A VER SE NOS ENTENDEMOS
Pedro Tadeu - in DN
Quando em 2019 o
governo de António Costa aprovou alterações ao Código do Trabalho e passou o
período experimental de 90 para 180 dias (mas em que planeta é preciso seis
meses para verificar se um trabalhador é competente?!...) deu um tiro de
pistola na geringonça.
Quando, nesse mesmo
Código do Trabalho, reforçou as possibilidades do patronato ficar livre das
regras da contratação coletiva, ao ampliar os motivos para a caducidade dos
acordos feitos entre sindicatos e patrões, prejudicando a capacidade de negociação
dos trabalhadores, deu um tiro de espingarda na geringonça.
Quando em todos estes
seis anos o ministério das Finanças usou, de forma sistemática, excessiva e
arbitrária, a cativações de verbas e eliminou na prática o financiamento
atempado de muitas medidas que tinham sido acordadas com os partidos que
viabilizavam o governo de minoria, deu rajadas de metralhadora na geringonça.
Quando António Costa,
ao longo de seis anos, permitiu que o financiamento do Serviço Nacional de
Saúde (SNS) resultasse numa constante subcontratação de serviços ao sector
privado, social e farmácias, que ronda já os 2 mil e 800 milhões de euros por
ano, em vez de contratar mais pessoal e mais equipamento, lançou uma granada
sobre a geringonça.
Quando em plena
pandemia por Covid-19 o governo começou a contratar mais enfermeiros a prazo,
dispensando-os logo a seguir, deu um disparo de morteiro na geringonça.
Quando na campanha
eleitoral para as autárquicas António Costa acusou a GALP de
"irresponsabilidade social" pelo fecho da refinaria em Matosinhos,
que atirou diretamente 400 pessoas para o desemprego, depois de meses e meses
de complacência do seu governo com esse processo desencadeado pela empresa, fez
explodir uma mina terrestre no caminho da geringonça.
Quando na discussão do
orçamento para 2020 António Costa não aceitou comprometer-se claramente em
pagar mais 50% de salário aos médicos que desejem ficar em exclusivo no Serviço
Nacional de Saúde, detonou um explosivo na geringonça.
Quando na discussão
deste Orçamento do Estado o governo apresenta um documento que nem PCP nem
Bloco de Esquerda têm condições de aceitar, por não garantir a aplicação
imediata de inúmeras propostas em discussão, como as creches gratuitas para
todas as crianças, o aumento extraordinário e abrangente de pensões, o baixar o
IVA da electricidade, entre muitas outras, liquidou a negociação. Este foi o
tiro de bazuca que matou, de vez, a geringonça.
Quando o secretário de
Estado Adjunto do primeiro-ministro, Tiago Antunes, mente na televisão ao dizer
que o PCP exigiu, sem cedências, a subida do salário mínimo para 850 euros já
em janeiro, quando na verdade aceitou 705 euros no início do ano e apenas 800
euros no final de 2022, fez de coveiro da então já falecida geringonça.
A geringonça morreu
porque António Costa fez por isso, desde há bastante tempo, provavelmente
porque acha que vai ganhar com eleições antecipadas.
Significa esta morte
que a esquerda não vai ser capaz de voltar a fazer um acordo que viabilize um
governo? Não.
Na verdade, o tempo
político que vivemos, com a pandemia aparentemente numa fase de controlo e com
um reforço do financiamento europeu garantido, convida a repensar profundamente
a forma como se elaboram orçamentos e como estes se articulam com outras
medidas exteriores a esse documento. É uma oportunidade que não se repetirá tão
cedo. Foi isso que o PCP pôs em cima da mesa.
Seja na discussão
deste documento, seja com outra solução encontrada ainda neste parlamento, seja
após eleições antecipadas, a esquerda acabaria por concluir que tinha mesmo de
matar a geringonça, pois com ela o PS já só geria a contabilidade do Estado com
a calculadora do receio nacional de eleições antecipadas. A esquerda terá de
pensar se vale a pena avançar para outro patamar de relação.
A direita, se precisar,
não hesitará em aliar-se toda ao Chega, sejam quem forem os líderes dos outros
partidos e, por isso, já tem implícita uma proposta política para os
portugueses apreciarem numas eventuais eleições antecipadas: tirar o PS do
governo.
Morta a geringonça, a
esquerda ou vai para a separação de águas entre os seus partidos ou para o
aprofundamento da relação. O medo da direita é a segunda hipótese. O medo da
esquerda é, também, a segunda hipótese.
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(já venho ...)
1 comentário:
Então só com um tiro de bazuca é que o PCP abriu os olhos?
Nem com tiro de pistola, um tiro de espingarda, rajadas de metralhadora, uma granada, um disparo de morteiro e ainda mais um explosivo serviram para dizer basta em nome do povo? Foi mesmo preciso um tiro de bazuca? E agora esperam que esse mesmo povo acredite? Acreditar em quê? Eu vou ali ver se o Marcelo ainda está no multibanco e também já venho.
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