- Edição Nº2461 - 28-1-2021
CONVERSA NOS ALGARVES
Foi em 3 de Janeiro de 60, isto é, há já sessenta e um anos, que o fascismo português sofreu uma derrota espectacular que terá levado Salazar a um mal controlado estado de irritação, verdadeiro «estado novo» perturbador da sua habitual tranquilidade: do forte de Peniche, prisão considerada de total segurança, evadiram-se dez presos, entre os quais Álvaro Cunhal, Canais da televisão portuguesa, porventura não todos, assinalaram só um poucochinho a efeméride, mas não deixa de ser curioso que exactamente por estes dias a RTP1 se tenha aplicado a entrevistar longamente Carlos Brito, ex-militante do PCP que não teve nada a ver com a fuga de Peniche e em tempos saiu do Partido por uma porta encimada por um imaginável letreiro a dizer-nos «Renovador». A entrevista não teve nada de obviamente provocatório ou semelhante, excepto porventura nessa etiqueta. Aliás, como bem sabe quem o queira saber, formular votos para que o PCP se «renove» é uma espécie de destino dos inimigos do PCP: que ele, o Partido, se renove incessantemente até à sua autodestruição final.
Por vezes, Roma paga
A entrevista a Carlos Brito, que aliás não arrancou de um pretexto visível e não teve relevo especial, poderia passar por apenas uma tentativa algo ingénua de incomodar o Partido que Brito afirmou querer «renovar». Aliás, mesmo durante a entrevista, que não foi breve, não foi possível vislumbrar sinais concretos e claros de convite a uma qualquer renovação. Mas admite-se que para o anticomunismo militante que está permanentemente alojado nos grandes «media» a questão não ofereça dúvidas: o PCP deve renovar-se até que deixe de ser «C», e a recusa dessa trajectória, porventura enovelada com ambições pessoais de promoção dentro do Partido, poderá explicar o embarque de Carlos Brito na mítica barca chamada «renovação» e a sua partida para os algarves. É claro e indubitável que Brito foi um resistente antifascista e que sofreu por isso, como o programa acentuou e bem, mas mesmo os bons combates travados não justificam uma atitude qualquer. Carlos Brito parece ter decidido «renovar» a partir da sua província natal e ao decidir assim pagou uma espécie de pesado preço: abandonou os muitos milhares de camaradas seus que optam pela permanência num combate comum que exige unidade sem rupturas e desaconselha protagonismos individuais, por muito apetecíveis (e porventura estimulados do exterior) que eles surjam. Há circunstâncias em que é preciso resistir às tentações, talvez Carlos Brito não tenha resistido a todas as que surgiram no seu trajecto, e em consequência saiu do mapa político português. Mas ganhou agora esta entrevista na RTP. Uma língua pérfida diria que Roma já paga, embora pouco, a quem há uns oito séculos atrás não pagava.
Correia da Fonseca
3 comentários:
Carlos Brito,ao render os ideais,deixou de ser respeitado,quer por ex-seus camaradas,quer até ,pelos do outro lado.Pode ser usado,mas não respeitado.Penso que a sua vivência com a ex-companheira não foi em vão .Correia da Fonseca sempre "cronicando"da forma que só ele sabe.Bjo
Também li esta crónica de CdF.
Ontem já consegui ler o Avante quase por inteiro.
Abraço!
Bem aparecido seja, aprende-se sempre algo com o CdF
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