terça-feira, janeiro 31, 2006

O que mudou - V

Não me lembro que em 1958 alguém, em S. Tomé, me tivesse dado mostras da sua predilecção clubista relativamente ao futebol da metrópole. E eu, então, deveria estar mais sensível a esse tema que hoje, “doente” que era do Sporting, lagartão impe®tinente, conhecido por “leão de Ourém”.
Pois, agora, o “doente” não sou eu – que me julgo curado de tal maleita… –, mas sim muitos dos santomenses (e principianos) que do futebol luso tudo sabem. Vantagens (?) das novas vias de comunicação.
Ser abordado por velhote (talvez bem mais novo que eu…) que me diz, orgulhosamente, ser tio do Luís Boa-Morte, quererem discutir comigo o decurso do campeonato português e o último escândalo da arbitragem sem eu ter “bagagem” para poder “entrar em jogo", foi experiência nova e significativa.
Até se chega ao ponto de uma banda mais ou menos rock, composta apenas por elementos femininos, se chamar… “no name girls” em implícita conotação com a claque do Benfica dos “no name boys”.
Foi realmente uma demonstração de que muito mudou. Porque os meios de comunicação mudaram, e o nosso património cultural passa pela universalidade do fenómeno desportivo-futebolístico. Um pouco como ópio do povo, servido pela SportTV.
E como foi na primeira “bomba” em que enchemos o depósito, à saída da cidade de S.Tomé, que comecei a confrontar esta mudança na t-shirt orgulhosamente benfiquista que o jovem que nos abastecia ostentava e só de futebol falava, aqui deixo testemunho de uma outra operação de abastecimento, dias depois, em S. João de Angolares, após termos tido alguma dificuldade em encontrar a “estação de serviço” que esperávamos ter à beira da estrada com cartazes e sinais de identificação por nós reconhecíveis…

Se repararem bem,

lá ao fundo está outro “posto de abastecimento”…

O que não mudou em S. Tomé e Príncipe - 5

Em S. Tomé e Príncipe... ver para crer.

Já aqui se deixou o que ilustra o que – a nossos olhos e sentires – não mudou em S. Tomé nas últimas décadas: a natureza e as gentes.
Várias vezes, agora, foi lembrada a surpresa maravilhada de há quase meio século perante uma paisagem, uma árvore, uma queda de água, um sorriso de criança, uma mulher com bebé na capulana, um rosto de velho… porque, de novo se sentiu a mesma surpresa maravilhada.
E aquela natureza!
Registo dois episódios para recordar (daqui a 50 anos?!):
o encontro/descoberta de uma enorme tartaruga que, no dia 21 de Dezembro, saiu do mar para vir desovar numa praia para onde dava o restaurante onde jantáramos, e o salvamento – dela e dos seus ovos – de cães que se aproximavam sorrateiros e, talvez, de homens que espreitavam o que acontecia com intenções suspeitas;
a descoberta, uns dias mais tarde, já na ilha do Príncipe, de uma enorme quantidade de tartaruguinhas que, acabadas de nascer, não encontravam o caminho para o mar porque as luzes do aldeamento turístico as perturbavam… e lá as ajudámos a fazer esse seu caminho que, como todos os caminhos, assim se faz, caminhando:

Atenção: de meias e sandálias não é nenhum de nós!,

mas um outro/a qualquer (talvez sul-africana/o)!

segunda-feira, janeiro 30, 2006

Ourém 1983!

(Ourém Outrora)
O quiosque do velho e bom amigo "carcereiro".
Que saudades! Obrigado Nuno Abreu!

Como a neve é fotogénica!

Era previsível.
De neve se falou, fala e, agora, se lê se vê.
Os telefonemas não pararam, crianças (de todas as idades) brincaram surpreendidas e maravilhadas com a novidade, milhares de fotografias se tiraram e agora mostram. Também aqui pelos blogs, claro!
Há uns anos, muitos menos quantos aqueles em que tal não se via, hoje estar-se-ia, com alguma ansiedade, à espera da revelação das fotografias.
Hoje, as fotos saem logo logo das máquinas digitalizadas e nos computadores são vistas e mostradas.
E como a neve é fotogénica!
Por aqui nada se publica. Não por reacção (reaccionária?) mas porque o nosso aparelho fotográfico não estava à mão, ou melhor, está noutras mãos que também nossas são e por Lisboa andam. Paciência. Fotos de outros não faltam, e vizinhos também fotografaram aqui o Zambujal. Como se verá.
Muito fotogénica é a neve!

sábado, janeiro 28, 2006

O que mudou - IV

Já escrevi sobre os ciclos em S. Tomé. O da cana de açucar, o do café, o do cacau.
Mudando a forma de exploração - da natureza, nela se incluindo os homens que natureza são - e quem explora, embora a mudança seja de nomes e não de classes.
E S. Tomé está numa fase entre-ciclos, também entre colónia e País, embora os anos de transição se sucedam e somem décadas.
O cacau acabou, ou recomeçará como produção "de ponta", para "nichos de mercado", como um italiano, com arte e engenho que muito nos louvaram, está a conseguir numa recuperada roça.
O turismo começou, também com "nichos", em "estaleiros" de experimentação de Pestanas e outros empresários, mas também com gente como João Carlos Silva, na sua Roça de S. João, perto de S. João de Angolares, que o faz com sensibilidade e cultura.

Santa Catarina -

povoação de pescadores

Mas se o turismo pode ser o centro de um novo ciclo, o que toda a gente (e ninguém...) espera é o que vai dar o petróleo anunciado polo de um novo ciclo. E não são de esperar coisas boas. Para as gentes, para os mesmos que viram passar os anteriores ciclos sem que deixassem de ser... ninguém. Povo.

O que não mudou em S. Tomé - 4

Entre 1958 e 2005/6 o que é que os meus olhos e o meu sentir (os de então e os de agora, os mesmos que outros são) viram e sentiram não ter mudado em S. Tomé?
Sobretudo a gente, o povo.
Das crianças, que são povo, já falei, das crianças falarei sempre, mas agora falo da gente adulta, do povo que tão depressa deixou de ser criança.
Este povo de S. Tomé, o de hoje e o de há 50 anos, não morre de fome. De muitas doenças morrerá, e cedo morre, mas de fome não. Morre de paludismo, de cólera, mas de fome não.
Assim era e assim é. E os hospitais que então havia nas roças - em cada roça, um hospital! - não eram para lhe impedir a morte pela fome ou qualquer morte prematura. Era para poderem estar em condições de trabalhar nos dias seguintes.
É um povo de mistura de gentes. De gentes vindas de Angola, para escravos serem e depois libertos, de gentes vindas de Cabo Verde, como contratados sem contrato terem a não ser o dever de colherem e prepararem o cacau para ser exportado. Há quem diga que também de gentes que já por cá estavam e resistiram quanto puderam a serem... descobertas pelos que abriram caminhos marítimos para estas e outras terras acharem, e gentes descobrirem e serem descobertos. Sim, que conhecerem e darem-se a conhecer é outra coisa.
Povo de escravos libertos e de contratados sem contrato é um povo alegre, acolhedor, capaz de revolta, talvez nunca de revolução. Gostei muito, há 50 anos como agora, de (tentar) conversar com eles, de homem para homem. Nem sempre é fácil a conversa quando tão diferentes as circunstâncias fizeram os homens que tanto precisam de conversar. De homem para homem que o mesmo é dizer de mulher para mulher ou de mulher para homem ou de homem para mulher. De ser humano para ser humano!

Conversa com "badio" (natural de Santiago, Cabo Verde) há décadas em S. Tomé, para onde veio como "contratado".

(Os meus vizinhos e amigos oureenses reparem que trago vestida uma t-shirt da Casa de Ourém...)

sexta-feira, janeiro 27, 2006

No (lento) "regresso" a S. Tomé


Estou a caminho!

pontes "portuguesas"

Mas a "viagem de regresso" não está fácil...

segunda-feira, janeiro 23, 2006

A preparar-me para o "regresso" a S. Tomé...

Estou no caminho de "regresso" a S. Tomé. Neste blog...
Vindo das eleições, que me ocuparam a disponibilidade mental e funcional ao nível do blog, vou "regressar" a S. Tomé mas, antes, deixo esta fotografia para quem tem manifestado estar com saudades do Mountolive.

Mas porque é que "eles" estão com aquele ar a "ouverem" as notícias e as reportagens das eleições?

'Tá bem!, estou solidário... Mas nunca mais me ligam nenhuma...

domingo, janeiro 22, 2006

Os objectivos não foram conseguidos...

Os objectivos claramente afirmados não foram alcançados. Mas o sentimento não é de derrota. É um sentimento de grande serenidade.

A nossa campanha – assim me quero referir à campanha de Jerónimo de Sousa – foi excelente, quase apetece dizer que foi inexcedível. Por virtude do candidato mas também como manifestação da actual expressão política do Partido Comunista Português, que vai muito para além de resultados eleitorais. Mais ainda para além de sondagens e, sobretudo, da sua despudorada utilização…
E, nas horas de comentários, não vi referida – também não posso (ou)vir tudo… – a circunstância de que essa candidatura, a nossa candidatura, foi recebida e (mal)tratada como sendo uma “candidatura de desistência” mesmo quando o Partido e o candidato afirmavam inequivocamente que era para ir até fim. Nem vi sublinhada – também não posso (ou)vir tudo… – a claríssima diferença de votação entre Jerónimo e Louça, que bem sublinhada teria sido se tivesse sido inversa a ordem da votação, mesmo que tivesse sido por diferença mínima.

Digo, aqui, o talvez dispensável: a luta que teve expressão neste episódio vai continuar.

Por 6 décimas de percentagem, acaba de ser eleito o novo Presidente da República, e os nossos objectivos eram evitar essa eleição e contribuir para uma ruptura com o rumo de que esse novo PR foi protagonista e fautor, tendo sido candidato ao serviço do mesmo rumo e projecto, que houve o cuidado de esconder, mas de que o povo, os trabalhadores, vão sofrer as consequências.

Ainda em duas palavras importa responsabilizar por este resultado o atraso e a divisão com que o PS avançou para esta eleição (não só na esquerda mas sobretudo no que é a sua área e direcção). E também salientar que as medidas que o seu governo tomou durante a campanha mais pareciam convites a que se votasse contra o que os eleitores pudessem identificar com essas medidas.
Pelo meu/nosso lado, vou/vamos dormir preocupado/s, muito preocupado/s, mas de consciência tranquila.

22 de Janeiro de 2006

Crónica da manhã brumosa (·)

O dia de ontem acabou com uma noite-madrugada muito húmida, de nevoeiro cerrado, que dificultou o regresso a casa.
A manhã de hoje nasceu(-me) brumosa. A sensação de tempo parado, silencioso, não é abalada pelos raros carros que passam na estrada e pelos ruídos da rádio que dão notícia de incidentes e boicotes, e de outras acções ou reacções.
Sei e sinto que começou um dia diferente. Um dia com data, como todos, mas também com um nome, não de um santo ou de uma passagem de tempo mas de um acto cívico, da conquista – que sei como não foi fácil – de poderemos escolher quem nos represente numa função, e num contexto para que também conquistámos – duramente, duramente – o direito de definir os contornos, o perfil.
A manhã está de bruma. Tranquila e parada. À espera do fim do dia que dependerá, para o nosso futuro, do que cada um de nós fizer, com a informação (e desinformação e manipulação a que foi sujeito, ou de que foi objecto) que cada um tem.
Acordei tranquilo e preocupado. E passarei muito atento e preocupado, vivendo uma expectativa de intervalo que espera o acto seguinte, as lentas horas desta manhã e da tarde que se lhe seguirá.
Nestas manhãs de bruma, o português ilustrado pensa em D. Sebastião. O que é um mau presságio porque este português sebastianismo é alienante uma vez que coloca numa ficção (por vezes meticulosamente construída ao serviços de interesses desumanos e desumanizantes) a salvação da Pátria.
Que o mesmo é negar a mudança de rumo que quase vitalmente se deseja, que tanto se precisa e de que tantos necessitam, porque este “Sebastião” (montado peça a peça, e que frio espantalho me parece) foi um dos maiores protagonistas pelo rumo que aqui, a este Estado da Nação, nos trouxe e a sua vocação, missão – e obrigação para com aqueles que o fizeram “Sebastião” –, seria a de contribuir para tal reforço desse rumo que chega a assustar.
Mas a bruma com que começou o dia, o ambiente sebastianista para que pode estar contribuindo, não esmorece a confiança com que, com muita determinação, vimos e sentimos e vivemos a real vontade (e necessidade) de mudança. Conscientemente arreigada em tantos de nós, e que tão maltratada e escondida e é. E que continuará amanhã. Com a luta nas condições hoje criadas por todos nós.
__________________________________________
(·) - Este título nasceu-me antes do texto. Ou melhor: o que tenho a irresistível vontade de passar a texto começou por esta frase. Que bem me parece que nem é original, embora não localize – nem o procure fazer – onde a colhi para em mim entrar e agora de mim jorrar.

sexta-feira, janeiro 20, 2006

Se me dão licença...

Não venho aqui dizer certezas. Se tenho convicções – e tenho! –, fujo das certezas. Venho só deixar algumas reflexões sobre estas eleições presidenciais, reflexões que me são provocadas e me fizeram saltar os dedos para as teclas do computador.
Nesta manhã, em que acordei a ouvir rádio, torna-se-me evidente, ainda mais do que em outras eleições, a utilização das sondagens como instrumento da campanha política.
Ao longo de semanas e meses, a fortíssima máquina promocional da candidatura de Cavaco Silva veio criando o ambiente de uma vitória inevitável, esmagadora, de Cavaco Silva. As sondagens foram utilizadas despudoramente para a criação desse ambiente.
Nos últimos dias aconteceu o que seria previsível, ou que tenho a pretensão de ter previsto. Como as vitórias anunciadas só se concretizam pelo voto, seria perigoso para as intenções de quem está por detrás da candidatura de Cavaco Silva que esse ambiente levasse à desmobilização do potencial eleitorado por “não valer a pena”, por estar “no papo”.
Por isso, com a utilização mais que despudorada escandalosa das sondagens, aí está o alerta para a necessidade de levar a votar por Cavaco Silva… porque a margem se tornou escassa e é preciso votar no domingo!
Mas não só. Simultaneamente, passa-se a “mensagem” de que há apenas utilidade nos votos em Soares ou Alegre nesta eventualidade de uma 2ª volta. O que é falso!
Em eleições como esta, na 1ª volta todos os votos que não sejam em Cavaco – em Soares e Alegre, como em Jerónimo, Louça ou Pereira – são votos que contam exactamente o mesmo para impedir a vitória de Cavaco na 1ª volta.
Para mais, é igualmente escandaloso, nestes últimos dias, o agravamento do apagamento da campanha de Jerónimo, a que só se resiste porque a campanha tem sido, sem sombra de dúvida, excelente e excepcionalmente mobilizadora. E os promotores de Cavaco sabem bem que é nesta candidatura que está o adversário. De classe. E muito os preocupa o modo como esta campanha correu.

Assim se faz (e desfaz) a democracia em que vivemos. Desta democracia burguesa, em que o poder é do povo e, por isso, o que há a fazer é manipulá-lo até todos os limites. Com o apoio inestimável da utilização das sondagens.

quinta-feira, janeiro 19, 2006

S. Tomé - uma pausa no que venho contando

Em dois registos.
Um, de muita preocupação mas não de surpresa, face às notícias do dia.
Num dos primeiros posts desta série sobre as férias em S. Tomé, alguma coisa está dita sobre uma pressentida situação de insatisfação e uma revolta voltada para dentro. Com que angústia se vêem os países independentes seguirem um mesmo trilho. Mas, como já se escrevia nesse post... o caminho do futuro não é uma recta!

Outro, bem diferente, sobre a visita do João Carlos Silva, Isaura e Diogo, a Ourém e à Som da Tinta.
Foi um fim de tarde muito bem passado, em todos os aspectos. Todos - e muitos foram - que estiveram no convívio ficaram com muita vontade que eles voltem depressa.
Entretanto, ilustra-se este segundo registo com uma foto de dois gatinhos que "habitam" o atelier e galeria que João Carlos abriu em S. Tomé, onde foi um restaurante de seu pai e onde ele, quando miúdo, serviu à mesa.
São dois pequenos bichos muito simpáticos, que têm cachecóis à roda dos pescocitos, estão "maquilhados a cores" pelos jovens artistas que ali trabalham, e são alimentados dieteticamente.

A duração das notícias

Comentários para quê?!

O número de notícias

Sem comentários!

segunda-feira, janeiro 16, 2006

O que mudou - III

Não foi só a roça Água Izé. Foram as roças.
E a mudança doi. Fundo.
Com o final do ciclo do cacau, toda a estrutura de exploração que tinha as roças como lugar e centro ruiu. Contemporaneamente com a assumpção da independência (política). E nada acontece por acaso...
As gentes continuam a viver por ali. Descendentes de escravos libertos e ex-contratados e filhos e netos de contratados.
Mas já não há cacau para colher. Não há que manter em forma os trabalhadores. Os hospitais são a ruina mais impressionante. Na roça Sundy, na ilha do Principe, o hospital tinha amplas salas e um gabinete de odontologia que - vê-se! - estava bem equipado.

domingo, janeiro 15, 2006

Enchemos!

E cheios de emoção, de alegria, estamos!

Um dos materiais da propaganda eleitoral de Jerónimo de Sousa dizia "Vamos encher o Pavilhão Atlântico". Houve que sorrisse perante ambição tamanha. Houve quem afirmasse dúvidas sobre a capacidade nossa de tal conseguir. Não nos conhecem e, depois, são incapazes de reconhecer a sua querida ignorância do que somos. E escondem - quanto podem - a nossa força, a força dos trabalhadores, do povo que descobriu, que tomou consciência. E também esses outros que não nos conhecem e não reconhecem continuam a luta. Contra nós. Mas... venceremos! Como no dia 14 de Janeiro de 2006 vencemos.

Enchemos! Mais do que encher, transbordámos o Atlântico. Foi impressionante.
Cada um de nós foi a gota da água que correu, cada um de nós que fez o rio que desaguou no mar. Atlântico? Maior é o Pacífico! E nós somos pela Paz e pelo "Atlântico" ao "Pacífico" chegámos.

Vencemos? Mas não serão os resultados eleitorais que decidirão quem venceu? Sim!, nessa luta que é eleitoral. Mas a luta não é só essa. A luta é, também e sempre, a de cada um ser a gota da água que corre, do rio que vai fazer mar. E essa luta vai muito para além de resultados eleitorais. Que é um episódio da luta. Um episódio que temos de vencer.

O Pavilhão do Atlântico já se chamou da Utopia, como lembrou o Manuel Rocha da Brigada Vitor Jara. Pois foi o pavilhão de uma utopia realizada. Mostrando como vale a pena lutar pelas utopias, por aquilo que provoca sorrisos nos outros, que os faz duvidar que consigamos.

E agora? Agora, vamos continuar esta luta para conseguir realizar outras utopias. Com confiança, com determinação.

sábado, janeiro 14, 2006

O que não mudou - 3

No que os meus olhos viram e os meus sentidos apreenderam, há quase 50 anos e agora, não mudou o povo. Não mudou este povo de escravos libertos, de contratados e filhos de contratados que era e é o povo de S. Tomé e Príncipe. Sobretudo, não mudaram as crianças. Muito vivas, alegres, futuro.

"... a razão de ser da nossa luta."

Amilcar Cabral




Olho as crianças
que para mim correm e abrem braços e risos.

Vejo as crianças
com os meus olhos cheios de passado e recordações.

Vejo-as leves leves
gráceis
futuro

Olho-as nos olhos vivos vivos
negros
promessas

Vejo-as com os dentes brancos brancos
alegria
(só)risos

Os meus dedos procuram as carapinhas
espessas
acolhedoras

Admiro-lhes a pela morena
quente
tensa

(Pressinto, nelas, os seios que ganham forma
que despontam.
Pressinto, nelas, as curvas suaves,
lentas
Vejo, nelas, as meninas… logo logo mães!)


E comovo-me!
E os meus olhos vêem o que não queriam ver.


Porque vejo o que fizemos
e fazemos (nós!) do futuro
das promessas.


Tão depressa envelhecem as crianças
leves, gráceis,
de olhos vivos, negros,
com dentes brancos, alegria e riso,
de pele morena, quente,
cabelos carapinha onde se perdem meus dedos.
Tão depressa envelhecem as crianças
e tão jovens em-velhas-ficam,
tão de repente perdem o viço
e tão rápido imitam vícios.
Tão de súbito murcham!

(Nelas, os seios caem,
pendentes.
Nelas, as curvas ficam frouxas
peles que foram pele quente, tensa.
Nelas, pesa uma ainda-não-criança nas costas
e uma outra na barriga:
três crianças que não o serão
envoltas num mesmo pano!)

Tão a fugir por estas crianças passa o tempo
que nem tempo para começar a viver têm.

sexta-feira, janeiro 13, 2006

Hoje, 13.01.2006 (sexta-feira)

O que é mais importante no caso Casa Pia e em casos como?

&-----&-----&

Haver (!) vítimas

&-----&-----&

ou haver (?) erros de processo e procedimentos errados relativamente aos presumíveis culpados fazendo destes vítimas enquanto as reais vítimas se tornam, elas, em presumíveis vítimas?

&-----&-----&

Mais… será que as reais vítimas têm – ao menos… – esse direito de vítimas serem e de não passarem a virtuais quando os presumíveis culpados têm poder mediático, o poder do dinheiro e/ou da política?

&-----&-----&

Tudo isto me mete nojo.

&-----&-----&

Tanto no sentido que Camões lhe deu pela voz de Adamastor, e Saramago recuperou, como no sentido que, na actualidade, correntemente lhe é dado.

"Catedrais verdes" - 2 fotos


















Não resisto a acrescentar estas duas fotos (e outras há...) ao "post" que deixei sobre as "catedrais verdes".

O qque mudou - II

Em 1958, os recém-licenciados pelo ISCEF, economistas novinhos em folha, foram recebidos por colega que geria (então pouco se falava assim... de gestão e de gestores) a Roça Água Izé. A lembrança é de deslumbramento.O "velho" colega, de que esqueci o nome, mostrou-nos a "maravilha" que era uma roça. Uma organização impecável para acolher e manter os trabalhadores, a grande maioria ditos contratados vindos de Cabo Verde ou Angola, em condições de serem explorados, dois hospitais, instalações industriais, um cais privativo.Depois, ofereceu aos nóveis colegas um almoço na esplanada em frente da sua sumptuosa residência. Sei que desse almoço tinha algumas fotografias, mas não as encontrei... Só encontrei as da criança no passeio e a das lavadeiras!
Agora, em 23 de Dezembro de 2005, foi chocante o que vi e o que comparei com as recordações que a memória me trazia. Dos dois hospitais, um de 1914, outro de 1928, restam ruinas, na esplanada em frente da abandonada e em ruinas casa do administrador cresce a relva e passeiam-se porco. Os adultos, um ou outro desse tempo, andam por ali parecendo nada ter para fazer, as crianças, sempre iguais, sempre lindas, agora "assaltam" os turistas pedindo-lhe "doces", esferográficas, camisolas ou... moedas.

quarta-feira, janeiro 11, 2006

Intervalo de tempestade - um raio na roça do João Carlos

Nesta série de coisas que quero contar sobre S. Tomé, tenho necessidade de fazer um intervalo.
Como noutro blog (no da Som da Tinta) se anuncia, o João Carlos Silva vem a Ourém no próxima dia 17, 3ª feira. Está anunciado onde deve estar e aqui outras coisas se têm para dizer. É que, na Roça S. João, apanhámos a maior trovoada-tempestade que já nos acontecera (aos 5 e, ao que parece, também aos hospitaleiros anfitriões).
E um raio caiu na roça, a electricidade estoirou e o excepcional jantar em que comprovámos que aquela cozinha tão televisiva não é só virtual, e foi saboreada à luz da vela, depois seguido de conversa muito interessante e agradável.
Como se tinha fotografado o que se via da varanda dos quartos por onde nos distribuimos no fim da tarde, fotografou-se a mesma perspectiva na manhã seguinte.
Vejam só o que aconteceu à palmeira imperial que serviu de para-raios:

O que não mudou - 2

A natureza!
Essa não muda, ou não mudou ainda, ou recupera das malfeitorias (ou benfeitorias) que lhe vão fazendo.
Já aqui deixei uma nota sobre a floresta. Esta será sobre o "casamento" da floresta com as praias e o mar. E reproduzo o aue me saiu, maravilhado, para o tal "diário" que me está a ajudar nesta tarefa:



"30.12.2005

As catedrais verdes

Dir-se-iam escondidas, recatadas, afeitas ao silêncio, ao recolhimento, à reflexão.
Ao longo do areal, sucedem-se as catedrais verdes, todas igualmente diferentes, ou todas diferentemente iguais.
Nelas se entra por portas dissimuladas na ramaria. E ficamos extasiados.
O silêncio é o do marulhar do mar a que demos costas e logo ali ficou e é o do levíssimo cantar de pássaros em corais polifónicos.
Pisamos o muito suave chão de areia, quente e fresco, e olhamos, maravilhados, o emaranhado das paredes que sobem de raízes abraçadas a rochas descarnadas e das abóbadas em copas, paredes e abóbadas que se adornam e abrem em vitrais por onde passam raios de sol.
Sobre o dourado que pisamos, tudo verde. Como se só verde houvesse, que o azul do céu pouco mais que espreita e nalgumas nem isso. Tudo verde de muitos verdes, de variadas combinações cromáticas.
Em silêncio, olhamo-nos e ouvimo-nos sem nada dizermos. Há comunhão entre os que desfrutam o espectáculo de ouro, verde, penumbra, sol.
Uma arquitectura imponente e leve, grandiosa e simples, repetindo-se em catedrais verdes sempre novas e únicas.
Crentes inventarão um arquitecto, dar-lhe-ão nome ou nomes, prestar-lhes-ão obediência e culto.
Eu, que crente não sou, quase me comovo e agradeço estar vivo e aqui e de aqui fazer parte, animal e natureza que sou. "

(na foto - que mal ilustra o que são as "catedrais verdes" - vale a pena observar as pernas que, no canto inferior esquerdo ajudam a avaliar a dimensão desta vegetação que se estende pelo areal até ao mar que nela entra pelas marés cheias)

Pois...

Um dia a acompanhar a campanha de Jerónimo de Sousa no distrito. De uma ponta à outra e volta.

O man está c'uma pica. O coroa é mesmo bué da fixe. Aliás, ele é o único fixe, ele é o verdadeiro fixe.
Dava cá um presidente para esta república! Um presidente à maneira.
No dia 22, curtida a véspera, botem o voto no Jerónimo que é de, certeza certezinha, um voto de que nunca se irão arrepender!

terça-feira, janeiro 10, 2006

Ciúmes ao(s) Mounti(s)

Então não querem que eu, Sérgio Ribeiro, tenha ciúmes?
Esforça-se um fulano para encontrar a forma de contar coisas que acha interessantes – e não só para ele, acha ele…–, vai contando-as com toda a intenção e não pinga um comentário, ou raríssimos são os que pingam.
Dá uma notícia do Mounti – porque lhe foi insistentemente pedida, aliás – e é uma enxurrada de comentários, e até um blog amigo, ou o blog de um amigo (de quem?, do Mounti ou de quem se julga dele dono e senhor?), transcreve o post(zinho) da notícia, com foto e tudo, e, para cúmulo, dá conselhos ao bicho para que trate mal quem o acarinha e está a ser retribuído em excesso.

E não querem que eu sinta ciúmes. Isto para não falar de coisas mais intimas… que tudo também tem limites, até esta invasão da privacidade que é, ou pode ser, a blogosfera.












"Quem é que não deixa dormir quem?"

O que mudou - I

S. Tomé e Príncipe era uma colónia. Assim o aprendi na escola, assim os meus olhos com 22 anos a descobriram e me ajudaram a descobrir o que era uma colónia.
Hoje, S. Tomé e Príncipe é um País. É a República Democrática de S. Tomé e Príncipe.
Mas o que os meus olhos a fazerem 70 anos viram, e os meus ouvidos ouviram, não descortinaram grandes diferenças. É que a independência foi só (!) política.
Depois, procurando mais, pensando melhor, uma diferença muito importante encontro.
Aqueles que ontem se queixavam e lutavam e os que hoje se queixam e lutam têm alvos para as queixas e as lutas que são diferentes.
Ontem, o alvo era o patrão, o colono, o colonialismo;
hoje, é quem eles próprios escolhem, numa perversão da democracia, sem verem que o que os seus eleitos, os que aparentemente os governam, estão a fazer é estarem ao serviço dos mesmos de ontem, a prosseguir, nas condições de hoje, a mesma política económica que mantém e agrava a dependência. Agora do País. Sempre dos Povos.
É verdade, e sublinhe-se!, que em condições diferentes. No caminho da História. Que não é uma recta!

O que não mudou - 1

A natureza, ou o que ela nos provoca, as palavras que nos faz dizer.
"Que exuberância", "luxuriante", "fantástico", "olha só para esta árvore... impressionante", e por mais que adjectivemos e eponhamos pontos de exclamação a nossa língua (europeia!) revela-se pobre.
E, no entanto, o que para mim não mudou também a mim mostrou - e ilustrou! - mudanças. E significativas.

"No dia de ontem, entrámos pela selva equatorial (por uma amostra, claro).
Não pela selva que ainda não foi desbravada, e de que recebíamos um cheirinho, mas pela selva que recupera, que regressa a selva.
Avançámos por uma estrada que está no mapa e que, aos poucos, deixa de ser estrada, antes do destino cartografado. Porque os homens abandonaram a senda que era sua – por maus caminhos, mas que sua era –, a senda que rasgara aquela estrada na selva, até Binda.
Aquela estrada começou a deixar de ser estrada quando o capitalismo dela deixou de colher frutos, voltou a ser selva quando o anti-capitalismo não teve força – poderia ter? – para ser (já!) pós-capitalismo."


(extracto de um "diário")

segunda-feira, janeiro 09, 2006

Vou começar a contar coisas...

Embora cada um vá tomar o a núncio como quiser, isto não é uma promessa nem uma ameaça. O que for, soará...
O caso é que, depois de algumas reflexões, julgo ter encontrado a "forma" de comunicar que me parece adequada a este meio de convívio, a este ponto de encontros. E, como quero contar coisas vividas nesta viagem a S.Tomé, aí vão algumas desta "forma", ou com este "forma...to".

Uma vez que esta viagem a S.Tomé e Príncipe me traz recordações fundas, de 1958!, e também me vi confrontado com as recordações do companheiro Manuel Freire, que há 20 anos foi cantar a S. Tomé, resolvi tentar sintetizar em meia dúzia de "posts" o que, para mim, mudou e o que, para mim, não teria mudado em S.Tomé e Príncipe.
Isto, claro, perfeitamente consciente de que tudo mudou - e muito! A começar por mim... Os meus olhos, que fizeram 70 anos em S.Tomé, não são os mesmos de quando tinham só 22 anitos. Em todos os sentidos e por todos os sentidos.
Vou tentar...

domingo, janeiro 08, 2006

Notícias do Mounti

Aí vão elas, tiradas do tal "diário", com foto incorporada:

06.01.2006
____________
(...)

Entretanto, a vida tomou o seu rumo normal, ou melhor, anterior.

&-----&-----&

E se o Mounti não me esperou e não respondeu ao meu gritado chamado (não teria ouvido…), em contrapartida fez uma recepção à Zé… que ainda não acabou. &-----&-----&

E não prevejo quando acabará.

&-----&-----&

Já aqui volto, a este tema.

(...)

Bom… voltemos ao tema Mounti, que tem muito que contar depois desta tarde e noite.
&-----&-----&

O sacana do gato está “passado”.

&-----&-----&

Ele, que se fazia passar por um "senhor", indiferente a afectos, mostra um sentimento, uma comoção, pelo nosso regresso, particularmente pelo regresso da Zé, que excede tudo o que se poderia esperar.

&-----&-----&

Há horas e horas que ronrona, que mia miados novos e langorosos, que faz e pede festas, que se enrosca no colo dela, que… não nos deixa dormir.

&-----&-----&

É tão enternecedor… que nem me irrita.
_____________________________

E continua!

À conversa (ou conversa de "branco")...

Estou a preparar (mental e laboriosamente) o meu "relato" para aqui, para os amigos que aqui vou encontrando. Mas está difícil... há tanto trabalho atrasado e acumulado!
No entanto, como quero estabelecer rapidamente o contacto (e alguns amigos estarão já de "cinto apertado" preparados para a descolagem... o que é incómodo), reproduzo uma página daquela espécie de diário que vou alimentando... e bem alimentada foi durante estes dias santomenses.


21.12.2005
_________
(...)

Só mais uma, em diálogo(s):

O “branco”(*): Andas na escola?
O João: Ando… na 6ª classe… em Neves…
O “branco”: … é longe…
O João: É… vamos de camioneta… partimos de Espa'inha… pagamos 30 contos (30 mil dobra igual a cerca de 500 escudos nossos) por mês…

(…)

O “branco”: Gostas de futebol, João?
O João: Gosto muito… sou do Sporting!
O “branco”: Eu também… e vês jogos na televisão?
O João: Vejo! Em Diogo Vaz... e gosto muito.

(…) (**)

Lá ao fundo, um outro diálogo.
Sobre que estariam eles a conversar?
________________________________
(*) - é assim que nos chamam, antes de lhes dizermos o nosso nome...
(**) - depois, demos "uns toques" numa "bola" indescritível, argamassa de plásticos e papel com cordeis em volta... pior de chutar que as velhas bexigas de porco com que jogávamos à porta do senhor Francisco Reis da Silva "Santo Amaro" (o pai do "nosso" Xico).

sábado, janeiro 07, 2006

As lavadeiras em 2005/6

Tendo descoberto, e publicado, uma foto de 1958 com as lavadeiras de S. Tomé, uma das primeiras coisas que procurei fazer foi, quase 48 anos depois, actualizar essa foto. Muitas fiz. Aqui fica a primeira.



Será, talvez, o começo da nossa conversa...



Aqui chegaram os portugueses...

... a S.Tomé.

Outros que não estes 4 mais o que tirou a fotografia.

Outros, os de quinhentos!

Confesso...

... a perturbação.
Nem foram assim tantos dias! Não tantos como aqueles que lutas antigas nos deram (a todos?) como direito a férias. Para mais, com feriados pelo meio que descontados deveriam ser...
Mas parece ter passado tanto tempo, para mais acrescentado de um dia difícil (des)graças à Luxor & Cia.!
Os amigos dizem que muito tempo foi, e felizes nos sentimos por haver mais quem sente a ausência nossa do que quem aborrece a nossa presença.
A perturbação (confessada) vem de não saber por que ponta recomeçar. E tanta ser a vontade!
Por mim, já fiz um turno na Som da Tinta, já retomei a Juventude (a Ouriense, e hóquista, e natação, e futsal, e patinagem, acrescente-se...), já tentei matar outras saudades, mas, confesso (perturbado) que isto dos blogs está complicado. Não sei por que ponta lhe pegar!
Há tanto para contar e mostrar...
Para já, um grande abraço!