quinta-feira, fevereiro 19, 2015

Clarificador e da maior oportunidade

 - Edição Nº2151  -  19-2-2015

Momentos de clarificação
na Europa
Amanhã termina o prazo do ultimato do Eurogrupo à Grécia. Um ultimato que, tirando partido da terra queimada por anos de políticas ditas de austeridade, usa a destruição, dependência e fragilidade da economia grega para chantagear e atacar todo um povo.



Ao momento da redacção deste artigo todas as hipóteses e desenvolvimentos do chamado «caso grego» são possíveis. Esta é a semana das decisões. Amanhã, sexta-feira, os olhos estarão postos no Eurogrupo, mas também em Atenas, onde o governo prevê aprovar um programa de medidas sociais. Para trás estará a reunião do BCE de ontem, quarta-feira (que ao momento da redacção deste artigo ainda não se tinha realizado) que irá abordar a questão do financiamento à Grécia, usando assim a dívida e as necessidades de financiamento do Estado como arma de chantagem, demonstrando mais uma vez como é falsa a «independência» do BCE.
Quem assistir à discussão da «questão grega» na comunicação social poderá ficar com a ideia de que o embate é entre visões diametralmente opostas sobre o papel da União Europeia. Não é exactamente assim. O governo grego já fez saber publicamente, várias vezes, que pretende manter a Grécia no euro e na União Europeia. O próprio plano Varoufakis reafirma esse pressuposto e aceita 70 por cento do conteúdo político do actual Memorando de Entendimento. O que o governo grego está neste momento, objectivamente, a procurar, é o espaço necessário, dentro do quadro da União Europeia e do euro, para conseguir aliviar o peso do serviço da dívida nas contas nacionais, garantir o financiamento ao funcionamento do Estado e assegurar que as receitas do Estado sejam prioritariamente canalizadas para medidas de alívio social.
E o que é sintomático dos tempos que vivemos, e do estado a que chegou o processo de integração capitalista, é que estas intenções do Governo grego suscitam por parte de governos como de Portugal – que poderia ganhar e muito com medidas como uma renegociação da dívida – um abjecto empenho em falar pelo dono e em adoptar uma postura que além de profundamente contrária aos interesses nacionais, adopta como seu um discurso racista e colonialista que remete o povo grego, e já o fez relativamente a Portugal, para a condição dos caloteiros preguiçosos do Sul que não querem pagar o que devem. 

O debate é político
O que está em causa não é um embate entre credores e devedores, onde os segundos não querem pagar o que devem. Não! a questão não é essa. O embate é entre um país e um povo que disseram não a mais exploração e empobrecimento e uma União Europeia que quer continuar a fazer da Grécia uma «lição», demonstrando pela prática que não é a vontade dos povos que determina o rumo da União Europeia mas sim a vontade dos poderosos, por mais destruição e sofrimento que isso implique. Ou seja, trata-se de um embate político entre uma super-estrutura de poder construída em nome dos povos mas à margem destes e os povos que se expressam clara e crescentemente, de forma legítima e democrática, contra esse poder anti-democrático que lhes destrói as vidas, submete os seus países e hipoteca o seu futuro.
Mais do que um simples debate sobre o pagamento de uma dívida estamos a lidar com a expressão política da crise na e da União Europeia, e todos já o perceberam. Daí o «quebrar de verniz» dos principais rostos da toda-poderosa União Europeia e a sua obstinação em afirmar que «não há alternativa ao memorando» e de que as «regras são para cumprir». 

Três questões nodais 
Neste preciso ponto do processo há três questões nodais que importa reter. A primeira é a de que conservadores e sociais-democratas estão unidos na chantagem e na imposição da via única. Por isso a resistência e as alternativas têm de se demarcar claramente das duas correntes que têm liderado o processo de integração capitalista na Europa. A segunda é que é cada vez mais claro para amplas massas populares que o euro e a União Europeia são uma parte do problema e não da solução, uma espécie de prisão onde estão reféns os trabalhadores, os povos e os estados da Europa e de onde os urge libertar. A terceira é que a realidade está a começar a demonstrar que há muito pouco espaço de manobra dentro da UEM para implementar medidas favoráveis aos trabalhadores e aos povos. Portanto a questão da imposição por via política de um processo intergovernamental de abordagem política da questão das dívidas soberanas; da revogação de instrumentos de domínio como o Tratado Orçamental, entre outros; e, mais importante, da ruptura com as políticas e orientações da UE, e em especial da UEM; são questões nodais para fazer deste momento um avanço na luta dos trabalhadores e povos da Europa, um momento que como já se viu exige coragem, determinação, verticalidade e, sobretudo, a rejeição quer da chantagem quer das meias-verdades.

Ângelo Alves 

3 comentários:

trepadeira disse...

Excelente análise.

Abraço,

mário

Olinda disse...

Tudo tao ôbvio.Angelo Alves di-lo de uma forma bastante intelîgivel.

Bjo

Anónimo disse...

Salónica na foto