quinta-feira, abril 23, 2020

Descarrila-mentes e dis-la-tes - 4 - Plano Marshall-II


Tinha a intenção de, neste apeadeiro, já ter “despachado” o Plano Marshall com apenas um descarrila-mentes, mas o tema é muito importante para o momento e daria para desastre bem maior. Vou tentar não abusar.

Foi-me observado, como dúvida séria que é levantada, se o tal Plano Marshall não merecera desconfiança de Salazar, que a ele no início não aderira. Essa poderá ter sido – e decerto foi – uma “informação veiculada”, dentro dos carris habituais e valorizando a cautela e o patriotismo do dit(ad)o(r).
Ora há outra informação a carrilar:
O Plano Marshall era destinado aos países da Europa (do BENELUX, França e Itália à cabeça) com dificuldades de recuperação (o tal ERP-European Recovery Program1948), não para lhes resolver as dificuldades, mas para controlar essa recuperação e, sobretudo, para evitar que caíssem na crescente atracção por caminhos em que a União Soviética pudesse ser referência e apoio (até foi dito que era para evitar que “o Exército Vermelho viesse fazer pic-nics nos Champs-Elysées”…), como a força das organizações de classe políticas e sindicais, isto é, a correlação de forças poderia fazer temer.
Portugal e a Espanha não estavam dentro dessas prioritárias preocupações da Administração dos Estados Unidos e do seu capital dominante investido em armas (ao lado do tal Plano, a NATO, para a qual Salazar não hesitou nada). Além disso, havia a posição no começo da guerra ser pró-nazi.
A Espanha ficou mesmo de fora do Plano Marsall, e Portugal entrou como “beneficiário” retardado, não por esperteza ou argúcia de Salazar mas por manholice para se integrar nos “países de democracia ocidental”, de onde a postura inicial na guerra o retirara… Por outro lado (se é que o é), a manobra diplomática de recuperar Timor da ocupação japonesa como “província ultramarina”, e lhe evitar sorte idêntica à de Guam, foi à custa (bem custosa) de facilidades na criação da base dos E.U.A. nas Lajes dos Açores (acordo de 1945), de importância estratégica.

Mas hoje, 23 de Abril de 2020, importa referir que as lembranças do Plano Marshall resultam da situação na União Europeia em crise profunda para que se procura solução ou remendo. Um Plano Marshall europeu para a Europa (seja isto o que for)? Que enorme descarrila-mentes.
Como não lembrar que, quando do Acto Único, que derivou do alargamento dos 9-10 (já com a Grécia) a 12 (Portugal + Espanha), sendo presidente da Comissão um sindicalista, Jacques Delors, se delineou uma coisa chamada coesão económica e social, a partir da necessidade de projectar, ao lado do mercado interno, com as previstas e inevitáveis assimetrias, transferências (não empréstimos!) dos países mais favorecidos para os menos favorecidos (que eram 4 - Portugal, Espanha, Grécia e Irlanda, os “da coesão”), o que levaria à criação de um Fundo de Coesão.

Que é dele?... descarrilou num Fundo Recuperação via para um orçamento “europeu” (em)prestamista.

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