terça-feira, junho 09, 2020

OS FACTOS (da 1ª semana de Junho) E A ARTE DE OS MANIPULAR - 5


OS FACTOS (desta semana) E A ARTE DE OS MANIPULAR - 5

Artefacto à
- Aparelho ou engenho construído 
para determinado fim.
(in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa)


Os factos (relevantes) nesta 1ª semana de Junho de 2020 são

·       o “esquecimento” do acórdão do Tribunal Constitucional Alemão;
·       a “sem-importância” do Conselho Europeu face à iniciativa franco-alemã;
·       a decisão da Comissão de dotar a recuperação com 750 mil milhões €;
·       a decisão do BCE de aumentar com mais 600 mil milhões € a dita recuperação;
·       a nomeação pelo 1º ministro português de um estratega hors-governo para a recuperação da economia portuguesa;
·       a apresentação, pelo presidente do PSD do plano para recuperação da economia portuguesa;
·       depois de Marshall, a ressus-citação de Keynes na ideologia da classe.

Comento, seguindo a ordem, mais ou menos arbitrária, dos factos relevantes porque
todos se interpenetram, com o meu ofício de cidadão-economista, isto é, a minha “arte” embora me falte engenho de tantos “artistas”, alguns que até engenheiros são (e de minas).

Tinha a intenção de terminar com este uma série de 5 posts com 7 capítulos (chame-lhe assim) em que me propus sinalizar e comentar factos que marcaram a 1ª semana de Junho de 2020, e podem servir para colocar uma espécie de tabuletas no entroncamento em que todos estamos, num mundo abalado por um surto epidémico (longe de terminar) que veio precipitar a crise económica do capitalismo que estava prevista.
O eclodir da epidemia no momento da conjuntura e no local onde se deu, configurou uma situação de enorme complexidade que não me canso de metaforizar como um vírus que veio da China cavalgar uma crise prevista.
Pela junção das duas circunstância (o vírus e a sua propagação não foi, para alguns círculos, tão inesperada como para o cidadão comum… e não faltaram tenteios para, a partir daí, se esboçarem interpretações e “teorias” conspirativas), a situação foi aproveitada, pelas forças dominantes, para procurarem concretizar aceleradamente transformações que lhes sirvam, e que só com lentidão e esperadas resistências poderiam implementar, contribuindo, com a manipulação da informação, para um sentimento generalizado de susto e medo que veio facilitar as transformações em curso.
Para uso pessoal, para conversa actualizada, e contributo para informação de visitantes e comentadores do blog – que ainda os há, escassos mas queridos – pareceu-me ser um momento de paragem e reflexão sobre factos relevantes e sua manipulação. Sem outras pretensões.
Terminaria com este 5º post, que estava esboçado para a abordagem de economista que não esquece que o é, e repor algumas questões em permanente necessidade de reposição. Acontece que me deixei apanhar por programa que há muito deixei de ouver, dito de prós e contras da RTP1, por trazer no guião temas que coincidiam com esta série.
Assim, abri um parênteses, ficando para amanhã a reflexão sobre a nada surpreendente ressus-citação de Keynes, que particularmente me convida a recordar e a retomar, como tem acontecido várias vezes.

Começo – e tentarei breve terminar – por dizer que apenas vi a primeira parte do programa, em que foram expostas as intervenções iniciais dos protagonistas – um membro do governo, um elemento da equipa do PSD, a actual presidente do “meu” ISEG, um professor de economia em universidade de Madrid, e um dirigente de uma entidade de marcas – porque o que ouvi chegou, isto é, foi suficiente para me pôr a teclar.
Confrontou-se em lume brando, e quase diria complementar, um “plano de estabilização económica e social (como quis frisar o membro do governo)” e um “plano de médio prazo” (que o representante do PSD apresentou como… não de muitos objectivos para agradar a todos mas como estratégico e… para algumas empresa e de médio prazo).
Ora, a esses dois documentos me referi como factos relevantes nesta série e pareceu-me necessário vir aqui acrescentar algo não escrito e suscitado pelo que ouvi.
Quer um quer outro documento centram-se nas empresas. O que é enfatizado pelo plano de estabilização de um governo naturalmente preocupado com o tecido empresarial português, de micro, pequenas e médias empresas em enormíssimas dificuldades, a que, como governo, tem de acorrer, para mais pressionado pela vertente social, diria à sua esquerda para usar terminologia corrente (ainda hoje, Jerónimo de de Sousa fez importante declaração, em vídeo, sobre Apoiar as MPME-Defender a Economia Nacional); o representante do PSD enfatizou também o seu plano de médio prazo como centralizado nas empresas, mais voltado para a selecção em claro favorecimento das empresas “competitivas”, na necessidade de não se desperdiçarem apoios, na criação de atractividade para o capital estrangeiro.
Levantei-me de onde estava sentado com uma incomodidade (e não era do assento) que me fez saltar para aqui. Por e para, mais uma vez, lembrar um plano de médio prazo a que estive ligado há mais de 40 anos. Mas não foi um plano preparado, em cima de respeitáveis mas apressados joelhos, sob pressão de e para manipulação. Foi uma equipa, com uma Secretária de Estado chamada Manuela Silva a tutelá-la, organizada pela OIT, com técnicos belgas, franceses, sueco, chileno, brasileiro, dois portugueses como contra-partes (um pelo Plano, outro pelo Emprego).
Demorou meses a elaborar, em trabalho intenso, com visitas ao interior do País. Foi o primeiro, e poderia ter sido pioneiro do Programa Mundal de Emprego, da OIT. O relatório, com o título Plano de Médio-Prazo 1977-80, Emprego e Necessidades Básicas, foi aprovado pelo Conselho de Ministros do 1º Governo Constitucional (por coincidência também do PS sem maioria absoluta…) mas que não o levou à Assembleia da República por ter dado prioridade a uma Lei-Barreto..
A OIT veio a publicar um volume – Employment and basic needs in Portugal –, com base no relatório e em que colaboraram alguns dos técnicos da missão a Portugal, entre os quais três portugueses, com prefácio de Manuela Silva, que se demitira do Governo antes dele cair. E depois se ter enveredado pela estratégia do FMI, centrada no apoio ao capital, à monetarização, ao endividamento.
Há episódios agri-doces (em doses desequilibradas!) que não se podem esquecer.

3 comentários:

Maria João Brito de Sousa disse...

Não vi o Prós e Contas desta semana mas, depois de lido o aqui li, vou tentar encontrá-lo no RTP play.

Abraço

Sérgio Ribeiro disse...

Bom Dia. Que bom saber que acompanha os meus "acompanhamentos" e comentários. Obrigado.
O prós e contras está bem colocado no ranking dos manipuladores. Saudações

Olinda disse...

Lembro-me de ler algo sobre esse trabalho conjunto sob a Conferência da OIT,acho que se chamava assim,num dos teus livros e da participação de vários sectores importantes para o desenvolvimento de Portugal.Uma Conferência com representantes dos trabalhadores. Longe vão os tempos em que existia democracia participativa.Bjo