terça-feira, setembro 04, 2012

Desemprego - conceitos e números - 10

Esta série - agora como há um quarto de século a publicada no Diário com o título O Mistério da D. População Activa - tem uma intenção que é a de colocar a representação estatística do desemprego no seu lugar: de representação da realidade e não de realidade. Aliás, sempre que cada número é um desempregado, a realidade do desemprego ultrapassa em muito a sua representação!

Toda a representação do desemprego assenta no conceito estatístico de população activa e população activa enquanto realidade somos todos nós, todos os que, em idade e condições de ter actividade, temos o direito ao trabalho (e a obrigação de trabalhar), seja a estudar, nas forças de segurança, em representação democrática, em serviço doméstico, no chamado "circuito económico". 

E a confusão conceptual é grande, e pode haver muita manipulação.

Ao ler o Jornal de Negócios-online de hoje (http://www.jornaldenegocios.pt/home.php?template=SHOWNEWS_V2&id=576219), um artigo interessante A miragem do desemprego jovem (de Steven Hill), pode ilustrar essa confusão, quando a pretende esclarecer, dada a misturada de conceitos que o artigo arrola e que, também, o próprio autor adopta. Parte, por exemplo da afirmação de que "O problema decorre da forma como o desemprego é calculado: a taxa de desemprego dos adultos é calculada pela divisão do número de pessoas desempregadas por todas as pessoas que constituem a força laboral. Assim, se esta compreende 200 trabalhadores e 20 estão desempregados, a taxa de desemprego é de 10%". Parece simples... mas que é isso de "força laboral"?, e como se delimitam as "pessoas desempregadas", a partir de que conceitos (que os há restritos e latos)?

Segundo a metainformação do Instituto Nacional de Estatística, o conceito estatístico de população activa é o do "conjunto de indivíduos com idade mínima de 15 anos que, no período em referência, constituiam a mão de obra disponível para a produção de bens e serviços que entram no circuito económico (empregados e desempregados)" . O que, evidentemente, é mais que discutível, e é variável segundo a legislação e a definição de empregados e de desempregados.
Mão de obra disponível?, circuito económico

Muitos exemplos poderiam ser dados, mas limitamo-nos ao do chamado trabalho doméstico: um(a) indivíduo(a) que, por divisão doméstica do trabalho, se levanta às 7 da manhã (ou antes), prepara o pequeno almoço de uma família, leva crianças à creche e à escola, volta para casa e trata de tudo que tem a ver com a sua administração (orçamento, contabilidade, compras, manutenção, impostos), vai buscar as crianças onde as levou, prepara refeições, acompanha - como tarefa, por vezes..., partilhada - a educação e os "trabalhos para casa" dos filhos, etc., e soma, neste conjunto de actividades bem mais de 8 horas diárias, com sobrecarga nos dias de descanso (porque não há nem creche nem escola) é um(a) inactivo(a) porque não está disponível para... trabalhar no "circuito económico".
Ou, voltemos atrás, que é isso de "disponibilidade" e de "circuito económico"?
Grande debate se abriria e está em curso - há décadas - na Organização Internacional do Trabalho. Há que "pinçar"!  

Não se conclua - e assim se conclui esta série - que, com estas reflexões, com estes "pinçamentes", se desvaloriza a utilização dos números, das estatísticas, das representações. De modo nenhum! São indispensáveis. Há é que - como em tudo - ter muito cuidado em não substituir a realidade pelo que a deve tão-só representar.

2 comentários:

GR disse...

Na realidade são questões muito pertinentes. Hoje mais do que nunca o dito “trabalho doméstico” tão desvalorizado para uns e bem pago para outros, é (um avô/a, mãe/pai/tias) inactivo quando trabalha “gratuitamente como empregado doméstico, educadora de infância, serviço geriátrico, etc) na sua própria casa ou para a família. Porém, deixa de o ser se for contratado com remuneração salarial (na casa de outros), assim já é activo e entra no circuito económico !!!
Não coloco a questão emocional (de um familiar ficar com a criança ou o doente idoso) mas…
Aos ditos “não activos” não chamarei trabalho escravo (por vezes até é), mas, actualmente esse trabalho não é entregue aos ditos “activos” por falta de dinheiro, não tendo como pagar a devida remuneração, então quem a faz gratuitamente faz trabalho escravo/gratuito, sem horário e muitas vezes doente?
Coloco aqui o/a trabalhadora que fazendo trabalho doméstico fica desempregada, para fazer esse mesmo trabalho gratuito ou seja, o circuito económico cessa, mas a actividade continua.
(penso que ninguém compreendeu o que eu queria dizer com esta minhas palavras, confusas)

Bjs,
GR

Graciete Rietsch disse...

Para mim trabalho doméstico corresponde a um emprego e por isso os direitos respepetivos deverão ser os de qualquer outro trabalhador. Eu assim faço.
Mas quando é executado por uma mãe ou avó sem apoios, muitas vezes com empregos no exterior, a isso eu chamo também exploração,porque o trabalho doméstico é duro.

Um beijo