segunda-feira, abril 02, 2018

Ah! aquilo da cultura...


Bom dia! Do Expresso curto:


Pedro Santos Guerreiro
Diretor

O chá das cinco da manhã

2 de Abril de 2018

(…)
Anda o país a celebrar o baixo défice orçamental de 2017 e o ministro das Finanças a exultar, como fez em entrevista ao Expresso, que ele “reflete o extraordinário estado da saúde da economia portuguesa”. E depois isto. “Isto?” Isto da Cultura. “Ah, aquilo”. Sim, isto próximo que parece aquilo distante a quem vê a Cultura como chá das cinco da manhã, que é quando estão a dormir.

“Somos todos Centeno” é o autocolante de automóvel do ano para os ministros. O pai da frase foi Adalberto Campos Fernandes, da Saúde, mas tem outros cunhados. Como o ministro da Cultura, que como todos os antecessores mendiga aumentos anuais num orçamento sempre miserável. O primeiro-ministro bem disse (e disse bem) no passado que a Cultura está em toda a governação, está em toda a economia e política, está na vida do país porque sem ela o país não é bem um país vivo. Está em todo o lado, sim. Só não está no Orçamento.

“Isto da Cultura” são as críticas em peso do setor artístico ao governo, depois de terem sido divulgados os resultados provisórios do Concurso ao Programa de Apoio Sustentado 2018-2021 da Direção-Geral das Artes, que financia grande parte da atividade artística em Portugal. Atores, encenadores e programadores exigem uma reunião com o primeiro-ministro e o PSD fala em “fracasso da política cultural”. Não tarda leremos colunistas e ouviremos economistas a falar da casta da “subsídio-dependência” que “tem de ser posta na ordem”, nessa espécie de ímpeto disciplinador que nunca justifica o concreto e se embaraça no geral.

Talvez esse seja o maior retrocesso deste processo: em face da retirada de apoios a companhias que os recebiam há anos, e que sem eles podem fechar, o debate público andou 15 anos para trás e centrou-se exclusivamente no dinheiro distribuído e não distribuído. Pensávamos já ter ultrapassado a exiguidade febril do discurso da “subsídio-dependência”, mas não se ouviu ninguém explicar a política para a cultura nem explicar para que ela serve e deve servir. Digam-me um político que saiba explica a cultura ao país, eu não ouvi nenhum.

O ministro da Cultura não disse nada e desta vez disse nada sem falar. O secretário de Estado Miguel Honrado tentou explicar que dar oportunidades a novos criadores implica deixar de apoiar outros, não justificando as escolhas. Algumas estarão certas, outras erradas, mas a quadrícula parece ser “não sabe/não responde”, pois não conseguimos perceber se faz sentido ou não deixar de apoiar esta ou aquela companhia, porque a explicação infalível é de que “não há dinheiro”. Sim, são todos Centeno.

Com uma nova geração muito mais cosmopolita e mais culta (infelizmente, não mais lida), a cultura entrou nos hábitos de públicos mais vastos e na política central de várias cidades do país. Isso gerou não apenas mais projetos, como “cidades-projeto”, como mais “eventos” que concentram pessoas e paradoxalmente as desviam do que não é ou parece ser pop ou trendy. Ao Estado cabe preparar terreno para os criadores, claro. O governo não deve sequer promover cultura, deve ser cultura. E, sobretudo, não ser a vírgula de um orçamento nem a casa decimal da atenção. Afinal, isto interessa a quem? “Isto?” Isto da Cultura. “Ah, aquilo”.
 (...)

Ah!...
 e aquela coisa do 
"carácter endémico do endividamento  na saúde"?;
e aqueloutra da
"recuperação  do investimento público"
com o peso no PIB em 1,8% 
apenas  superior aos 1,6% de 2016?

1 comentário:

Justine disse...

Só coisas irrelevantes!!