Abrilabril:
«Estou enojado e cansado de ver activistas e rebeldes
usar cadáveres de crianças para forjar cenas emotivas para consumo ocidental. E
depois interrogam-se sobre as razões pelas quais jornalistas põem em causa
partes da narrativa» – escreveu
ele no Twitter, acompanhando as palavras com imagens ilustrativas do conteúdo
da mensagem.
O tweet esteve pouco tempo exposto, antes de se sumir
nos subterrâneos censórios da rede, o que não impediu a reprodução da mensagem
à velocidade da luz, através da internet. É certo que não chegou aos
consumidores da informação digna e com chancela de qualidade que a põe a salvo
de qualquer risco de contaminação pela «propaganda russa», mas despertou
milhões para uma realidade cada vez mais difícil de esconder.
«Estou enojado e cansado de ver activistas e rebeldes
usar cadáveres de crianças para forjar cenas emotivas para consumo ocidental. E
depois interrogam-se sobre as razões pelas quais jornalistas põem em causa
partes da narrativa»
RIAM DALATI, PRODUTOR DE INFORMAÇÃO INTERNACIONAL
DA BBC (11/04/2018)
Em tweet anterior, Riam Dalati já mostrara o seu
inconformismo perante as versões oficiais postas a circular sobre o que
acontecera em Duma, desmontando então a foto do
«último abraço», a chocante imagem com que os «Capacetes Brancos», destacamento
dos serviços secretos britânicos, agitaram a opinião pública mundial.
Os cadáveres de duas crianças mortas em andares separados de um prédio que
desabou em Duma – como testemunham fotos captadas imediatamente a seguir à
tragédia – foram depois colocados lado-a-lado, em posição de dramático abraço,
para as fotos captadas no local de recolha e identificação das vítimas. É
difícil qualificar adequadamente os seres humanos capazes de tais práticas
necrófilas.
Os frequentadores do jornalismo sério, profissional e
independente já tinham posto os olhos numa extraordinária reportagem do enviado
da BBC,
dada a conhecer em 13 de Novembro passado, na qual expôs minuciosamente, sem
margem para dúvidas nem espaço para teses conspirativas, abundantes provas de
que as potências da NATO, tão expeditas em bombardear arsenais químicos sem
libertar um átomo de veneno para a atmosfera, estavam a mobilizar os próprios
meios militares para dar fuga e encaminhar para novas regiões de acolhimento os
terroristas do Estado Islâmico derrotados em Raqqa, o seu quartel-general na
Síria ocupada. «O
segredo sujo de Raqqa» é o título dado por Dalati ao seu trabalho.
Outro profissional da comunicação, o
norte-americano Tucker Carlson daFox News, por sinal uma das estações
de televisão mais favoráveis a Donald Trump, levou a peito a frase
de Orwell segundo a qual «a liberdade é também a capacidade de dizer às pessoas
o que elas não querem ouvir» e foi incapaz de se conter ao cabo de tantas
certezas oficiais e académicas sobre Duma. Desabafou em directo:
«Todos os génios que
dizem que Assad matou essas crianças saberão o que estão a dizer? Claro que não
sabem. Estão a inventar. Não fazem ideia nenhuma do que aconteceu».
Também de nacionalidade norte-americana, o
enviado especial da One America News Network (OAN) ao «massacre de Duma», Pearson Sharp, expôs frontalmente,
perante as câmeras, os resultados da sua investigação no terreno:
vagueou pelas ruas, entrevistou mais de 40 pessoas escolhidas ao acaso, visitou
residências, hospitais, variados locais públicos e não viu nem ouviu nada que
indiciasse a existência de um ataque químico. Vale a pena vê-lo e ouvi-lo:
Poderia continuar esta caminhada, de caso em caso, de
profissional em profissional. Citar os vídeos e as fotos testemunhando que, nas
zonas sírias controladas por terroristas, «moderados» ou não, há lugares onde
as crianças são treinadas a simular os efeitos de ataques químicos, numa
espécie de concursos em que são distinguidas as que melhor interpretam, por
exemplo, os espasmos da agonia; ou então dar voz às declarações de pessoas que
participaram nessas encenações, identificando-se a elas próprias nos vídeos em
que foram figurantes.
Para muitos, através do mundo, a verdade destas
mentiras montadas para não deixar esmorecer a guerra tornou-se um facto
admissível, ou mesmo inquestionável.
Para muitos outros subsiste o natural cepticismo. Os
efeitos da tese da teoria da conspiração são fortes e duradouros. Além disso, a
guerra de propagandas é inerente aos conflitos militares, muito mais em
situações, como a da Síria, onde se enfrentam, agora directamente, as mais
poderosas potências mundiais.
A posição cúmplice de Portugal: lamentável,
confrangedora e ultrajante
Há que distinguir, porém, entre o cidadão comum,
certamente mais dependente da comunicação social que lhe chega sem fazer
qualquer esforço, daqueles que têm outros níveis de responsabilidade política e
social, como os deputados, os ministros, o primeiro-ministro, o Chefe de
Estado.
É lamentável que a maioria dos eleitos da Assembleia
da República tenham dado como confirmada a história do suposto ataque químico
de Duma, apenas com base na versão dos «Capacetes Brancos», e não se
informassem mais pluralmente antes de votar – assumindo como dogma as posições
belicistas da NATO e da União Europeia, como seu braço civil.
«Marcelo Rebelo de Sousa [...] envolveu o país num
acto de guerra»
É confrangedor que o primeiro-ministro António Costa
tenha permitido que o Chefe de Estado envolvesse o governo na sua grotesca e
submissa declaração de cumplicidade com uma agressão militar ilegal; e que, não
contente com isso, tenha adoptado o mesmo tom subserviente na sua própria
declaração. Como se estivesse a penitenciar-se aceitando humildemente, e como
merecidos, os puxões de orelhas que, pelos vistos, recebeu por não ter
expulsado diplomatas russos na sequência da história de venenos e espiões que
cheira a aldrabice de uma ponta à outra.
É ultrajante e abusivo para os portugueses que o
Presidente da República, também renomado professor de Direito, tenha associado
Portugal ao mais descaradamente ilegal acto de guerra praticado por aqueles a
quem qualificou como «amigos e aliados», corresponsabilizando-se, deste modo,
por um acto criminoso contra um país e um povo soberanos que viola o direito
internacional da forma mais grosseira possível.
Maioria de deputados, governo e
Presidente da República assumiram-se assim como cúmplices de um acto
fora-de-lei na cena internacional; acataram, sem reticências, pretextos e
alegações que ou já se revelaram inquestionáveis mentiras ou carecem de
investigação por organismos credíveis.
À hora a que o Chefe de Estado proferiu a profissão de
fé validando as razões da agressão contra a Síria já tinha obrigação de saber
que os agressores mentiram deliberadamente: os locais alvejados não guardavam
armas químicas, ao contrário do invocado, porque não consta que deles tenha
brotado sequer um átomo de veneno para as imediações.
A irresponsabilidade de Marcelo Rebelo de Sousa ao
abusar da palavra em nome dos seus concidadãos foi mais longe: envolveu o país
num acto de guerra que, se tivesse corrido de acordo com os fins e segundo as
circunstâncias descritas pelos autores, provocaria, então sim, um autêntico
ataque químico susceptível de arrasar todas as formas de vida em redor.
Um parênteses: a guerra humanitária de Theresa May
Tratou-se, portanto, de um atentado de terrorismo de
Estado praticado contra a Síria, hipocritamente em nome dos direitos humanitários
do povo sírio, através de uma cruzada para atenuar «o seu sofrimento», como
beatificamente sentenciou Theresa May, a primeira-ministra britânica. Que tem
como marido e conselheiro um gestor de topo do Capital Group, fundo de
investimento que possui cerca de dez por cento da Lockheed Martin, gigante da
indústria da morte e fabricante dos mísseis de cruzeiro JASSM, que se estrearam
neste acto piedoso contra território sírio, assim gerando um merecido reforço
de lucros a quem os fabrica e financia. Cada unidade desses mísseis custa a
modesta quantia de milhão e meio de euros. E cada acção da Lockheed Martin
valorizou-se 2,3% na primeira sessão de bolsa a seguir ao dia do
bombardeamento.
Da Cimeira das Lajes à actualidade, vamos de mal
a pior
Para a História, e para que se interpretem
objectivamente eventuais acontecimentos vindouros que poderão não ocorrer por
«azar» ou ser «obra do acaso», fica o facto de as autoridades portuguesas em
funções terem conseguido ultrapassar, em cota de desprezo pelo direito internacional,
o comportamento das que, há 15 anos, arrastaram o país para a conivência com a
invasão terrorista do Iraque. Nesse caso, a guerra assentou em mentiras, mas
foi suportada por uma resolução do Conselho de Segurança da ONU; nos dias que
correm, a guerra baseia-se em mentiras, trava-se sem mandato das Nações Unidas
e mesmo contra a Carta das Nações Unidas. Dentro das atitudes condenáveis, o
país foi levado de mal a pior.
A escassos dias das celebrações do 44º aniversário da
Revolução de Abril, Portugal surge enrodilhado numa teia vergonhosa e perigosa
de ilegalidade internacional, com expressões terroristas; uma teia tecida pela
NATO e pela União Europeia, assente na habitual invocação cínica dos direitos
humanos, da liberdade e da democracia. Valores reduzidos um pouco mais a pó,
dia após dia, mercê de tão vigorosos como permanentes espezinhamentos.
«Para a História [...] fica o facto de as
autoridades portuguesas em funções terem conseguido ultrapassar, em cota de
desprezo pelo direito internacional, o comportamento das que, há 15 anos,
arrastaram o país para a conivência com a invasão terrorista do Iraque»
Esqueçam tudo quanto eventualmente ouviram dizer de
mal a Macron, May, Juncker, Merckel, Marcelo, Costa e muitos outros parceiros
garbosamente «atlantistas» e «europeístas», a propósito de Donald Trump; e que
possam soar como condenações, discordâncias, até reparos irónicos,
manifestações de dissidência, acusações contundentes sobre a pessoa e a conduta
do presidente norte-americano em exercício. Não passam de exercícios políticos
inconsequentes, palavras ditadas pelo oportunismo do politicamente correcto,
afinal sem conteúdo nem verdadeira acrimónia.
A partir de agora, porém, quaisquer reparos críticos
ao presidente norte-americano dirigidos pelos seus «amigos e aliados» terão,
logo que proferidos, tanta consistência como as verdades oficiais em torno do
ataque químico em Duma, das tentativas de liquidação dos Skripal, ou dos
arsenais químicos aniquilados pelos mísseis que consumaram a agressão de 14 de
Abril contra a Síria, provavelmente o prólogo de algo mais substancial e
catastrófico que paira agora um pouco mais ameaçador sobre o planeta. O grupo
naval do porta-aviões norte-americano «Harry S. Truman» saiu há poucos dias de
Norfolk, provavelmente em direcção às imediações da Síria, pelo que ainda são
necessárias algumas semanas antes de estar operacional para a nova missão. Qual
será?
Coisa pacífica e pacificadora não será, por certo.
Porém, digníssimos dirigentes como Macron, May, Merckel, Rajoy, Tusk, Orban,
Costa e Marcelo não precisam de se preocupar nem de se desviar das ocupações
diárias, por exemplo cortar décimas do défice, salários de quem trabalha,
direitos de cidadania.
Todos sabem, de cor e salteado, o que fazer quando a
altura chegar: tal como agora, basta-lhes seguir o chefe, ainda que o chefe de
turno se chame Donald Trump.
1 comentário:
Ao ler esta informação,repito as palavras de José Goulão:"Restam-nos a vergonha e o nojo."Nunca a humanidade foi tão desumana,nada aprendeu com o passado.Bjo
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