21.03.2017
(...)
O cronista dos factos i relevâncias
– Recomeçando...
O Velho – … no Dia da Poesia.
O cronista dos factos i
relevâncias – … com quem?!
O Velho – Logo me salta o Cesário, o “meu poeta”.
O cronista dos factos i
relevâncias – … o nosso!
O Velho – É verdade. Pelo que foi e, sobretudo, pelo
que poderia ter sido se não tivesse morrido com 31 anos,
O cronista dos factos i
relevâncias – É significativo que, acabado de ler este
livrinho do Zé Gomes, em que tanto escreve tão pouco sobre a escrita e os seus
artífices - como grupo -, não tenha eu dele retido uma linha, uma palavra, sobre
Cesário.
O Velho – É verdade. E admiro tanto os dois… Mas
vamos ao registo, neste dia.
O cronista dos factos i
relevâncias – … estou aqui para isso!
O Velho – E, por isso…, vamos guardar – para hoje –
um começo e pedaço do “sentimento de um
ocidental”, e, para amanhã – para a “aula”/oficina da Universidade Sénior
de Ourém – o poema “impossível” como
mote para glosar.
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Nas nossas ruas, ao
anoitecer,
Há tal soturnidade, há
tal melancolia,
Que as sombras, o
bulício, o Tejo, a maresia
Despertam-me um desejo
absurdo de sofrer.
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Isto… escrito por um
homem com um domínio da língua que nos querem roubar como o fizeram
(provisoriamente...) à soberania de cunhar moeda!, homem que, com uma vida de 31
anos, ainda teve tempo para, no mesmo poema “sentimento
de um ocidental”, nos ter deixado esta(s) mensagem(s)
Se eu não morresse, nunca! E eternamente
Buscasse e conseguisse a perfeição das cousas!
Esqueço-me a prever castíssimas esposas,
Que aninhem em
mansões de vidro transparente!
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E também – a propósito de
(...) castíssimas esposas,
que aninhem em mansões de vidro transparente! –
nos deixou esta versão do que dizia ser impossível:
Impossível
Nós
podemos viver alegremente,
Sem que venham com fórmulas legais,
Unir as nossas mãos, eternamente,
As mãos sacerdotais.
Sem que venham com fórmulas legais,
Unir as nossas mãos, eternamente,
As mãos sacerdotais.
Eu posso ver os ombros teus desnudos,
Palpá-los, contemplar-lhes a brancura,
E até beijar teus olhos tão ramudos,
Cor de azeitona escura.
Eu posso, se quiser, cheio de manha,
Sondar, quando vestida, pra dar fé,
A tua camisinha de bretanha,
Ornada de crochet.
Posso sentir-te em fogo, escandescida,
De faces cor-de-rosa e vermelhão,
Junto a mim, com langor, entredormida,
Nas noites de verão.
Eu posso, com valor que nada teme,
Contigo preparar lautos festins,
E ajudar-te a fazer o leite-creme,
E os mélicos pudins.
Palpá-los, contemplar-lhes a brancura,
E até beijar teus olhos tão ramudos,
Cor de azeitona escura.
Eu posso, se quiser, cheio de manha,
Sondar, quando vestida, pra dar fé,
A tua camisinha de bretanha,
Ornada de crochet.
Posso sentir-te em fogo, escandescida,
De faces cor-de-rosa e vermelhão,
Junto a mim, com langor, entredormida,
Nas noites de verão.
Eu posso, com valor que nada teme,
Contigo preparar lautos festins,
E ajudar-te a fazer o leite-creme,
E os mélicos pudins.
Eu tudo posso dar-te, tudo, tudo,
Dar-te a vida, o calor, dar-te cognac,
Hinos de amor, vestidos de veludo,
E botas de duraque
E até posso com ar de rei, que o sou!
Dar-te cautelas brancas, minha rola,
Da grande loteria que passou,
Da boa, da espanhola,
Já vês, pois, que podemos viver juntos,
Nos mesmos aposentos confortáveis,
Comer dos mesmos bolos e presuntos,
E rir dos miseráveis.
Nós podemos, nós dois, por nossa sina,
Quando o Sol é mais rúbido e escarlate
Beber na mesma chávena da China,
O nosso chocolate.
E podemos até, noites amadas!
Dormir juntos dum modo galhofeiro,
Com as nossas cabeças repousadas,
No mesmo travesseiro.
Posso ser teu amigo até à morte,
Sumamente amigo! Mas por lei,
Ligar a minha sorte à tua sorte,
Eu nunca poderei!
Eu posso amar-te como o Dante amou,
Seguir-te sempre como a luz ao raio,
Mas ir, contigo, à igreja, isso não vou,
Lá essa é que eu não caio!
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Amanhã, com um dia de atraso…,
muito iremos “oficinar” sobre poesia!
1 comentário:
A poesia é uma arma carregada de futuro,como dizia Celaya!
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