* porque é que o governo não responde a perguntas, como as do deputado Bruno Dias, de 7 de Julho (!), sobre e-escolinhas e essas coisas de fundações, e se vitimiza com as consequências do que faz, e de não esclarecer o que fez a quem tem a obrigação de esclarecer.
Aqui estão as 10-perguntas-10 devidamente fundamentadas, de 7 de Julho, isto é, de há 5 meses:
Pergunta 3.031 - 4ª.
«Assunto: Financiamento oculto no "e-escolas" e "e-escolinhas": Fundação para as Comunicações Móveis e Fundo Sociedade da Informação.
Destinatário: Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações
Exmo. Sr. Presidente da Assembleia da República
«Desde há anos que o PCP vem insistindo junto do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicações na exigência de informação concreta e transparente sobre o financiamento do projecto "e-iniciativas".
Esta operação, com que o Governo se tem desdobrado por todo o país em acções de propaganda e de "entrega de computadores portáteis", permanece até hoje sem qualquer prestação de contas relativamente à sua gestão financeira e execução orçamental.
Já em 2007, questionado pelo PCP na Comissão Parlamentar sobre esta matéria, e sobre os montantes envolvidos nesta operação, o Ministro Mário Lino afirmou taxativamente que não estariam em causa dinheiros públicos e que todo o financiamento assentaria em verbas de empresas privadas, em resultado de contrapartidas do concurso de atribuição de licenças UMTS (comunicações móveis de 3ª. geração).
Perante a insistência do PCP, o Ministro adiantou que a verba envolvida corresponderia a cerca de 400 milhões de euros. Esta informação voltou aliás a ser retomada no "Esclarecimento" conjunto, emitido a 01-07-2009 pelo MOPTC e pelas três empresas de telecomunicações envolvidas nesta operação (TMN, Vodafone e Optimus), onde se pode ler que «os operadores acordaram em comprometer, na execução deste Programa [e-escola], contrapartidas num montante equivalente a cerca de 390 milhões de euros»,
Todavia, a verdade é que nesse mesmo ano, com o Despacho n.2 18188/2007 de 16 de Agosto, emitido pelos Ministros das Finanças, da Economia e das Obras Públicas, o Governo refere a criação do "Fundo para a Sociedade da Informação", na sequência de um protocolo assinado entre o MOPTC, a TMN, a Vodafone e a Optimus, com um capital de 24.939.894,85 euros, «resultado das contribuições financeiras, em partes iguais de cada um dos referidos operadores móveis».
Nesse mesmo Despacho, o Governo declara: «consideram-se cumpridas e, consequentemente, extintas as obrigações da TMN, da Vodafone e da Optimus relativas à contribuição em termos proporcionais para os projectos necessários ao desenvolvimento da sociedade da informação». Note-se: tinham sido pagos menos de 25 milhões de euros.
Entretanto, já o Governo havia constituído, através do Despacho n.Q15475/2007 de 18 de Julho, a entidade gestora do Fundo para a Sociedade da Informação, na directa dependência do Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, nomeando para seu coordenador, com estatuto remuneratório equiparado a director-geral, Mário Franco, antigo Presidente da "Fundação para a Divulgação das Tecnologias de Informação" (na dependência do Instituto Português da Juventude e do Instituto do Emprego e Formação Profissional). Posteriormente seriam nomeados para adjuntos dois quadros superiores do ICP-ANACOM.
Este "Fundo para a Sociedade da Informação" surgia indicado no portal do MOPTC com endereço na Av. Defensores de Chaves, n.Q41, 4.Q Dto., apresentando-se como «um fundo aberto com a natureza de património autónomo, sem personalidade jurídica, constituído pelas contribuições daqueles operadores». Isto, já em 2007.
No entanto, o mesmo Despacho (n.Q15475/2007) atribuía à entidade gestora a «missão» de «praticar todos os actos e operações necessários ou convenientes à boa administração do Fundo para a Sociedade de Informação (FSI),de acordo com as prioridades definidas pelo Governo, bem como preparar o necessário enquadramento jurídico e financeiro à transformação do FSI num fundo susceptível de serfinanciado também por capitais públicos».
O que isto significa é que desde o início, e antes mesmo de existir a Fundação para as Comunicações Móveis, o Governo definiu orientações para uma base de financiamento da operação "e-iniciativas" (projectos "e-escolas", "e-escolinhas" e "e-oportunidades"), com recurso a dinheiros privados mas também públicos. E nunca forneceu a mínima informação ao Parlamento sobre a gestão desses recursos.
Já em 2008, surge a Fundação para as Comunicações Móveis, instituída pela Sonaecom, Vodafone Portuga'l e TMNem 11-09-2008, de acordo com a informação agora divulgada pelo Governo, que afirma aliás que «o Estado Português é responsável pela gestão da Fundação, designando, através do Conselho Geral, a totalidade dos membros do Conselho de Administração, disponibilizando instalações para o seu funcionamento e atribuindo verbas para cumprimento das obrigações de acção social assumidas pelo Estado no Programa e-escola».
Mesmo depois de esta Fundação ter sido constituída, nenhum diploma foi publicado em relação ao Fundo para a Sociedade da Informação, cuja situação, missão e administração permanecem inalteradas, apesar da aparente sobreposição de funções. Até hoje, não se encontra registo no Diário da República de qualquer exoneração relativamente aos cargos nomeados. Entretanto, em entrevista ao Diário de Notícias de 02-07-2009, o coordenador da entidade gestora do Fundo para a Sociedade da Informação Mário Franco apresenta-se desta vez como Presidente da Fundação para as Comunicações Móveis, afirmando ser o «o único executivo remunerado» nessa Fundação.
Nos últimos meses, o Governo já atribuiu a título oficial um montante de 36.529.466,00 euros à Fundação para as Comunicações Móveis, verba que resulta (e que corresponde à maior fatia) dos resultados líquidos do ICP-ANACOMnos últimos dois anos. Essas transferências constam, respectivamente, da Portaria n.2 1415/2008 de 5 de Dezembro e da Portaria n.2 423/2009 de 22 de Abril.Só estes montantes já ultrapassam o montante pago pelas empresas de telecomunicações (25M€) que levou o Governo a declarar «cumpridas e, consequentemente, extintas as obrigações da TMN,da Vodafone e da Optimus» relativamente às licenças UMTS.
Apesar do reconhecimento expresso no citado "esclarecimento" do MOPTC e das três empresas privadas sobre estes programas, de que «compete ao Estado a monitorização e fiscalização da sua aplicação», continuamos até hoje sem nenhuma informação concreta e rigorosa da parte do Governo quanto aos dinheiros públicos - e às contra partidas dos dinheiros privados - envolvidos nesta que é a maior operação de propaganda de que há memória de um Governo neste sector, mas também um negócio cujas proporções apenas são comparáveis à falta de transparência com que se processa.
Está em causa, segundo o Governo a «entrega de um milhão de computadores portáteis». Isto representa muitas centenas de milhões de euros em bens e serviços transaccionados, centenas de milhares (ou mesmo um milhão) de contratos de fidelização de clientes para empresas de telecomunicações, em fornecimento de "Internet de banda larga móvel". E a única verba conhecida em todo este processo, por ter sido publicada em Diário da República, corresponde aos 24.939.894,85 euros, «resultado das contribuições financeiras, em partes iguais de cada um dos referidos operadores móveis»; e aos 36.529.466,00 euros dos resultados líquidos do ICP-ANACOM.
Mais grave ainda, o Governo e as operadoras anunciaram no seu "esclarecimento" conjunto que a Fundação para as Comunicações Móveis procedeu «até ao momento, ao pagamento à SONAECOM de € 11.650.638,62, à TMN de € 25.325.319,31 e à VODAFONE de € 10.825.319,31, de acordo com a informação validada por cada Operador, tendo estes valores sido utilizados na íntegra para cobrir, ainda que muito parcialmente, os custos incorridos pelos Operadores com a execução do programa». Ou seja: uma Fundação instituída por empresas privadas, em que o Estado assume (explicitamente) a responsabilidade pelo financiamento, transfere verbas para as empresas que a criaram, para compensar o custo de iniciativas que estas se comprometeram a garantir!
Perante estes factos, estamos claramente perante uma situação de promiscuidade envolvendo dinheiros públicos, interesses privados e propaganda governamental, que assume proporções verdadeiramente inaceitáveis e que exige que de uma vez por todas sejam dadas explicações ao País e desde logo à Assembleia da República.
Assim, ao abrigo do disposto na alínea d) do Artigo 156.2 da Constituição da República Portuguesa e em aplicação da alínea d), do n.2 1 do artigo 4.2 do Regimento da Assembleia da República, pergunto ao Governo, através do Ministério das Obras Públicas, Transportes e Comunicacões o seguinte:
1. Como explica o Governo que uma operação com a dimensão e as implicações económicas e comerciais do "e-iniciativas" se concretize com esta falta de transparência, sem que quaisquer informações tenham sido prestadas ao Parlamento?
2. Como explica o Governo que tenham sido declaradas como «cumpridas e, consequentemente, extintas as obrigações da TMN, da Vodafone e da Optimus relativas à contribuição em termos proporcionais para os projectos necessários ao desenvolvimento da sociedade da informação», após o pagamento de menos de 25 milhões de euros por estas empresas?
3. Como explica o Governo que, as citadas empresas tenham recebido (no mínimo) uma verba superior a 47,8 milhões de euros da Fundação para a Sociedade da Informação, a título de compensação pelas mesmas acções que às empresas compete desenvolver, como contrapartida do processo das licenças UMTS?
4. Como explica o Governo que, desde Setembro passado, toda esta operação governamental funcione a partir de uma Fundação privada, instituída por três empresas e relativamente à qual o Governo disponibiliza instalações e verbas - sem que nenhuma informação concreta seja sobre isso disponibilizada?
5. Como explica o Governo que se mantenham em paralelo, com as mesmas missões (e aparentemente, com a mesma morada e as mesmas instalações) a Fundação para as Comunicações Móveis e o Fundo para a Sociedade da Informação?
6. Confirma-se ou não que permanece em funções a administração da "entidade gestora do Fundo para a Sociedade da Informação", tendo o seu coordenador um estatuto remuneratório equiparado a director-geral?
7. Em caso afirmativo, esse estatuto é acumulado com o de Presidente da Fundação para a Comunicações Móveis?
8. Como explica o Governo que esta situação se verifique, quando o Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações afirmou por mais que uma vez na Comissão Parlamentar que não estariam envolvidos dinheiros públicos nesta operação?
9. Para além dos mais de 36,S milhões de euros acima referidos, que outras verbas foram atribuídas à Fundação para as Comunicações Móveis por parte do Governo? .
10. Quando vai o Governo finalmente apresentar à Assembleia da República os documentos de demonstração de resultados desta operação, que esclareçam de forma concreta e rigorosa quais as suas fontes de financiamento e em que termos se tem efectuado a sua gestão e execução orçamental?»
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São perguntas datadas de 6 de Julho, com entrada carimbada a 7 de Julho, no cumprimento do dever de um dputado, cujo é o de fiscalizar a actuação do governo.
Para mim, a meu critério, isto é um escândalo. Ou melhor, são dois: é um escândalo o que está relatado a anteceder as perguntas do deputado, e é um escândalo que o Governo se permita não responder.
O que está acima não se trata nem de quebrar "segredos de justiça", nem de "escutas" invias, nem de quejandas malfeitorias com intenções conspiratórias. Está acessível a quem quiser informar-se (como foi, hoje, o meu caso), antes de abrir a boca... até porque pode haver moscas pelas vizinhanças.
3 comentários:
Dito com pormenores aquilo que há já muito se desconfia também nas escolas.
A minha dúvida é a seguinte: mesmo que fique claro como água que houve abusos repetidos e constantes dos governantes, mesmo que se PROVE, há alguma consequência? Alguém vai preso? Julgo que não. E com a maneira tradicional de votar do português, também não é em eleições que serão penalizados.
Não sei porquê, mas lembra-me Catilina... Haverá hoje em dia algum Cícero que mande Catilina para o exílio?
... pormenores e em euros!
Um abraço
Já agora, e é pena só hoje ter vindo «passear» por aqui, o GP do PCP voltou a questionar o Governo na semana passada àcerca deste assunto. É que surgiram dados novos... O Relatório e Contas da Fundação para as Comunicações Móveis (FPCM), que pode ser consultado no site da dita cuja (www.fpcm.pt), não apresenta um «cêntimo» de despesas e de receitas (custos dos serviços prestados e vendas ou prestações de serviços - desculpem a falta de rigor de acordo com o SNC) da actividade principal da respectiva instituição. De acordo com o mesmo, e com o aval do ROC (que até poderá ser legal(?)), os montantes recebidos do Estado e das Famílias e entregue às operadoras (Grupos Económicos) não provocam alterações patrimoniais na Fundação, pelo que não devem ser registados como proveitos nem custos. Pasme-se o zé povinho com tal conclusão!
Os dinheiros são públicos, entregues directa ou indirectamente a empresas operadoras de comunicações móveis, mas o veículo financeiro de tal transferência escusa-se a prestar contas públicas...
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