em 1981 e lido com grande atenção e intenção, retirei, vejo agora, muitas notas. Não que o livro não me tivesse suscitado algumas dúvidas, particularmente levantadas por aquela outra (e de outros) intenção de cavar uma d ivisão entre o "jovem Marx" e o "Marx adulto" (de O Capital), mas uma das grandes utilidades de alguns livros é a de nos provocarem (por vezes, até por provocação) reflexões mais aprofundadas. Duas citações, para poupar o muito que, por palavras "inventadas" por mim poderia para aqui trazer:
  1. «Para Marx, as antinomias específcas do capitalismo, que derivam da produção de mercadorias, são as que existem entre liberdade e necessidade, necessidade e oportunidade, teleologia e causalidade; destas decorre a especial antinomia entre a riqueza da sociedade e o empobrecimento social.» (pg. 81)
  2. «O mundo da troca de mercadorias é o mundo da universalidade do egoísmo: o do interesse pessoal. Os sujeitos da troca são indiferentes entre si; estão em relação uns com os outros apenas para a realização dos seus interesses pessoais: no que respeita à "necessidade do outro (e dos outros)" - que é, como sabemos, o que Marx considerou a mais elevada e "mais humana" necessidade - a redução é total.» (pg. 64

Num outro livro - editado em 1974 pela Prelo, de autor soviético, Molatchov - encontrei, logo na introdução, esta observação que me parece pertinente:

  1. «A economia socialista destina-se a satisfazer as diversas necessidades do homem, do trabalhador. É por esta razão que o cientista, que estuda as suas leis de desenvolvimento, deve corresponder a elevadas exigências.» (pg. 5)
  2. «À primeira vista, concretizar a necessidade de um acto ou acção parece ser um assunto subjectivo. É precisamente desta forma que a economia política burguesa procura interpretar as necessidades. No seu estudo, substitui a análise económica e social das condições de vida material (no que se refere à formação das necessidades humanas) pela psicologia. Deste ponto de vista, as necessidades encontram-se completamente isoladas do processo de reprodução e intervém no indivíduo como um sentimento negativo que ele procura, ao mesmo tempo, eliminar. (...) Sempre que analisam a natureza das necessidades humanas, os economistas burgueses têm, geralmente, tendência para tornear os problemas sociais agudos do capitalismo e dedicar-se, antes, a especulações mesquinhas sobre os sentimentos do homem.» (pg. 9)

(sobre isto, continuaremos... e com uma citação de Marx)

sexta-feira, agosto 27, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 12 (Nazim Hikmet)

Este será o mais meu de todos os "poemas cucos". Porque, sendo "cucado" de Nazim Hikmet, nele estou eu, e outros que como eu.


Estarei eu, sinto-me, em muitos outros poemas que meus não são, e que, por mais que os (mal)trate nunca meus serão. Mas este é meu!, já o era antes mesmo de o tirar de onde estava aninhado - como o fizeram os que o traduziram do turco -, antes de o tratar (decerto mal) para que meu seja. Que Nazim Hikmet me perdoe, assim como tanta gente diz - ao fazer uma "maldade" que acha que não é ou que é por bem - "que deus me perdoe"!


À maneira de
Nazim Hikmet

Por minha fraqueza, mas não só a minha,
separaram-me do meu Partido;
mas não me importei
porque do Partido eu continuei
a ser.

Por nossas fraquezas,
já muitas vezes tentaram acabar com o nosso Partido;
mas nunca conseguiram
porque nós continuámos e continuamos a ser O Partido

Não fiquei esmagado
sob a tortura e o comportamento

Não fomos destruídos
nem pelos de fora e nem pelos de dentro

(hoje,
com um pensamento triste
e já de saudade,
e uma dedicatória ao
Henrique Cunha)

"Aquela decência fundamental"!

Normalmente (o que é a norma?) aproveito, do que estou a ler, pedaços que me "marcam" (ou que eu marco com marcador que sublinha...) para "postar" mensagens no blog som-da-tinta. Muitas por lá tenho deixado. Menos que as leituras, e o que, de elas, me "marcaram". Mas esta é para aqui:
« - Oh, não inteiramente. Ele não desistiu da Europa - discordou Joanna. - a Europa que há nele é a sua sobrevivência. Essas pessoas não desistirão. Mas também são melhores que a Europa. Havia nelas gratidão e idealismo. Aquela decência fundamental
(Património, Philip Roth, pg. 114)
Atenção! esta Europa não é a chamada União Europeia. É a propriamente dita. E a "decência fundamental" é o respeito por... decência. Fundamental!

Tomar partido! (necessidades - 1)

Não há uma sequência planeada de temas. Nestas reflexões, as cerejas vão saindo umas atrás das outras ao sabor das leituras e releituras e adia-se a arrumação. Por isso mesmo me parece que estão a faltar umas palavras sobre necessidades. Não abro um parêntese, não saio do rumo, apenas introduzo umas considerações sobre um tema que se me afigura sempre em falta. Talvez por lhe dar tanta importância.
É verdade que se pode pegar nele de forma que desvie do essencial, que pode mesmo servir para aquela deriva intencional (mal intencionada) de dividir Marx, de seccionar a juventude da maturidade como se esta (a matura idade) não seja claramente explicada por aquela, como se não houvesse um percurso que, tal como o da História, avança sem cortes mas com saltos (qualitativos) provocados pelos passos (quantitativos) que se vão dando… por vezes “marcando passo”
A nossa base teórica, no que respeita à economia, não pode menos-considerar as necessidades. O ser humano tem a sua “primeira natureza” enquanto matéria organizada em ser vivo, com as necessidades que lhe são… naturais, isto é, as de se manter matéria organizada, viva: alimenta-se, protege-se do meio de que é parte, reproduz-se para se continuar; tem uma “segunda natureza” enquanto animal que se socializa, que comunica, que trabalha, que divide trabalho, que vai criando necessidades que são naturais a essa “natureza social” porque humanas e em constante progresso, embora a escala do tempo possa ser imperceptível para o nosso horizonte individual, tão limitado nos anos de sua duração.
Estou, é evidente, a entrar por áreas que não são as do sapateiro que sou, a tocar rabecão que não é o meu instrumento (nenhum o é…), se calhar a dizer disparates. Mas não a dispara(ta)r! Comedido.
O que quero tornar claro é que, ao tomar partido, assumimo-nos materialistas, históricos e dialécticos. E que as necessidades nossas são as de ser(mos) animal e humano, isto é, social.
Temos necessidades! A economia estuda (ou deveria estudar) como, pelo trabalho (necessidade nossa, imaterial), servindo-nos e transformando a natureza que nos rodeia e em que somos, as satisfazemos. Criando valor – de uso e de troca – até ao acto de usar o valor de uso, até consumirmos, consumo que já é de outras áreas que não a da economia.
Por isso, a avaliação (digamos moral) das necessidades está fora das nossas fronteiras, embora as várias áreas do pensamento e da compreensão do que somos e como estamos tenham de se integrar numa visão de conjunto. E tomar partido! Não como economista, mas reflectindo-se evidentemente na economia que, como economista, cada um pratica.
Por isso, gosto de citar Marx (pois claro!): "Para a nossa finalidade (…) é totalmente indiferente se um produto real, por exemplo, como o tabaco, é do ponto de vista fisiológico, um meio de consumo necessário ou não; basta que, em conformidade com o hábito, [ele seja] um tal [meio de consumo necessário]."

Repito, modificando: basta que, em conformidade com o hábito (poderia dizer-se: com a cultura própria do tempo-em-que), esse produto real (essa mercadoria saída da esfera produtiva…) seja sentida como uma necessidade, isto é, seja um meio de consumo sentido como necessário, independentemente de considerações fisiológicas ou outras, como morais ou éticas. E aqui entram em campo as relações sociais de produção e a superstrutura da formação social, ou seja a exploração capitalista, a publicidade, a ideologia que se impõe dominantemente, a partir da relação de forças na luta de classes.


(segue já… amanhã)

quinta-feira, agosto 26, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 11 (José Gomes Ferreira)

Sirvo-me do José Gomes Ferreira (e tem-me servido tanto!) para um (re)tomar de balanço na "cuquice".
Obrigado, camarada Zé Gomes!



Mesmo "à maneira de"
José Gomes Ferreira

E agora?
Agora nada.
Mais poemas.
De outros e meus
(se for capaz...)
Para não morrer à míngua de ser.
Parece que só sei viver através das palavras!

Os incêndios e as ZIF

A reunião de terça-feira do Comité Central tomou a importante decisão de, por proposta dos organismos executivos, escolher o camarada que vai personalizar a candidatura do PCP às eleições presidenciais. É o camarada Francisco Lopes, e a sua declaração política é esclarecedora. Que, quem quiser, pode ler aqui.
Mas a reunião do CC não se limitou a essa importante - e não só para o PCP! - decisão. E se decisões (nem sempre fáceis) de âmbito interno foram tomadas, o comunicado tornado público ilustra as posições do PCP sobre a situação que vive o País. A título de exemplo, e pela sua oportunidade neste final de Agosto, reproduz-se o ponto I.5, sublinhando-se o que, por critério pessoal, pareceu merecer destaque:

«I.5. O Comité Central do PCP manifesta a sua profunda preocupação com a evolução dos fogos florestais e as suas consequências na vida, bens e economia de milhares de famílias e manifesta a sua solidariedade para com os produtores florestais e agricultores atingidos pelos incêndios. Uma situação que demonstra que apesar das melhorias verificadas nos meios de combate a incêndios a questão crucial e mais decisiva – a do estado da floresta enquanto elemento estruturante de uma política de prevenção – continua à margem das preocupações e da acção do Governo, que opta por culpar outros factores, designadamente as condições climatéricas, quando, antes, em anos de baixos riscos, chamou para si o êxito da redução da área ardida.

O Comité Central reclama medidas de apoio imediato para repor os bens e produções perdidas e reafirma a inadiável necessidade de uma nova política agro-florestal que invista na prevenção estrutural, no ordenamento e gestão activa da floresta que defenda e apoie os baldios que reforce os meios e serviços do Estado e o apoio às Zonas de Intervenção Florestal, garantindo os fundos do PRODER perdidos pelo corte das contrapartidas nacionais e intervindo na política de preços em defesa dos pequenos produtores. Uma política que defenda e apoie a produção nacional e combata o abandono da agricultura familiar e a desertificação humana e económica em vastas regiões do país.»

Tomar partido! 17

Estes apontamentos, que servem de apoio de fixação ao que está a ser estudado e preparado para uma intervenção próxima, e também, evidentemente, para comunicação por esta via a que dou muita importância, não podem ser encarados como um curso ou parecido. Já neste blog algo fiz com esta intenção que não é a de agora, numa série sobre materialismo histórico, que foi uma experiência útil (para mim, pelo menos).
Em relação ao que, agora, aqui me traz, ainda há alguns temas, ou aspectos, que se impõem enquanto fixação de reflexões após leituras e releituras. Na sequência da abordagem da base teórica, na vertente económica, há que insistir na questão das esferas do processo total de produção do capital, nas metamorfoses por que passa o capital, nas suas materializações como relação social que é, e na importância relativa que vão tendo essas formas.
Se o capital passa da forma dinheiro à forma mercadoria, nesta se torna produtivo para a ela regressar – sem ter saído... – acrescida de valor, mercadoria que tem de realizar valor de uso e valor de troca, metamorfoseando-se em novo (e mais…) dinheiro, a importância relativa das formas do capital materializado na concretização dos circuitos e as independência e autonomia de algumas dessas formas ou de formas nelas nascidas ou incluídas como dependentes, sem alterarem a natureza essencial das relações de produção. Assim o capitalismo passar por fases diferentes, também – e intrinsecamente – marcadas pela relação de forças na luta de classes sempre viva – enquanto houver classes antagónicas –, embora latente e, ideologicamente, ou escamoteada ou não consciente.
O capital financeiro, se não éforma nova, tem vindo a ganhar preponderância no funcionamento da economia política capitalista, e a tomar dimensões absolutamente desmesuradas, com o reforço de vias especulativas para acumulação e concentração de mais dinheiro e para contrariar a dificuldade de tal ser conseguido na esfera produtiva com a criação e apropriação de mais-valia. O capital-dinheiro simbólico (fiduciário, não-metálico) cresce “assustadoramente” por via do dinheiro fictício, do crédito, das “engenharias financeiras”, das “injecções” com que os Estados “socorrem” as entidades bancárias e para-bancárias, agravando as contradições que o capitalismo engendra e lhe são inerentes.
As 5 dinâmicas que Marx enumera no Livro terceiro de O Capital (acréscimo da exploração do trabalho, descida de salário abaixo do seu valor, depreciação de elementos de capital constante, sobrepopulação relativa, comércio externo) como contrárias à baixa tendencial da taxa de lucro, e que de modo algum a anulam, incluem e acrescem com a demencial financeirização. O que não leva a passarem de dinâmicas que contrariam uma lei que, por si mesma, se define como tendencial, e que tem a sua razão de ser na evolução da composição orgânica do capital, com o trabalho morto ou cristalizado a, inelutavelmente, ganhar espaço e tempo ao trabalho vivo, podendo libertar os portadores deste de actividades que o trabalho cristalizado ou morto pode realizar, mas de que resulta, nas relações sociais que são o capitalismo, o desemprego em vez do tempo livre e humanizado.
(isto tem de continuar…)

No "expresso" de hoje à tarde

Viagem para Fátima

Se já tantos escreveram,
se Saramago escreveu*,
se Mário Castrim escreveu**.
porque não hei-de escrever eu?

* - No ano da morte de Ricardo Reis
** - A caminho de Fátima

1.
Parecem metralhadoras
as ininterruptas faladoras!
‘Inda por cima em crioulo...
… dão-me cabo do miolo!

2.
Um bebé que chora
toda a hora
(e mais meia...)

3.
A mãe embala,
docemente,
a tia (?) adormeceu,
finalmente.

4.
Um pé grande, grande
(p’raí 44, no mínimo)
vem do banco de trás
e zás!
instala-se no banco vazio
aqui ao lado do meu,
deve ser do tio.

5.
Um pé grande, enorme,
todo mulato menos na sola,
extremidade de um corpo que dorme.
Deve ser de Angola...
.
6.
Branco na planta que espanta,
luzidia,
aqui está,
a fazer-me companhia,
um pé enorme,
que dorme.
.
7.
... e só lhe falta ressonar
(faço-lhe justiça,
não há que dizer:
bem lavadinho, nenhum cheirinho
e unhas bem cortadas)
Deixá-lo estar...

8.
Nos lugares à frente
6-orientais-6,
desses, das peregrinações.
São três casais
de 3-gerações-3.
.
9.
Vieram de longe,
cheios de fé.
Já começaram a rezar,
mesmo sem virem a pé
têm promessas para pagar!

10.
Vão até Fátima,
e em Fátima vão ficar
… e eu também...
faço escala de curta paragem,
estou de obrigatória passagem.
Sou o peregrino acidental
para chegar ao Zambujal.
(Aleluia!)

11.
Há os que,
expressamente,
seguem rapidamente para Braga,
Boa viagem!
25.08.2010

quarta-feira, agosto 25, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 10 (Martinho Marques)

Este poema não tem "cuquice", e na sua última palavra (nunca a queiram dizer...) se verá porquê.

.


É de Martinho Marques

e deste livro


.

O PAPEL

.

.

O papel............do tabaco

o papel.............do sabujo

o papel.............do macaco

o papel.............do buraco

........................que é sujo

.

O papel.............à sucapa

do papa............de Roma

o papel.............do diploma

o papel.............do perfeito

o papel.............do direito

o papel.............papelão

o papel.............do fiel

o papel.............do papão

o papel.............da falácia

o papel.............da polícia

o papel.............do comício

o papel.............do palácio

o papel.............do ofício

que sai

ou que vai.........a sair

o papel.............do papel

atraente............é trair

e é manter.........o papel

ascendente

e caduco

.........................do cuco

_______

.
... e dele me "vingarei",
de Martinho Marques um "poema cuco" farei!

A questão (magna) do desemprego

Esta mensagem poderia incluir-se na série Tomar partido!. Porque o desemprego é questão crucial (qual não é? mas esta é-o especialmente), enquanto situação social terrível mas também enquanto questão teórica. No entanto, não a incluo na série porque iria perturbar a minha sequênci a de reflexões.
Esta mensagem impõe-se-me como reacção a um cartaz de propaganda de um partido que se afirma bloco e de esquerda, cartaz que confrontei nas ruas de Lisboa e que nos entra pelos olhos dentro a gritar que com o desemprego todos perdemos.
A frase é de choque, o grafismo será aliciante (há gostos e estéticas para tudo) ou eficaz (sei lá...)e pode apanhar os passantes desprevenidos. Sobretudo se não armados com uma protecção ideológica permeáveis, por condições objectivas a este tipo de mensagens de propaganda.
Perdemos todos com o desemprego? Todos?!
Quem atira isto cá para fora contribui para a onda de que estamos todos no mesmo barco, de que todos sofremos a crise, de que todos temos de fazer um esforço, seja no IVA, no IRS, e por aí fora até medidas mais drásticas ou que já não podem sere encapotadas. E contribui porque ao serviço do classe que provoca o desemprego, com o funcionamento que impõe à economia e a mentira consciente, ou por confrangedora debilidade ou total vazio ideológico, com uma camada de verniz de esquerda a tapar essas "misérias".
O desemprego tornou-se uma "variável estratégica" do capitalismo, é a forma de ter mercadoria força de trabalho em stock, de manter e reforçar um exército de reserva de mão-de-obra, de se utilizarem as condições que o desemprego cria para se atacarem os direitos conquistados (e constitucionalizados), para se promover a baixa de salários e a precariedade.
Quantos não conhecemos argumentos de gente nossa como "tive de aceitar senão estava desempregado" ou "eu ia para a luta mas não posso correr o risco de ficar desempregado" (e, depois, desempregado fica...).
.
Perdem com o desemprego os grandes senhores da finança e os cavalheiros da indústria?, ou ganham com o desemprego que fomentam?
Perdem com o desemprego os quadros ao serviço do capital seja qual for a forma (ou a máscara)que este tome?
Ao menos... um acrescento do tipo nós à terrível palavra todos! Que se tornou uma arma ideológica para que muitos de nós não tomemos consciência que há classes sociais e interesses antagónicos. Todos é nada e pode ser tudo.
.
Com o desemprego, perde (e sofre) quem vive do seu trabalho e ganha quem explora os trabalhadores!

Tomar partido! (Os transportes)

Quando, ao reflectir sobre a base teórica que fundamentou, ou veio fundamentar, o partido que foi tomado, se confrontam os conceitos nucleares de trabalho, de criação de valor, de trabalho produtivo, espanta o facto desta base teórica ter os seus caboucos lá para a segunda metade do século XIX, quando não havia excel e processadores de texto, estavam para nascer ou eram crianças os avós de Bill Gates e Makintosh (“isto” é um fulano?...), quando davam as primeiras e indecisas voltas os pneus do que viriam a ser os automóveis e não havia aviões (apesar das barcarolas e dos balões).
Não obstante, o sr. Karl Marx, nos seus estudos (teóricos!) sobre o trabalho produtivo já teve a clarividência de considerar que os transportes tinham um papel central nessa tal base teórica. O que é verdadeiramente espantoso!
É verdade que Marx foi sempre testemunha atenta do que se passava à sua volta – como os pneus… - e privilegiava a dinâmica, o que caminhava para o futuro – sobre rodas ou não…
Marx interessou-se muito pelos transportes, e empolgou-se com o seu vertiginoso progresso com a burguesia ascendente (progresso que, hoje, parece lentíssimo!). Decerto porque, nascido ele a 1818, a locomotiva de Stephenson apareceu em 1825, em 1830 foi inaugurada a primeira via férrea Liverpool-Manchester, na década de 40 o mundo passou de 8 mil para 30 mil quilómetros de redes ferroviárias (que coisa impressionante!) De 1863 a 1867, estando Marx entre os 45 e os 50 anos, enquanto escrevia manuscritos (não tinha computador…) para O Capital, nas “suas barbas”, na Áustria, construia-se, através do colo de Brenner, uma via férrea com 22 túneis nos Alpes, sessenta viadutos e pontes, ligando Alemanha, Áustria e Itália.

Há quem diga que se estava na “era do carril”.
Mas não foram apenas os caminhos de ferro. Para dar um outro exemplo, lembre-se que o canal de Suez foi inaugurado no final de 1869. Adiante... avante!

.
Evidentemente que esses factos, e o seu encadear, tiveram importância no estudioso da realidade, e seu atento observador, que era Karl Marx. E foi capaz de ver para diante, de avaliar a importância do desenvolvimento impetuoso dos transportes nos meios de produção e de o enquadrar na natureza capitalista do sector.
Antes, muito antes, do automóvel, do avião, das auto-estradas da comunicação.!
Uma base teórica colocada sobre carris, é o que é!

terça-feira, agosto 24, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 9 (Mário Castrim)

Este é um "poema cuco" especial. Algum não o será?... Sobre um poema de um camarada que deixou uma enorme saudade que resiste aos anos que vão passando. Com uma dedicatória: à Mariana Rafael (a Clarinha).

À maneira copiada
(com uns acrescentos)
de Mário Castrim

Viagem
através de uma tipografia clandestina*


Gritar Liberdade!, é fácil
… quando se vive com liberdades.
É fácil defender a liberdade de expressão
num off-set sofisticado,
com ar condicionado, telex, telefones
amplas janelas para o sol, quebrado
por estores de alumínio, docemente,
com salário em dia, hora para almoço, crédito bancário,
protecção constitucional e recurso ao tribunal.
E, mais adiante, fácil é defender direitos humanos
em mails e nets, blogs e facebook
tudo Windows set e new-look.

Assim,
serem pela liberdade de expressão uns,
outros perorarem sobre direitos humanos
é cómodo, é fácil, é barato e dá milhões (a alguns…)

Mas do que eu estou a falar é de outra coisa.
Se entendeste, o poema está cumprido.
Se não entendeste, o poema espera
com a paciência tradicional de todos os poemas


___________________
* -
do caderno Viagens,

editado pela célula dos Trabalhadores Gráficos

da Renascença Gráfica/"Diário de Lisboa"

para a Festa do avante! de 1977 (Jamor)

Correu bem.

Correu bem!

Isto é, correu de acordo com as regras. Nossas. Democráticas!
Foi proposto - depois de consultados, antecipadamente, os membros do CC -, foi discutido, foi votado, foi aprovado, foi comunicado.

Aquando da comunicação, feita pelo secretário-geral, ouviram-se as perguntas esperadas, que tiveram as respostas repetidas e que, por isso, deviam ser consabidas. Mas os preconceitos, os "clichés", as perguntas repetem-se. Têm de se repetir as respostas!

Depois, duas horas mais tarde, no final da reunião de trabalho, que continuou, o candidato do PCP às eleições presidenciais fez uma declaração.


Os comentários dos encartados comentadores repetiram as "dúvidas", os preconceitos, os "clichés". As mesmas das perguntas...

Assim será (mais) esta batalha.
.
Votos de bom trabalho (e votos dos outros...), camarada Francisco Lopes!
... E só com muito trabalho nosso, porque tem de ser de todos!


Para que fique claro

Em razão de algumas dúvidas que me colocaram, e para que fique inteiramente claro o modo como funcionamos, escrevo esta mensagem às 23:48 de 23 Agosto e vou fazer uma opção de postagem para as 11 horas de amanhã, 24 de Agosto.
A essa hora, e pontualmente como é nosso hábito, começará a reunião do Comité Central eleito pelos delegados eleitos ao Congresso de 2008. Porquê tão tarde? Porque muitos dos camaradas se deslocam de longe - irão do Algarve a Trás-os-Montes - e hoje, até tarde, têm trabalho, partidário ou não, para fazer (eu, por exemplo, que não me desloco de muito longe - chegam duas horas, com uma hora e meia de autocarro - não podia ir hoje para Lisboa porque tive reunião da concelhia até há pouco).
Pois nessa reunião, como já vi e ouvi anunciado vai ser decidido qual vai ser o candidato do PCP às presidenciais. Foi até dito que "amanhã será anunciado..." como se fosse coisa já decidida.
Pois não está!
De acordo com os nossos modos de proceder, depois de consultas que lhes pareceu convenientes, os organismos executivos do Comité Central (a Comissão Política e o Secretariado), na reunião convocada para as 11 horas, e no 1º ponto da ordem de trabalhos, vão apresentar a proposta do camarada a cumprir essa tarefa e, cumprindo decisão anterior (que pode, evidentemente, ser alterada... mas só pelo organismo que a tomou, e que foi o CC), será um membro do CC. Essa proposta será apreciada pelo colectivo do CC, que a discutirá e decidirá. Só depois se pode dizer quem será esse nosso candidato, e deverá ser o Secretário-Geral a fazê-lo. Nada impede que a discussão possa levar a decidir diferentemente da proposta dos organismos executivos.
Nada na manga! Nenhum tabu!
Sem burocracia ou procedimentos de faz-de-conta, mas com lisura e coerência democrática. Sublinho: democrática!
Não estranhem, por isso, que a esta hora que escrevo não possa responder à pergunta sobre quem será o candidato do PCP à eleições presidenciais, e comece a reunião do CC, às 11 horas a que sai esta mensagem, sem o saber, como nenhum outro membro do CC o sabe.

Tomar partido! (formas materiais do capital)

Neste apontamento de hoje, apenas quero deixar um breve encadeado de observações que procuram sintetizar o resultado de algumas leituras e reflexões próximas (embora continuadamente repetidas e reformuladas que não revistas).
De acordo com a nossa base teórica, sendo o capital uma relação social de produção, ele materializa-se em capital-dinheiro (D), capital-mercadoria (M) e capital-produtivo, (… P …).
Essas formas materiais que toma a relação social passam por metamorfoses, de D a M e de M a D, como fases do processo de circulação do capital e, enquanto capital-produtivo, na esfera do processo produtivo (… P …), divide-se em capital constante, que é mercadorias-meios de produção - pano, linhas, botões, máquinas, energia -, e capital variável, que é mercadoria-força de trabalho - horas de trabalho, de que só algumas são trocadas pelos meios para a sua recomposição e (sobre)vivência do proprietário/trabalhador.
.
D – M (…P…) M’ – D’
.
Por este caminho, de que não me canso e em que descubro sempre “paisagens” novas, continuaria, mas só quero acrescentar que, ao longo do processo histórico, outras formas materiais do capital (da relação social de produção) foram aparecendo e/ou autonomizando-se, algumas delas vindas de modos de produção anteriores e/ou coexistentes, isto é, de outros estádios de relações sociais de produção, de anteriores fases do desenvolvimento das forças produtivas.
Refiro-me ao capital-comercial e ao capital-financeiro, inseridos nos circuitos de circulação do capital, e que foram tendo crescente autonomia e importação no circuito total de reprodução do capital.

segunda-feira, agosto 23, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 8 (Antonio Guerrero)

Não será bem “de cuco” esta mensagem, a tirar dos ninhos de outros as palavras que quero dizer e a dar-lhes ares meus às maneiras suas.
Neste caso, a situação é mais séria que a simples (e importante!) intenção, estulta..., de melhor dizer o que outros disseram tão bem que me desafiou.
Neste caso, traduzo “à minha maneira” – sendo boa a tradução que conheço – e denuncio! Denuncio a prisão do poeta, desde 12 de Setembro de 1998 (há 12 anos!), e de mais 4 companheiros, acusados de “conspiração por espionagem” e de acção consciente como “agentes não registados de um governo estrangeiro”, quando esse governo estrangeiro é o da sua Cuba, e a acção de conspiração era a de procurar conhecer, informar e impedir actos de sabotagem e terrorismo contra a sua Pátria.
de António Guerrero
(Desde mi altura)


Hasta quando

Muitos Abris passaram sem regresso,
tanto se atarda a primavera nova
que não poderei dizer-te ao certo
até quando será esta espera, esta demora.

Dá-me pena saber as flores em tuas mãos
e não as poder regar todas as manhãs.
Causa-me dor adivinhar os frutos dos teus lábios
e não os misturar com meus doces morangos.

Não sei até quando estará seco este vale,
quando voltarão às árvores as flores e os frutos,
mas neste rego onde hoje morre a rosa
sempre se incendeia de vida o coração.

Tomar partido! (para quê?)

Suponhamo-nos em tarefa, na Atalaia a construir a Festa (que é nossa na construção e na desmontagem, para que seja de todos enquanto cidade viva e outra durante três dias), ou a colar cartazes, ou a cobrar quotas e entregar cartões, ou a distribuir propaganda na rua … para que nos serve, então, a base teórica?
Sim, para que nos serve saber se este assalariado desta fábrica a encerrar, operário, é trabalhador produtivo e se aqueloutra assalariada da mesma fábrica, empregada da contabilidade, é trabalhadora improdutiva, como aqueloutra “aviadora” numa grande superfície, todos/as sujeitos/as ao mesmo sistema de exploração, vivendo os mesmos problemas em casa … sim, para quê?
Não será perder tempo estudar “essas coisas” quando a luta está aí, na construção de uma “cidade” nossa, nos cartazes que, com frases curtas e incisiva, e motivos gráficos apelativos, passam a mensagem que se quer retida, nas quotas e fundos que se tem de receber senão a organização não funciona, na propaganda que é preciso entregar de mão em mão, nas palavras a dizer aquele operário e aquelas trabalhadoras (talvez…) não-produtivas?
Não! A luta ideológica é uma frente da maior importância, deve dirigir-se às massas, tem de contrariar, com os nossos escassos meios, a tremenda campanha ideológica que nos massacra, que nos divide, que nos alicia, que nos engana permanentemente. E, para isso, a base teórica é indispensável, porque a tomada de consciência (de classe) tem de se somar às condições objectivas que podem levar à luta, mas que dela podem afastar, ou desviar para batalhas que não são as nossas, quem nosso é, objectivamente.
E continuo este tomar partido!, na sua expressão da base teórica, colocando alguns pontos que resultam do exemplo que saltou sobre os trabalhadores/as serem ou não produtivos/as. Tem importância? Tem toda a importância porque é fulcral para a compreensão do funcionamento da economia. Porque está intrinsecamente ligado às noções de trabalho e de criação de valor (que é, em unidade dialéctica, de uso e de troca) e de mais-valia que se metamorfoseia em lucro e outras formas.
Não se pode lutar sem esse conhecimento, ou sem essa discussão que até pode levar a compreensões diferentes? Claro que sim, mas mais frágeis, menos seguros.
Vou deixar apenas um aspecto que, julgo, a todos tocará. Segundo a nossa base teórica, produtivo não é igual a necessário, produtivo não é igual a útil, produtivo não é igual a racional. Alimentar estas confusões, mesmo que com a melhor das intenções, serve para dividir, empresta a um conceito ou categoria económica uma carga moral que não tem. Ora é preciso tornar claro que, como dizia Marx, a economia política não tem uma moral e, tal como a sua prima, a dona religião, serve para a acumulação da riqueza em boa consciência, em virtude e etc.
Para a compreensão do funcionamento da economia política há que estudar as metamorfoses do capital nos seus círculos de distribuição (D-M e M-D) e de produção (…P…), e nas suas extensões e interpenetrações e localizar onde e como se cria valor.
(e logo volto para continuar...)

Denúncia!

Sobre as Honduras.
Ler Liberdade de informação aqui, em cravodeabril.

domingo, agosto 22, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 7 (Jean Gabin)

Não só os poemas se "cucam". Aliás, já "cuquei" um pedaço de um poema do José Saramago a ser cantado pelo Manuel Freire - e deveria, talvez..., ter tentado colocar o video para poder ser ouvid(e)o. Agora sei. E, agora, vou buscar, isto é "cucar", o maintenant je sais, cantado/dito pelo Jean Gabin que gosto (será gôsto?) de ouvir de vez em quando.


À maneira de
Jean Gabin
(ou ouvindo-o cá dentro de mim
cantar versos de J-L. Dabadie)


Agora sei,
ah, sim! agora sei o pouco que sei,
vou à janela,
olho para fora de mim e interrogo-me

Agora sei,
agora sei que não aceitei
a cruel obrigação de ser fiel

Agora sei,
agora aprendi que sempre cumpri
o dever moral de ser leal
.
Sim, agora sei,
agora sei que, com o amor que inventámos,
não esquecerei uma manhã de ternura
.
Sim, agora sei,
agora sei que, com os que sei camaradas,
lutámos e continuará a dura luta

__________________________________
(*) - Os cucos são aves conhecidas por chocarem os ovos em ninhos feitos por outros/as; também se aplica o epíteto a algumas “aves” humanas que se aproveitam do trabalho dos outros/as

Por onde vai a economia portuguesa?

Quando "dava aulas" (estranha forma de... dizer), um dos testes que fazia, mesmo em auto-avaliação, era perguntar aos meus alunos qual o título de um estudo do professor Francisco Pereira de Moura, que eu citara e que de que recomendara a leitura. E a resposta era invariavelmente errada. Em vez de Por onde vai a economia portuguesa?, respondiam-me (os que respondiam...) Para onde vai a economia portuguesa?

Aproveitava a "deixa", ou a escorregadela, para, depois de recomendar que se começasse a ler os livros, e todos os trabalhos, pelo título, fazer a distinção entre as duas proposições, sublinhando que, mesmo quando se sabe para onde se vai, pode ser de enorme importância a questão por que caminhos lá chegar.

Nós, por exemplo, estamos convictos que vamos para o socialismo, e alguma coisa queremos contribuir para lá chegar, mas podemos, nesse esforço/luta para onde vamos e queremos ir, por onde vamos nem sempre será a melhor ajuda para lá chegar mais deoressa e melhor. Que (e como) fazer?

Por outro lado, estando onde estamos, neste estád(i)o em que nos encontramos, mais importante que os objectivos afirmados - ou por quem não avaliou a possibilidade de os cumprir, ou apenas os afirma para conseguir resultados eleitorais (vivemos em democracia...embora bem desvirtuada), ou até procura alcançar outros bem diferentes - são os passos que estão a ser dados, as medidas que o poder, o real e o fa(n)ctual (de fantoche), toma ou intenta tomar e as suas consequências nas gentes que por estes tempos e caminhos vivem.

Vem isto a propósito (se é que vem...) de ter recorrido ao aparelho de busca da net para encontrar o trabalho de Pereira de Moura e, à pergunta por onde responderam-se com para onde e como!

Interessante, não é?

Depois, fui procurar Francisco Pereira de Moura e, claro, encontrei, entre outras coisas, Por onde vai a economia portuguesa? (o livro, evidentemente...)

Álbum - 11

No Parlamento Europeu.
Quando, depois da cisão entre "franceses" e "italianos" do Grupo Comunistas e Aparentados, que atravessou o mandato de 1989 a 1994, em que o PCP ficou, com os "gregos", no grupo "Coligação de Esquerda" maioritariamente PCF, e os "italianos", antes de desaparecerem como PCI, formaram a "Esquerda Unida" (isto para simplificar), se conseguiu reconstituir um grupo confederal, formado por "espanhóis", "franceses", "gregos", "italianos", "portugueses" (como se vê na foto), e depois "nórdicos" e outros isolados. Foi um passo importante!
Olho para a foto, e vejo que faltam alguns, que estariam em trabalho algures (por exemplo, nessa altura, o PCP tinha três deputados e só estão dois na foto - não sei se, naquele dia, faltou o Barata-Moura, o Luis Sá ou o Honório Novo, que se sucederam, por esta ordem, num curto espaço de tempo -, e estaria em tarefa que impediu de ficar na foto)

Desta equipa, uma da muitas em que "joguei", sempre com a mesma "camisola", olho para os componentes e vejo uns que morreram, outros que desertaram ou se transferiram...
Mas foi um passo importante, ou uma inversão de caminho de cissiparidade!

sábado, agosto 21, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 6 (Daniel Filipe)

É sempre com emoção que se relêem (e "adaptam" cucamente) poemas de quem se conheceu e de quem se gostou muito de conhecer e conviver.





À maneira de Daniel Filipe
(com um "toque" do Ary)



(…)

Pelos homens, pelas mulheres, pelos trabalhadores
pelos meninos tristes suburbanos, pelas viúvas sós e rurais,
contra o peso da impotência, contra o medo,
contra a mentira e a calúnia e tudo o mais
contra a exploração e a miséria, a fome e a sede

Lutaremos, camaradas!

Na aparência sozinhos, muitos, muitos mil,

por Abril lutaremos, meu amor

Notícia na TSF

com alterações (de forma, sem deformar...) de minha respons(h)abilidade:


Jerónimo aponta o dedo ao Governo
em matéria de execução orçamental

Hoje, na TSF, às 14:27

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa, acusou hoje o Governo de, em matéria de execução orçamental, continuar a abdicar de pôr em marcha medidas necessárias de combate ao desperdício.
O líder comunista, à margem de primeiro encontro de militantes em Avis, comentou desta forma os últimos resultados da execução orçamental que apontam para um aumento do défice público, na ordem dos 347 milhões de euros nos primeiros seis meses do ano, quando comparados com o 1º semestre de 2009.
Para os comunistas, além do combate ao desperdício, o Governo deveria ir buscar dinheiro onde ele está, no grande capital., e não onde ele escasseia cada vez mais.

Tomar partido! (pausa)

Uma pequena nota prévia: o facto de tanto gostar da expressão tomar partido não me leva a reivindicar qualquer originalidade. Considero, até, que muito do gosto que por ela tenho resulta da sua força quase diria universal. Acho, por exemplo, de grande felicidade o uso que lhe foi dado aqui na vizinhança, ao aproveitar-se o nome da cidade e concelho de Tomar para se “jogar” com a expressão tomar partido… por Tomar.
Pelo meu lado, insisto na referência à sua retroversão francesa parti pris que, na minha leitura, ainda lhe dá mais (ou menos…) força, pelo significado ou interpretação que pode ter de preconceito, como por vezes se usa, enquanto francesismo na nossa portuguesíssima linguagem corrente.
Pois sem qualquer parti pris… tomei partido, e estou convencido que, por o ter feito sem ambiguidade (mas tentando não ser ostensivo), nada se me colou de preconceituoso. Tomei partido!, num certo momento já longínquo de décadas, por opção de vida. E, nesse Partido que tomei, cá vou fazendo, feliz da vida, a minha vida.
Daqui resulta a assumpção de tarefas e talvez aquela que é agora prioritária, nesta altura da vida, seja a de me dedicar (mais!) ao estudo, não para “saber mais” mas para mais aprender e melhor transmitir como forma de fortalecer, eu, a consciência do partido que tomei e ajudar, outros, a ganharem consciência de classe. Isto como luta e para a luta.
[O que não me desviará de outras formas de luta e tarefas, evidentemente, embora não me sinta muito vocacionado (este físico já não é o que era…) para participar em tarefas como a da construção da Festa, de que guardo, de há muitos anos, a recordação de uma desajeitada martelada num dedo (de intelectual…) que me deixou marca.]
Neste fim de semana, e dada a decorrente baixa de visitantes e de comentários (que comecei a gerir nesta forma de comunicação), fica esta reflexão muito pessoal sobre… tomar partido. Segunda-feira voltarei (talvez…) a continuar a trazer para aqui o trabalho sobre a base teórica em que estou empenhado.

sexta-feira, agosto 20, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 5 (Alda Lara)


Então? Então... nenhuma mulher, nenhuma poet(is)a? E ele há tantas!
Escolhi esta. Porque muito gosto da sua poesia. Porque a terei conhecido, ou dela estive próximo, na Casa dos Estudantes do Império. Porque morreu aos 31 anos. E atrevi-me a “cucar” o seu poema Círculo. Melhorei-o? Decerto que não. Fiz outro, quase com as mesmas palavras, procurando o mesmo sentido e ritmo. Meu, de cuco, sendo dela.

À maneira de Círculo,
“cucando” Alda Lara

Minha!, esta culpa

Todo o caminho é belo se andado.
Ficar a meio é perder o sonho.
É deixá-lo apodrecer, por não caminhado,
é fechar o círculo da angústia, do abandono.

É ir de mãos abertas… mas vazias.
De coração repleto… mas chagado.
É ter o sol a arder dentro de nós,
mas por grades infinitas cercado.

Culpa de mim, que fiz o que podia,
na hora dos descantes e das lidas,
no tempo todo das lutas?

Ah! ninguém diga que foi minha a culpa,
Ah! ninguém diga…

Minha?... minha só esta culpa,
esta culpa de ter dentro do peito
tantas vidas!...

Tomar partido! (alguns aclaramentos - 2)

Tomar partido contra a exploração, que é intrínseca ao funcionamento de um sistema económico que assenta na criação e apropriação de mais-valia, é fácil (é uma maneira de dizer…), sobretudo para quem a sofre no seu viver quotidiano, é instintivo, e pode também ser uma questão… de imperativo moral.
Acontece que, na maior parte dos casos, assim é, e toma-se partido sem um conhecimento mínimo da base teórica em que «repousa toda a compreensão» (usando expressão de carta de Marx a Engels) dos mecanismos de exploração.
No entanto, este conhecimento, ao menos nas suas linhas gerais, é indispensável para a luta consciente. E não é fácil esse trabalho de “saber das coisas”, até pelo ambiente cultural em que se vive, mas sobretudo quando se quer aprofundar, nesta ou naquela área, como na da economia política.
Ora conhecer o funcionamento dos processos i) de produção do capital, ii) de circulação do capital e iii) total da produção capitalista (títulos dos 3 livros de O Capital, que tem o subtítulo geral de Crítica da Economia Política), é essencial para quem se pretenda marxista, e faça da base teórica uma sua arma de luta, na vertente ideológica. E contra esse conhecimento aprofundado levantam-se barreiras objectivas (em português, as edições avante!, ainda só têm publicados os 5 tomos dos 2 primeiros livros, o que já é trabalho notável) e as que concretizam a luta de classes, no plano ideológico.
Na economia política, os apologetas do capitalismo consideram, por exemplo, que os ditos factores de produção – “capital” e “trabalho” na terminologia não-marxista – proporcionam rendimentos aos seus proprietários (capitalistas e trabalhadores) independentemente da esfera de actividade (produtiva ou de circulação) em que são utilizados. E esta perspectiva, ou concepção, é não só imposta em todas as escolas em que se ensina economia – mesmo naquelas em que o marxismo não está totalmente abolido e ocupa uma espécie de reserva arqueológica (nalguns casos como algo respeitável enquanto história passada) do pensamento económico – como tem influência (e perturba, e provoca perturbação) em franjas mais permeáveis dentro do pensamento económico considerado como marxista, pelo que assim favorece a campanha ideológica contra o marxismo.
E não é a discussão, ou o debate, que está em causa. A base teórica do marxismo-leninismo alimenta-se e fortalece-se nessa discussão e nesse debate, mas para isso é indispensável conhecer sobre que repousa a nossa base teórica.
.
A partir daí… discutir tudo!

Tomar partido! (alguns aclaramentos - 1)

Ao ler Marx, ou ao ler sobre Marx, não se tem a ideia – isto digo eu… – de que se está a pescar (ou a saber da poda), mas a de que se está a aprender a pescar (ou a aprender a saber da poda), para usar imagens talvez demasiado batidas… mas clarificadoras. Não há fato feito, não há comida pronta para levar ao micro-ondas, não há modelos acabados, nem sequer as peçazinhas todas que (?!) são precisas para formar o puzzle ou construir o lego, até porque peças de ontem não servem hoje, não se ajustam, e Marx sublinhava-o.
Marx estudou quem pensou sobre a realidade antes de ele, com cuidado e muito respeito mas também com acerado sentido crítico (que consigo praticava), observou a realidade que vivia para a conhecer e para contribuir para a modificar, escreveu, escreveu, escreveu, muitas vezes repetindo melhor o que já antes dissera, algumas vezes corrigindo, mas sem apagar o que estaria errado ou incompleto porque isso antes datado representava um passo, e era útil enquanto fixação do estádio do conhecimento a que se chegara quando errara ou fora incompleto ou insuficiente.
Na área da economia política, Marx estudou com os “clássicos”, que um século antes dele foram os economistas da burguesia ascendente, e deles aproveitou o grande salto que provocaram no pensamento económico, particularmente Ricardo e, sobretudo, Adam Smith com quem muito “conversou”. Nada inventou a partir da negação e do desprezo dos outros (mesmo quando era violento e cáustico). Com todo o respeito pelo saber antes adquirido (e datado!), firmando-se no que adquirira no aprofundado estudo do direito, da filosofia, da história, deu o “salto qualitativo” ao encontrar no trabalho o seu carácter duplo, que se exprime em valor de uso e em valor de troca, e ao tratar a mais-valia independentemente das formas particulares que viesse a tomar (lucro, rendas, juros, despesas) nas metamorfoses do capital que, como relação social, se materializa em várias expressões. E, como ele o escreveu em carta de 27 de Abril de 1867 a Engels, aí está «o que há de melhor no meu livro (O Capital) e aí repousa toda a compreensão»; e acrescentava que «o estudo dessas formas particulares da mais-valia, se é confundido com o estudo da forma geral à maneira dos economistas clássicos, dá uma misturada informe».
Este é um aspecto sobre que importa reflectir (e discutir... se houver com quem) quando se fala da base teórica de quem tomou partido.
Tratando-se de base e de teoria, há que ver quais os conceitos que são caboucos dessa base sobre que se constrói a teoria. Também como arma para a tomada de consciência, para a tremenda e tão desigual (nos meios) luta ideológica.
.
(o trabalho desta noite - mais para a madrugada... -,
de fixação de leituras ao longo do dia,
saiu-me demasiado longo para mensagem de post
pelo que o subdividi.
Logo, a continuação - esta - vai seguir dentro de pouco tempo)

quinta-feira, agosto 19, 2010

Poemas cucos* (e outras coisas cucas) - 4 (Brecht)

E esta, hem?


Tradução (?)
(muito "à maneira"!)
de Brecht


Oh! Quão difícil é governar e gerir!

1. Todos os dias se diz ao povo

quão difícil é governar.

Sem estes governos, os PIBs não cresceriam para baixo,

e o desemprego não diminuiria quando aumentam os desempregados

se o primeiro-ministro não fosse tão engenheiro.

Sem ministro/a da saúde,

as mulheres não poderiam parir em trânsito ambulatório,

e os professores e professoras não poderiam ser assim enxovalhados

sem ministro/a da educação

(e como era possível fechar tanta escola ao mesmo tempo?)

Sem ministro dos negócios estrangeiros (e dos outros),

e o da defesa que invade e ocupa para salvaguardar direitos humanos,

como é que haveria guerras?,

e poderia mudar o ano sem mensagem do presidente da república?

Nada disto seria possível (ou provável...)

e, se houvesse de risco de não acontecer,

até poderia o ano novo não começar a 1 de Janeiro,

por apenas ser 31 de Dezembro quando SEXA estivesse disponível

para dizer a sua mensagem aos portugueses.

2. É também difícil

- ao que nos é dito... -

dirigir uma fábrica e fazer searas e colher.

Sem o patrão, não é verdade que as paredes da fábrica ruiriam

e as máquinas iriam para a sucata?,

e que, se algures aparecesse um tractor,

ele não poderia rodar e lavrar sem as ordens de quem manda?

Que seria da indústria sem industriais?,

e que seria da propriedade rural sem proprietários rurais?,

quem é que semearia centeio onde já se tinham plantado batatas?,

quem produziria bolas de sabão e bolhas especulativas?

3. Se governar fosse fácil,

não haveria necessidade de espíritos tão esclarecidos

como os dos chefes.

Se o operário soubesse usar a sua ferramenta,

e se o camponês fosse capaz de distinguir uma foice de um martelo,

não haveria necessidade nem de patrões nem de proprietários.

E é só por estarem as gentes tão mal informadas e estúpidas

que há necessidade de uns poucos serem tão inteligentes.

4. Ou será que governar e gerir só é assim tão difícil

porque a exploração e a mentira são coisas

que só alguns herdaram

e apenas poucos aprenderam bem e praticam melhor?