terça-feira, novembro 02, 2021

Ora pensemos em voz(es ao) alto - II

Foi com verdadeira satisfação que li o artigo de Pedro Tadeu no Diário de Notícias, um dos muitos orgãos da comunicação social onde deixei alguma colaboração (bem escassa no DN). Li, quase com alegria, e reproduzi porque inForma, com enorme oportunidade, nestes tempos e lugares de avassaladora desinformação.

Vem tal artigo como que encher o meu saco de criança a pedir ó tia, dá bolinho!, a acompanhar netos e com a alegria de ver tradições não arrasadas (traídas) por estrangeiradas de bruxas e abóboras. E obriga-me, com urgência e muito gosto, a ultrapassar um incidente em que inadvertidamente caí, ao fazer comentário numa mensagem de facebook.

Trata-se da utilização, a meu ver excessiva e perigosa, das designações de esquerda e de direita. A torto e direito (o que não é o caso de António Tadeu)!

Direita e esquerda não são  conceitos científicos, são posições num hemiciclo parlamentar. Já classes sociais e correlação de forças entre classes sociais têm um fundo conceptual. Mas (aqui) não quero entrar por esses caminhos. Oportuno me parece ser a génese das forças sociais em confronto neste momento.

Em 25 de Abril (de 1974, claro) havia dois partidos. Um na clandestinidade, cá dentro e a lutar, marxista-leninista; outro, recém formado lá fora, social-democrata de raíz marxista mas não leninista, com militantes cá dentro. Havia, também, movimentos e projectos de partidos com diferentes formas e expressões.

Com o 25 de Abril, na esteira do que foi o borbulhar do final do fascismo e da guerra colonial, muito na base do catolicismo progressista, formaram dois partidos que, desde então, têm vindo a ser protagonistas na acção político-partidária.

Pode (posso?) dizer-se que o PPD (note-se o nome: Partido Popular Democrático) agrupou, predominantemente, os cidadãos que, aceitando a democracia social se predisporiam para uma organização da sociedade de cariz socialista por contrária à exploração do trabalho/trabalhadores, com sérias reservas a qualquer beliscar do que seria, a seu conceito, a "democracia política".

O CDS (note-se o nome: Centro Democrata-Social) teria uma matriz cristão-democrata, aliciando e agregando os extractos populacionais de confissão e obediência religiosa, opondo-se à concepção socialista e/ou social-democrata, mas sem recusar a co-habitação numa estrutura social com valores e objectivos anti-fascistas e de democracia na sua vertente política.

Como logo se teria visto (quem quisesse ver), as forças e dinâmicas que caracterizavam o que se alcunhava de Estado Novo, antigo regime e outras alcunhas, não foram reprimidas, e a essas novas condições (democráticas em alguns sentidos, que não equilibradamente em todas as vertentes da democracia) se adaptaram capciosamente, procurando infiltrar-se onde vissem brechas, aproveitando não serem violentamente reprimidos para se manifestarem, por vezes com violência.

Dir-se-ia, simplificando ou retro-activando linguagem de hoje, que a esquerda se constitucionalizou num ambiente de precária estabilização.

Poucos anos passaram, ou muitos anos passaram (depende da escala). O mundo, no seu todo, mudou mais que os anos que passaram (muitos ou poucos).

A actual situação faz pensar. Como todas deveriam, mas algumas mais do que outras. Entender-nos ter-se-á tornado mais difícil, porque a informação ganhou transcendência, porque os dicionários deixaram de ter utilidade, porque se simplificaram frases, palavras, se desmiolaram expressões.

Hoje reescrevo, estimulado pelo que li, que o PS é tão de esquerda, tão de esquerda que prefere ser a esquerda da direita que a direita da esquerda. Depois de se vangloriar ter aberto a porta da governação (a quem estava à sua esquerda e por confessada necessidade) a forças à sua esquerda, não as deixou assomar à janela.

E fico-me, por agora satisfeito. Porque (julgo) ter minimamente clarificado o que penso.


1 comentário:

Olinda disse...

O PS insiste em apresentar-se de esquerda,mas não contesta as políticas neoliberais e a sua subserviência à directiva europeia é chocante.Com os dirigentes que possuem,dizer que o PS é de esquerda é uma profunda fraude.Bjo