quarta-feira, outubro 31, 2007

Princípios... - 8

4. - O princípio e os seus usos
ou
a falta de rigor no (ab)uso da aparência do rigor
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o princípio do rigor (continuação e final)
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Porque se faz isto?
Para a imagem. Para que se fique com a ideia que se dominam, até ao mínimo pormenor, saberes e técnicas inacessíveis ao comum dos mortais (ou aos mortais comuns), e assim se fundamentar políticas que só os “sábios” estão em condições de definir e prosseguir.
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Saindo da consideração em abstracto – embora a referência ao mítico défice orçamental, e aos 3,00%, já seja “ponte” para a realidade concreta da nossa política – não fujo a dizer que Vítor Constâncio, governador do Banco de Portugal, ilustra esta postura do “rigoroso sem mácula”, sempre com “números certos” na manga ou debaixo da gravata.
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Do cadeirão onde foi colocado como supra-partidário – ele que foi secretário-geral de um dos partidos que alternam no poder –, com o seu ar sério (alguém viu o homem rir?), atira-nos com o seu rigoroso rigor, com o “número certo”, nos momentos apropriados, e o que diz ecoa como se fossem verdades indesmentíveis. Ai do “ignorante” que se atreva a pôr em causa a sapiência de quem tão sapiente é, ou o mostra pelo ar e postura.

Mais depressa se apanha um “rigoroso” que um coxo…
No entanto, as coisas estão a correr mal, ilustrando também como tudo é efémero, e não há “número certo” que resista ao confronto sério com a realidade.
Nem venho aproveitar as escorregadelas das faltas de rigor que se descobriram em documento ou relatório que não as poderia ter para poder ser o que queria apresentar-se como sendo. Venho, só, trazer dois episódios que me parecem elucidativos.
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Tem o Banco de Portugal (BP) a tarefa de anunciar previsões quantificadas da evolução da economia portuguesa. O que é muito necessário, e se vai tornando indispensável.
Tem, o BP, os dados todos, alguns que só dele são. Pois a penúltima previsão de crescimento do tal PIB português era de 1,6% e a última, um trimestre depois, passou a ser de 0,5%. A previsão de um indicador passa, num trimestre, a ser de menos de um terço do que foi! Que credibilidade se pode dar a quem se nos apresenta como sendo a credibilidade em pessoa?
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Depois, outro episódio que é mais para o caricato.
Quem, Vítor Constâncio, se toma os ares que lhe fazem a imagem e afivela a postura da intangibilidade, reage mal a que se lhe pergunte se pensa aplicar a si a contenção salarial que defende (sempre!) que seja aplicável aos que ganham em 3 a 4 anos o que ele ganha num mês, e, perturbado, dá uma prova de ausência de rigor onde o rigor seria possível e fácil.
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Na verdade, argumentar que o preço do barril de petróleo é de “50 e tal dólares” (!?), mostra total ausência de rigor quando se podia (e devia) dizer, naquele dia, esse preço em número exacto, esse sim certo, e que conhecido de SEXA. deveria ser[1].
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É isso, mais depressa se apanha um “rigoroso” que um coxo!

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[1] - às 10.45 de 13.07.2005, o “barril de brent" para entrega em Agosto subia 22 cêntimos face ao fecho da véspera, para 59,04 dólares no mercado electrónico de Londres; em Nova Iorque, o barril de referência transaccionava-se a 60,65 dólares, em alta de 3 cêntimos em relação ao fecho da véspera.

1 comentário:

Sal e Pimenta disse...

Também concordo que há um grande abuso desse suposto rigor, que mais não é que show-off.

Parabéns pela chamada de atenção.

Mas também compete a quem lê e ouve o que se diz, interpretar, filtrar, decifrar, etc.

Só para testar a ideia de que primeiro se tende a falar e só depois a interpretar, há pouco tempo eu disse num grupo de amigos: "disse hoje no telejornal que amanhã a temperatura vai estar entre os -10º e os 40º positivos."
A pergunta imediata de um deles foi: "Onde?"