terça-feira, junho 30, 2020

Com os dias/séculos contados...


Começar o dia com um mail destes, é pouco agradável... mas é bom porque acorda para a luta:
«Segundo o Relatório da Segurança Social relativo a Maio de 2020 verifica-se que o Covid-19 está a custar à Segurança Social até 31/05/2020 – 1.237,7 milhões de euros, sem contar com a diminuição da receita efectiva.
         O saldo global do subsetor da Segurança Social atingiu, em Maio (de 2019), o valor de 1.824,4 milhões de euros, superior ao registado no período homólogo (de 2018) em 336,4 milhões de euros.
·         O saldo global do subsetor da Segurança Social atingiu, em Maio (de 2020), o valor de 634,9 milhões de euros inferior ao registado no período homólogo (de 2019) em 1.189,5 milhões de euros.
Este resultado teve como base o facto de o aumento da receita efectiva, que se cifrou em 48,2 milhões de euros, ter sido inferior ao aumento da despesa efectiva, que foi de 1.237,7 milhões de euros. Como sempre e em todo o mundo capitalista em caso de crise são os Fundos dos Trabalhadores os primeiros a avançar. É na Segurança Social e nos Fundos de Pensões que compram os prejuízos derivados da baixa de cotações das empresas em bolsa.
Segundo o "Foicebook ...desde os primeiros alertas do Financial Times no início de 2019, 1,9 bilhão de euros desapareceram pura e simplesmente (porque nunca existiram) e 3,5 bilhões de reivindicações provavelmente farão o mesmo. Ninguém se orgulha de estar entre os perdedores, mas sabemos que os bancos franceses BNP Paribas, Crédit Mutuel, Société Générale e Crédit Agricole estão nas fileiras. Nesse sistema financeiro interconectado - diz-se que é sistémico a partir de agora - sempre há vencedores e perdedores, os primeiros se gabam disso, os outros ficam calados. 
Estes últimos foram vítimas notáveis de um desses acordos financeiros de que tanto gostam, aos bons cuidados do Credit Suisse. Após uma parceria com a Wirecard, o japonês SoftBank investiu 900 milhões de euros na empresa na forma de acções conversíveis, que agora não valem nada. Mas estes foram imediatamente vendidos, em particular aos fundos de pensão do BNP Paribas e do Crédit Mutuel, segundo o Wall Street Journal. Boas finanças e nada ilegal, mas parece furiosamente o jogo da batata quente, esse investimento ocorrido após o alerta ter sido dado! Quanto ao Crédit Agricole, ele participou de um pool bancário que abriu um crédito rotativo para o Wirecard de 1,75 bilhões de euros, segundo Agefi."
Nunca o sistema capitalista esteve tão próximo do seu fim e na enxurrada querem levar os trabalhadores à frente.»
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Talvez... sem comentários!
 mas ainda se dirá que,
como tudo que é perecível,
o capitalismo tem os dias contados

(ou os séculos, como diz Avelãs Nunes)


O PCP e o Orçamento Suplementar


PCP deixa aviso sobre OE Suplementar 

ao Governo: ou muda proposta ou 

pode ter “um problema sério”

Rodrigo Antunes / Lusa

O secretário-geral do PCP, Jerónimo de Sousa
Em causa está a manutenção da abstenção dos comunistas na generalidade, disse Jerónimo de Sousa no final de uma reunião do Comité Central do PCP.
Este domingo, o PCP avisou o Governo que ou aceita mudar a sua proposta de Orçamento Suplementar na especialidade ou pode ter “um sério problema”. Está em causa a manutenção da abstenção dos comunistas na generalidade.
Esta advertência em relação à proposta de Orçamento Suplementar para 2020, cuja votação final global está prevista para sexta-feira, na Assembleia da República, foi transmitida pelo secretário-geral do partido, Jerónimo de Sousa, em conferência de imprensa, no final de uma reunião do Comité Central do PCP.
“O PCP absteve-se na fase de generalidade da proposta de Orçamento Suplementar com a ideia de que na discussão na especialidade fosse possível encontrar manifestações de avanço, de garantia de direitos, de proibição de despedimentos e de medidas de proteção social para quem tudo perdeu. Verificamos que muitas destas matérias não estão lá na proposta [do Governo], o que leva a uma preocupação natural, justificou.

segunda-feira, junho 29, 2020

O que eu ando a ler...

O que eu ando a ler e me dá prazer 
(porque muito bem escrito - a meu gosto -,
porque diz coisas que quero ler e aprender  a dizer)
e por isso reproduzo 
(do Expresso-curto de hoje, de Germano Oliveira):


«O QUE EU ANDO A LER

Creio que o fim da adolescência é uma circunstância: não acontece aos 18 da maioridade legal ou aos 21 da licenciatura nem aos 30 dos empréstimos à habitação, não é certamente aos 40 das lipoaspirações e dos implantes de cabelo ou aos 50 dos despedimentos amigáveis nem aos 60 do temor de um tumor, há adolescentes licenciados endividados calvos gordos desempregados doentes com as idades todas, creio que a adolescência, a genuína adolescência, aquela além-envelhecimento e antientorpecimento, a que é determinada pela expectativa de tornarmos o nosso mundo um lugar transformado pelas nossas intervenções, essa adolescência tão vaidosa de esperança e desejosa de feitos só é desfeita pela introdução da morte, quando as infinitas ilusões juvenis se tornam repentinas desilusões adultas assim que atendemos o telefonema que anuncia a finitude das nossas pessoas:


- ele morreu
ou
- ela morreu



e depois silêncio, o rigoroso silêncio da dor, nenhum adolescente sabe manter o diálogo da morte, nem os envelhecidos tão-pouco, ficar subitamente crescido é ser vítima-sobrevivente da colisão de nos noticiarem a primeira morte da nossa intimidade de avós pais tios maridos mulheres cunhados sogros namorados irmãos amigos e demais prolongamentos de afinidade: a adolescência é ir passar o fim de semana a casa da mãe ou do pai ou de ambos se ainda estiverem juntos e trazer melancias para guardar no frigorífico e hambúrgueres no congelador, é almoçar um assado ao domingo à tarde enquanto a avó conta a história do baile em que o avô esse galã a seduziu em 1925, é chamar o cunhado que sabe mudar pneus quando temos um furo no Volkswagen, é fumar um cigarro com o sogro enquanto ele se intumesce com o tempo da tropa em que entrou num bar e acabaram todos à porrada (ele saiu-se bem claro que se saiu), é ouvir a adjetivação viçosa da sogra sobre os novos músculos do Ricardo Araújo Pereira, é receber uma chamada do irmão-muito-mais velho camionista a dizer que se sente sozinho na viagem para Itália porque lá caramba há tanto covid, é insistir com o namorado para não deixar a tampa da sanita levantada e ficarmos furiosos-enternecidos por ele nunca o fazer, é estar no Primavera Sound e aquela amiga que não conseguimos encontrar na multidão escrever “a vida vai acabar num instante. merecemos estar todos juntos!”, exclamação, merecemos sim, a adolescência é estar com gente gente gente, toda a nossa e tão querida gente, mas um dia o telefone toca e fica gente-1, é subtração irreparável, e depois fica-se com medo, tanto mas tanto tanto medo, todo o tanto e tão maldito tanto, do dia do segundo telefonema, gente-2, eles morrem-nos, meu Deus, mas os números deles continuam no nosso telemóvel, 91 qualquer coisa, o que se faz ao número de um morto?, digam-me o 5G do além e eu fundo uma operadora de telerressurreição, que frase adolescente, eu sei, mas apesar de adulto ainda me recordo das técnicas juvenis, é da saudade desse tempo, todo esse distante mas tão bem lotado tempo que acaba com um telefonema - e então não se perde a expectativa de tornarmos o nosso mundo um lugar transformado pelas nossas intervenções, o mundo é um lugar demasiado imperfeito para o abandonarmos aos seus defeitos, mas perde-se a inocência, essa fundamental condição adolescente, porque a cada feito notável da nossa vida lembramo-nos de quem faz falta, toda a aguda e tão insuperável falta, para celebrar connosco essas conquistas esporádicas, os adolescentes não têm tempo para emoções destas, estão demasiado ocupados da gente toda, não sabem como dói uma memória, é nisto que creio porque ficar adulto é isto que li:



“Um dia alguém morre apressadamente e as referências
estruturais da memória são elementos geométricos
e decorativos no interior das casas, impressos
nos fragmentos de luz. E o amor
cabe dentro da morte como punhados de terra
em mãos fechadas”,



está na “Autópsia” do José Rui Teixeira, poeta da minha terra, o Porto onde acabou a minha adolescência, foi lá que fiquei adulto que é sentir desta maneira:



“a morte dos outros é mais difícil do que a nossa, porque vivemos a morte deles e não viveremos a nossa. E porque a morte dos outros significa o desmantelamento do nosso passado, a inexistência do nosso passado, do qual deixa de haver prova indiscutível. Ficam imagens, objectos, detritos, coisas em gavetas que nada dirão aos vindouros. E os nossos mortos fazem-se não apenas pó mas nevoeiro, figuras extintas, indistintas, irrecuperáveis”,



é das “Imagens Imaginadas” do Pedro Mexia, ando a folhear, o Mexia é do Expresso que é o jornal da minha vida adulta, o meu gente-1 ia ter orgulho de eu publicar onde o Mexia escreve, é preciso lembrar o que os mortos sentem por nós, reparem no verbo: “sentem” terceira pessoa do plural do presente, não é amor passado mas amor presente, é amor até com data, gente-1 faria anos daqui a dias, parabéns:



“O passado de qualquer ser humano transforma-se num fantasma, mas temos de fazer um esforço e recordar, porque recordar engrandece-nos, eleva-nos para lá da vida e da morte, para lá da História, da política e da humilhação. Quem recorda e o faz com toda a profundidade devida transforma-se num deus”, é do Manuel Vilas e do seu “E, de repente, a alegria”, é o que ando a ler, o Manuel Vilas sofreu gente-1 e depois gente-2, pai e mãe, gosto muito do arranque do livro, é assim, todo este aparentemente adulto mas na verdade tão adolescente assim: “Tudo aquilo que amámos e perdemos, que amámos imensamente, que amámos sem saber que um dia nos seria roubado, tudo aquilo que, após a sua perda, não conseguiu destruir-nos — embora tenha insistido com forças sobrenaturais e procurado a nossa ruína com crueldade e afinco — acaba, mais tarde ou mais cedo, transformado em alegria”.(...)»


... e termina bem, desejando-me;

«(...) Tenha um bom dia.»

... e, quando procurava espaço para dizer... sei lá...talvez gostei, obrigado!,...  logo tropeço  nos anúncios, no "assine isto" e "leia aquilo", num fecho com "boa cama boa mesa".
Ora bolas para os desmancha-prazeres!

sábado, junho 27, 2020

Preparando a FESTA

... esperando (e desejando) que não haja condições que a tornem impossível:

No Público de hoje:




































... e não podia faltar o veneno. 
Insinuado ou explícito:
"... Resquícios da disciplina soviética 
na capacidade de organização do partido..."!!!

a organização do Partido é
de inspiração leninista
- disciplina e
 centralismo democrático!
(aprendam)

quinta-feira, junho 25, 2020

O velho e o novo


  • Gustavo Carneiro


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 - Edição Nº2430  -  25-6-2020

O velho e o novo

«A crise consiste precisamente no facto de que o velho está a morrer e o novo ainda não pode nascer. Nesse interregno, uma grande variedade de sintomas mórbidos aparece». A afirmação de Antonio Gramsci, proferida nas primeiras décadas do século XX, ganha hoje flagrante actualidade, à medida que se aprofunda a crise do capitalismo e, com ela, (res)surgem muitos destes sintomas.
Em 2019, 26 capitalistas concentravam uma riqueza equivalente à da metade mais pobre da população mundial, ou seja, 3,8 mil milhões de pessoas. Se a cada dois dias surgia um novo multimilionário, essa mesma metade perdia diariamente 500 milhões de dólares. No mesmo mundo em que alguns têm fortunas superiores à riqueza criada anualmente por países inteiros, 2,2 mil milhões de seres humanos continuam sem acesso a água potável.
Em 2018, estima a UNESCO, 20 milhões de crianças não foram vacinadas contra o sarampo, a difteria e o tétano. Já os gastos militares, não cessam de aumentar, atingindo máximos históricos: em 2020, os EUA destinaram para o sector a maior verba de sempre, superior a 738 mil milhões de dólares, perto de duas vezes e meia o PIB de Portugal e bem mais de 30% do total das despesas militares mundiais. É este o mesmo país que depois de abandonar a UNESCO fez recentemente o mesmo com a Organização Mundial de Saúde.
Nos últimos anos, mais de 16 mil pessoas, fugindo das guerras promovidas pelas potências ocidentais em África e no Médio Oriente, morreram no Mar Mediterrâneo quando tentavam entrar na Europa Fortaleza. Muitas outras (entre elas milhares de crianças) são mantidas em campos de refugiados sem condições ou entram em redes de tráfico humano, seja laboral ou sexual. Nesta mesma Europa, ressurgem os saudosistas de Hitler, Mussolini e Salazar, há partidos comunistas proibidos e quem reclame o confinamento especial para ciganos. Do outro lado do Atlântico, nos EUA ou no Brasil, o aumento da exploração é acompanhado da intensificação do racismo e da xenofobia, da repressão e do obscurantismo.
Ao contrário do que alguns ingenuamente (?) previram, tudo se agravou com a pandemia. Enquanto milhões de norte-americanos (e não só) caíam no desemprego, recorriam à ajuda alimentar e, aos milhares, morriam de COVID-19, um punhado de milionários via as suas riquezas aumentar em largas centenas de milhares de milhões de dólares... Também por cá, grandes empresas distribuem dividendos e recorrem a apoios públicos ao mesmo tempo que despedem, desregulam horários, cortam salários.
Vivemos tempos perigosos e exigentes. A história e a vida já mostraram quão mórbidos e dramáticos podem ser os sintomas de um capitalismo agonizante. A luta aí está, acesa, até que o novo se imponha.

                                                                             

quarta-feira, junho 24, 2020

Um veto (talvez) inesperado

DECLARAÇÃO DE JOÃO OLIVEIRA, MEMBRO DA COMISSÃO POLÍTICA DO COMITÉ CENTRAL DO PCP 

E DEPUTADO DO PCP À ASSEMBLEIA DA REPÚBLICA

O PCP discorda 

do veto do Presidente da República 

ao apoio a sócios-gerentes

O PCP discorda do veto do Presidente da República ao apoio a sócios-gerentes, pequenos e médios empresários, que foi aprovado pela Assembleia da República e iremos propor que a Assembleia confirme a lei com uma nova votação, relembrando que aquilo que está em causa é um apoio a quem faz descontos para a Segurança Social e que, portanto, deve ter essa contribuição reconhecida.
O PCP considera inaceitáveis os fundamentos apresentados pelo Presidente da República para este veto e também a ideia de que esse apoio só possa ser concretizado se o Governo estiver de acordo com essa alteração na discussão sobre o Orçamento Suplementar.
Relembramos que houve no passado situações em que a Assembleia da República aprovou leis de indemnização e de apoio, em situações diversas, sem que o Presidente da República tenha levantado os problemas que neste momento está a levantar, a propósito dos apoios aos pequenos e médios empresários.
Por outro lado, aceitar a ideia de que o Orçamento Suplementar só pode conter as medidas e propostas que o Governo aceitar, significa anular a capacidade e competências próprias da Assembleia da República em matéria orçamental e a possibilidade de se discutirem propostas que dêem resposta aos problemas do país.

segunda-feira, junho 22, 2020

Foi mesmo quase por acaso...


    QUASE POR ACASO
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Não!, não vou escrever sobre a vandalização da estátua de António Vieira. Não vou galopar nessa correria sem jeito nem destino com que nos querem distrair daquilo a que deveríamos estar atentos.
Mas custa ver lembrado esse nome pelos motivos pelos quais foi. E dos quais nem uma palavra direi. Não por exaltada indignação, que nem é caso para isso. Mas para não entrar em jogos com que alguns nos querem entreter.
Ora, já que lembrado foi o nome, direi dele uma coisa que me recordou, para além daquelas que a escola pública e universal teria a obrigação de ensinar e que, se calhar, só foi que o dito António Vieira era padre. E tão padre foi que lhe ficou o ministério agarrado como primeiro nome.
Do que me lembrei foi que, há 42 anos por Janeiro, fazia o meu pai 80 anos, a que tanto se esforçara por chegar, tão agarrado à vida que era.
Queria eu, seu filho único, dar-lhe uma prenda que não fosse uma gravata, um par de meias ou um lenço, que muitas dessas iria receber, indiferente e agradecido, mas algo que mais tivesse a ver com ele, com a sua vida. Comprei-lhe um livro. Bonito, bem ilustrado (João Abel Manta!), encadernado, que até só como objecto, pensei, lhe iria agradar, a ele que vivera muito da sua vida activa em tipografias, encadernações, papeis, cartolinas e congéneres.
Mas não só isso. Também a minha dedicatória, o título e o autor.
A minha dedicatória foi
Para começares a aprender o que nunca soubeste fazer, comerciante por errada vocação. No festejo do 80º aniversário com um beijo do
Perceber-se-á a estranha dedicatória pelo título do livro
ARTE DE FURTAR
e porque foi a homenagem de um filho a um pai, que, às vezes, como que se desculpava de não ter enriquecido por nunca ter sabido roubar… isto sem qualquer conotação entre a vida de comerciante e a arte de roubar…
O nome do autor não aparece onde é costume, e a apresentação diz que, em edições ao longo dos séculos (o manuscrito é do século xvii) teve vários nomes no frontispício, a começar pelo do Padre António Vieira, João Pinto Ribeiro, Tomé Pinheiro da Veiga, Duarte Ribeiro de Macedo, António da Silva e Sousa, Padre Manuel da Costa, D. Francisco Manuel de Melo…
De qualquer modo, esta obra “… veio a lume pela primeira vez, em 1652, pela mão roubada do Padre António Vieira…”. E lê-se mais adiante da apresentação “Acreditamos que uma «Arte de Furtar» escrita hoje alargaria consideravelmente os horizontes deste jardim zoológico da trapaça, do logro e do embuste por onde o Autor nos leva a passear.”
E é tudo. Salvo ler, conhecer, aprender, falar do que se sabe, sabendo que é pouco.

Ler e pensar 2 vezes - 2

A opinião de Luis Reis Torgal que acabo de publicar aqui, pediu-me o título que está acima.
Ler e pensar. 2 vezes. Ou mais. Pensar, como aprender, sempre.
Sobre este tema de que Luís Torgal dá opinião, já muito pensara antes. E não só agora, em que a luta anti-racial foi acicatada (e aproveitada) pelo hediondo assassinato de um afro-americano (há euro-africanos, ásio-americanos, euro-americanos, euro-asiáticos, afro-asiáticos... todas as combinações miscigenadoras possíveis, e em duplicado porque são todas com vice-versa... porquê me parece que só se usa a de afro-americano?, porque o tráfico esclavagista mais preponderante historicamente foi de África para as Américas?...).
Ao pensar 2ª vez, o que acrescentaria, à excelente e exigente reflexão de Torgal, é que, neste caso, neste mundo de (des)informação e falsos combates, isto está tudo ligado. 
Quer dizer: não há (des)informação, ou informação excessiva, pandémica, por acaso, ela existe e bem orquestrada para promover falsos combates, desviando as gentes, o povo, dos combates a fazer, daqueles que ajudarão a mudar o mundo, a fazê-lo menos deshumano (porque não mais humano?!).

Ler e pensar 2 vezes - 1

No Público de hoje:


OPINIÃO
Luís Reis Torgal
Este mundo da (des)informação
e dos falsos combates! 
História e memória
22 de Junho de 2020

Não sei se por cá há mais ou menos racismo do que noutros países, mas o que importa é contribuir de forma autêntica, e não através de falsos combates, para que ele desapareça, em todas as formas que subsiste. E são muitas, com certeza.

Em 1989 escrevi um livro intitulado História e Ideologia, com base em textos que havia publicado ao longo de vários anos. Tentei mostrar que uma coisa é a História como ciência, que procura objectivamente interpretar de todos os ângulos e com todas as fontes possíveis o que se passou e vai passando, e outra a Memória que vai surgindo, mais ou menos espontaneamente ou em função de ideologias organizadas, e cuja “legitimidade histórica” (para empregar uma expressão de Marc Ferro) vai variando à medida que se altera a visão do mundo. Daí mudarem as interpretações dos factos ou os nomes das ruas, de praças, pontes ou instituições, surgirem e derrubarem-se estátuas… 
O que hoje é digno de glorificação, amanhã não será. O que hoje é esquecido, amanhã pode ser louvado. Neste mundo de (des)informação — devido por vezes ao excesso de informação superficial — basta dizer para crer. Assim, surgem nos periódicos e nas redes sociais — a par de textos de jornalistas, de historiadores e de outra gente da escrita, feitos com muita serenidade — artigos e opiniões que enchem de crenças ou de dúvidas quem os lê, sem se procurar saber até onde chegou o conhecimento histórico da realidade.
O homicídio do afro-americano George Floyd pela polícia de Mineápolis desencadeou uma onda de legítimo anti-racismo que devia ser controlado pela posição correcta e objectiva dos poderes políticos, da ciência e da civilidade, e não aproveitado abusivamente por ideologias. E o certo é que esse anti-racismo militante, por vezes tão primário como o próprio racismo, extravasa o universo em que se formou, atingindo vários países, inclusivamente Portugal, onde cada um se esforça por dizer o que pensa e o que sente, sem analisar calma e profundamente os factos. Assim, chegou-se a atentar contra a estátua (com certeza de uma estética mais que discutível) de um dos nossos maiores escritores e oradores e homem de rara coragem cívica, o Padre António Vieira, sem que alguma vez se tentasse perguntar a alguém que estude cientificamente história da cultura e história política o que se pode concluir do pensamento e da prática deste jesuíta do século XVII.
O que parece a alguns ser prioritário é vandalizar, como se estivéssemos no tempo dos iconoclastas que, de resto, aparecem em todas as épocas e com todas as ideologias, motivados não por ideias bem assentes mas por paixões incontroláveis. Qualquer estudioso de Vieira saberia dizer que este lutou pelos índios, pelos cristãos-novos e pelos judeus, mas não se encontrava ainda na época própria para defender com o mesmo denodo os negros escravos do Brasil, embora em seus sermões, nas igrejas do Rosário dos Pretos, aludisse à forma desumana com que eram tratados pelos colonos, com quem teve pugnas constantes, tentando mostrar a esses infelizes que ao menos eram senhores da sua alma que — como era próprio da crença católica do tempo — seria salva pela sua fé. Só por isso se deve vandalizar as estátuas de Vieira? E como é que isso contribui para a luta contra o racismo, que deve ser uma ideia e uma prática firmes, assumidas diariamente, assim como a luta pelo humanismo, em geral esquecida neste mundo de concorrência e de consumismo? Se tal sucedesse, há muito teríamos mais negros, ciganos e gente de todas as etnias nas escolas, como alunos e professores, nas profissões mais bem pagas, nos parlamentos ou nos governos, e menos a viver nos novos “bairros da lata”, onde se desenvolvem situações de violência, que a polícia deveria, em regra, saber controlar (o que por vezes consegue), se tivesse meios e preparação para o fazer.
A nossa forma de alterar o cenário político e social — em Portugal e em outros países — foi, em certos casos, meramente formal e em resultado das paixões do momento. Assim, por exemplo, criaram-se, mudaram-se ou apagaram-se nomes, construíram-se e derrubaram-se estátuas e outros símbolos de memória, sem muitas vezes saber porquê, em lugar de se assumir a História e tentar por meios estruturais alterar a ordem das coisas. Seria este — a meu ver — o modo mais certo de não apagar a História (ou a Memória, como por vezes se diz) e de tentar mudá-la para melhor, em benefício de todos os homens.
Não volto a discutir assuntos que já estão gastos sem verdadeiramente se terem debatido. Mas recordo ainda uma experiência pessoal e deixo uma breve consideração de ordem científica e cultural.
Há algum tempo perguntaram-me se a minha Universidade deveria retirar o título de doutor honoris causa a Francisco Franco, que lhe foi concedido em 1949, tal como fez a Universidade Santiago de Compostela. A minha resposta imediata foi “não”, pois a História não se apaga, mas explica-se e compreende-se criticamente. O mesmo terá considerado a Universidade de Oxford, que em 1941 concedeu o título a Salazar. E, quanto à questão fundamental do racismo, julgo que Portugal, como país que teve um “Império Colonial” até 1974 (com uma falsa tentativa desesperada para alterar legalmente o seu estatuto, sobretudo a partir dos anos 50 e 60, sem com isso deixar de sentir uma guerra que se prolongou por mais de uma década), deveria contribuir — dando colaboração aos investigadores autóctones — com os seus historiadores, os seus antropólogos, os seus sociólogos… para melhor conhecer a realidade dos países de língua oficial portuguesa, quer na sua perspectiva colonial, quer na perspectiva anticolonialista. É que sem isso não será possível conhecer a sua história de hoje, cheia de contradições e dificuldades. E essa realidade não se conhece apenas nas bibliotecas e arquivos, mas nos próprios espaços, no íntimo da complexidade das suas geografias, das suas sociedades e das suas culturas. Também assim se conheceriam melhor os seus exilados ou aqueles que, vindos de África, como de outros continentes, escolheram Portugal para viver.
Não sei se por cá há mais ou menos racismo do que noutros países — houve seguramente (a meu ver) menos anti-semitismo, depois de derrubado o monstro da Inquisição —, mas o que importa é contribuir de forma autêntica, e não através de falsos combates, para que ele desapareça, em todas as formas que subsiste. E são muitas, com certeza.

Professor catedrático aposentado da Faculdade de Letras da Universidade de Coimbra, fundador do CEIS20

sábado, junho 20, 2020

Perplexo?..., quem?

Perplexo? Mas que coisa é essa...
E verdade que não se pode prever tudo. Nem quando. Nem como.
E daí, dessa impossibilidade de prever tudo, nasçam eventuais perplexidades.
Mas que terão de durar pouco. Em quem, pelos anos que viveu, já viveu muito.
É verdade que não basta ter vivido muito para não de espantar. Mas ajuda.
E quem, além de ter vivido muito, muito quis entender no/do tempo que viveu, menos tempo viverão consigo as ocasionais perplexidades.

'Tá bem! Sejamos mais precisos. Há mesmo no ar, em concorrência com os virus, com a imaterialidade das moedas, com os aviões - que estão a voltar a voar... mas devagarinho, o que não é de sua natural natureza -, com toda a passarada - que, bem a vê quem não sai de casa... com quintal - que nunca esteve confinada, há no ar, sopra uma brisa de perplexidade.
Perplexidade a que alguns são mais atreitos, e outros não deveriam sentir, por calejados. Ou, nestes, duraria pouco tempo.

Depois, há palavras que parecem ganhar mais estatuto.
Novo.
Normal.
E, apesar de não ter havido Santo António, querem casar as duas palavras.
O novo com a normal(idade) seria o futuro.
Ou, não casando, que se arrumem em união de facto.
Seria o novo normal que há-de vir. Quando sairmos d'isto.
E até parece que já teria estado mais perto como futuro que se promete.
Houve números que vieram protelar o enlace desenlace. Ficou um pouco de quarentena.
O que era bom, ou tinha sido, era que depois dos tele-todos em marcha, de lançada a economia digital, e tal e coisa, se retomasse a actividade no tal novo normal. Com a ajuda,
 como se prenda fosse, do bilião e milhares de milhões. (Aliás, ao que ouviu hoje e como se esperava, as coisas no chamado Conselho Europeu não estão nada fáceis:)

Bem... por hoje, e a pretexto do anúncio da rapidez com que passou a perplexidades, apenas se quer deixar dito e escrito, que novo recorda o ESTADO que tivemos, era chamado NOVO, e tão más lembranças deixou a quem dele se lembra e de todos deveria ser lembrado.
E acrescenta~se, já e por agora, que esse Estado Novo pode parecer normal para alguns, provocou noutros - decerto anormais! - uma resistência que deveria ser lembrada e se faz lembrar.
Não se diz que, entre os "responsáveis democráticos" que vemos, ouvimos e lemos, haja quem deseje restaurar o Estado Novo como novo normal... mas a gente vê, ouve e lê cada coisa... que até nos deixa momentaneamente perplexa!



sexta-feira, junho 19, 2020

Um tanto perplexo

Há uma certa perplexidade no ar.
Uma perplexidade latente, talvez inexprimível. Por enquanto. Porque tem muito de surpreendente, e atropelando-se, o que a provoca.
Passou-se do quase pânico a partir de uma informação invasiva e assustadora para uma contida alegria contentinha por termos sido tão capazes, tão disciplinados, tão exemplares perante a ameaça.  Saltou-se da situação de emergência em estado de calamidade para a situação de calamidade pública.  Depois, logo, logo, veio a descompressão, o relativo alívio com o elogio da sageza e as novas formas de viver, de trabalhar, "é assim mesmo", "ora aí está". Apareceu o ludíbri(lh)o (nos olhos) da conciliação de não precisar de sair de casa para ir trabalhar, para levar as crianças à escola, com só umas saídas ao super, hiper-mercado para renovar os stocks do frigorífico, da arca, da despensa.
"Eureka", a economia digital, o tele-trabalho, o tele-tudo no telemóvel e no tablet.
E até voltou o futebol.
Com calma! Não vamos ter pressa demasiada. O mais importante já está. Está no tablet, no tele-móvel, no tele-visor, na tele-escola, no tele-trabalho, pois então. É a digitalização da economia a juntar ao 1 bilião e 350 milhares de milhões que vem aí perdidos de fundos.
Ah! a digitalização da economia! Que sonho. Com os trabalhadores em lay-off, e/ou a darem ao dedo entre duas espreitadelas ao duelo Porto-Benfica ou duas em conversas entre amigas ou vizinhas... ao tele-fone, claro e com muitos beijinhos virtuais.
E eis que: a sensacional notícia/surpresa, há muito esperada da Liga dos Campeões em Lisboa (também no Porto, claro... tenham calma). O auto elogio, o prémio pela boa condução das coisas públicas. A recompensação. Anunciada com a pompa e circunstância de informação dada (sem máscaras) pelos maiores de nós. Da República, da Assembleia, do Governo, do Futebol, de Lisboa. Só 5! Assim é que é! Muito espaço aberto, e pouca gente. Assim é que é. Como manda o bom senso que outros não tiveram. Porque ainda não sabiam que assim é que era.  Ou não quiseram saber. Mas esses... cala-te boca. Assim é que deveria ter sido no 1º de Maio. Como foi no 10 de Junho. Muito poucos e todos sentadinhos enquanto só dois é que falam. Um de cada vez, claro. Vêem como é. Ele até é professor. De muita coisa. Nasceu para isto. Para ser o que é.

Mas... cuidado!, em Lisboa e Vale do Tejo há números a crescer, e aquela festa no Algarve!?, e o café do senhor não-me-lembro-do-nome?, e hoje no I.P.O.?
Cuidadinho!
Mas... afinal? Ou, em francês; m'enfin!
Estou perplexo, pode-se ou não "poderá-se" ir assistir à Liga dos Campeões? Terá algum jeito o sucesso nacional que se anuncia, a meio  de Junho, como a realização piramidal que, nos noticiários, se ensanduicha com os que morreram com o virus (teria sido?), com os números dos que foram descobertos infectados que não se resolvem a diminuir consistentemente (e quantos estarão sem serem testados?), dos que hospitalizados estão e dos que hopitalizados deixaram de estar que-são-os-que-francamente-aliviam-os-que-o-poderão-vir-a-ser-hospitalizados. Sim, porque são muitos os que saem curados e dos cuidados intensivos. Haja saúde...

Bom... e se mudasse de assunto? O quê?, do Centeno?, do Novo Banco?! (diz uma vozinha dentro do perplexo... que reponde:) Por favor... Mais perplexo do que já estou, NÃO!!!


quarta-feira, junho 17, 2020

Mais Caraça, há 80 anos

Citação (entre muitas possíveis e desejáveis!) de Bento de Jesus Caraça:

"Assistimos aqui a um despertar das massas, mas apenas num sentido, digamos, negativo; um despertar que reage apenas contra a injustiça de que se sente vítima; um despertar truculento que não atinge a profundidade do sentido da reflexão e da justiça; acima de tudo, um despertar orientado sem grandeza. Mas essa profundidade e essa grandeza, não é já sob a conduta de Hitler que podem ser atingidas. (…) Hitler apega-se ao que é fácil, ao que é transitório - a expansão imperialista – para mascarar a sua falência na política interior. O resto ultrapassa-o. De modo que todo o problema está nisto - saber em que grau o despertar da alma colectiva das massas na Alemanha é independente de Hitler e quando, afastado este, esse despertar entrará na fase, por enquanto não atingida, das realizações duradouras e fecundas. Será preciso dizer que aqui se contém, neste momento, a chave dos destinos da Europa?”
Continuava Caraça:
“Mas não nos iludamos. Se o enunciar da questão parece fácil e claro, a sua resolução afigura-se-me extremamente difícil. Ao analisá-la do ponto de vista internacional (e só assim pode ser estudada) surgem as complicações, tais e de tão estranho carácter, que se não enxerga, no meio de tantas possibilidades, qual o caminho necessário de saída. A hegemonia de Hitler sobre o centro da Europa cortando-a em duas, do Báltico ao Mediterrâneo, hegemonia conseguida através da aliança com a Itália (a primeira grande vítima futura de tudo isto) é um facto inegável, uma realidade política, económica e geográfica. Mas grande nau, grande tormenta; essa hegemonia acabou por provocar, como reacção, uma conjugação poderosa de forças opostas a qualquer novo acto de expansão imperialista na Europa. À primeira vista, parece ser Hitler o inimigo nº 1 dessas forças postas ao serviço da paz (15) e por um lado assim é; no entanto, Hitler é hoje um homem absolutamente indispensável na Europa capitalista…”

Este trecho foi escrito em Maio de 1939, em complemento da conferência de Maio de 1933, e Caraça terminava-o reiterando:


“De modo que mais necessário e urgente que nunca, para pôr termo a esta coisa sórdida, anti-racional, a esta macacada que é a política europeia presente, mais necessário que nunca é e continua a ser despertar a alma colectiva das massas.” 

A Cultura Integral do Indivíduo – problema central do nosso tempo, 1933-1939



Caraça e a Biblioteca Cosmos

Há uns dias sem (a)postar. Faz-me falta. Faz-me faltar fazer o post, vir ver quantos o terão lido, quantos comentários. Às vezes, porque há comentários, comentar... Mas nem sempre há condições, Da objectivas e das subjectivas...
Hoje, à procura de coisas sobre cultura, e do fundamental A cultura integral do indivíduo, encontrei:





































Aqui fica... mas procurarei levar a mais lados.

domingo, junho 14, 2020

Para este domingo - Canto civil (Orlando da Costa)

Poemas lidos (e muito bem) na inauguração o monumento dedicado à libertação dos presos políticos da prisão de Caxias a 26 (já madrugada de 27) de Abril de 1974


Orlando da Costa – “Canto civil 1”

Este é o meu canto civil

canto cívico graduado

desde um tempo antigo que vivi

entre poemas de aço camuflados e algemas de silêncio


Esse era o tempo do assalto às casernas

mas já então eu escrevia o que devia:

a cartilha da guerrilha do amor e da paz

para ser ensinada à luz das lanternas

nas escolas nas igrejas na parada dos quartéis

Este é o meu canto civil

canto cívico desfardado

escrito a vinte e oito de Abril

do ano passado à noite

de punho cerrado com alegria e sem espanto

canto para ser cantado de dia

por todos por muitos por mim ou por ninguém

Soldado raso

ao cimo da calçada

em guarda

de flor e farda

a flor que te damos

é pão da madrugada

É pão amassado

sem liberdade

é gesto de guerra

em nome da paz.

É flor de canção

em terra mar e ar

rubra flor popular

num só cano de espingarda

Soldado raso

em sentido na memória

lembra-te de novo e sempre

a flor que te damos

é da terra é do povo

é pão da madrugada.

Podcast (estudio-raposa-audiocast): Download

https://www.estudioraposa.com/index.php/10/12/2012/orlando-costa-canto-civil-2/

sexta-feira, junho 12, 2020

Apoio do PCP às MPME

 - Edição Nº2428  -  9-6-2020

AR aprova propostas do PCP de apoio às MPME


Obteve a aprovação da Assembleia da República, sexta-feira, 5, depois de ter estado em debate na véspera, o projecto de lei do PCP com medidas fiscais de apoio às Micro, Pequenas e Médias Empresas (MPME).
O diploma, que baixou à comissão de Orçamento e Finanças para apreciação na especialidade, contou com o voto favorável de todas as bancadas à excepção do PS, que votou contra.
Viabilizado foi ainda um outro projecto de lei da bancada comunista, este dirigido para o apoio à retoma e dinamização da actividade dos feirantes (no abastecimento às populações) e dos empresários de diversões itinerantes, no contexto da resposta à epidemia de COVID-19. Sem votos contra, o diploma passou com a abstenção de PS, PSD, CDS, PAN e IL, e os votos favoráveis das restantes bancadas e da deputada não inscrita Joacine Katar Moreira.
Estas eram duas de um conjunto de seis iniciativas legislativas que estiveram em debate da autoria do Grupo Parlamentar comunista, todas elas orientados para o apoio às MPME; as restantes quatro tiveram sempre o voto contra do PS, acompanhado no chumbo em duas delas por PSD e CDS, que se abstiveram nas duas restantes.
O diploma comunista aprovado prevê a suspensão do Pagamento por Conta (PPC) no IRC «até ao final do ano em que perdurarem as medidas excepcionais e temporárias de resposta à epidemia para MPME e cooperativas».
Outra das propostas é a «dedução antecipada de Pagamentos Especiais por Conta (PEC) não utilizados, entre 2015 e 2019, para micro, pequenas e médias empresas». Estabelecido é também que os reembolsos no IVA, IRC e IRS sejam efectuados no prazo máximo de 15 dias.
Estas são medidas de inegável importância para as MPME, sobretudo se se levar em conta que a acção do Governo neste capítulo tem sido limitada e insuficiente e, no essencial, direccionada para as grandes e algumas médias empresas.
Num quadro em que dezenas de milhares de empresas se viram obrigadas a suspender a sua actividade em resultado da crise epidémica de COVID-19, com brutais consequências económicas e sociais, os «apoios aprovados pelo Governo para responder a esta situação passaram ao lado da imensa maioria deste tecido económico», observou no debate o deputado comunista Bruno Dias, descrevendo assim a verdadeira situação de pequenos e micro-empresários e empresários em nome individual, que ouvem anúncios de milhões e mais milhões em dinheiros públicos, em verbas da Segurança Social e crédito disponível e, na prática, só encontram «restrições, burocracia, bloqueios, factores de exclusão e de impedimento no acesso aos apoios e ao financiamento».
No que se refere ao acesso ao crédito, Bruno Dias não esteve com meias palavras e considerou a situação um «autêntico escândalo», condenando os bancos por se aproveitarem da crise pandémica e dos «dinheiros mobilizados». «O dinheiro chega aos bancos e de lá não passa para as pequenas e micro-empresas», acusou, defendendo que é preciso «garantir que os recursos chegam de facto ao terreno», que «aqueles que ficaram sem rendimento não ficam ao abandono», que o «acesso aos apoios não é condicionado por discriminações absurdas».

quinta-feira, junho 11, 2020

terça-feira, junho 09, 2020

OS FACTOS (da 1ª semana de Junho) E A ARTE DE OS MANIPULAR - 6

OS FACTOS (desta semana) E A ARTE DE OS MANIPULAR

Artefacto à
Aparelho ou engenho construído 
para determinado fim.
(in Dicionário Priberam da Língua Portuguesa)

Os factos (relevantes) nesta 1ª semana de Junho de 2020 são
  • o “esquecimento” do acórdão do Tribunal Constitucional Alemão;
  • a “sem-importância” do Conselho Europeu face à iniciativa franco-alemã;
  • a decisão da Comissão de dotar a recuperação com 750 mil milhões €;
  • a decisão do BCE de aumentar com mais 600 mil milhões € a dita recuperação;
  • a nomeação pelo 1º ministro português de um estratega hors-governo para a recuperação da economia portuguesa;
  • a apresentação, pelo presidente do PSD do plano para recuperação da economia portuguesa;

    • depois de Marshall, a ressus-citação de Keynes na ideologia da classe.
Comento, seguindo a ordem, mais ou menos arbitrária, dos factos relevantes porque todos se interpenetram, com o meu ofício de cidadão-economista, isto é, a minha “arte” embora me falte engenho de tantos “artistas”, alguns que até engenheiros são (e de minas).


Toda a reflexão tem um substrato ideológico, sobretudo a que se afirma não-ideológica.
Quem aborda temas económicos move-se ideologicamente entre duas posições que diria extremas: i) a de a economia ser uma ciência social que parte do axioma do ser humano integrado na natureza a recorre aos recursos desta, colhendo-os e transformando-os para satisfazer as suas necessidades básicas e as que decorrem do seu percurso socializante, respeitando o meio e os outros como iguais e diferentes, ii) a de ser a economia uma técnica de combinação óptima dos recursos e dos seres humanos como produtores e distribuidores, visando objectivos de acumulação na posse de uma classe social dominante, sem ter em consideração a finitude dos recursos e a condição humana da mercadoria força de trabalho.
Entre os dois extremos há uma larga gama de posições ideológicas ou que ideologicamente se exprimem (ou não) e que como ideológicas deverão ser identificadas. Nesta 1ª semana de Junho de 2020 duas referências ilustram o enunciado, a meu ver e como reflexão assumidamente ideológica.     

A consideração do Plano Marshall como exemplo de auxílio prenhe de solidariedade num final de guerra devastadora é, isso sim, exemplar de facto relevante do tempo que se vive e da manipulação que emprenha essa referência. Para o comprovar poderia socorrer-me do que tenho escrito sobre esse Plano mas, fugindo à auto-citação, cito do livro Os novos muros da Europa de Carlos Santos Pereira: O Plano Marshall constitui antes de mais um investimento. A economia americana tem importantes excedentes a escoar. Os apoios são fulcrais para a recuperação da Europa, mas servem em boa parte para subsidiar as exportações americanas. Tanto mais que, através dos Gabinetes Marshall (então secretário de Estado), e de outros instrumentos junto dos governos europeus, os americanos têm uma palavra decisiva na gestão dos créditos. Dean Acheson, o sucessor de George Marshall na secretaria de Estado americana, reconheceria mais tarde que «estas medidas de auxílio e reconstrução só em parte são motivadas pelo humanitarismo; o Congresso autorizou e a presidência está a levar a cabo uma coisa fundamental para os nossos próprios interesses»…” (pág. 39).

Quanto a Keynes, a sua aparição é frequente, desde os anos 30 do século XX.
Lord Keynes fez escola. A sua intervenção na “Grande Crise” foi decisiva para se ultrapassar o péssimo bocado por que passou o sistema capitalista, mas foi pedagógica, didáctica. Porque foi de estudioso que aprofundou o conhecimento da economia política e que, de certo modo, se aproximou da crítica da economia política. De que, no entanto, só se aproximou. E ficou do lado de dentro do sistema, estudando-o e ensinando a partir da detecção de pontos fracos e procurando para eles respostas. Que não são possíveis sem a sua crítica, não só como é mas como vai sendo, cavando fundo nos seus caboucos, nas relações sociais de base sobre que assenta, na exploração do homem pelo homem, na mercadorização da força de trabalho dos seres humanos, única criadora por capaz de criar valores de troca que, na unidade dialéctica com os valores de uso, satisfaçam necessidades humanizando-se (esta é atrevida síntese de muito complexa construção).
Da contribuição de Keynes para a crítica da economia política (limitada mas estimável) resultou muito de importante para a ciência económica, para a macroeconomia.
Pessoalmente, vim confirmando o que hoje afirmo. Algum desse contributo só tarde o apreendi como vindo de Keynes porque parte dele foi indirecto, no ISCEF, pelos seus (diria) seguidores mas não confessos, via Samuelson por exemplo. Entretanto, em Coimbra (na FD da UC) mais abertamente se  ensinava/aprendia/falava de Keynes.
Mas o que aqui traz essa importante referência é o contentamento contentinho com que alguns invocam o nome de Keynes para (ou por) ser, de novo, o putativo vencedor deste mau momento do capitalismo. Na minha opinião, muito se enganam. Aliás, atribuir a Keynes e seus continuadores o mérito dos anos do pós 2ª guerra mundial na sua “guerra fria” com o “socialismo real” parece-me abusivo. Leio Bretton-Woods como derrota de Keynes e a abertura, a prazo, para o monetarismo bem contrário a Keynes. Mas estas seriam longas e lentas reflexões e discussões.
Para este comentário, sublinho que estimo redutor ver o contributo de Keynes como a valorização do papel do Estado e considerar que este despejar de milhares de milhões de euros pela “Europa” que é parte da União Europeia é “bazucada” à Keynes. Sendo esta, como é, a “acção resoluta” (Luís Marques, Expresso-30.05) de quem tem o poder (dado por quem?, a quem?, e como?) de imprimir dinheiro, ela não pode ser equiparada ao que se fez antes da 2ª Guerra Mundial, e não se inspira em Keynes, nem as “actuais autoridades europeias” se podem considerar instituições de um Estado.
Nos anos trinta, a moeda dominante no comércio internacional era a libra, depois da guerra passou a ser o dólar, mas quer uma quer outra moeda tinha um valor concreto, material, de troca, que o dólar (35 US$=1 onça de ouro) deixou de ter com a decisão unilateral de Truman da inconvertibilidade, em 1971, segundo passo, depois de Bretton-Woods, para o monetarismo e o neo-liberalismo. E nada mais contrário a Keynes.
Por isso, direi que invocação de Keynes é um facto relevante mas é também a ilustração de uma manipulação evocando um salvador, um “bombeiro sempre às ordens”.
Juntando os dois temas, para terminar o que aqui já não cabe, recorreria de novo (porque está aberta) à pág. 39 do citado livro de Carlos Santos Pereira, ao referir-se ao Plano Marshall: “Mas é sobretudo a economia americana que beneficia de um poderoso estímulo. O domínio do dólar no sistema internacional está garantido.” E foi garantido até à exaustão, até não haver ouro em Forte Knox que chegasse para trocar pelos dólares em circulação e a dominar o mundo capitalista. Com/por moeda des-materializada ausente do legado de Keynes nem, assumidamente, no de Marx.
Se o dólar trazia impresso o que se impunha a uma moeda,

a confiança (IN GOD WE TRUST), a sua falta deixou de a justificar como valor de troca.

De onde se levanta a questão: e os milhares de milhões (que ultrapassam o bilião) de €uros* que vão jorrar por essa U.E. adentro, “generosamente” concedidos por quem “imprime dinheiro”, que valem eles como “riqueza das nações”, de quais nações?
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*- não resisto… e deixo o testemunho pessoal de quem assistiu à gravidez e parto do €uro como moeda (no PE, de 1990 a 1999): a moeda única, o €uro, foi gerado e parido como coisa nenhuma, não tem contrapartida material, é um instrumento fictício (como a dívida é uma armadilha desse fictício arsenal) engendrado pelos que dominam a correlação de forças para se servirem dele para manter e alargar o seu domínio. Até quando?


A saída de Centeno...

 do Público:

COMENTÁRIO

O último dia de Mário Centeno

Um ministro das Finanças popular já de si é uma raridade. Um Governo a fazer uma remodelação pouco mais de seis meses depois de tomar posse, prescindindo do seu ministro mais popular, também não é comum. A saída de Mário Centeno ficará para a história pela sua originalidade.

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... para onde?