quarta-feira, agosto 22, 2012

Um conto (quase) de vigário


uma "espécie de crónica" 
tirada de uma "espécie de diário":

(...)
Ao começo da tarde, tocou o telefone, atendi-o ou, com mais precisão, atendi-a, à voz feminina que, do outro lado dos fios (foi o telefone fixo!) me perguntou se era eu tal como estou nomeado na lista telefónica, com Ferreira e tudo.

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Preparava-me para a habitual (e simpática… coitados/as) “corrida em osso”, quando lá de cima, do outro telefone, a Zé se meteu na conversa a dois, pelo que passou a ser conversa a três.

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Então que era?

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Uma coisa muito bem armadilhada, após um introito que nos prendeu, com respostas satisfatórias a perguntas pertinentes.

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Uma “voluntária”, ao serviço de uma instituição (do Estado?... pois, pois…) propunha-nos um rastreio de prevenção de AVCs (do Ministério da Saúde?... sim, sim…) que iria ser feito em Ourém.

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Vencido o primeiro embate, a “voluntária”, cheia de voluntariedade, encantada por estar a falar com pessoas tão diferentes do habitual (economista e filóloga…filóloga?... não conhecia o curso… também não se pode saber tudo, não é verdade?…, cada um com a sua especialidade), viu-se mesmo (ou ouviu-se mesmo) com pena de deixar a “conversa à trois”, passou-nos à colega encarregada das marcações.

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Esta, a das marcações, tomou notas, notou-se que estava a consultar a lista das marcações, e propôs-nos 19 horas, a Zé contrapropôs 7 e meia, aceite com ligeira relutância e o pedido de pontualidade pois o rastreio terminaria às 20 horas, chegando ao ponto de nos pedir que estivéssemos um pouco mais cedo. 

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Indicou-nos o local, e recomendou que não tomássemos café ou fizéssemos outras coisas que (deduzimos…) alterassem o estado com que nos apresentaríamos ao rastreio de prevenção de AVCs.

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Perguntaram, inclusive, se tínhamos médico de família e o nome dele.

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Na nossa boa fé, tão bem manipulada, adiámos coisas mais ou menos in(d)iciadas para a tarde, não tomámos o café que nunca tomamos nem o chá que tomamos sempre, organizamo-nos para estar às 7 e pouco na “Casa da Banda”, depois de meter gasolina no carro da Zé (já ao novo preço… antes que aumente amanhã), de fazer umas pequenas compras.

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E estávamos.

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Alguma afluência, caras conhecidas, ou que me conheciam (“olá, sôtor… também veio… é preciso aproveitar tudo, não é?... como isto está!...”)

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Informámo-nos, junto de uma recepcionista, do andamento dos trabalhos “lá dentro” e fomos dar uma volta “de fazer horas” pelas cercanias, aproveitando para fazer coisas que tinham de ser feitas.

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Às sete e vinte e muitos minutos, alí estávamos nós, preparados para o rastreio de prevenção dos nossos eventuais ou previsíveis AVCs.

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Eu sentei-me cá fora a ler o Pennac, a Zé lamentou a falta do livro e, também por isso, ao passarem uns minutos das tais 7 e ½ dirigiu-se à menina recepcionista perguntando pela pontualidade e teve logo resposta pronta, nem sabemos se passando por cima de alguns expectantes com marcação anterior à nossa. 

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Entrámos no salão de ensaios e espectáculos da Banda e deparámo-nos com umas seis ou sete mesas com alguém “da casa” (não da Banda-dona-de-casa mas dos concessionados do espaço) a receber os… “fregueses”.

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Que é o que nós éramos, embora só o descobríssemos tarde… por excesso de boa fé..

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Um jovem, cheio de simpatia, algo untuosa, identificou-nos (com um sorriso surpreso e cúmplice quando, à pergunta casados?, respondemos unidos de facto!) e começou a a apresentar-se.

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Mas só começou… porque logo que disse que representava uma empresa privada que estava a fazer um estudo, o interrompemos e dissemos não ser essa a informação que ali nos levara.

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O jovem tartamudeou com deficiência de informação da "telemark" (que trabalharia para várias empresas, e etc. e tal) e procurou avançar dizendo que nos iria medir a tensão arterial, mediria a massa corporal (aquilo que as máquinas nas farmácias fazem por 50 centimos) e que… mas não quisemos ouvir mais.

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Apenas dissemos ter sido enganados, e que não estávamos interessados em mais nada dali.

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Quando regressávamos a casa, irritados, eu ia com aquele pesar de quem só se lembra do que deveria ter feito depois de ter perdido a oportunidade de o fazer.

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Deveria ter pedido o livro de reclamações e despejado ali a irritação que trazia para casa por ter caído naquele conto do vigário, que não teve consequências materiais salvo as de tempo perdido e programas alterados.

não há respeito algum pelos outros,
vale tudo,
isto é, apenas, um pequeno (quase inocente) exemplo
... de empreendedorismo

1 comentário:

Graciete Rietsch disse...

Eu também já fui contactada para um conto do vigário idêntico, mas como já conhecia a história vinda de uma vítima, não cheguei a cair.
Sorte a minha, porque para irritar basta o conto do vigário que é esta política.

Um beijo.