O convite, já aqui referido, para colaborar com uma turma de escola cá do sítio, teve consequências.
Para falar, documentadamente, de honestidade, lembrei-me de usar um dos livros a que dedico maior afeição. Que são muitos. Mas este...
Trata-se de Arte de Furtar, da autoria do Padre António Vieira (o que é muito discutido... mas não vou por aí), primeira edição de 1652.
Arte de furtar, espelho de enganos, teatro de verdades, mostrador de horas minguadas, gazua geral, é oferecido a D. João IV e parece ter incomodado bastante o Santo Ofício. É natural.
Serviu-me para falar de honestidade, aproveitando um trecho da apresentação (não assinada) da edição que tenho (da Estúdios Cor).
«"Ora a "Arte" é um panfleto, uma sátira, um protesto. Aponta os que se vendem por pouco e desmascara aqueles que exigem muito no negócio. Se um mendigo finge uma chaga para comover o passante e abrir-lhe a bolsa com a gazua da piedade - logo a "Arte de Furtar" lhe dá um lugar no catálogo. Mas também lá estão os largos espaços necessários à grande burla, à venalidade do alto funcionalismo, à viciação dos despachos ou dos processos judiciais...»
Dá-me muito prazer folhear esta edição. Um "objecto" da maior qualidade, com ilustrações de João Abel Manta.
São 70 (LXX) capítulos e uma conclusão (por exemplo, o capítulo XL é aquele em que Responde-se aos que chamam visco ao fisco), e é uma escrita denunciante e encantatória. Nalguns trechos de uma chocante actualidade!
Ofereci-o a meu pai, nos seus 80 anos, há 34 anos, com uma dedicatória em que sublinho a sua qualidade de "comerciante por errada vocação", por ter sido, intransigentemente, contrário ao que este livro tem por título.
Percebe-se, acho..., porque razão este convite - e a resposta que lhe dei - mexeu tanto comigo. Se com ele comecei o dia, preencheu-o e com ele acabo.
2 comentários:
Objecto muito belo, conteúdo mais do que actual!E discutir o conceito de honestidade é sempre importantíssimo. É-o mesmo se a discussão é apenas dentro de nós, muito maior se for com jovens.
Até logo:-))))
O nosso tempo dá bem pra pôr à prova a arte de furtar e discutir a honestidade,que julgo ser o objetivo deste livro que eu não li,infelizmente, mas que conheço.
Um beijo.
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