terça-feira, dezembro 15, 2009

Notas cariocas - 4

  • Em cada ano, por esta altura.
Em cada ano, por esta altura, andamos por terras, conhecemos gentes. Somos humanos ao encontro de humanos. Tão diferentes de nós. Tão outros-iguais-a-nós.
O ano passado foi no Vietnam - a viagem! -, há dois anos em Moçambique, há quatro anos em S. Tomé e Príncipe. Há três anos foi no Zambujal ... regressado de Coimbra.
Este ano está a ser aqui, à volta do Rio, neste Brasil imenso. Imenso hoje, maior amanhã.
Há pouco, num "onibus", no meio de gente, uma jovem aí dos seus doze anos ofereceu-me o lugar enquanto a mãe, que ia sentada ao lado, a fazia saltar para os seus joelhos. Agradeci e cedi a oferta à Z.
Logo, no autocarro cheio, uma outra jovem, esta já bem mais espigadota, me fez sinal a ceder-me o lugar onde ia sentada. E insistiu, apesar da minha estranheza e recusa.
Ao sair do autocarro, agradeci com o melhor dos meus sorrisos, escondendo o incómodo (e, talvez, a irritação...) de tão velho me terem feito sentir.
Isto de barbas brancas em época natalícia!
  • Ao longo das estradas, uma invasão se repete.
Ao longo das estradas, uma invasão se repete. A mesma. Em S. Tomé, em Moçambique, no Vietnam, aqui, entre o Rio e Parati. Em cada povoação, em cada pequeno aglomerado populacional, a(s) igreja(s).
É - para mim, claro - assustador. Igreja(s) com os mais variados nomes. Alguns repetindo-se. Estando na Ásia, em África, nesta América do Sul. Com uma força por vezes opressiva, insultuosa. No meio de habitação degradada, de barracas e barracos, onde evidentemente falta o indispensável para um viver digno do corpo, abundam os curandeiros das almas, os anunciadores da vida eterna. Uma vida outra, de certeza melhor que esta. Que deve ser vivida com resignação, para que a outra seja o reino dos simples. Não o da liberdade.
Enquanto, ao lado, os condomínios, os "resorts" para turistas gozando de reformas chorudas, as ilhas de alguns que presos deveriam estar. Este reino da necessidade... para os outros.
  • Leio: "Como é que podemos ser felizes sem a curiosidade, sem perguntas, dúvidas e argumentos? Sem o prazer de pensar?". É nesta página que vou. E "traduzo": como é que podemos ser humanos sem humanos sermos, e sem lutar por um mundo diferente, humano?
Espreito o final do discurso de que tirei aquela frase que agora estava a ler, e antecipo a sua leitura: "Que ninguém me obrigue a escolher."
Será esse o problema do autor-personagem ou do personagem-autor. Não é o meu! Escolhi. Tomei partido. Sem a arrogância de afirmar certezas, entre elas a de que escolhi bem, muito menos a de que era a escolha única.

6 comentários:

Pata Negra disse...

Um homem quando viaja deixa sempre um pouco de si pelo caminho mas traz também um pouco (já devo ter ouvido isto das letras de algum poeta!). Espero que não deixes por aí nada que nos faça falta e que tragas testemunhos que nos enriqueçam - espero não, tenho a certeza!
Já agora coloca uma fotografia numa das próximas "notas" para comprovar a tua viagem, não estejas tu no Zambujal e as "notas" não passem de mera ficção!
Um abraço e que Rias de Rio e de rir

samuel disse...

Grandes e belas notas de viagem! Assim vale a pena viajar...

Abraço(s).

Graciete Rietsch disse...

Querido camarada Sérgio segundo ARY "Tomar partido...é sabermos em alma e consciência que o nosso Partido é o melhor". E eu subscrevo sem arrogância mas com orgulho. Um abraço muito grande ,querido camarada, e obrigada pelo que me tens ensinado.

Maria disse...

E assim acompanhamos a tua viagem... tão de perto que quase me sinto por aí...

Beijos, também à Z.

Anónimo disse...

Vejo que se aventuraram nos ônibus locais, a partilhar da proximidade com o povo da Costa Verde... Quanto às diferenças sociais e à geração incessante de excluídos, cabe a indignação de quem vota na esperança e colhe muito mais o sucesso virtual do "nosso líder" Lula do que o real acesso que poderiam ter às melhores coisas da vida - neste caso, a dignidade, a saúde, a educação, a segurança ... os direitos humanos (ouro puro). Fica o país (quase que) desprovido da oposição (porque também virtual) tão necessária para estimular melhor governo. Os acordos se multiplicam e o Brasil parece viver atacado pelo perigoso vírus do Partido Único a iludir com "esmolas" um povo que, diante dos recursos que temos, poderia ter o ouro acima referido. A propósito, esta semana os impostos no país atingiram R$ 1 Trilhão - parte deles originados por dinheiro guardado em meias e cuecas.

Fernando Samuel disse...

Boa estadia.
Bom regresso.

Beijo e abraço.