domingo, abril 26, 2015

Crónica para um dia de memória e futuro (25 de Abril, ontem)

Durante a viagem de regresso, o cansaço de tanta emoção e abraços venceram-me. Dormi. Depois de uma curta refeição, enquanto, ao telefone, trocava as habituais e sempre camaradas impressões com o CS, e me preparava para pôr fim ao dia cheio, os olhos foram atraídos por uma imagem no aparelho de televisão. Era o Jerónimo, a falar (sem som) num cenário de biblioteca. Parei a ver se percebia… e fugi para um canto só meu, onde pudesse ver e ouvir o que adivinhava … interessante (pelas imagens fugidias).
Procurei o princípio. Teclando no recomeço do programa. Apanhei tudo. E o dia cheio extravasou.
Um debate na TVI!
É irresistível a vontade de comentar, de cronicar sobre um debate tão rico e tão esclarecedor, com tanta adulteração da História e com tanta urbanidade (quando a imprecação e a indignação poderia provocar voz alta e gritada), com tal limpidez de posições e com tais confissões sobre o perigo que pesou sobre o Povo e a Pátria. Mas só poderei deixar – eu que vivi intensamente alguns daqueles episódios recordados e tão mal-contados por alguns –, à medida razoável de um blog, um apontamento sobre cada um dos intervenientes.
Como estavam todos na “qualidade” de deputados na Constituinte (3 eleitos pelo PPD/PSD, dois pelo CDS, um pelo PS e um pelo PCP… faltando alguém eleito pelo MDP/CDE e alguém eleito pela UDP), começo pelo que foi chamado “pai da Constituição” (!), Jorge Miranda, que (tendo tido o cuidado de esclarecer que foi deputado pelo PPD e não pelo PSD), pelo que disse e como disse se definiu como estrénuo defensor de uma democracia ocidental contra o comunismo, contrapôs a legalidade democrática à legalidade revolucionária, sempre em alternativas redutoras e académicas.
Depois, entre os professores, Freitas do Amaral, o contra-revolucionário no terreno, não hesitou em deturpar a letra da Constituição para justificar o voto contra o espírito de democracia avançada, anatematizando uma “constituição económica” que, aliás (é bomlembbrar!) se baseava na articulação de três sectores – público, cooperativo e privado – e na prevalência do interesse geral sobre o interesse particular e, ainda hoje, insistiu em recordar, mais de uma vez, a fera e repetida ameaça da guerra civil e da divisão do País em dois, com a transferência dos "democratas" (de costas quentes peloapoio internacional), do Governo e da Assembleia Constituinte para o Porto.
A seguir, Basílio Horta, companheiro do Diogo (assim o tratava) na Constituinte, nos conluios inter-partidários com o PS e nas excursões ministeriais e autárquica para o parceiro de conluios, o polivalente adaptável que tão bem conheci, enquanto representante da Corporação da Indústria do "Estado Novo", mais reconhecido por fascista, na fase de conciliação do contrato colectivo dos metalúrgicos em 1973, e que, ali,no debate, corroborou sem corar… o que "o Diogo" aventou.
Do lado dos eleitos PPD/PSD, Angelo Correia fez o seu televisivo "número" de historiador-teórico-ideólogo-estratega de coisa nenhuma, e Marcelo Rebelo de Sousa também foi ele-mesmo, com a sua destreza e habilidade funâmbula, deixada para o fim do programa, a partir de uma pergunta preparada de um jovem assistente para resposta, na sua qualidade de comentador residente do canal... sempre com a sua aposta na irradiante simpatia coloquial valorizando muito, subliminarmente, a sociedade civil juventude desorganizada versus velhice... não a do Padre Eterno mas a dos partidos, depois de ter renovado o episódio, muito repetido neste 25 de Abril de 2015, da rocambolesca fuga pelos telhados de Beja.
Ainda Manuel Alegre, explicando inexplicáveis coisas, poeta e muito socialista, democrata e todo anti-ditaduras, saudoso de uma união PCP-PS “à francesa”, decerto distraído do que isso foi e do que isso deu.
Por último, Jerónimo de Sousa, o operário construído e sempre em construção, no meio dos deputados professores, doutores, engenheiros empresários e poetas, muito sereno (como é que conseguiu?!). conciso, humilde (talvez demais...) mas firme, a pôr alguma ordem em várias desordens a tender para caos (e terrorismos a redundarem, se necessário fosse, em guerra civil, com armas e munições em leasing de governos e partidos “democráticos” ocidentais…).
Foi evidente, para quem divida as orações daquelas prédicas, que havia, em 1974/75, não alternativas redutoras mas caminhos diferentes para a Pátria, que estavam em causa opções de classe. Como continuam a estar. Noutras condições. Na mesma luta!  

1 comentário:

cid simoes disse...

Bom resumo, mas vejam porque ainda estão a tempo.