quarta-feira, agosto 30, 2006

Quente e (muito) frio

Um dia destes, ao “ouver” o noticiário da televisão surpreendi-me a apoiar o que dizia o Ministro da Agricultura deste governo do nosso descontentamento.
O ministro falava da Companhia das Lezírias, velha luta nossa, e em termos que eram positivos pois contrariavam a insistente vontade e sucessivas tentativas de privatização, e defendiam a sua manutenção enquanto propriedade do Estado e a sua valorização como privilegiado espaço produtor (e também histórico e turístico). Fiquei satisfeito e tinha a intenção de o dizer.
Entretanto, lembrei o título de um semanário saído no sábado em que, na boca do mesmo ministro, se punha a frase “falhámos nas pescas”. Fui ler a entrevista na esperança de ter dois motivos de aplauso para o mesmo membro deste governo. Afinal…
Na entrevista ao Expresso, o Ministro da Agricultura, Desenvolvimento Rural e das Pescas, se disse essa frase que o jornalista colocou como título, mais coisas disse e algumas também surpreendentes, mas agora pela negativa.
Então não é que, perguntado se foi o falhanço das políticas que levaram a que, em 10 anos, Portugal tenha menor frota, menos emprego e mais baixa produção no sector, respondeu que a culpa era de um ministro do regime anterior (o que é que foi isto?...), o senhor Tenreiro (1901-1994, entre 1936 e 1974 o “patrão das pescas” em Portugal e um dos sustentáculos do regime fascista, tendo fugido impune em 25 de Abril de 1974)?!
E mais coisas disse sem tocar nas políticas que, sobretudo depois de 1986 (adesão às CE/UE), foram catastróficas para uma grande vantagem portuguesa que é a sua ZEE e as potencialidades nacionais no sector das pescas, e evidenciando a sua partilhada obsessão pelas soluções "privatização" e "competitividade".
Um balde água fria (e salgada).

Agora é só festa, A FESTA

Extracto do programa da Festa, para domingo, 3 de Setembro, no palco Arraial, depois do comício:

Agora é só festa, A FESTA

Este nosso amigo, Andrés Stagnaro, cantautor uruguaio (ver blog Somdatinta), que vem à Festa e está no Zambujal, vai ensaiar e conversar no espaço Som da Tinta, hoje, a partir das 18.30.

Agora é só festa, A FESTA!

terça-feira, agosto 29, 2006

Contar contido - III

Porque não morrer aos 70 anos?
E se o pensei, no meio da insónia, das dores e do susto, porque não escrevê-lo:
morrer aos 70 anos?
Com alguma idade terá de ser e esta não é melhor nem pior que qualquer outra.
Vou fazer tudo o que estiver ao meu alcance (e agora sei que pouco é), tudo o que depender de mim, para que não seja já, espero confiadamente que não o seja, mas se for… posso dizer, à maneira de epitáfio, que pior teria sido não ter vivido os 70 anos que vivi e como os vivi.
Vivos!

Contar contido - II

Guinadas
Espasmos, cólicas (falta-me a palavra certa que para aqui trazia…) acompanhados de ruídos de voltas, reviravoltas e revoltas no interior do intestino, impedem-me de dormir.
Tento várias posições e em nenhuma tenho descanso.
Estão a ser mais violentos os espasmos, as cólicas (não consigo recuperar a palavra trazida da cama e do passeio na madrugada, pelo quintal… acompanhado pelo Mounti), dores que nunca sentira.
Isto está complicado!
Desejo quarta-feira como o náufrago espera e procura a bóia.
Mas, curiosamente, parece(-me) que estou muito calmo, tranquilo. Suportando as dores, a insónia, lendo, fazendo uns sudokus.
(Ah! a palavra é guinadas!)

Contar contido - I

Um homem a contas com um problema grave de saúde é, naturalmente (?), egoísta, egocêntrico. Estive - e estou atento a essa outra fraqueza. Muito escrevi para reter o que senti neste período da minha vida e umas coisitas (leves...) aqui trouxe.
Em atenção a e em intenção de um excelente amigo que me pediu mais "contares contidos", vou editar mais três e encerro o tema.
A partir de hoje, estou em festa... do Avante!

Sacana!

Parece-me que, até há uns dias, o sacana do bicho maligno se instalara, e estava sossegadinho, sem fazer ondas.
Com os exames, sobretudo com a colonoscopia, foram mexer-lhe, tiraram-lhe uns bocadinhos para análise, e o gajo chateou-se.
Se ele estava cá dentro, tranquilamente beneficiando da minha incúria para ir dando cabo de mim, e eu não sentia o que estou a sentir – e violentamente –, não vejo outras razões que não sejam a da irritação do monstro face à ameaça de que vai ser retirado do seu cantinho, e a de querer fazer todo o estrago possível antes de.

sexta-feira, agosto 25, 2006

O gozo que isto me dá...

Quando este fulano espalha papeis pelo chão com a intenção (!?) de os arrumar, dá-me cá um gozo... ajudá-lo.

quinta-feira, agosto 24, 2006

Confrangedor primarismo!

Estou a ler, com gozo e proveito, um livro que me ofereceram, Anos Inquietos-vozes do movimento estudantil em Coimbra (1961-1974), de Manuela Cruzeiro-Rui Bebiano.
Através de 7 entrevistas, recuo até tempos que vivi intensamente, de longe ou aproximando-me com algum escondido protagonismo, e tem sido uma leitura muito interessante, não raras vezes merecendo-me sorrisos, noutras dúvidas e desacordos, sempre uma muito útil panorâmica de um tempo que foi - e é - nosso.
Até que, de repente, tropeço num pequeno trecho que me irrita e indigna. Um dos entrevistados, o dr. Pio de Abreu, no meio de uma resposta, deixou escapar a seguinte frase (ou à força a incluiu...):
"... mas, a seguir é o 25 de Novembro, o Melo Antunes e o Costa Gomes entregam Angola ao MPLA e em troca não há guerra civil em Portugal, embora o PC quisesse o contrário."
Assim se "faz história"! Com a arrogância redutora de quem tem as certezas todas e nunca se deixa enganar. Revelando um primarismo ideológico (ou anti-ideológico) que é confrangedor.

segunda-feira, agosto 21, 2006

Contar contido

As sessões quotidianas de recuperação
Há equipas com a tarefa – bem meritória…– da recuperação do pós-operado.
Por azar, chegam sempre em momentos inoportunos. No final duma mudança de penso, no regresso, estoirado, da sanita, quando decidi repousar de tantos “trabalhos”.
Eu atrelado pelo nariz, com fios, tubos, agulhas entrando-me por tudo o que é buraco, veia, flebite, e ei-los que chegam entrando logo em funções.
Exercícios e mais exercícios. Braços para cima, braços para baixo. Encher pelo nariz, expelir pela boca. Tossir, retossir. Usar os suportes do soro como halteres... Andar empurrando esta traquitância toda.

Deixem-me estar quietinho, por favor!

domingo, agosto 20, 2006

Desbarretando-me...

"Memórias de Marcello. O malogrado senhor Prof. Doutor Marcello Caetano nasceu há cem anos. Este facto foi recordado na generalidade dos meios de comunicação social. Mas parece não haver memória justa de quem foi a referida criatura. Há apenas a memória lavada e enxuta, tipo toalha de mesa imaculada, sem nódoa e perfumada com essência de lavanda. Deve ser porque sobre este chão, o pátrio, é tudo horizonte. E, claro, mansos costumes. Puta que pariu a indulgência. E a ignorância mais ainda. Nicky Florentino."

Abençoado Nicky!
Fascismo? Houve isso?!

Foi um dia muito bonito


Foi um dia de encontro e de reencontro de amigos. Foi um dia em que o Alentejo (o grupo os trabalhadores, de Ferreira do Alentejo) veio até Ourém e ao espaço Som da Tinta. Foi um dia muito bonito.
Desde o convívio em casa da famíla Laíns Galamba até ao último cante, de despedida, não houve um som dissonante naquele cantar e conversar solidário.
De resistência se falou. Da que foi e recordamos, da que não podemos esquecer tão precisa é.

sexta-feira, agosto 18, 2006

Contar contido

O umbigodreno
Ele é assim!
Não é por assim ser que merece menos simpatia, nem quero, de nenhum modo, ridicularizá-lo.
Mas fez-me rir a cena.
Entrou, efusivo, palavroso. Foi debitando sentenças. Sobre saúde e doenças, sobre médicos e hospitais.
Mantive-me discreto mas não resisti a um gesto de boa vontade: mostrei-lhe a minha barriga ornada pelos 29 agrafes.
Que festa!
Mirou, apontou (quase quase tocou com o dedo…), observou, comentou. Meticuloso. E saiu-se com esta: “ah … cá está! o dreno!… cá está ele…”
Não me desmanchei, mas sorri procurando não o magoar:
“É pá!, isso aí é o umbigo!”

Contar contido

Dialéctica escatológica
Já passei por tudo. Ou já tudo passou por mim. O que, não sendo o caso, sinto como se fosse…
Depois da ausência de circulação pelo intestino operado – ao menos… um pumzito –, agora é a circulação total, tudo a sair quando, como e por onde lhe apetece.
Chegaremos ao controlo do tráfego… mas até lá não está fácil!
Os amigos vêm animar, com visitas e boas palavras. Há um que diz: “é pá… tens de ter a moral em cima!”
Pois é!, mas como é que se pode ter a moral em cima todo borrado por baixo?

quarta-feira, agosto 16, 2006

Contar contido

A magna questão dos gazes-3

Parece que tudo depende de… me soltar!
Tanto que eu gostaria de soltar pum!, pum!, pum!, pum! De quatro estalos. E nem pouet, pouet, pouet…
Valha-nos, vá lá, vá lá, algum mau cheiro como sinal positivo!
Ao que eu estou a chegar ... com toda a gente e gabar a minha pança, sem jactância a ganhar (?) insignificância!
“Está a ficar mais molinha!”, “que deprimida em relação a ontem!…”, “que belos ruidos peristálticos!”
Que animação! Não solta é os traques exigidos...
Mas... quando me desinibir, se me vier a desinibir, vai ser cá um foguetório!

Contar contido

Repetição de penalty defendido?-2
O corpo é o meu. Quieto. Inerme.
As mãos é que não! As mãos são de quem entreguei o corpo para o defender deste “penalty”.
Tudo correu como espera(nça)do. As mãos, hábeis, dextras, estriparam o "monstro", sem bolas na trave nem ressaltos na linha branca.
O corpo ficou enrolado, estendido, à espera que as mãos o animassem. Ouvindo aplausos, vivós.
A preguiça instalou-se na pequena folga – “ansas" que fazem pança –, e o corpo não se levantou para participar no foguetório.
A decisão parece inexorável. Terá de se repetir o "penalty".
Custa! Mas se tiver que ser...
25.07.2006

terça-feira, agosto 15, 2006

Os dias lá fora vistos por um vidro sujo - 2



Entre os dias lá fora
e o vidro sujo que os transfigura,

a presença querida
enche as tardes ansiosamente esperadas.

Contar contido

Ao loooongo de 4 semanas de internamento, tomei notas, escrevi pequenas frases, procurei guardar fundas impressões e comoções. Podia guardar tudo isso para mim, e muito de isso para mim ficará guardado, mas gosto de contar. Vou aqui trazer algumas "coisas passadas a limpo":

Sem palavras! Como se diz quando a emoção (real ou requerida) não encontra as palavras que a traduzam. “Não tenho palavras!”
Então… recorro às "cem palavras".
Para contar e conter. Para que o contado seja contido.


Passagem a empijamado

Chegamos de mala de cartão ou de “bobby” de contrafacção invasora chinesa. Perdidos e dependentes. Enfraquecidos pela fragilidade, fragilizados pela fraqueza.
Acompanhados por uma incomparável solidariedade, muitos e juntos, mesmo que só dois. Assustados.
Depois, num ápice, sem se saber como, o que fica fica sozinho, miseravelmente sozinho.
E a enfermeira que passa pergunta com a possível bonomia: “Então?!... ainda não vestiu o pijama?... é a primeira coisa a fazer assim que aqui chega… tem de tirar análises, fazer RX, está a chegar aí o doutor…”
Empijamamo-nos.
Passei a ser o da cama 4 da enfermaria 4.

Bom feriado!

Talvez para retomar ritmo, talvez para começar a "fazer a mão", talvez só para vos saudar, resolvi começar o feriado com esta saudação:

segunda-feira, agosto 14, 2006

Uma Tarde Cultural dedicada ao Alentejo na Som da Tinta


INFORMAÇÂO-CONVITE

Dia 19 de Agosto de 2006,
em Ourém,
a Som da Tinta

promove uma
Tarde Cultural
dedicada ao Alentejo

depois de um convívio,

às 15.30 – cante e desfile, no Centro Cívico,
do grupo Coral e Etnográfico
“os Trabalhadores“, de Ferreira do Alentejo
16.30 – no espaço Som da Tinta,
inauguração da exposição de fotografias
“A sul gentes adentro”, de António Lains Galamba
apresentação do livro
“Minhas senhoras e meus senhores
– vida, fome e morte nos campos de Beja
durante o salazarismo”,
de Paulo Lima
- “Conversa aberta” – resistência ao sul,
com vários intervenientes,
como João Honrado, José Casanova e Sérgio Ribeiro
- encerramento
com a actuação do Grupo Coral,
no espaço Som da Tinta

quarta-feira, agosto 09, 2006

Os dias lá fora vistos por um vidro sujo -1




Às vezes... um pássaro.

Às vezes, um pássaro passa
do verde onde vive,
pelo cinzento de cimento,
ao azul deste céu de Julho

Às vezes, um pássaro traça novos riscos,
reinventa caminhos,
ajuda-nos a percorrê-los.



22.0.7.2006