terça-feira, outubro 18, 2011

O literal e o real – 2

… parece-me justificar-se a reserva sobre a expressão fuga de capitais no seu sentido literal, embora se aceite, evidentemente e com toda a adequação, o seu emprego em sentido metafórico, plural e material.
É que… o capital não foge!
Desde logo, porque capital é, na sua essência, uma relação social entre quem se apropriou de meios de produção criados pelo trabalho, em processo histórico de séculos e milénios, e os trabalhadores desapossados desses meios de produção e que apenas dispõem da sua força de trabalho, que é usada como mercadoria nas horas de que precisa trabalhar para si e nas horas que são mais-valia.
Naturalmente, a relação social tem expressão material, materializa-se em mercadoria e faz esta passar por várias metamorfoses, desde o capital-dinheiro trocado pelo capital-mercadorias/forças produtivas, usado como capital-produtivo para se transformar, de novo, em capital-mercadorias, agora com força de trabalho incorporada, para ser trocado por/realizado em mais capital-dinheiro.
Neste modo de produção, ao princípio é o dinheiro!, e ao fim tem de ser mais dinheiro.
(…)
As leis resultantes da crítica da economia política feita por Marx confirmaram-se, na realidade, com a composição orgânica do capital e a baixa tendencial da taxa de lucro.
Esta baixa tendencial, com as suas contra-tendências, procura ser contrariada pela intensificação da exploração que aumente a mais-valia criada na etapa produtiva da circulação, e também através do acréscimo da injecção e circulação de dinheiro fictício e do crédito. O que a circulação do capital, sob a forma dinheiro, veio facilitar. Em vez de se transportarem notas e moedas, cuja ligação a bases materiais, metálicas, se foi perdendo, um simples telefonema, cliques em computadores, passaram a facilitar a chamada circulação de capitais. E estes, se, metaforicamente, fogem de onde não conseguem as taxas de exploração capazes de compensar as leis objectivas, na verdade correm para/perseguem lugares onde se multipliquem,  ou porque a exploração é mais fácil, ou porque, sem produzirem valores de uso,  especulam, criando mais dinheiro sem nada terem criado.

Não fogem. Correm, em desespero, para a sua multiplicação no vazio.

A livre circulação de capitais veio tudo facilitar. A criação de uma União Económica e Monetária, com a moeda única e o Banco Central único, é episódio desta cavalgada de desmaterialização, não da economia mas das finanças pois afasta cada vez mais o circuito monetário fictício e creditício do circuito da economia real, para cujo acompanhamento aquele teve origem e razão de ser.
O que apenas é possível por demissão do controlo político nacional sobre os movimentos, não de livre mas de libertina circulação de capitais financeiros, enquanto as outras liberdades de circulação, sobretudo a de trabalhadores, se constrangem, quando conveniente, e não importa com que violência.

1 comentário:

GR disse...

Enquanto lia este post, começou o dito ex-emigrante Álvaro a discursar na UNL (arranja sempre a melhor hora, para ninguém o ouvir).
De todas obscenidades que proferiu, concordei com a última frase; “Portugal, ainda vai ser um exemplo”
Também acredito! mas há custa de muita luta dos trabalhadores e com os cidadãos que lutam pela Democracia, vamos conseguir dar a volta a isto.

Bjs,

GR