segunda-feira, março 09, 2015

20 de Janeiro de 1978

A arrumar (?) papéis velhos.  Da arca...

Subia, marcando pausadamente cada passada, a Rua de Sant’ana à Lapa. Vinha do Quelhas para a Rua de Buenos Aires, e sobrava-me algum tempo. Era o dia 20 de Janeiro de 1978. Acabara de ler as “grandes" de o diário, dobrara o jornal e metera-o debaixo do braço. Reflectia sobre o que ia sendo este País que se transforma, sobre este Povo que tem de continuar a resistir. E que resiste e que luta e que defende o que conquistou.

Subia a rua, e acabara de passar em frente de um prédio esquisito onde está a ser instalada uma coisa qualquer das “caixas”. Por causa das obras e do lamaçal que se alastrava, mudei de passeio completamente entregue ao que se entretecia cá por dentro de mim. Cruzei um vulto, que quase me tolheu o passo. Era um velhote, daqueles rijos, quadrados, feitos de uma só peça. Aspecto de velho operário, reformado ou lá perto, mas pronto para os biscates. Também vinha entregue aos seus pensamentos e reflexões, mas em voz baixa e gesticulando.

Quando nos cruzámos, estendeu o braço para o tal prédio, apontou qualquer coisa e lá continuou a caminhada, dizendo, resmungando. Não foi para mim que disse, mas eu ouvi-o, na passagem desencontrada: “Está bonito, está! Está lindo está o 25 de Abril! Foda-se! Filhos da puta!”. Os meus olhos seguiram o que apontara o braço do homem, que já ia mais abaixo, continuando a arenga. Numa das extremidades do tal prédio esquisito estava escrito CDS e na outra ponta o desenho canhestro da mão fechada em punho cerrado com um PS lá dentro.

Foi no dia 20 de Janeiro de 1978, quando subia a Rua de Sant’ana à Lapa, e se faziam maiorias constitucionais PS/CDS para pôr o País no rumo certo. Deles.

 20.01.1978

1 comentário:

Olinda disse...

E desde logo,um rumo,que nos tem doîdo muito assistir.E continua,cada vez mais,doloroso.

Bjo