quinta-feira, junho 30, 2011

O programa de governo - 2

Na estreia do novo governo na Assembleia da República, e naquilo que a antecedeu e a rodeou, há muitos comentários a fazer. Alguns, muitos, teria eu para fazer. E irei fazendo-os por aqui.

Por agora, apenas quero falat de chantagem.

  • Chantagem do Presidente da República, quando usa a sua legitimidade democrática e a do governo que se formou após as eleições legislativas, sob o seu apadrinhamento, para transformar essas legitimidades democráticas (desta democracia...) em legitimidades únicas e absolutas como se outras não houvesse, como se não houvesse outras maneiras de se exprimir a democracia (poder do povo). 
  • Chantagem do Primeiro Ministro, quando vem juntar, ao programa de governo - e na sua apresentação -, mais umas medidas, entre elas a de uma redução de metade do subsídio do Natal (para quem, como), com o argumento-chantagem do relatório trimestral do INE (que oportuno...) que serviu para dizer que se está mais longe do compromisso dos 5,9% do défice orçamental pelo que é indispensável "irei mais longe", "já", quando poderia servir para se dizer exactamente o contrário.
  • Chantagem à volta do "emagrecimento do Estado", transformado em indiscutível e indiscutido objectivo, esquecido que o endividamento é, sobretudo, não-estatal, para o que veio ajudar, hoje mesmo, o sr, Trichet (ou tricher?), a "arrumar" as suas malas do BCE, quando, com uma auto-proclamada autoridade, afirmou que há que, em Portugal, é preciso, sobretudo, despedir na função pública.

Parece estar a formar-se
um coro de chantagistas!
   

Este governo - "Duas marcas"

Continuando o seu labor incansável e de enorme valia político-cultural, Correia da Fonseca vai publicando as suas crónicas sobre televisão. No avante! e no Alentejo Popular sou seu leitor, e nelas encontro, sempre, matéria para aprender e para divulgar. Para divulgar, ou por meu assimilado e indirecto (e, decerto, nem sempre fiel ou ajustado) intermédio, ou por transcrição directa, como é o caso desta Duas marcas, que li no Alentejo Popular de 23 de Junho, e quero dar a conhecer a quem não a tenha lido, ou aconselho a releitura. 


1. A televisão tem estado cheiinha da notícia: aí está ele, o governo. Não um governo qualquer. Nem sequer um qualquer governo de direita. Trata-se de um governo que, emergindo de uma maioria parlamentar absoluta, se prepara não só para ajustar contas com o 25 de Abril mas também para destruir o que dele reste. Há sérias razões para admitir que o País está perante o projecto silencioso, talvez até em certa medida inconsciente de si próprio, de refundar um salazarismo sem Salazar, sem polícia política e sem censura oficial (aliás tornada inútil perante a evidente eficácia das formas actuais de censura instaladas na generalidade dos media dominantes). E a abundante informação que a TV nos fornece acerca do governo Coelho/Portas, como aliás é seu dever fornecer, não tem a mínima preocupação em dourar a pílula amaríssima, se não venenosa, que a Europa dos Ricos prescreveu para administração urgente ao povo português: em nome do interesse nacional, como sempre se faz quando se trata de agredir as populações, vão ser atirados para o desemprego milhares de trabalhadores, vai ser extorquido mais dinheiro aos doentes e aos deficientes, vai ser reduzido por alegada falta de meios o apoio ao milhão e tal de velhos que já se arrasta na pobreza E não sou eu quem o diz ou aqui o inventa: foi a TV que nos últimos dias me veio ensinando isto e muito mais, numa quase alegre profecia fácil das desgraças a que o povo português foi sentenciado.

2. Compreender-se-á, espero, que nestas colunas se dê especial atenção a duas marcas que este governo desde já ostenta e de que se diria serem claras, por óbvias, se não fossem de facto nigérrimas por ilustrarem, além do mais, a sinistra mistura de ódio e medo que através dos tempos a direita sempre arrasta na sua bagagem relativamente à cultura. Não poderá dizer-se, decerto, que ela não tem boas razões para isso: a cultura ilumina e a direita obscurece para confundir, a cultura revela o mundo e a vida enquanto a direita lhes falsifica a imagem, a cultura liberta e a direita oprime. Objectar-se-á talvez que a direita sempre tem contado com gente de boa craveira cultural/intelectual entre os seus. Mas convém saber que essa espécie de situação contranatura decorre da existência de contradições internas na personalidade ou no pensamento das figuras que concretamente ilustram essas situações paradoxais ou de excepção. Nem todos podem ser construídos de uma só peça e a coerência, embora possa acontecer sem grande esforço, não é uma espécie de maná que caia do céu aos trambolhões.

3. As tais duas marcas a que me refiro, escolhendo-as entre outras por terem directamente a ver com as preocupações regularmente abordadas nestas duas colunas, são o projecto de privatização da televisão pública e a extinção do Ministério da Cultura. Até ao momento em que escrevo, não foram prestados ao País quaisquer esclarecimentos acerca do modo e do grau que consubstanciarão a anunciada privatização da TV estatal, sendo contudo muito provável que se trate de entregar a RTP1 a privados. Desde já é possível sublinhar, contudo, duas ou três coisas. A primeira delas será que, com provável excepção para a RTP África, cuja missão poderá talvez ser desempenhada pela RTP Internacional, todos os canais da RTP são necessários para que ela possa cumprir de facto os deveres de serviço público que lhe estão cometidos. A segunda nota será para sublinhar que, como aliás é praticamente consensual, o mercado telepublicitário já não suporta mais um canal concorrente sem que esse facto redunde em grave prejuízo financeiro para todas as operadoras. Por último, é preciso acentuar uma esquecida (ou escamoteada) verdade fundamental: sendo certo que a acção da Radiotelevisão Portuguesa tem estado longe de convergir para o cumprimento de um eficaz serviço público, designadamente na área da promoção e divulgação cultural, é evidente que o remédio para essa gravíssima omissão não é o despedaçamento da empresa ou a amputação dos canais decisivos para o êxito da sua missão. Alegar que para ter uma RTP que falha o seu dever mais valerá que o Estado se desfaça dela é, a menos que se trate de um caso de debilidade mental, uma tentativa um pouco ingénua de enganar as gentes. Mas elas, as gentes, de tanto serem enganadas já perderam um pouco a capacidade para identificarem os vários contos do vigário. Pelo que sempre convém preveni-las. Como agora e aqui se tenta fazer.

O programa de governo - 1

Cumprida a missão informativa sobre o "dia da Grécia", que a mim próprio, abusivamente, atribui, quero referir-me a um tema que estarei a deixar passar: o "programa de governo".
Não porque o... "deixe passar", não porque não me preocupe o que ele diz, não porque não queira falar de tal documento (embora não seja, evidentemente agradável, e já esteja cansado de ler e ouvir coisas sobre ele, sobretudo panegíricas).
De tal "coisa" deixarei aqui, decerto, alguns comentários.
Por agora, ficam apenas dois, que retive de passagem, ou teria sido "de ouvido".

  • Inclui, o programa, medidas de ataque ao desemprego? "Dá-se um doce" a quem as descobrir, mas não faltam, para além das "boas intenções" afirmadas sem qualquer consistência, os ataques aos desempregados!
  • Taxas moderadoras? Trata-se, no fundo, da passagem de um Serviço Nacional de Saúde universal e constitucionalizando - um direito! - para um sistema assistencial aos pobrezinhos que não podem pagar os cuidados de saúde.

quarta-feira, junho 29, 2011

Grécia - a última notícia

The least but not the last (new):

«Larga maioria no Parlamento
dá o “sim” ao novo pacote de austeridade
Grécia aprova plano-chave
para garantir financiamento europeu
29.06.2011 - 14:12
por Pedro Crisóstomo

O “sim” de 155 deputados permitiu ao primeiro-ministro grego, George Papandreou, fazer aprovar as medidas de correcção orçamental que acordou com os responsáveis internacionais para encaixar 28 mil milhões de euros até 2015.

Um membro do PASOK (o partido liderado por Papandreou que tem, desde 2009, maioria absoluta no Parlamento precisamente com 155 votos) recusou votar favoravelmente o pacote, mas, em contra partida ao “não” do dissidente Panagiotis Kouroublis, houve um deputado da oposição que deu o “sim” ao plano de contenção.

Papandreou passou na prova-de-fogo, depois de três dias de duras discussões parlamentares com a oposição e no meio de contestação nas ruas e de uma greve geral de 48 horas. Mas, apesar de poder respirar fundo, o primeiro-ministro tem pela frente novos testes a enfrentar no Parlamento. A discussão em detalhe das medidas vai ser votada a partir de amanhã. E em causa estão pontos como o aumento da carga fiscal ou mais cortes salariais na função pública.

“Podemos escolher entre o défice e a prosperidade. Este [voto] é apenas uma forma de ganharmos tempo para fazer mudanças que precisamos de realizar”, dramatizava Papandreou antes de os deputados fazerem aprovar as medidas.

Para fazer passar o plano de contenção, bastava ao Governo o voto de 151 dos 300 deputados, mas as divisões internas no interior dos socialistas não dava garantias absolutas de que o plano fosse aprovado. Apenas havia a expectativa de ver repetido o sinal de “dever patriótico” (tão repetido por Papandreou) dos socialistas, que, com os seus votos, garantiram o sucesso da moção de confiança ao Governo.

Batalha campal na Syntagma
Em frente ao Parlamento, em Atenas, a praça Syntagma voltou a transformar-se numa verdadeira batalha campal, durante a madrugada, ainda a discussão parlamentar estava horas de começar. As agências internacionais descreveram violentos confrontos entre os manifestantes e a polícia. Procurando controlar os que tentavam abalroar as grades metálicas de segurança que limitam o acesso à escadaria do edifício parlamentar, as autoridades dispararam gás lacrimogéneo sobre os manifestantes.

Mercados antecipam voto positivo
Na Europa, já várias vozes tinham avisado não haver plano B para um eventual chumbo às medidas de austeridade adicionais que Bruxelas exige serem implementadas até 2015. Já a discussão parlamentar decorria, Jim O'Neill, economista-chefe do banco Goldman Sachs dizia à Bloomberg: “O plano B é rezar [para que o pacote passe]”.

Tal como na semana passada, quando os deputados votaram a moção de confiança ao executivo remodelado, os mercados reagiram por antecipação. Na expectativa de que a maioria socialista se unisse em torno da aprovação das medidas acordadas com Bruxelas, as bolsas de referência na Europa estavam ao início da tarde a reagir em alta.

Notícia actualizada às 14h37»

(quando 51,7%
 - 155 em 300 - são
uma "larga maioria"!)

Actualizando este "dia grego"

(que até faz esquecer o programa de governo português... )

«Grécia em convulsão social e política
decide futuro no Parlamento
29 de Junho de 2011, 11:57

O futuro da Grécia é decidido no Parlamento nesta quarta-feira. Um novo pacote de medidas de austeridade vai ser votado e precisa ser aprovado para evitar a bancarrota no país.

Nas ruas de Atenas, milhares de pessoas estão desde ontem a manifestarem-se e já ocorreram confrontos entre manifestantes e polícia. De acordo com as autoridades, 37 pessoas ficaram feridas e 14 foram detidas.

O país está hoje no segundo dia de uma greve geral, a quarta organizada desde o princípio do ano e a primeira de 48 horas.

As novas medidas de austeridade incluem um aumento da carga fiscal e mais cortes salariais. Entre 2012 e 2015, o programa prevê um encaixe de 28,6 mil milhões de euros e privatizações num montante de 50 mil milhões de euros para reduzir a dívida pública.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) e a União Europeia (UE) começaram a ajudar a Grécia em Maio do ano passado, com um empréstimo total de 110 mil milhões de euros.

As instituições exigem agora que o novo pacote de austeridade seja aprovado no Parlamento para que a próxima tranche de ajuda financeira, de 12 mil milhões de euros, chegue ao país.

“Há momentos decisivos e as próximas horas serão decisivas não apenas para o povo grego, mas também para a zona euro e para a estabilidade da economia mundial", disse o presidente da UE, Herman Van Rompuy, citado pela AFP.

Depois de dois dias de debate sobre o plano, o Parlamento grego vai hoje a votos. É necessário que 151 dos 300 deputados votem a favor das medidas de austeridade.

O partido Pasok, no poder desde 2009 e liderado pelo primeiro-ministro George Papandreou, tem apelado ao consenso na votação.

Tudo indica que o Pasok vai conseguir a aprovação das medidas, apesar da oposição da Nova Democracia que nos últimos dias afirmou o voto contra e as críticas dirigidas ao Governo dentro do próprio partido.

Caso o plano seja aprovado nesta tarde, amanhã os deputados voltam a votar, desta vez para decidir como as medidas vão ser aplicadas.

@Alice Barcellos com AFP»

(...decide futuro...
não só grego
e não só no Parlamento!) 

29.06.2011 - 08:38

«Mundo
Novos confrontos em Atenas
horas antes da votação
do novo pacote de austeridade»

Adormecemos com a Grécia, acordamos com a Grécia

Hoje, a Grécia

Apenas sublinho o que me pqrece de o fazer:

Austeridade
Bruxelas ameaça Grécia com o inferno mas prepara alternativas
Luís Rego em Bruxelas
29/06/11 00:05

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O primeiro-ministro grego, George Papandreou, começa hoje a viver o dia D. Se o pacote de austeridade chumbar, acabou-se o financiamento.

.A Grécia entra hoje na votação do pacote de austeridade que permite manter a torneira aberta.

A Comissão quer que os deputados em Atenas votem hoje o novo plano de austeridade com a falência e o fim da "solidariedade europeia" em mente. Mas embora nenhuma alternativa avançada pareça muito convincente, são muitos os rumores sobre um chamado plano B em caso de o parlamento rejeitar o programa económico que prometia manter a torneira europeia aberta à economia grega.

Ontem, o comissário Olli Rehn viu-se forçado a fazer uma declaração dizendo que "a única forma de evitar um incumprimento imediato é se o parlamento apoiar o programa económico revisto" e "para quem especula sobre outras opções, deixem-me dizer claramente: não há plano B para evitar o incumprimento". Porém, o ministro alemão das finanças, Wolfgang Schauble, que subscreve o maior empréstimo nacional no resgate grego, diz o contrário. "Estamos a prepararmo-nos [para isso]", disse, respondendo ao que fará em caso de voto contra no Parlamento. "Seria irresponsável que não tivéssemos um plano de contingência mas não devemos falar disso agora", explicou ontem uma fonte comunitária.

Entre muitos desmentidos categóricos, o porta-voz de Rehn, Amadeu Altafaj-Tardio, acabou por reconhecer o mesmo: " não seria muito responsável dizer que qualquer que seja o resultado da votação no parlamento grego, temos outros planos". E continua na linha ameaçadora ou motivadora para os deputados gregos: "se a Grécia fizer tudo para adoptar os objectivos fixados há um ano atrás, a solidariedade continua. Senão, tudo mudará".

(Olli Rehn é o durão,
o outro é Barroso)

terça-feira, junho 28, 2011

A leitura de um Público em ida-e-volta – 3

Continuando a saga, e sem a levar até ao fim - porque mais coisas poderia para aqui trazer dessa leitura do Público de domingo, em três horas de ir e voltar a Lisboa - referiria, agora, duas “matérias” que mais me provocaram e impuseram comentário.
Uma, deriva da coluna de Vasco Pulido Valente, de que me julgava liberto mas que, talvez por um desejo absurdo de sofrer (influência de Cesário Verde...) não resisti a ler, apesar da dose que me foi dado observar estar disponível na revista única do Expresso, com o homem na capa e em muitas páginas de texto e tristes fotografias. Deve tratar-se de epidemia…
O texto de VPV tem o título apelativo de A esquerda no dia seguinte e é, na verdade, prova do estado em que está. Que, confirmo, não melhorou nada nem mostra sinais de recuperação. Mas que ali vai ocupando o canto superior esquerdo da última página do Público.
Então, o Correia Guedes, perdão, o Pulido Valente, com o seu doentio snobismo, arquiva a sua/dele esquerda, que se resumiria um partido, o PS, que de esquerda nada mostra que seja, outro, o BE, que ele admite, benevolentemente, que partido seja, e um outro partido, o PCP, de que escreve quatro linhas de antologia para fechar a coluna: «No meio de todo este delíquio, fica o PC, que, habituado a desgraças, se porta com dignidade no seu próprio enterro». Pelo meu lado, habituado à desgraça do colunista, nem comento, militante que sou de um PC de boa saúde, resistindo a todas as certidões de óbito passadas por enfermos e moribundos.





osítiodosdesenhos
Fernando Campos



Outra nota é relativa à Dona Teresa de Sousa, senhora por quem tenho desamor desde a primeira vista, que tem vindo a transformar-se em alergia. Ora a DonaTS está muito zangada com a Senhora Merkel, e escreve uma página inteira sobre A chancelar que temos e a que gostaríamos de ter.
A D. TS, na sua longa prosa, destila as suas opiniões, que poucas são, sobre a “Europa”: União Económica e União Política, já!
Só duas observações para exemplo da sua “qualidade” (embora vá aproveitar outros seus “estímulos” para um artigo entre mãos, ou entre mentes, ou entre dentes...).
A D. TS faz um paralelo entre as posições do “chefe do Tesouro americano” (que rigor!) que teria dito que «nada se resolverá se a Europa não conseguir agir “como uma só voz, e uma voz clara, sobre uma estratégia”» e a da vice-ministra dos Negócios Estrangeiros de Pequim que teria dito, a 17 de Junho, «que “é de uma importância vital” para a China que os Estados europeus consigam resolver as suas dificuldades». A opinião da senhora chinesa será o que é mas decerto que, para ela, Estados europeus não são a mesma coisa que, para a D. TS e para o homem do Tesouro dos EUA, é "a Europa”.
Aliás, a D. TS farta-se de fazer citações, mostrando baralhar o muito que lhe passa debaixo dos olhos, e desse muito (demasiado?) retira a opinião/conselho de que «Angela Merkel tem de usar a sua autoridade e a sua legitimidade política para explicar claramente aos alemães que a Europa não se resume aos erros da Grécia ou de Portugal». Depressa!, alguém que leve isto a ler à Sra. Merkel até porque se correm graves riscos dada «… a oposição dos cidadãos europeus, cada vez mais conquistados pelos velhos demónios do populismo e da xenofobia que ciclicamente a vêm ensombrar» (à Europa dela).
Como tudo seria fácil se se desse ouvidos à Dona Teresa de Sousa e se se esquecesse tudo o que a vida nos ensina!

Notícia Lusa

Agendamento potestativo
do PCP
para discutir
renegociação da dívida


Lisboa, 27 jun (Lusa) -
O PCP apresentou hoje no Parlamento um pedido de agendamento potestativo para a discussão do projeto de resolução do PCP para a renegociação da dívida, debate que os comunistas defendem "ter que ser feito o mais cedo possível".

"Entendemos que esse debate tem que ser feito o mais cedo possível, porque é agora que se toma essa decisão sobre se o país deve ou não, como nós propomos, fazer a renegociação da dívida, ou afundar-se num programa que tem tudo para nem a divida poder pagar ao fim de uns anos de aplicação", disse o líder parlamentar do PCP aos jornalistas.

Após a conferência de líderes parlamentares, Bernardino Soares disse que o debate ainda não ficou marcado porque ainda não está definido o primeiro dia de trabalhos "normais" do Parlamento após a discussão do programa do Governo, na quinta e sexta-feira.

"O nosso agendamento visa, no primeiro momento possível, fazer o debate da proposta de renegociação da dívida pública", sublinhou, referindo que aquela foi uma das principais propostas e compromissos da campanha eleitoral comunista.

ACL.
Lusa

A leitura de um Público em ida-e-volta - 2

O Samuel "Cantigueiro", no seu “astro” da blogosfera, sempre oportuno, contundente e carregado de saudável ironia, quase sempre muito bom (porque este sempre não quer dizer sempre, pois não inclui, nesta apreciação, as vezes que a mim se refere e gaba…), gabou-me a paciência de ter lido o Público de domingo de lés-a-lés.
É quase verdade. Numa triste viagem de ida-e-volta a Lisboa quase o li todo. Tive sorte! Aquela edição do diário vinha bem recheada. Além do “dossier” sobre as agências de rating, e da “descoberta” do “capitalismo ético” patenteada por António José Seguro, havia muito mais. Para o que não chegaram as 3 horas de ir e voltar.
No entanto, estimulado pelo Samuel, aqui vou deixar registo de algo do mais aproveitável dessa leitura, apesar de alguma coisa desse aproveitamento merecesse ser… deitada para o lixo. Mas o facto é que merecerá registo antes de lhe ser dado destino.
Mas começo por duas coisas positivas, que estimo de guardar.
Uma, um artigo de opinião do Frei Bento Domingues, sobre uma Carta de Einstein a uma criança, que me apetece recortar e guardar pelo que faz pensar enquanto diálogo (em discordância mas enriquecedor) sobre ciência, filosofia, teologia.
Outra, foi aquele quarto de coluna do Miguel Esteves Cardoso, sobre a A canção, que me levou a, no regresso a casa, ouvir isto:


Recomendação

Ontem, houve mais um Prós e Contras, na RTP1. Embora canse, por vezes exaspere, vale sempre a pena ver (e, se possível, ouvir...).
Ontem, discutia-se a política do medicamento. Foi evidente a diferença de posições, por vezes o conflito de interesses, e recuei alguns anos até à quase década e meia em que estive ligado, como economista de empresa, à indústria farmacêutica, quando, em Portugal, havia indústria farmaceutica e publicações como uma coisa chamada Mensor. Adiante... que não é dessa experiência que, agora, importa falar.
Importaria falar do negócio em que se tornou o alongamento da vida humana, fruto do processo histórico e progresso social. E a dimensão negócio esteve sempre subjacente embora, de certo modo, abafado no confronto, por vezes conflituoso, entre profissões ligadas à política do medicamento. Ou seja, de parte da política de saúde, de que há um Serviço Nacional de Saúde de que se pretende fazer "tábua rasa".
Mas houve um momento, 6 minutos em muito mais de duas hora, que merece registo e recomendação. Ouça, quem tiver meios os minutos 39,11 a 45.14, em que Luisa Ramos, em nome dos "utentes", metendo o Rossio na Betesga, consegui dizer muito do que tinha de ser dito. E ouvisto!
Falando de nós, do SNS, do que somos e onde estamos. 

Altos voos - 2

Tive o privilégio de viajar de avião (pelo menos) três vezes tendo por companhia próxima (não desejada… de parte a parte, julgo eu) o dr. Mário Soares. Ou de não viajar, como foi aquela, já aqui relatada, em que Sua Excelência faltou ao embarque, em Maio ou Junho de 1974, por não se “rebaixar” a viajar numa TAP “proletarizada”, sem a primeira classe que a Swissair lhe oferecia, quer-se dizer, saindo mais caro aos cofres do Estado.
Da segunda vez, Mário Soares não tinha escolha. Foi uns tempos depois, no começo dos anos 80, e o voo era entre a cidade da Praia e o aeroporto do Sal, o único que nos levava à e trazia da República de Cabo Verde. E os TACV, que faziam essa “ponte”, só tinham espaço, e pouco, para uma classe.
Foi uma viagem inesquecível, para mim.
Era o meu regresso de uma missão de cooperação, pela OIT/BIT (quando a cooperação era, também, solidariedade e não o negócio e a satisfação de clientelas partidárias em que, depois, se tornou).
Estivera na noite anterior no Djonsa, na Fazenda, em despedida fraterna, e fizera praticamente uma “directa”. No caminho, conduzido pelo Xavier, cuja mulher também regressava nesse voo, ainda passámos pelo “plateau” e o “jeep” encheu-se com a miudagem que ele comportava, e que queria despedir-se de mim (do “artista”, como me chamavam o Eliseu, o Elísio, o Val e todos os “mini-pop”*).
Chegados ao aeroporto, feitos os despachos e as pesagens, prontos para embarcar, a primeira surpresa/emoção: os putos que não tinham cabido no “jeep” apareceram, esfalfaldos da correria com que se tinham atirado “plateau” abaixo e amarinhado até ao aeroporto. Não queriam deixar de se despedir de mim... e foram as primeiras lagrimitas a despontar.
Passado um bocado, quase na hora do embarque, aparece a segunda surpresa/emoção. Alguns amigos, que tinham ficado no Djonsa à espera que a manhã nascesse – e não tinham malas para fechar e transportar… – apareceram, com o Didi Marreco e o Zézinho, e fui acompanhado até ao avião ao som dos seus violinos na “hora di bai”.
Lá me aguentei mas, ao chegar ao meu lugar e tempo de “apertar os cintos”, desatei num pranto desabalado.
Foi aí que entrou o dr. Mário Soares. Que estava no avião, vindo da salinha dos VIPs, e observava a cena. Regressava de uma visita de atarefado “caixeiro viajante” da Internacional Socialista, para convencer o PAICV a entrar para o grupo e, decerto, se desmarcar de outras más companhias.
E então não é que a Graça, a mulher do Xavier, talvez perturbada com o meu choro e querendo acudir-me, ao colocar uma cesta de fruta na acanhada bagageira, dá com ela na cabeça do Mário Soares que, se não estava incomodado, mais incomodado ficou.
Depois, ao chegar ao Sal, perdemo-lo. Deve ter ido para a sala de espera a que, homem de todos os direitos, tinha direito e, no voo Sal-Lisboa, terá viajado lá na frente, na 1ª classe de uma TAP já “em recuperação”, sem incómodos companheiros de viagem com violinos que não eram para ele, e cestas de fruta que lhe batiam na cabeça.
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• - esta dos mini-pop será uma outra estória…

segunda-feira, junho 27, 2011

Privataria

 Do faceboook, do meu amigo (é mais que isso!) João Morais Ribeiro, fui buscar esta ex-citação (muito bem iluestrada):

«Privatize-se tudo, privatize-se o mar e o céu, privatize-se a água e o ar, privatize-se a justiça e a lei, privatize-se a nuvem que passa, privatize-se o sonho, sobretudo se for diurno e de olhos abertos. E finalmente, para florão e remate de tanto privatizar, privatizem-se os Estados, entregue-se por uma vez a exploração deles a empresas privadas, mediante concurso internacional. Aí se encontra a salvação do mundo… e, já agora, privatize-se também a puta que os pariu a todos.»

José Saramago
in Cadernos de Lanzarote – Diário III

[Por:
 A Água é de todos!
Por um referendo nacional]

A cofinanciação dos fundos comunitários

Defendendo o que é evidentemente justo. Em todas as frentes. Contra todas as hipocrisias e "ajudas".
Bem aproveitado pouco mais de um minuto, João!

Para o dia seguinte, ou um outro lado de um domingo qualquer... como o de ontem

De um "diário" que não escrevi:

Há sempre uma outra maneira de “ver as coisas”. De as sentir. De as viver.
Enquanto eu “fugia” de Caxias a chutar na bola-de-meia, num daqueles becos a que chamavam “recreio”, para que os guardas nos abriam as porta das celas, uma a uma e desfasadamente, e nos acompanhavam lá acima para apanharmos ar livre, no beco ao lado, rectângulo de cimento e muros, o Orlando Gonçalves ouvia, vagamente, os ruídos que eu fazia no meu (t)reino de liberdade.
Tínhamos sido presos no mesmo dia, no Notícias de Amadora – que era ele e a família, que, depois e também, éramos nós, seus camaradas e amigos. Eu fora lá levar “material” e, por acaso, estava lá quando a brigada o fora buscar. E, tendo-me encontrado na tipografia, decerto para reduzirem despesas – antecipando medidas agora impostas – o chefe da brigada, depois de telefonar para a sede, por conta da casa, claro, que então não havia telemóveis (e que houvesse…), também recebeu ordem para me levar.
“Olha esse… vale mais dois pássaros na gaiola que um deles a voar”…

E assim foram os nossos, do Orlando e meus, últimos dias do fascismo. Sobre que ele escreveu um livro – precisamente com o título “Caxias - Últimos Dias do Fascismo” – e eu um livro escrevi – “Porque vivi e quero contar…”.
Pois, nesse seu livro, o Orlando conta que ouvira ruídos anormais no espaço ao lado e, depois de algum esforço, se apercebera que era alguém a dar chutos numa bola. Ressabida e brincada que era a minha tendência para chutar em tudo que fosse redondo (ou aproximado), e de muito gostar de “jogar à bola”, logo terá concluído : é o Sérgio, com certeza….
E deve ter sorrido, tendo eu – e uma bola-de-meia – contribuído, de forma inocente e indirecta, para que aquele(s) recreio(s) também tivesse(m) sido de comunicação e de amizade.
Assim tivessem sido tão fáceis as comunicações entre nós, a bater com os nós dos dedos na parede comum das nossas celas contíguas, até tudo se ter transformado, no dia 25 de Abril à noite, numa conversa aos berros, e gritos de dúvida, perplexidade, alegria, entre as janelas gradeadas.

É o capitalismo (e tal como ele é!), estúpidos...

Ontem, na ida a Lisboa, beneficiando do facto, útil e muito agradável, de ter “chófera”, tive a oportunidade de fazer, do Público, comprado numa “estação de serviço”, uma leitura não habitual. E tive sorte. Tinha muita e interessante matéria.
No entanto, como sempre, é preciso escolher a informação que nos atiram à cara, aliciantemente. Seleccionar. Informar-SE.
Não é fácil. É preciso resistir à curiosidade de saber o que se passa com Vanessa Fernandes, embora o caso humano deva fazer pensar, ou começar por ai e ficar-se pela Pública, ou a fazer os sudokus.
Mas esta edição tem uma “investigação”, na verdade muito interessante, sobre as agências de ratings, e dela foi feito o editorial. Há mesmo que nela nos determos.
Já por este espaço se tratou de tal tema, até com o suporte de outros jornais e de “autores consagrados”, como num “post” de 30 de Abril [As tais coisas do "rating" (ou de notação)], em que terminava, citando Krugman:
«"Tem de se fazer alguma coisa para acabar com a natureza fundamentalmente corrupta do sistema em que o emitente da dívida é quem paga a respectiva avaliação."
E não PECs!»

Pois nesta edição de ontem do Público parece haver a intenção de se ser exaustivo e “arrumar” o tema.
Dada a característica e limitações deste espaço, apenas pouco mais se aproveita que os títulos, além do da primeira página:
  • Na página 4 – Serviços de rating custam nove milhões de euros ao Estado e a empresas -Perguntas e respostas
– em que é ouvida muita gente, com destaque para anteriores ministros da economia e das finanças portugueses.
  • Na página 6 – As agências de rating ampliaram a crise de hoje. E preparam… a crise de amanhã
– em que se faz, desde 2001, o histórico das malfeitorias e “erros” desta criação aparentemente fantasmagórica.
  • Na página 3 – Editorial – As agências de rating ou a face oculta do século XXI – A crise que vivemos é uma crise da democracia em que os mercados impõem a sua lei aos Governos eleitos.
– em que o editorialista confessa a sua perplexidade por, perante as acusações amplamente fundamentadas sobre os gravíssimos “erros” (diria crimes intencionais) cometidos nas suas notações, de consequências catastróficas, ter sido invocada (e aceite) a 1ª emenda da Constituição dos Estados Unidos, ou seja, a garantia da liberdade de expressão, pois as responsabilidades evidentes nesta explosão de crise não existiriam uma vez que as informações e relatórios, com os resultados conhecidos, não seriam mais que… opiniões.

O que perpassa, em todas as páginas e linhas lidas - e que merecem ser estudadas -, é que tudo isto é uma fatalidade, no caso português um fado!, que as agências de rating, apesar de terem criadores, que são, simultaneamente, emitentes de empréstimos e investidores em empréstimos, nas condições que elas… opinam, são entidades fantasmagóricas, obra e graça de não-se-sabe-quem para desgraça dos trabalhadores, dos povos, e benefícios incalculáveis de cada vez menos tubarões que, comidos os peixes pequenos e médios, entre si medem forças.

Nada a fazer?
Tudo a fazer!

Entre tanta outra acção, aproveitar estas informações e completá-las. Ir para além delas, ir ao fundo das coisas. De que fogem. Dizer, sem ambiguidades, que é o capitalismo – a exploração, a especulação –, a funcionar. Tal como ele é. E não pode ser de outra maneira.
É causa espanto, sorriso e (quase) susto ler na página 22 desta mesma edição do mesmo Público,  que alguém que se candidata a “lider” do Partdo Socialista, querer privilegiar o capitalismo ético!
Faltava esta do capitalismo ético...

domingo, junho 26, 2011

"Cortina"

No fim de um domingo carregado de emoções, e incapaz de começar a trabalhar (reflectir, ler, escrever, pensar), recorri a esta "cortina" para ver se passo a... "outra".
Há momentos assim, e este Cio da Terra, do Milton e do Chico, ajuda muito, não é? Para mim, é um... clássico. 


E ouçam/vejam, também, a Tetê Spíndola!

Debulhar o trigo
Recolher cada bago do trigo
Forjar no trigo o milagre do pão
e se fartar de pão

Decepar a cana
Recolher a garapa da cana
Roubar da cana a doçura do mel,
se lambuzar de mel

Afagar a terra
Conhecer os desejos da terra
Cio da terra,
propícia estação de fecundar o chão.

Na morte de Nápoles Guerra

Fomos a Lisboa. Para nos despedirmos do José Luís Nápoles Guerra e dar um muito sentido abraço de solidariedade e amizade à família e, em particular, à Maria Amélia.
É quando faltam palavras e quando sobram palavras. Porque não chegarão as palavras para tudo dizer, porque todas, ou algumas, nada dirão do que – ou como – se quer dizer.
E terão mesmo que ser escritas algumas palavras? Sei lá… Elas impõem-se(-me).
O Nápoles foi um homem diferente. Como todos somos. Embora uns o queiram mostrar, e outros esconder. O Nápoles, não. Foi!, foi diferente por tão naturalmente verdadeiro ter sido. Sempre presente e sempre discreto. Nunca (se) mostrando, nunca (se) recusando..
Chamávamos-lhe "militar". E ele ria. Chamamos-lhe militar. Coronel que quis ser sempre capitão. De Abril. No melhor que esta designação, capitão de Abril, possa ter – e historicamente tem, ou terá –, e de que alguns fazem alarde e a que dão mau uso e exemplo. Bem ao contrário de Nápoles Guerra.
A vida de Nápoles Guerra foi de luta determinada e serena. Assim o encontrou a morte. Determinado e sereno. A lutar. Pela vida.
E foi dura, muito dura, esta sua última luta. Tão dura que se pode dizer, sem hesitar, que foi ilustração do que ele era. Nunca se dando por vencido. Apagando-se porque era o tempo de. Sereno e determinado. Com a Maria Amélia ao lado, a companheira de mais de meio século, os dois que sempre se mostraram como um casal em que nunca um parecia estar à sombra do outro, em que cada um era o que era e o que os dois eram.
E, embora doa, a vida continua, os dois continuados pelos netos, que perderam a presença física do avô mas guardam o exemplo das histórias por ele vividas e por ele contadas, as histórias de verdade e luta da sua vida simples, determinada e serena, e que fazem com que o lembrem como o “seu herói”. Que nunca quis ser.
Obrigado, José Luís Nápoles Guerra.

Para um domingo como este, ou outro qualquer

De um diário que não escrevi:

24 de Abril
Ao acordar, tive uma ideia.
Em vez de um par de meias, escolhi três, isto é, três meias ou um par e meio. As duas meias que calcei e uma outra, a do par mais usado, cujo ficou desirmanado.
Com arte e ofício relembrados, enchi-a com páginas do jornal da véspera. Compactei muito bem, dei-lhe forma e tinha nas mãos uma bola-de-meia. Das boas. Das antigas.
Quando o guarda me veio buscar para o recreio, lá em cima, nos terraços compartimentados sobre as celas, estava preparado.
Subi as escadas e… ia contente (pode dizer-se isto?).
Depois de ficar sozinho (mas vigiado!) para aquele curto tempo de ar livre (!) no rectângulo de cimento de um beco rodeado de altos muros, fiz umas corridas em roda, de aquecimento, antes de pôr a bola-de-meia a saltar.
Foi assim que me escapei dali, de Caxias. Enquanto ensaiava fintas e passes malabares, enquanto dava toques sem deixar a bola cair no chão, enquanto chutava contra uma parede como se nesta estivesse desenhada uma baliza, enquanto afinava a pontaria dos remates.
E assim se passou aquele tempo… livre, livre.
Depressa o guarda me fez voltar à cela.
Para o tempo de espera. Para esperar o tempo de interrogatório. De tortura. Para esperar o dia seguinte.
Mas não foi esse o tempo do dia seguinte.
O dia seguinte que chegou a Portugal e a Caxias foi 25 de Abril. De 1974. 

sábado, junho 25, 2011

Sessão sobre a situação na Líbia

Ângelo Alves no facebook:

CT Vitória cheio para condenar guerra de agressão ao povo Líbio

Mais de cem pessoas participaram ontem numa acção de debate e esclarecimento contra a agressão imperialista à Líbia, organizada pelo PCP.
O Debate, organizado pela Organização Regional de Lisboa do PCP e presidido por Paula Henriques, membro do CC e da DORL, teve como oradores principais Manuela Bernardino, membro do Secretariado do Comité Central, responsável das relações internacionais do PCP e Silas Cerqueira, activista e fundador do movimento da paz português e de solidariedade com os povos em luta, recentemente regressado de Tripoli (capital Líbia) onde participou numa conferência internacional de solidariedade com o povo Líbio e contra agressão imperialista.
Com o salão do Centro de Trabalho Vitória cheio com cerca de 110 militantes do PCP, personalidades independentes e activistas da luta pela paz e de solidariedade com a luta dos povos, o debate foi uma viva denúncia das dramáticas consequências da guerra desencadeada pelos EUA, França, Grã-Bretanha e NATO contra o povo Líbio e uma forte afirmação da determinação em prosseguir e intensificar a luta pela paz, o fim da ingerência externa e dos bombardeamentos.
Bombardeamentos que, na opinião dos dois oradores e de vários participantes do debate que usaram da palavra, são a mais evidente prova da falsidade e hipocrisia dos pretextos invocados pelas potências agressoras para desencadear os ataques. Fazendo o paralelismo entre a guerra de agressão à Líbia e outras guerras imperialistas como a guerra do Afeganistão, do Iraque ou da Jugoslávia, os participantes deploraram o papel do Conselho de Segurança da ONU, que por via da aprovação das Resoluções 1970 e 1973, tomou uma decisão que nas palavras de Silas Cerqueira é ilegítima, ilegal e criminosa.
Chamando a atenção para os perigos decorrentes da continuação da guerra, não ignorando problemas sociais e políticos existentes, mas afirmando o direito dos povos de decidirem pelas suas mãos os seus próprios destinos, os participantes denunciaram as reais causas desta guerra de agressão: o controlo de recursos naturais e energéticos e o domínio geoestratégico no continente africano e numa região rica em recursos naturais como o petróleo e gás natural, chave para as rotas energéticas e de transporte e importantíssima do ponto de vista geoestratégico – como o demonstra aliás a possibilidade uma das consequências desta guerra de agressão poder ser a divisão do país e a instalação ali do AFRICOM, como denunciou Manuela Bernardino.
Causas que, como foi afirmado, são indissociáveis da profunda crise do capitalismo e da resposta de força do imperialismo a essa mesma crise, bem com da tentativa das principais potências imperialistas de contrariar e conter as lutas populares que no Mundo Árabe, e independentemente do seu desfecho, abalaram o sistema de domínio imperialista na região.
Denunciando vários exemplos e episódios da vasta campanha mediática de desinformação e mentira posta em marcha para “legitimar” a agressão à Líbia os participantes enfatizaram a necessidade de prosseguir e intensificar o esclarecimento através de acções organizadas pelo PCP e pelos movimentos unitários e de construir a mais ampla unidade em torno da luta pela paz na região, pelo fim imediato da agressão à Líbia e pelo denúncia de outras manobras de destabilização e ingerência externa em curso, como é o caso da Síria.
No final do Debate Manuela Bernardino afirmou os valores do internacionalismo e da consciência que impele os comunistas a lutar e a demonstrar a sua solidariedade para com os povos vítimas da agressão e opressão imperialistas, terminando a sua intervenção final com uma citação de Silas Cerqueira que, ao justificar a sua decisão de se deslocar a Tripoli num cenário já de guerra, simplesmente afirmou: “tinha de ser, tinha de ir”.

Altos voos

1. Demagógicos
Tornou-se motivo político relevantíssimo o facto de Passos Coelho ter viajado para Bruxelas, na TAP e em classe económica.
O que dá bem a medida de duas tristes verificações:
(1) Da descarada vocação demagógica com que este governo começa;
(2) da pobreza fransciscana (do ponto de vista político-cultural) de uma comunicação social que se/nos entretém a glosar (gozando-nos?) este mote.



2. “Patrióticos”
Em 1974, logo em Maio, a TAP, com a crescente influência da comissão de trabalhadores e dos sindicatos, acabou com as duas classes. Tendo de ir a Genève, em missão do Ministério do Trabalho, entrei em contacto com a delegação da nossa transportadora aérea e, para o regresso, fui informado, na véspera, que iria ter a companhia do dr. Mário Soares.
Encontrando-me na fila de embarque, e tendo vindo cumprimentar-me quem me dera essa informação, perguntei-lhe, de passagem, “então?… e o dr. Mário Soares?”. Com ar contrafeito e escandalizado, deixou escapar o desabafo “ora… nem imagina… vai regressar no voo da Swissair… e sabe porquê? Porque a TAP não tem 1ª classe!...”

Pois!

Muito boa!... memória

De António Filipe, no facebook:
Ouvimos hoje (24/06/2011) Passos Coelho afirmar que o Conselho Europeu não podia ter corrido melhor para Portugal.
Proponho um exercício de memória:
Alguém se lembra de algum Conselho Europeu em que algum Primeiro Ministro tenha dito que não correu bem para Portugal?

Um jogo "da glória" e uma luta inglória?

No chamado "jogo da glória" (e noutros parecidos) volta-se muita vez à "casa zero". Mas esse retorno é ilusório. O "jogador" já não o mesmo e a "casa zero", embora aparentemente seja a mesma, já não o é porque, tanto para o "jogador" como para a "casa", passou tempo, essa dimensão em inexorável em mudança permanente, porque se alteraram  as condições intrínsecas do jogador e da "casa" e as condições relativas aos outros ´"jogadores" e às outras "casas". Assim nos jogos, assim na vida, no processo histórico.
Pelo que, voltarmos a descobrir caminhos marítimos, ao PREC, a ter estaleiros navais e uma Siderurgia Nacional, à possibilidade de fazer um referendo sobre a adesão às Comunidades Europeias ou um outro sobre a entrada na moeda única, regressarmos ao escudo como ele era, são hipóteses ilusórias, serão jogos "inglórios".
Mas retirar-se daqui que a luta contra o que nos trouxe a esta "casa"/situação é inglória seria errado e dramático. Tal como o seria ignorar as condições em que se saiu da "casa zero", quando a ela pode parecer estar-se a voltar. As causas têm de ser lembradas, as lições não podem ser esquecidas!
Elucubrava assim, a partir do folhear da revista Portugal e a CE, nº 26/27 de Jan./Jun. de 1997. Fez-se, nesse já longínquo tempo (mas tão recente!), o que havia a fazer. Lutou-se contra o que seria a passagem a outras "casas" neste tão pouco glorioso caminho, e não se conseguiu, não se teve força para impedir o avanço com as consequências previstas e prevenidas nos planos económico, social, também cultural.
Mas não é pela impossibilidade de voltar à "casa zero", e começar de novo como se hoje fosse igual a ontem, que se pode menosprezar ou desvalorizar os ensinamentos desse momento da luta. Até porque a luta de hoje é continuidade da de ontem.
Por isso, reler esta revista que tenho entre mãos não é memória, passadismo. É, tem de ser!, estudo e estímulo para que a luta de hoje seja escorada nas lições que só o passado pode dar.
O enunciado das 15 perguntas com resposta (e o seu "sumo") de há mais de 14 anos tem a maior actualidade e pertinência. Não para se dizer, com ar triste e nostálgico, "vêem como tínhamos razão..." mas para dar razões e força (ou força e razões) para, hoje, lutar contra o caminho em que se quer prosseguir, nas condições de hoje ao serviço dos mesmos interesses de ontem e de ante-ontem. Melhor se conhecendo o funcionamento do capitalismo na sua contemporânea fase. Melhor lutando.



  

sexta-feira, junho 24, 2011

Pretextos

Posso afastar-me deste local de trabalho que os pré-textos vão aparecendo e acumulando-se para tratamento posterior. E são tantos que muitos se perdem.
Uma das fontes mais pródigas é a do rádio do carro. Há sempre mais conversa que música. E é cada conversa...
Ainda agora, ao regressar da festa de encerramento do ano lectivo da Universidade Sénior, e da passagem pela Assembleia Municipal, onde assisti (da assistência!) a parte da sessão, em que a representação do PCP eleita nas listas da CDU estava bem entregue, ouvi debater o tema das eleições no PS e os perfis e as hipóteses dos dois candidatos.
Cheguei a casa sem incidentes (admiro-me sempre!) e fui à estante buscar um livro que me serviu de base para o recomeço das aulas no ISEG, quando voltei do Parlamento Europeu em 1999, e que terá sido um dos causadores do meu prematuro abandono daquela docência. É que fui inegrado numa equipa em que tal livro - Introdução à política económica, de Jacques Généreux - era básico... e eu não me consegui adaptar. Pelo que rumei a qui à aldeia e, tendo sido convidado para ir "dar economia" no Politécnico de Tomar por lá andei, com muito gosto... até que o Ministério da Educação resolveu que o reformado que eu era não podia acumular com "dar aulas". Isto é, parece que eu seria um obstáculo à formação naquela escola de um quadro de docentes nativos. Coisas estranhas...
Ainda cheguei a respingar (além de ter completado o semestre como "conferencista"), mas o regresso ao Parlamento Europeu em 2004, por necessidade e opção partidária, encerrou de vez a minha docência formal.
Porque estou a lembrar isto? Porque, como as cerejas, o Magno a falar do Seguro e do Assis me lembrou o Généreux, e este me lembrou a minha "indocência".
É que o tal livro, começando por abordar a políticia económica com muito aproveitável pedagogia, às tantas, no capítulo 5 da Parte I - Os objectivos políticos - trata a política como um qualquer outro mercado, um mercado em que a mercadoria é o voto.
Haverá, decerto, quem ache muito natural, mas foi-me insuportável a convivência com o seguinte sumário:
5. Os objectivos politicos
5.1. Limites da abordagem tradicional
5.1.1. A dimensão política dos problemas económicos
5.1.2. As motivações dos homens políticos 
a) A impossível identificação das preferências colectivas
b) Os objectivos dos decisores políticos
5.2. A lógica da acção política
5.2.1. O mercado político
a) A oferta política
b) A procura política
c) o equilíbrio do mercado político
5.2.2. Uma nova análise da política económica
a) o que é uma política eficaz?
b)A globalização dos problemas
c) A preferência pelas políticas conjunturais
d) O peso dos grupos de pressão mais eficazes

Ao percorrer este livro, sumário e estas páginas, que terão muitos "parentes chegados" no que serve para formar "economistas" percebe-se a "onda" de separação do político do social, como, em política económica, tudo se reduz a mercado, com regras simplistas de funcionamento, e com a mercadoria-força de trabalho a ter um tratamento igual ao de qualquer outra mercadoria-factor de produção.
No entanto, se há política económica (e políticas económicas) - que não se reduz(em) à(s) que, "généreusement", inoculam nos jovens formandos em economia - é porque há, também, economia política enquanto ciência social. Com teoria do valor, mais-valia, classes sociais, trabalhadores, burgueses (às vezes malteses), exploração, especulação  e essas coisas.


Para uma galeria de ilustrações (e não só...)

De uma colecção de 5 volumes com os documentos de uma Conferência do PCP - Portugal e o Mercado Comum - realizada no Porto, a 31 de Maio de 1980:

1.- Efeitos Globais da adesão à CEE e alternativa
2.- Agricultura
3.- Pesca, Comércio, Transportes, Turismo
4.-Indústria
5.- Intervenção de Álvaro Cunhal * Conclusões Gerais

Nº 26/27, Jan./Jun. 1997

Nota do Director
Editorial
Seriedade Política e Propaganda
O Caminho para a Moeda Única
Perguntas com resposta (15)
O PCP contra a Moeda Única
Os "amigos" do Euro

quinta-feira, junho 23, 2011

Garantias...

Passos Coelho garantiu a Durão Barroso que Portugal está empenhado em cumprir acordo
23.06.2011 12:56
"Porreiro, pá... mas já cá se sabia!"

A metáfora da metáfora

Texto recuperado para hoje, e de que deveria alterar o título e subtítulo´(e também o texto), neste dia de Conselho Europeu em Bruxelas, para A metáfora da metáfora ou a política ao nível das massas e As andorinhas e o amor em matéria de política, tendo sempre presente a luta de classes. Mas vai assim... sem mudar nada. Metaforicamente.

A metáfora da metáfora
As andorinhas e o amor em matéria de ensino

Adormeci tarde, sobre uma página deste livro (Chagrin d'école, de Daniel Pennac).
Acordei apressado em o continuar. Preparo-me para saltar da cama, mas uma subtil barulheira sustém-me. Há um desaustinado pipilar à volta da casa. Piares e mais piares, ao mesmo tempo intensos, constantes e contidos.
Ah! pois é… é a partida das andorinhas. Todos os anos, por esta altura, elas marcam encontro nos fios da electricidade. Campos e bordas das estradas cobrem-se de despedidas, como numa imagem habitual, de fotógrafo amador.
Preparam-se para migrar. É a euforia dos reencontros e das partidas. As que ainda voltejam no céu pedem autorização para alinharem com aquelas já pousadas nos seus lugares nos fios, excitadas pelo desejo de horizonte.
“Arrumem-se, vá, toca a voar!”
“Já vou, já voo!”
Há um frenesim de voos de chegada, de voos de falsas partidas, de "tudo a postos?, aos seus lugares".
Uma agitação que vem do norte, em batalhões hitchcockianos, rumo ao sul.
E o livro conta o que se ouve, e sente, e vê. E mais... 
Mais ou menos assim:

«(...) essa é precisamente a orientação do nosso quarto: norte, sul.
Uma clarabóia na parede virada a norte, uma dupla janela na parede virada a sul.
E todos os anos o mesmo drama: perturbadas pela transparência dessas aberturas envidraçadas em frente uma da outra, um bom par de andorinhas atiram-se de cabeça contra a clarabóia.
Por isso, nada de escrita esta manhã. Abro a clarabóia norte e a dupla janela sul, e mergulho na nossa cama. E ali ficamos nós, ocupados por uma manhã a observar esquadrilhas de andorinhas a atravessarem este nosso esconderijo, de súbito silenciosas, intimidadas talvez por estes dois corpos alongados que as vêem passar em revoadas.
Só que, de um lado e de outro da dupla janela, ficam dois estreitos e verticais pedaços de parede. O espaço aberto é largo entre as duas molduras das janelas, que dão passagem à vontade a todos os pássaros do céu… mas nunca falha!, há sempre três ou quatro esparvoadas que chocam com os pedaços de parede aos lados da janela. São as desalinhadas, as que não seguem o caminho direito e aberto. As que passam ao lado, batendo as asas.
Poc! Tombam no tapete.
Então, um de nós dois levanta-se, pega na aturdida andorinha na concha da mão – não pesam nada, esses ossos cheios de ar -, espera que ela acorde, e atira-a pelos ares para se juntar às companheiras. A ressuscitada, ainda um pouco grogue, ziguezagueia no espaço reencontrado, depois pica a fundo para o sul, e desaparece no seu futuro.
E pronto!, a minha metáfora vale o que vale mas é a isto que se assemelha o amor em matéria de ensino, quando os nossos alunos voam como pássaros loucos:

fazer sair do coma escolar
uma caterva de desorientadas “andorinhas”.

Nem sempre se consegue, falha-se por vezes no apontar do rumo, algumas delas não acordam, ficam no tapete ou partem o pescoço numa vidraça mais adiante. E permanecem nas nossas consciências como buracos de remorsos onde repousam as andorinhas mortas no fundo do nosso jardim.
Mas temos sempre de tentar!
Nós temos tentado. Eles são os nossos alunos.»

E nós, nós somos os que com eles aprendemos.


Hoje, 23 de Junho

Hoje, dia de Conselho Europeu, ou me engano muito ou vai ser um dia daqueles... importantes.
Não por ser "dia feriado" (e, para muitos, "dia santo").
Não por Passos Coelho ser a cara nova que Portugal apresenta para a mesma obediência servil às mesmas políticas, não por se dever esperar grandes decisões, mas porque se vão confrontar, entre os mandantes nesta dita "Europa" - ou entre os "grandes políticos" mandatados pelos grandes financeiros (e não pelos povos que os elegeram para os representarem!) -, linhas de ataque, e se vão medir forças. Em €uros, US$ e noutras moedas que, aparentemente menores, estão na sombra e a assombrarem.
Há, sobretudo, que saber ler na entrelinhas, e procurar formas de comunicar para interessar os mais interessados, os trabalhadores e os povos de que são parte... naquilo que mais lhes interessa: qual o papel que lhes está a ser reservado nesta fase de processo histórico em que o capitalismo estrebucha.

quarta-feira, junho 22, 2011

Salve-se quem (o capital financeiro) puder... ou bem usar o poder

Hoje, no ávante!, mais um episódio do "serviço público" de informação que Jorge Cadima nos vai prestando:

A crise dos centros mundiais do capitalismo agrava-se rapidamente. O desastre que se avizinha, e a incapacidade do imperialismo o evitar, acirra todas as contradições e rivalidades, num «jogo do empurra» de consequências imprevisíveis.

A zona euro está à beira da explosão, com a grande finança anglo-saxónica à espreita. A economia grega afunda-se após um ano de pilhagem da troika, e a Grécia tem hoje a mais baixa notação das agências de rating para qualquer país do mundo (Bloomberg, 19/6). A banca inglesa foge da zona euro (Telegraph, 18/6). Cresce a notável contestação nas ruas do povo grego. No início de Junho o Ministro das Finanças alemão escreveu à troika «advertindo para uma possível bancarrota da Grécia e admitindo que o actual plano de resgate fracassou. Como alternativa, apela para uma reestruturação de facto» (Der Spiegel, 8/6). A proposta de Schäuble envolveria um pequeno sacrifício para a banca privada: aos «investidores» seria «pedido que trocassem todos os títulos de dívida grega na sua posse por outros cujos prazos seriam alargados em sete anos. Os investidores receberiam o seu dinheiro mais tarde, mas recebê-lo-iam na totalidade». Em contrapartida, seriam intensificadas as privatizações, como por exemplo a empresa energética grega DEI «que teve lucros de 950 milhões de euros em 2010» (Spiegel, 7/6). O Ministro das Finanças irlandês aproveitou para «reavivar um pedido que alguns dos principais detentores de títulos [de dívida irlandesa] aceitassem perdas, a fim de minorar os custos do resgate da banca irlandesa» (Financial Times, 16/6), no qual o governo já injectou 34,7 mil milhões de euros (Bloomberg, 16/6). Estas propostas desencadearam uma tempestade furiosa. O chefe da eurozona, Jean-Claude Juncker, afirmou que «impôr prejuízos aos investidores poderia desencadear uma versão europeia do colapso bancário da Lehman Brothers […] A proposta alemã é perigosa» (Guardian, 17/6). Mostrando quem realmente manda, acrescentou: «se fizermos algo que seja rejeitado pelo BCE, pelas agências de rating e portanto pelos mercados financeiros, arriscamo-nos a incendiar a zona euro» (Bloomberg, 19/6). A Ministra das Finanças francesa Lagarde concordou. Zapatero «espera que os investidores contribuam de forma voluntária» (Bloomberg, 19/6). O vice-presidente do BCE Vítor Constâncio, que enquanto Presidente do Banco de Portugal ganhava 250 mil euros por ano, mais do dobro do seu congénere dos EUA (ionline, 21/5/09), repetiu: «somos contra qualquer tipo de incumprimento com 'corte de cabelo'» (Spiegel, 16/6), o que em linguagem de gente quer dizer que não se pode exigir um único euro aos banqueiros. Os cortes de cabelo aceitáveis para Constâncio são os dos trabalhadores, a quem quis sempre baixar os salários. O novo patrão americano do FMI (Lipsky) ameaçou cortar os financiamentos (Guardian, 17/6). Sarkozy foi mais longe, ameaçando que «sem o euro não há Europa e sem Europa não é possível a paz e a segurança» (BBC, 17/6). A Alemanha recuou. Falta saber até que ponto é que a corda entre o colosso da Europa capitalista e os seus directos competidores na zona euro pode esticar. A imprensa anglo-saxónica repete apelos para que a Alemanha saia do euro (Telegraph, 18/6). Mas os EUA são uma bomba-relógio ainda maior que a zona euro.

O Der Spiegel (8/6) levanta a ponta do véu de tanta resistência: «se se quer obrigar o sector privado a custear uma parte dos resgates, tal terá de acontecer dentro em breve. […] Já hoje um montante considerável da dívida da Grécia foi transferida para o público. […] Mais cedo ou mais tarde, os investidores privados ter-se-ão despojado totalmente dos seus investimentos de alto risco na Grécia». É este o verdadeiro objectivo dos «planos de resgate» da troika. Resgate para a banca, afundamento para os povos e os países. É para aqui que vai o dinheiro dos nossos salários e reformas. O grande capital financeiro está a pôr-se a salvo, antes do inevitável colapso que gerou. Hoje, lutar é a única alternativa ao desastre para o qual o capitalismo «triunfante» nos conduziu. Ou o capital financeiro, ou os povos. Há cada vez menos alternativas de compromisso.

Reflexões lentas – sobre a saída do euro, a entrevista do Prof. João Ferreira do Amaral

A entrevista do Prof. João Ferreira do Amaral, no Diário de Notícias de 20 de Junho, tem grande interesse, e justifica a maior atenção.
Com base numa reflexão que vem fazendo há muitos anos, não motivada ou condicionada por ventos, marés ou conjunturas, este economista, com um CV que, a partir de critérios objectivos (embora nuns casos sobre-valorizados, noutros ignorados), lhe concede grande credibilidade, diz o que pensa da situação económica que se está a viver, em Portugal e não só, e prevê e previne, como nunca deixou de o fazer.
João Ferreira do Amaral foi uma voz que, durante a década de 90, apesar de nesta ter estado em funções de consultor e assessor de presidentes da República, alertou para as condições em que se estava a criar a moeda única, ao serviço de que interesses, e para as consequências desastrosas que resultariam para a economia portuguesa da sua adopção. Fora da área do PCP – com o sentido de classe que nos define e com base no fundamento técnico em que nos escorámos –, JFA destoou do consenso laudatório e enganador sobre as doses de mel e canela que iria forjar o nosso futuro com a entrada para o euro.
Mais autorizada é por isso a opinião de JFA quando vem dizer, sem fazer alarde estulto do que advertiu atempadamente, que tinha razão (e acrescento, sem qualquer pejo: que tínhamos razão).
A sua posição política ideológica nunca se afirmou coincidente com a nossa, mas nunca recusou conversar connosco, condicionar as suas opiniões coincidentes com as nossas por aquilo em que connosco não coincidia. Por isso mesmo, ganha muito maior importância, para nós, o que afirma. E se a entrevista merece ser toda lida e estudado o que para além dela vai, aqui apenas reproduzo os títulos, que são da escolha da redacção do DN, mas, aqui, relevam o essencial das suas posições:

«Portugal deve usar fundo da “troika” como ajuda à saída do euro»
«Descida da TSU é um disparate total»
«Espero que não se ajustem à bruta os preços dos transportes»

Naturalmente que, também nesta entrevista, não coincido em tudo com JFA. A uma pergunta crucial (“podemos fazer isso sozinhos?”) parece-me que a resposta passa ao lado ao referir a necessidade de apoio (de quem?), quando o que se considera necessário e urgente é que os países sujeitos a este brutal ataque dos “mercados” concertem posições, pois só assim terão força (periférica) face a um centro super-integrado e esmagador.
Como é evidente, estou a falar numa perspectiva que se pretende marxista e não é essa a matriz do pensamento de JFA. Mas é um pensamento, uma reflexão, também uma abordagem técnica, que, pela sua seriedade, merece atenção. E nos ajuda.