sexta-feira, julho 01, 2016

Para tudo, uma pergunta (que fazer?), sempre uma mesma resposta (a luta!).


  • Ângelo Alves 
  • Membro da Comissão Política


Cabe aos povos trilhar, pela luta, os caminhos da ruptura
Brexit, o que fazer?


O referendo britânico constitui um acontecimento de grande importância política para os povos do Reino Unido e da Europa. A ideia da irreversibilidade da União Europeia sofre um profundo abalo. O debate sobre o futuro do continente europeu e das relações entre os seus povos e estados está na ordem do dia.


Foi quase há quatro anos que afirmámos na Resolução Política do XIX Congresso do PCP que a crise do capitalismo na União Europeia expunha com notável clareza a natureza e as insanáveis contradições do processo de integração capitalista europeu e que por isso a crise na União Europeia era também a crise dos seus fundamentos e pilares económicos, políticos e ideológicos. Estava formulada a tese da «crise na e da União Europeia» que tanta actualidade tem hoje.

Afirmámos na altura que «a profunda crise social e económica na União Europeia, a afirmação das várias instituições europeias como instrumentos políticos do domínio dos grandes monopólios e do capital financeiro, o salto ultraliberal e federalista em curso nas instituições da UE e o aprofundamento das contradições políticas e institucionais no seu seio» eram elementos de «um processo de concentração do poder político e económico, rolo compressor de direitos sociais, laborais e democráticos e da soberania dos povos», elementos que, como afirmámos então, «revelam com assinalável nitidez os limites objectivos da União Europeia, demonstrando que esta não é reformável e está condenada ao fracasso».

Aí está a realidade a dar razão ao PCP. O referendo britânico é «apenas» mais um momento – muito importante sem qualquer sombra de dúvida – de um processo em que a acentuação da natureza imperialista da União Europeia aprofunda de forma vertiginosa os quatro eixos de contradição que a percorrem: de classe; democrático e de soberania; civilizacional e de falta de legitimidade; de rivalidade inter-imperialista. Contradições que estiveram todas presentes no Brexit e cujas expressões confluem de forma cada vez mais evidente numa crise «sistémica», profunda e persistente que não nasceu agora, antes com a própria criação da CEE e depois da União Europeia. Tal como o capitalismo, também a União Europeia carrega no seu bojo, devido à sua natureza de classe, a crise.

Novo pico de crise

É por isso que o referendo britânico adquire uma tão grande magnitude. Se ele fosse o resultado de uma mera conjuntura política interna britânica, ou mesmo de uma curva apertada da relação entre potências no continente europeu, não teria o impacto que está a ter. Mas não é só isso. É preciso enquadrar o referendo britânico para o entender na sua plenitude.

Ele acontece precisamente quando o mundo e a Europa estão às portas de um novo pico de crise económica e financeira do capitalismo; quando a crise social no continente europeu faz desta região uma das zonas do globo de maior regressão social da última década; quando se sucedem escândalos financeiros uns atrás de outros e se torna visível que a corrupção faz parte do status quo; quando países como a Grécia continuam a ser esquartejados económica e socialmente e humilhados politicamente; quando os discursos delicodoces da «construção europeia» dão lugar à despudorada arrogância da Alemanha imperialista; quando o sistema político burguês no continente mergulha numa profunda crise e o fascismo se alimenta da exploração social e da opressão nacional; quando as rivalidades inter-imperialistas extravasam os corredores de Bruxelas e fazem estalar o verniz da hipocrisia eurocrática; quando o Mediterrâneo se transforma na maior vala comum da história recente da Europa e a União Europeia diz explicitamente aos povos do mundo «não venham para a Europa»; quando a União Europeia militarista faz a guerra em várias partes do mundo, alimenta e financia terroristas, faz acordos de «cooperação» com governos fascistas e empurra o continente europeu para um embate com a Federação Russa de incalculáveis consequências.

Trilhar os caminhos da ruptura

É este, resumidamente, o quadro em que aconteceu o Brexit. A História está a desenrolar-se diante dos nossos olhos e a pergunta de Lénine faz todo o sentido: que fazer? A imagem da bicicleta que não pode parar revela o seu ridículo de forma exuberante. Ela está a abrandar, e a questão é o lado para onde vai cair. A resposta reside, como sempre, na questão de classe. As reacções dos últimos dias, no Parlamento Europeu e no Conselho Europeu, fazem recordar a imagem da orquestra no convés de luxo que continua a tocar a mesma música enquanto o barco se afunda. Mais e melhor União Europeia, dizem eles. Dali não seria de esperar outra coisa.

Cabe aos povos trilhar, pela luta, os caminhos da ruptura, tomar o convés superior, organizar o salvamento e sair do barco antes do sufoco final. Salvar a Europa, significa, mais do que nunca, derrotar as imposições, políticas e pilares da União Europeia em todas as suas dimensões. E isso não é compaginável com visões reformistas da União Europeia, e muito menos com brincadeiras mediáticas, de um indisfarçável populismo e politicamente desonestas como a proposta do BE de um referendo indefinido que o PCP já desmontou e bem.

avante! 
de ontem

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