terça-feira, fevereiro 27, 2018

Morreu Varela Gomes

E, como está a acontecer como lava de vulcão a que abriram as torneiras, derramam-se as memórias. Algumas partilhadas por muitos, outras só minhas mas vindas com irreprimível vontade de se partilhar. 
Antes do "caso de Beja", nas eleições para a Assembleia Nacional de 1961 as listas da oposição democrática ao fascismo incluíam um militar do quadro, um jovem capitão. Foi assim que o ainda mais jovem economista conheceu o Capitão Varela Gomes. Nas sedes da candidatura, ao lado do Teatro Avenida, entre o Campo Santana e o Martim Moniz, a presença viva, corajosa, estimulante de Varela Gomes marcou uma campanha eleitoral. Uma campanha eleitoral em que a auto-determinação dos povos foi tema, e em que a afirmação de não à guerra colonial foi acto de ousadia, mormente por parte de um militar.
Depois, quase logo a seguir, o "golpe de Beja", com a noticia, recebida por quem o acompanhava de muito perto, o modo como estava a correr a operação e, sobretudo,  a notícia da gravidade do ferimento de Varela Gomes, primeiro dado como em estado desesperado.
Lembro o choque, as lágrimas de raiva, de impotência.

Uma admiração enorme que nasceu então, nesse ano de 1961, e se renovou perante uma personalidade sem hesitações nem ambiguidades. Digam o que disserem, escrevam o que escreverem de Varela Gomes, nada beliscará a imagem do homem coerente e firme, do "capitão de Abril antes de Abril", do democrata porque lutador do povo e pelo poder ao povo.   

sexta-feira, fevereiro 23, 2018

Eu, que activo estou (e me quero!) ...

 - Edição Nº2308  -  22-2-2018

Os inactivos
A cena mediática nacional é hoje palco privilegiado da actividade frenética a que se dedicam uns espécimes que a si próprios se classificam de inactivos, isto é, dos que dizem «estar fora da vida política activa». De José Miguel Júdice a Santana Lopes, de Marques Mendes a Cavaco Silva, só para citar alguns exemplos, é ver como todos se desunham a perorar sobre os «casos» colocados na ordem do dia pela agenda económica/política/social do capital.
Refastelados nos seus cadeirões de comentadores ou em poses para a posteridades, coloquais uns, mais doutorais outros, todos debitam em nome da democracia sobre os problemas do povo e do País como se estivessem isentos de responsabilidades, quais virgens sem sombra de pecado, e apontam caminhos que a ser seguidos só poderão levar ao desenvolvimento e ao progresso, apesar de terem a particularidade de serem os mesmíssimos trilhados ao longo de décadas com resultados sempre em desfavor dos suspeitos do costume.
Nesta lavandaria self-service, autêntica barrela de passados mais ou menos longínquos, Júdice já não é o antigo fundador do contrarrevolucionário MDLP onde a extrema-direita se acoitou para combater o 25 de Abril, de onde passou para o PSD, partido em que permaneceu até se aproximar do CDS, primeiro, e do PS, depois, em eleições autárquicas, acabando a apoiar Marcelo nas presidenciais. Do mesmo modo, Marques Mendes lixiviou um longo passado como autarca, deputado, ministro de Cavaco Silva (de 1985 a 1995) e de Durão Barroso (2002 a 2004), e dirigente do PSD. Poderíamos continuar por aqui que havia pano para mangas, mas seria ocioso. O que importa mesmo referir é que estes políticos da política de direita, dizendo não estar no activo, intervêm activamente como fazedores da opinião publicada, seja para falar sobre a «insustentabilidade do Serviço Nacional de Saúde e do sistema de Segurança Social» ou ameaçar contar o que dirigentes socialistas lhe disseram no passado «sobre o Bloco de Esquerda e o PCP», como fez Cavaco em entrevista recente ao Expresso, seja nos recados semanais transmitidos nos comentários televisivos e replicados depois abundantemente em jornais, revistas e sítios electrónicos. A tónica mais recente, comum a praticamente todos, a propósito do congresso do PSD e até a despropósito, é a entronização da dupla Cavaco Silva / Passos Coelho em que todos parecem agora apostados. Afinal terão sido eles os salvadores da Pátria, o empobrecimento forçado e brutal de milhões de portugueses foi uma forma de progresso, os despedimentos em massa uma inevitabilidade para o crescimento da economia, etc., etc., etc.
Nesta corrida para ver quem lava mais branco, Marques Mendes, que foi ao congresso do PSD «matar saudades», deixa «uma palavra de agradecimento» a Passos Coelho pelo «legado na história do PSD e na história do País», e já anuncia que Luís Montenegro será líder do partido, não se sabe é quando.
Se isto é um inactivo, imagine-se o que seria se estivesse em actividade.

Anabela Fino 

... aplaudo activamente
este  A talhe de foice

quarta-feira, fevereiro 14, 2018

Impostos "europeus" e "cidadania europeia", ardis de rabito federalista de fora com federalismo escondido




do (quase) diário;

14.02.2018

Ontem, deitei-me muito tarde (…) já hoje.

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Ainda antes postei uma declaração importante do João Ferreira sobre os impostos “europeus”, em que insistiu muito (talvez demasiado) nas referências à coesão económica e social ligada ao orçamento, como coisa conhecida e falada... mas o que tem sido é deliberadamente esquecida e pouco lembrada como obrigação (ou objectivo) assumida com o Acto Único de 1986 ... onde é que isso já vai!

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E – ainda! – vi um post do Alexandre Castro merecedor de transcrição, e que preparei para esta manhã... manhãs sempre curtas em madrugadas longas:

A parolice do doutor Costa em relação aos novos impostos da UE


A parolice do doutor Costa em relação
aos novos impostos da UE
Ao chegar-se à frente na questão da criação de mais impostos europeus, o doutor Costa quer ser mais papista que o próprio Papa. Ou, então, estará a abrir caminho – através da exibição de um fanático e ridículo europeísmo – para vir a ocupar, no futuro, um cargo de prestígio nas instâncias europeias, após cessar as suas funções de primeiro-ministro de Portugal. Seja como for, fica-lhe mal a assumpção desta expressiva e bacoca profissão de fé europeísta, inquinada por um escandaloso e rasteiro servilismo, que envergonha o país. Eu até não sei se a ideia não lhe teria sido encomendada por alguém importante, de Bruxelas, de Paris ou de Berlim, para, assim, se iniciar uma campanha promocional que facilite a aceitação, por parte da opinião pública europeia, da criação de mais impostos comunitários. É que esta declaração extemporânea e absurda, que não cabe em nenhum contexto político das funções de um primeiro-ministro, enquanto tal (nenhum primeiro-ministro dos países da UE veio a terreiro falar disto), vai levar o médio cidadão europeu a formular o seguinte raciocínio: Se Portugal, um país pequeno e pobre, e que foi crucificado na cruz da troika, aceita, de bom grado, a criação de mais impostos comunitários, porque não aceitar a ideia como útil e razoável?

Mais uma vez, Portugal tem um primeiro-ministro a fazer a quixotesca figura do “Bom Aluno” da Europa, uma postura que foi comum a todos os primeiros-ministros, depois da adesão à UE. Parolice promovida…


Alexandre de Castro

Muito importante!

terça-feira, fevereiro 13, 2018

domingo, fevereiro 11, 2018

Para este domingo - Zeca a propósito de Rasputines cá dos Cabrais

Com as nossas tamanquinhas...



ZECA AFONSO
Como se faz um canalha
Conheci-te ainda moço
Ou como tal eu te via
Habitavas o Procópio
Ias ao Napoleão

Mas ninguém sabia ao certo
Como se faz um canalha
Se a memória me não falha
Tinhas o mundo na mão

Alguma gente enganaste
(A fé da muita amizade
Tem também as suas falhas
Hoje fazes alianças

A bem da Santa União
Em abono da verdade
A tua Universidade
Tem mesmo um nome: Traição

Um social-democrata
Não foge ao Grão-Timoneiro
Basta citar o paleio
O major psicopata

Já são tantos namorados
Só falta o Holden Roberto
Devagar se vai ao longe
Nunca te vimos tão perto
Nunca te vimos tão longe
Daquilo que tens pregado
Nunca te vimos tão fora
Da vida do Zé Soldado

Ninguém mais te peça meças
No folgor dos gabinetes
Hás-de acabar às avessas
Barricado até aos dentes

És um produto de sala
Rasputim cá dos Cabrais
Estas sempre em traje de gala
A brincar aos carnavais

Nos anais do mundanismo
A nossa história recente
Falará com saudosismo
Dum grande Lugar-Tenente

São tudo favas-contadas
No país da verborreia
Uma brilhante carreira
Dá produto todo o ano

Digamos pra ser exacto
Assim se faz um canalha
Se a memória não me falha
Já te mandei prò Caetano

    

terça-feira, fevereiro 06, 2018

"Modelo alemão"? (ou a alternativa "chora-mingalhas"?)

do Público de hoje:
Aumento de 4,3% e menos horas de trabalho
põem fim a guerra laboral
Patrões das principais empresas alemãs e o mais poderoso sindicato germânico põem fim a braço de ferro
com acordo que prevê jornada de 28 horas semanais e participação nos lucros das empresas.

6 de Fevereiro de 2018, 11:12
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BÀ sexta foi de vez. O mais forte sindicato alemão, o IG Metall, chegou a um acordo com o patronato para um aumento salarial de 4,3% e um alívio no número de horas incluídas na jornada laboral. Depois de cinco reuniões sem sucesso, e uma série de greves de 24 horas que custaram 200 milhões de euros à economia alemã, a última ronda de negociações permitiu chegar a um pacote de medidas que ficam aquém das exigências iniciais daquele sindicato (pedia aumento de 6%), mas que deverá servir de referência para futuras negociações, incluindo noutros sectores da maior economia europeia.

A aplicação das medidas aceites pelo IG Metall (que representa 3,9 milhões de trabalhadores alemães) e pelo patronato vai estender-se por um período de 27 meses, segundo noticia a imprensa alemã nesta terça-feira. "Os trabalhadores vão ter mais dinheiro no bolso em termos reais; vão obter uma parte justa dos lucros das empresas; e isso vai impulsionar o consumo", resumiu um dos negociadores daquele sindicato, Roman Zitzelsberger, citado pela Reuters, ao fim de 13 horas de negociações.
O acordo foi selado em Estugarda, sede de empresas importantes como a Daimler, abrangendo no imediato meio milhão de trabalhadores no sudoeste do país, mas acabará por se estender a outras regiões e sectores de actividade, "servindo de benchmark para milhões de trabalhadores" na Alemanha, sublinham analistas ouvidos pela mesma agência de notícias.
Numa base anual, o acordo representa um acréscimo salarial de 3,5%, segundo as contas de um analista do banco alemão Commerzbank, Eckart Tuchtfeld. O que significa que, para as empresas, haverá um aumento dos custos de produção acima do inicialmente previsto, mas, como refere outro analista do Barclays, "pelo menos este acordo traz garantias de maior certeza" para o patronato. Ainda na semana passada, uma greve de 24 horas paralisou empresas como a Airbus, a Daimler, BMW e Bosch, custando aos fabricantes de carros, empresas fornecedoras de bens e de engenharia qualquer coisa como 200 milhões de euros. E os sindicatos tinham ameaçado com mais greves e outras formas de luta, caso a reunião de segunda-feira não servisse para alcançar um acordo. O que acabou por acontecer, depois de se registarem cedências de ambas as partes.
Além de um aumento salarial de 4,3%, que começará a ser pago a partir de Abril, os trabalhadores abrangidos irão receber um pagamento único de 100 euros, relativo ao exercício fiscal do primeiro trimestre. É um valor extra, não repetível, que a partir de 2019 se converterá num pagamento único de 400 euros por cada ano, ao qual acrescerá outro pagamento anual extra correspondente a 27,5% do salário mensal de cada um. Porém, este montante pode ser convertido em menos horas de trabalho por quem preferir uma jornada laboral mais leve – o que acontecerá de qualquer forma, visto que uma das alíneas do acordo agora firmado prevê a redução das 35 horas de trabalho semanal para 28, para quem tiver filhos menores, familiares doentes ou idosos. Uma medida que será válida por um período de dois anos. Em compensação, as empresas poderão recrutar mais trabalhadores que estejam disponíveis para 40 horas de serviço semanal, o que será uma forma de criar "mais flexibilidade", sobretudo em períodos em que seja necessário aumentar a produção para responder a aumentos na procura.
A notícia deste acordo surge no mesmo dia em que as bolsas europeias registaram índices a perder cotação, em resposta às perdas acentuadas verificadas em Wall Street, onde o Dow Jones Industrial caiu, pressionado pelo aumento das taxas das obrigações do Tesouro dos EUA. Um movimento que é justificado pelos dados dos custos salariais, que subiram na economia norte-americana, e que pôs os investidores à espera de uma subida das taxas de juro. O dia ainda traz outra boa notícia para a economia alemã, a de que as encomendas na indústria subiram 2,2% no último mês de 2017.

Todos estes factores conjugados apontam para um aumento da inflação na zona euro, empurrada pelo principal motor económico que é a Alemanha, fazendo a taxa aproximar-se dos 2%, meta do Banco Central Europeu (BCE). Mas será necessário aguardar para ver se isso de alguma forma pode acelerar a retirada dos estímulos que o BCE tem empregado para ajudar a economia da zona euro.

segunda-feira, fevereiro 05, 2018

Trabalho extraordinário e em dia feriado, encurtamento do dia de trabalho e "bolhas"

de  "eles andam aí?" (no Expresso curto de hoje, por Pedro Lima):

"(...)

O PCP lembrou este fim-de-semana as más companhias com que anda o PS ao lembrar o chumbo, com o apoio do PSD e do CDS, da reposição do pagamento do trabalho extraordinário e em dia feriado proposta pelos comunistas. (NB1)

(...)

Eles andam também aí, os receios de turbulência nas Bolsas. Depois de um início de ano quente, a semana passada foi marcada por uma forte queda das ações em muitos mercados. O que nos dizem estas recentes quedas? É o princípio de uma correção mais acentuada? É uma bolha prestes a estourar? Os receios estão aí, como nota o Wall Street Journal, os alertas também. Depois de Alan Greenspan, ex-presidente da Reserva Federal, ter dito que nos Estados Unidos há duas bolhas, uma nas ações e outra nas obrigações, este fim-de-semana coube a Janet Yellen, que no final da semana deixou também de ser presidente da Reserva Federal, dizer que o facto de as avaliações dos ativos estarem tão elevadas é fonte de “alguma preocupação”. Se é uma bolha ou não, é algo a que não sabe responder. Foi numa entrevista à estação televisiva CBS.

Hoje alguns dos principais mercados asiáticos fecharam a sessão a cair: Tóquio 2,2% e Hong Kong 1,4%. Lisboa abriu a perder 0,56% com as quedas do BCP, Galp e EDP em destaque.

Há também alertas em torno das moedas virtuais, com a Bitcoin a destacar-se pela forte perda de valor. Nouriel Roubini, o economista americano que gosta de nos dar más notícias, também anda por aí a alertar para aquela que considera a maior bolha de sempre na História da Humanidade. (NB2)

(...)"

Notas do blog:
(NB1) - Citação de fontes onde se vai
quando por outros trabalhos:
... o verdadeiro reino da liberdade,
a qual, porém, só pode florescer
 com aquele reino da necessidade como base sua.
O encurtamento do dia de trabalho 
é a condição fundamental.

(NB2) - Quando é que "eles"
deixaram de estar "c' a bolha",
ou, pelo seu funcionamento,
deixaram de caminhar para ela?

domingo, fevereiro 04, 2018

Para este domingo



Sonho de Primavera

Sonhei com flores coloridas,
tal como florescem em Maio.
Sonhei com verdes campos
e com o canto alegre dos pássaros.

Quando os galos cantaram,
meus olhos abriram-se.
Estava escuro e frio,
e corvos grasnaram no telhado.

Mas, nas vidraças,
quem pintou estas folhas?
Podem rir-se do sonhador
que viu flores no inverno?

Sonhei com um amor a-dois,
eu e uma bela donzela,
com carícias e beijos,
com alegria e felicidade.

Quando os galos cantaram
acordaram meu coração.
Agora, sento-me, aqui, sozinho
e sonho o meu sonho!

E fecho de novo os meus olhos,
com o coração ainda a bater apressado.
Quando me entrarão os verdes pela janela?

Quando terei meu amor em meus braços?

sexta-feira, fevereiro 02, 2018

Duas no cravo!

Do (quase) diário:
(...)
&-----&-----&
 2 no cravo da ferradura
(no ditado popular, ao ferrar uma besta, o ferrador dá uma martelada no cravo e dá outra na ferradura não acertando no prego)
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 1 (uma na pata direita do lado interno)
- Edição Nº2305  -  1-2-2018
Dez notas sobre financiamento partidário
DEMOCRACIA Nos últimos meses, como aliás em momentos anteriores, a Lei do Financiamento dos Partidos, aprovada em 24 de Abril de 2003 e que o PCP sempre combateu e combate, serviu uma vez mais para uma violenta campanha antidemocrática contra «os partidos», mas visando o PCP e a sua independência. Nestas páginas procura-se contribuir para o esclarecimento acerca do que verdadeiramente esteve em causa com as alterações introduzidas em Dezembro último na Lei do Financiamento dos Partidos e do significado profundo desta lei.

1-Desde a primeira hora que o PCP considera a Lei do Financiamento dos Partidos Políticos e das Campanhas Eleitorais antidemocrática e inconstitucional. Esta lei, tal como a Lei dos Partidos Políticos, foi aprovada em 2003, simbolicamente no dia 24 de Abril; seguiu-se a lei que instituiu a Entidade das Contas e Financiamentos Políticos.
Se a Lei dos Partidos pretendia impor um «modelo único» de funcionamento partidário, decalcado das opções de PS, PSD e CDS (sem que tivesse havido qualquer problema com a lei anterior que o justificasse) a Lei do Financiamento aumentava as subvenções públicas aos partidos que já então viviam sobretudo dessas verbas e ampliava consideravelmente as despesas eleitorais. Por outro lado, impunha inaceitáveis limitações à angariação de receitas próprias (quotas, contribuições de filiados) por parte dos partidos junto dos seus militantes e simpatizantes e em iniciativas políticas com angariação de fundos, eixos em que assentam a esmagadora maioria das receitas do PCP.
O Partido votou contra este pacote legislativo e deu expressão de massas a esta sua oposição por ver nele uma «inaceitável agressão, pela via da lei, aos valores fundamentais da liberdade de associação e autonomia dos partidos, até aqui respeitados como princípios fundamentais da ordem jurídica portuguesa pós-25 de Abril», como na ocasião afirmou na Assembleia da República. Contra tais leis promoveu, aliás, a Marcha «Liberdade e Democracia», no dia 1 de Março de 2008, com mais de 50 mil participantes, exigindo o restabelecimento das liberdades e direitos democráticos consagrados na Constituição e a revogação das leis antidemocráticas que visam atingir o PCP.

2-As recentes alterações à lei foram suscitadas pelo Tribunal Constitucional, que apelou à Assembleia da República que a clarificasse e eliminasse as inconstitucionalidades. Foram precisos 14 anos para que o Tribunal Constitucional confirmasse muito daquilo que PCP vinha dizendo desde 2003 sobre a Lei de Financiamento do Partidos e sublinhasse a necessidade de corrigir algumas das suas normas mais absurdas, regulamentadas pela Entidade das Contas. Os processos-crime instaurados a quem cede espaços públicos para a realização de sessões de esclarecimento, a proibição de uso de bandeiras de campanhas eleitorais anteriores, são exemplos deste tipo de normas.
Entre as questões suscitadas pelo TC junto da Assembleia da República estavam dúvidas de constitucionalidade relacionadas com o regime jurídico institucional do financiamento político-partidário e as «disfuncionalidades que tal regime acarretava» e a necessidade de corrigir arbitrariedades existentes na sua aplicação. De facto, às inaceitáveis normas de intromissão incluídas na lei somaram-se ao longo dos anos as interpretações abusivas da Entidade das Contas, fazendo exigências absurdas, comportando-se ora como legislador ora como uma verdadeira polícia política o que tem resultado na aplicação de coimas inadmissíveis.

3-Estas alterações não foram feitas «às escondidas», como determinados sectores procuraram fazer crer. Na sequência da solicitação do Tribunal Constitucional, o presidente da Comissão Parlamentar de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias – o deputado Bacelar de Vasconcelos, do PS – solicitou a constituição de um grupo de trabalho informal com vista a encontrar as soluções legislativas correspondentes. Durante meses, cada grupo parlamentar representado naquele grupo (PS, PSD, PCP, BE, CDS e PEV) apreciou o roteiro de sugestões apresentado pelo Tribunal Constitucional, reuniu com o seu presidente e vice-presidente e elaborou as propostas que entendeu, sendo depois possível alcançar um consenso alargado das alterações a introduzir.
O CDS participou no processo desde o início e, já no final, manifestou discordância com dois artigos, que foram destacados e votados em separado. O BE participou no grupo, votou favoravelmente todas as alterações e procurou depois demarcar-se do processo.
O debate realizado no plenário da Assembleia da República, na data definida pela conferência de líderes parlamentares, pôde ser acompanhado pelos órgãos de comunicação social, como qualquer outro.

4-As recentes alterações aprovadas por ampla maioria na Assembleia da República não representam qualquer aumento das subvenções estatais aos partidos. Abriu-se, pelo contrário, a possibilidade de uma maior iniciativa própria dos partidos políticos na recolha de fundos junto dos seus militantes e simpatizantes, sem prejuízo de toda a fiscalização e controlo existente. Ou seja, os partidos que o entendam podem ser menos dependentes das subvenções públicas.
O PCP propôs por diversas vezes ao longo dos anos reduzir as subvenções públicas aos partidos: a última, no final de 2016, visava a redução de 40 por cento, proposta que foi chumbada por PS, PSD e CDS. Nos dois últimos orçamentos do Estado, por proposta do PCP, foi congelado o valor das subvenções públicas aos partidos políticos.

5-Os partidos também não deixariam de pagar IVA com as alterações à lei. Não esteve em questão, em todo o processo de alteração à Lei do Financiamento dos Partidos, nem o alargamento do regime de IVA nem o seu fim. Os partidos pagam e continuam a pagar IVA por toda a actividade que não seja política – da mesma forma que todo o património partidário imobiliário não afecto à actividade política paga IMI. Ao que se procurou pôr cobro foi à «discricionaridade de interpretações que tem existido por parte da Autoridade Tributária» relativas ao pagamento e devolução deste imposto e ao que constitui ou não actividade política.
É um absurdo que, por exemplo, um partido que contrate uma empresa para a montagem de um comício tenha direito a ver o IVA devolvido, enquanto o PCP viu muitas vezes negada essa restituição pela compra dos materiais necessários à montagem e organização do comício pelos seus próprios militantes. Ou que a Autoridade Tributária não considere intervenção política e afirmação de identidade do PCP iniciativas do Centenário de Álvaro Cunhal.

6-Não há qualquer incoerência entre a votação favorável do PCP às alterações aprovadas a 21 de Dezembro e a sua oposição de sempre à Lei do Financiamento dos Partidos, como a generalidade dos órgãos da comunicação social procurou fazer crer. Como o PCP esclareceu no dia 27 desse mês numa nota do seu Gabinete de Imprensa, as alterações introduzidas não configuram uma nova legislação e mesmo as soluções propostas pelo TC que tiveram acolhimento nas alterações consensualizadas pelos partidos não são as que o PCP defende.
A lei, mesmo com as alterações introduzidas, continua a não ser democrática, pois mantém como objectivos centrais dificultar ou mesmo impedir a recolha de fundos assente na iniciativa própria e na contribuição dos militantes e simpatizantes, e a manter o pendor do financiamento público dos partidos, através das elevadas subvenções estatais. A lei mantém ainda a limitação da autonomia de financiamento dos Partidos face ao Estado e às entidades públicas.

7-As receitas em numerário não são sinónimo de receitas de origem duvidosa. A lei impõe regras de comprovação e justificação de todas as receitas, sejam elas em numerário ou não. O PCP não é nem nunca foi contra a prestação de contas e o seu rigor, mas condenou e condena a ingerência, devassa e condicionamento da actividade e liberdade de organização política que a lei procura impor. Todos os anos o Partido presta contas ao Tribunal Constitucional e os documentos sobre as contas de gestão são públicos. Poderão os bancos que o Estado português «resgatou» dizer o mesmo?
O que os autores e defensores da Lei de Financiamento dos Partidos realmente pretendem é atacar a independência do PCP através da limitação da liberdade dos seus militantes e simpatizantes de contribuírem financeiramente para o seu Partido. A lei actual não permite, por exemplo, que 358 militantes ou mais paguem uma quota de cinco euros em numerário, mas aumentou substancialmente as subvenções estatais aos partidos políticos, beneficiando fundamentalmente os que têm maior expressão eleitoral.
As moedas de dois euros e as notas de cinco euros deixadas nas acções do PCP representam contribuições limpas e honestas, o que não se poderá dizer daqueles cheques ou transferências bancárias de dezenas de milhares de euros que qualquer um pode fazer a partir de um banco ou off-shore. Por outro lado, nenhuma norma constitucional impõe às pessoas a obrigatoriedade de abertura de conta bancária, que só abre quem quiser.

8-As iniciativas de angariação de fundos são expressão da livre dinâmica de actividade dos partidos, como aliás de quaisquer outras organizações de cidadãos. Contudo, a Lei de Financiamento dos Partidos (aprovada em 2003 e entrada em vigor desde 2005) e a Entidade das Contas têm na Festa do Avante! um dos seus alvos privilegiados. Particularmente grave é o facto de as «iniciativas de angariação especiais de fundos que envolvam a oferta de bens e serviços» que pela sua própria natureza se diferenciam quer dos donativos de pessoas singulares quer das «receitas de angariação de fundos» às quais a lei actual já impõe limites rígidos e absurdos, passarem a estar também sujeitas a esses mesmos limites.
Ao longo dos anos, a Entidade das Contas pautou a sua actividade por interpretações no mínimo «criativas» da Lei, sobretudo no que à Festa do Avante! diz respeito: quis definir como produto da actividade de angariação de fundos do PCP toda a receita efectuada na Festa, como se esta não envolvesse avultadas despesas na sua construção, e procurou excluir das contas inúmeras despesas relacionadas com o seu funcionamento.
As contas da Festa do Avante! são apresentadas anualmente, com o rigor a transparência que caracteriza o PCP.

9-O PCP sempre defendeu que o financiamento dos partidos deve resultar da sua iniciativa própria e da contribuição dos seus membros e simpatizantes. Mais do que um simples slogan, trata-se de um princípio aplicado pelo Partido. Senão veja-se: do total de receitas arrecadadas pelo PCP só 11 por cento resultam de fundos públicos; os restantes 89 por cento provêm do pagamento de quotizações e contribuições de muitos milhares de militantes e simpatizantes, da realização de iniciativas e de donativos devidamente comprovados e justificados perante as autoridades competentes.
Quanto aos outros partidos, sem excepção, obtêm a maior parte das suas receitas por via das subvenções estatais e do financiamento público: o PS 69 por cento; o BE 78,8 por cento; o PSD 82,7 por cento; e o CDS 96 por cento. Percebe-se assim a verdadeira razão que os leva a defender exclusivamente o financiamento público dos partidos: porque, por esta via, têm garantido esse financiamento. Há partidos – os partidos da política de direita – a quem não faz falta a independência financeira nem sequer os meios próprios pois o capital fornece-lhes os instrumentos de propaganda de que precisam. Para o PCP, a independência financeira e os meios próprios são garantia da capacidade de intervir e de independência político-ideológica. Assim, ao procurar limitar a recolha de fundos por parte dos partidos a lei visa acima de tudo o PCP, como desde a primeira hora foi denunciado. Já o aumento das subvenções estatais beneficia os partidos da política de direita, que foram os seus autores.
É importante lembrar que foi só em 1999 que PS e PSD concordaram finalmente com a proposta do PCP de proibir o financiamento dos partidos por empresas. Como na altura se reafirmou, «o financiamento privado dos partidos políticos tem como razão última a opção político-partidária e essa opção é de pessoas e não de empresas». Por outro lado, acrescentava o PCP, «não se vislumbra que razões altruístas possam levar empresas a financiarem um partido político, já que, por natureza, o objectivo essencial e a razão de existência de empresas privadas é a obtenção e maximização do lucro».
As concepções do PCP acerca do financiamento dos partidos são claras e não podem ser mais transparentes.

10-No PCP, os fundos são colocados inteiramente ao serviço da luta dos trabalhadores e do povo pela democracia e o socialismo. Partido independente do Estado e do capital, o PCP procura assegurar pelos próprios meios o seu funcionamento e a divulgação da sua mensagem política – como se prova, aliás, pela origem das suas receitas e do seu património, assegurados na sua grande maioria pelos seus militantes e simpatizantes. Como princípios de funcionamento consagrados nos Estatutos do Partido conta-se a não admissão de vantagens e privilégios pessoais pelo desempenho de tarefas de responsabilidade ou cargos públicos. Também nisto se comprova que o PCP é um partido diferente dos que «são todos iguais».

2 (segunda, nas quatro patas da besta)
Mordomos NATO
Na véspera da visita a Portugal do Secretário-Geral da NATO, os Ministros da Defesa e Negócios Estrangeiros publicaram um artigo no Público (25.1.18): uma lamentável posição de submissão e seguidismo, contrária à Constituição de Abril. Conseguem, num mesmo parágrafo, recordar que Portugal é membro fundador da NATO (sem lembrar que foi no tempo do fascismo) e afirmar que «a NATO é, pela história e pelo presente, uma parcela marcante da nossa forma de conceber a Defesa Nacional, integrando o seu código genético». Os genes do passado andam por aí. 
O artigo junta a sigla NATO à palavra «segurança». Refere com orgulho que «Portugal é dos maiores contribuintes» para a missão NATO no Afeganistão «com quase 200 militares envolvidos». Mas o que é o Afeganistão ocupado, após décadas de subversão e 17 anos de guerra EUA/NATO? No sábado anterior ao artigo, um ataque talibã matou 22 pessoas e no fim-de-semana seguinte um veículo-bomba matou 100. O New York Times (27.1.18) citando a ONU, diz que ao longo de 2017 morreram em média dez civis por dia, sem recordar que muitos morreram em ataques aéreos dos EUA/NATO. A agência da ONU para os Refugiados (UNHCR) fala em cerca de 2,5 milhões de refugiados afegãos, só no Paquistão e Irão. Segundo outra agência da ONU, a UNODC, a produção de ópio, quase totalmente erradicada no ano anterior à invasão, disparou após 2001, tendo em 2017 a área de cultivo de papoilas aumentado 63% e a produção de ópio 87%. Papoilas afegãs produzem 90% da heroína mundial e o Afeganistão é o país com a maior percentagem de heroinómanos (BBC, 11.4.13). Nos EUA os utilizadores de heroína aumentaram de 189 mil em 2001 para 4,5 milhões hoje (Chossudovsky, global research.ca, 27.1.18). O jornalista A. Vltchek mostra campos de papoilas junto à base dos EUA em Bagram (21stcenturywire.com, 5.8.17). São antigas e bem documentadas as ligações entre os serviços secretos dos EUA e o tráfico de drogas. Quando o artigo diz que «somos [...] produtores de paz e segurança [...] em tantas outras partes do globo», citando concretamente o Afeganistão, é disto que fala.

Todas as guerras NATO geraram tragédias semelhantes, com um rastro de destruição dos Balcãs à Líbia e Médio Oriente. Os ministros anunciam que no «futuro próximo» Portugal irá «reforçar as capacidades, nomeadamente através da aquisição de novas aeronaves de transporte médio e do reforço da nossa capacidade naval» no âmbito da NATO. Entretanto, adia-se investimentos no SNS, transportes públicos ou na prevenção e combate a incêndios. Defendem «que a NATO se mostre cada vez mais preparada para a sua vocação a 360 graus», ou seja, o auto-proclamado ‘direito’ a intervir em toda a parte e sob qualquer pretexto. Mas a NATO é uma ferramenta criminosa de guerra, destruição, mentira e agressão imperialista. Que se acha acima da lei. Querem comprometer Portugal em futuras guerras contra o Irão, a RPD Coreia ou mesmo a Rússia e a China, decididas pelos EUA/Trump? Com que consequências? Para quê? 

Não é apenas em matéria de UE que este governo não rompe com políticas contrárias aos interesses do povo e do País. Tal como Tony Blair, há quem no Governo PS queira ser dos mais fiéis mordomos da NATO, agora sob a tutela Trump. É uma tradição antiga nas nossas classes dirigentes, trocar a soberania por um prato de lentilhas. Mesmo que seja, como em 1580, para se submeter a potências em declínio. Em declínio, mas criminosas e perigosas.


Jorge Cadima