sábado, março 23, 2013

Falemos sério, muito seriamente!



A 5 Abril de 2011, nas vésperas do Governo PS/Sócrates pedir a intervenção externa do FMI e da União Europeia, o PCP foi pioneiro na apresentação da proposta da renegociação da dívida pública. Entretanto a indispensabilidade da renegociação da dívida passou a ser reconhecida por amplos sectores da sociedade portuguesa, incluindo muitos dos que criticaram originariamente a proposta do PCP. Hoje, mais do que nunca, perante a dimensão trágica da concretização do pacto de agressão, a proposta política que o PCP apresentou ao País há quase dois anos confirma-se como uma opção indispensável para travar o caminho do desastre.
1. Como o PCP sucessivamente denunciou, o endividamento externo líquido do País é uma das consequências mais visíveis da política de direita que PS, PSD e CDS impuseram nos últimos 37 anos. Uma dívida pública e privada colossal, em que a dívida privada é maior do que a dívida pública e que é inseparável de um processo de desindustrialização, do abandono da produção nacional, das privatizações, da submissão às imposições da UE (incluindo a opção pelo euro) e do grande capital. Uma dívida que resultou, não de um povo «a viver acima das suas possibilidades» ou do investimento do Estado na saúde e na educação, mas de um processo de aprofundamento da dependência externa e de subordinação aos interesses dos grupos monopolistas.
2. Com o endividamento do País ganharam aqueles que nos impuseram a liquidação do aparelho produtivo – como a França e a Alemanha – e a quem passámos a comprar aquilo que o País deixou de produzir; ganharam e ganham os bancos da Alemanha, da França, e também de Portugal, que de forma escandalosa se financiam junto do BCE a taxas de juro de cerca de 1%, para depois adquirirem dívida pública cobrando taxas de 6%, 7% e até 8% ao Estado português; ganharam os banqueiros, a quem o Estado limpou prejuízos (como no BPP e no BPN), entregou milhares de milhões (como no BCP; no BPI; ou no BANIF) e adiantou garantias, transformando dívida privada em dívida pública.
3. A opção de PS, PSD e CDS de abrirem a porta à intervenção externa da troika, a pretexto de uma dita bancarrota, tal como o PCP denunciou, não resolveu nem o problema da dívida nem do défice. A cada dia que passa confirma-se o desastre económico e social a que conduz a política do Governo PSD/CDS. Os trabalhadores e o povo viram sistematicamente atacados os seus direitos, os seus salários, as suas reformas e degradar-se de uma forma brutal as suas condições de vida. Semana após semana, foram e são avançadas mais medidas contra os interesses da generalidade dos portugueses, apresentadas de cada vez como inevitáveis e definitivas e logo agravadas.
As consequências desta política na sociedade portuguesa acumulam-se: um desemprego real a caminho de um milhão e 500 mil desempregados; uma recessão prolongada que as próprias previsões da troika apontam já para 2,3% em 2013 e para a sua continuação em 2014; uma destruição acelerada de micro, pequenas e médias empresas; a degradação acentuada de serviços públicos em sectores essenciais; o aumento da exploração; o aumento da pobreza.
De facto, comprova-se que, tal como o PCP sempre afirmou, a consolidação das contas públicas e a redução da dívida pública tem de ser obtida com o crescimento económico e não se atingirá com uma política altamente recessiva como é a inscrita no pacto de agressão. O anúncio de que o défice das contas públicas continuará acima dos 6% e de que a dívida pública ultrapassa já 122% do PIB são disso bem demonstrativos.
4. A gravidade da situação actual impõe que o PCP insista numa política alternativa ao pacto de agressão. Uma alternativa que passa por encetar a renegociação de uma dívida que mostra ser impagável e em nome da qual se continua a impor sacrifícios inaceitáveis aos trabalhadores e ao povo. Uma opção que não sendo original – recorde-se o processo desenvolvido pela Alemanha há 50 anos que indexou o serviço da dívida contraída no quadro da II Guerra Mundial a um valor de 5% sobre as exportações – se adequa à realidade portuguesa.
Renegociar a dívida é indispensável para garantir a criação de condições para o crescimento, para o aumento da produção nacional, para o aumento do investimento e a melhoria dos salários, pensões e reformas e em geral do poder de compra dos trabalhadores e das populações. Renegociar a dívida é pôr fim à imposição de juros agiotas (7330 milhões de euros em 2012 – mais do que a despesa com educação ou com o Serviço Nacional de Saúde) que retiram ao país recursos essenciais. Renegociar a dívida é apurar e recusar pagar uma parte que é ilegítima. Renegociar a dívida é garantir afinal o seu pagamento, que não será possível sem a criação de mais riqueza.
5. O processo de renegociação que o PCP propõe envolve, entre outras, as seguintes medidas:
(a) Determinação completa e rigorosa da dimensão da dívida, identificando a sua origem, natureza e tipo de credores bem como a avaliação da sua previsível evolução, com e sem renegociação;
(b) Fixação de um serviço de dívida que, após a renegociação dos seus montantes e valores legítimos, do alargamento dos respetivos prazos de pagamento e da adequação das taxas de juro, seja compatível com um crescimento económico pelo menos da ordem dos 3%, atribuindo um período de carência e indexando o valor dos encargos anuais com esse serviço da dívida a uma percentagem previamente fixada das exportações anuais do País;
(c) Salvaguarda plena da parte da dívida correspondente aos pequenos aforradores – certificados de aforro e certificados do Tesouro e daquela que está na posse do sector público administrativo e empresarial do Estado, que não serão assim objeto da renegociação;
(d) Reconsideração dos prazos, das taxas e dos objetivos a prever no âmbito do empréstimo do FMI e da UE, recusando qualquer tipo de ingerências ou imposições políticas condicionantes da soberania própria do Estado;
(e) Diversificação das fontes de financiamento do Estado e a adoção de políticas de «renacionalização» dessa dívida;
(f) Reavaliação urgente de todas as PPP, ferroviárias, rodoviárias e na Saúde, visando a sua renegociação ou anulação, com redução substancial dos respetivos encargos;
(g) A adopção de uma política virada para o crescimento económico onde a defesa e promoção da produção nacional assuma um papel central – produzir cada vez mais para dever cada vez menos. Com medidas que visem o reforço do investimento público, a aposta na produção de bens transaccionáveis e por um quadro excepcional de controlo da entrada de mercadorias em Portugal, visando a substituição de importações.
(h) A convergência de ações destinadas a barrar a espiral especulativa e a construir uma resposta conjunta à situação de estrangulamento económico e social dos países que enfrentam problemas similares de dívida soberana – Grécia, Irlanda, Espanha, Itália, Chipre, etc.
6. O caminho da renegociação da dívida pública não é uma solução fácil, livre de dificuldades e constrangimentos, mas é aquela que, em vez de defender os interesses do capital, assume o compromisso com as necessidades dos trabalhadores, do povo e do País. Longe de constituir uma medida isolada, a renegociação da dívida pública é uma opção de ruptura e mudança, uma opção patriótica e de esquerda, tanto mais necessária quanto inadiável e cuja concretização é inseparável da ampliação da luta de massas e do reforço do PCP.

2 comentários:

Graciete Rietsch disse...

E dizem que não há alternativa, nem propostas!!!

Um beijo.

Artur Ricardo disse...

Clarinho como a água da fonte... só não entende quem não quer entender!
Um abraço