quarta-feira, agosto 31, 2005

Antologia

Endossado aos "mais velhos" que olham em frente,
para o futuro, para a luta que continua:

"O melhor do tempo que passa, inexorável, é descobrirmos, tantos anos depois, que aquele rosto, apesar de sulcado pelas rugas, permanece inalterável na fisionomia da dignidade. Quando se olha um ser humano honrado, o que menos conta são as alterações físicas. És tu companheiro, ainda podemos caminhar juntos, partilhar convicções, continuar a empunhar a digna bandeira que descobrimos há uma imensidão de tempo. Quero lá saber que contes por décadas a tua existência, se a mão que me estendes é tão juvenil, se o teu sorriso confiante no devir me faz tão bem. Se o teu exemplo posso mostrar, sabendo que me vai trazer novos rostos solidários, orgulhosos por seres tão nosso.Obrigado por do tempo teres feito coerência. Por teres ficado onde estás, avançando sempre. Por não teres perdido, e tantos pretextos invocam os que no tempo se esvaiem, as referências que te moldaram o carácter. "
27/8/05

Pedro Namora

Obrigado por este texto!

terça-feira, agosto 30, 2005

Aforismos felinos - 3

depois de bem comer
os beiços lamber
(suavizando as saudades da Justine...)

segunda-feira, agosto 29, 2005

Auto-retrato a pedido...


Com um abraço para a Carmen Zita e o Sérgio Poupado, este "retrato aos 68"
(sem retoques e já desactualizado... embora me sinta em melhor forma que quando o escrevi)














Retrato aos 68

UM CORPO QUE ENVELHECE
UM HOMEM QUE ENTRISTECE
…MAS AINDA COM A SORTE
DE SORRIR À MORTE
(com meia cara…)
Um joelho que claudica
Um ombro qu’artrose
Uma coluna que são só hérnias
e entorta
Um libido que não endireita
(a não ser de 15 em 15 dias…)
Um pé e dedos que engrossam
gota a gota
Um coração que hipertense
e umas veias que colesterolam
Os músculos que, destreinados,
afrouxam, frouxos
Os nervos que, sempre à beira de um ataque,
relaxam, relapsos
Uma cabeça que encanece,
cabelos que caem e/ou embranquecem,
olhos que nem ao perto nem ao longe…
(… só com progressivas em progressão)
ouvidos qu’ensurdecem,
dentes de comprar, tirar e pôr,
uma voz qu’enrouquece
E uma memória que esquece,
projectos que fenecem,
uma massa cinzenta que s’acinzenta
(e como é que se chama o raio do alemão?)
Bom… já são quase setenta![1]

29.12.2003
[1]e está muito bem para a idade, dizem eles e elas!
Ora porra!, digo eu…

De vez em quando, sabe bem recordar...


De vez em quando, é preciso arrumar papeis, fotos,
essas coisas...
E há algumas dessas coisas que estão sempre a saltar,
porque nunca se rasgam, nunca se deitam fora,
de que se tiram cópias e mais cópias.
Esta, por exemplo:




Quando em Lisboa se vivia o DIA PRIMEIRO
depois das portas que ABRIL abriu,
eu vivia-o em Ourém, aqui,
com pena de não estar onde (também) queria estar,
contente por estar onde escolhera estar,
aqui, na minha terra,
com a gente que sou.

sábado, agosto 27, 2005

História de uma andorinha - 7 e último episódio


Curioso…
Também foi com saudade que a vimos partir,
no seu voo elegante e rápido,
a juntar-se à família que parecia esperá-la,
toda reunida nos fios da luz e do telefone,
seus locais de repouso e de encontro,
e de onde partem, em grupo organizado,
depois de ensaios que ficamos presos a observar.
Para regressarem no próximo verão.
Cá as esperamos, amigas.

Talvez uma se recorde da aventura que viveu este ano.
Nós aqui a deixamos registada para não a esquecer.

Fim

Direitos!

Numa das entradas de minha casa
tenho este quadro
Retirado de uma página do diário “os primeiros dias”, de 26 de Agosto de 2005:

(...)
Tirei-a da parede e tenho aqui, sob os meus olhos, a “Declaração dos direitos do homem e do cidadão”, “decretados pela Assembleia Nacional nas sessões de 20, 21, 23, 24 e 26 de Agosto de 1789 e aceites pelo Rei”.
Há 216 anos!
São 17 os artigos e convinha lembrá-los um a um.
(…)(nessa Declaração), saída da Revolução Francesa, os “direitos naturais” são, a liberdade, a propriedade, a segurança e a resistência à opressão.
No entanto, todos eles têm os limites resultantes da vivência em sociedade, e diz-se:
  • não se pode ser livre prejudicando a liberdade dos outros;
  • pode ser-se privado da propriedade se “a necessidade pública, legalmente verificada, o exigir evidentemente”… mas (ou não fosse esta a declaração dos direitos do homem e do cidadão nos alvores da constitucionalização do capitalismo) “sob a condição de uma justa e prévia indemnização”;
  • a segurança e a resistência à opressão tem os limites da lei e do respeito pelos direitos dos outros.

História de uma andorinha - 6

Bai é magoado (como se diz em crioulo)

E ei-la quase totalmente recuperada!

Talvez com pena de partir, tendo de deixar quem lhe devolveu vida e voo.

Parece hesitar…

O olhar é de reconhecimento.

Mas o gato, a “fera”, ainda não desistiu…

(amanhã será último episódio)

Para o meu fim de semana

Mandou-me um amigo e camarada para leitura do meu fim de semana:

Letreiro

Porque não sei mentir,
não vos engano:
nasci subversivo.
A começar por mim – meu principal motivo
de insatisfação -,
diante de qualquer adoração,
ajuízo.
Não me sei conformar.
E saio, antes de entrar,
de cada paraíso.
Miguel Torga
Que o seja também para todos!

quinta-feira, agosto 25, 2005

História de uma andorinha - 5



Mantido o "perigo" à distância, graças ao bom trabalho do segurança...,

a andorinha começava a recuperar, respondendo aos estímulos da salvadora

que, cansada mas (quase) satisfeita, se preparava para a parte final do salvamento.

... embora a "fera" não desarmasse e usasse artimanhas (artes & manhas) mil!

(isto é para manter o "suspense"...)

(continua amanhã, com o penúltimo episódio)

O tempo

Contar os anos
por décadas

Viver os segundos
como eternidades

(26.12.2002)

quarta-feira, agosto 24, 2005

História de uma andorinha - 4

a "fera"


Justine, em comentário ao episódio anterior, disse (e ela sabe do que fala):
"Uma das acções mais importantes, durante o período de reanimação, foi cuidar para que tudo se passasse fora da vista (e das garras) do gato da casa... "

Mas não foi possível!
Ele estava lá, doméstico, ternurento… mas predador.
À espreita do menor descuido da equipa de salvamento.
Equipa que teve de se reforçar com um elemento para a segurança.
Terá sido suficiente?

(continua)

A posição do Comité Central do PCP sobre os incêndios

Na sua declaração sobre a reunião do CC do PCP, ainda a decorrer, Jerónimo de Sousa referiu-se, entre outros assuntos da vida de Portugual e dos portugueses, aos incêndios.

"O Comité Central do PCP analisou a dramática situação vivida por inúmeras regiões e povoações causada pelos incêndios florestais dos últimos meses, repetindo-se neste ano de 2005, o que de há anos a esta parte, e muito particularmente a partir de 2000, vem flagelando o País, com perdas de vidas humanas e bens e com custos ambientais e materiais gigantescos.
Esta brutal realidade que os portugueses estão a viver é o desmentido da afirmação do «estamos preparados para todas as eventualidades» do primeiro-ministro em inícios de Maio, que revelava já claramente a subestimação da dimensão do problema que depois prosseguiu na avaliação dos meios necessários, apesar dos alertas da sua exiguidade, feitos inclusive pelo PCP.
O Comité Central do PCP declara a sua mais veemente oposição a qualquer tentativa de absolvição dos responsáveis políticos e partidários, ou seja a «despolitização» da tragédia que mais uma vez atingiu o País, bem como denuncia a fraude da responsabilização da pequena propriedade florestal, para ilibar as políticas agro-florestais de direita de sucessivos governos.
O Comité Central do PCP reafirma que continuará a intervir e tudo fará, para que se tomem as medidas necessárias para pôr fim ao flagelo, como fez recentemente na Assembleia da República e no Parlamento Europeu e no imediato reclama do Governo o conjunto de medidas para resposta urgente às populações que ficaram sem casa nem bens, na reposição do potencial produtivo de explorações agrícolas, instalações industriais e comerciais, com indemnizações adequadas e a declaração do estado de calamidade pública em todas as freguesias e concelhos onde a dimensão da catástrofe o exigir."

Aforismo felino



vale mais um pássaro no papo

que dois a voar

(atenção que este aforismo pode ter conotação com um episódio da "História de uma andorinha")

terça-feira, agosto 23, 2005

História de uma andorinha - 3


Retirada a andorinha de dentro de água, também cheia de cloro mas ainda com vida, foram os primeiros socorros.
Os primeiros e os segundos...
Lembrando experiência anterior, a salvadora usou várias técnicas de socorrismo e serviu-se de vários meios.
Técnicas como a da massagem cardíaca, como a da respiração boca-a-boca (ou boca-a-bico...).
Meios como um secador de cabelo, como um lençol de banho felpudinho.


(continua)

A audácia e o risco

Na reunião do Comité Central, o camarada Jerónimo de Sousa citou uma frase de Álvaro Cunhal:
"... não se sabe onde acaba a audácia e começa o risco..."

É por isso que só os audazes correm riscos!

História de uma andorinha - 2




"Sensação estranha mas bela, esta de nadar com andorinhas a mergulhar ao nosso lado.
Creio que é um privilégio, tê-las como amigas."
(diz ela, Justine, em comentário ao primeiro episódio desta história)


Até que... até que uma andorinha, talvez mais novita, talvez menos experiente
- não terá vindo ainda o ano passado... - se atrapalhou e caiu à água!
A tempo foi visto o acidente, ainda a pobre andorinha estrebuchava, e a nadadora-salvadora correu logo logo em seu socorro.

(continua)

Como se fosse a cavar trincheiras

Estive na Salgueira. A ver, a ouvir, a cheirar, a sentir o fogo. Ali, a dois passos.
O fogo e as gentes.
Uma velhota, mais resignada que desesperada, molhava e molhava e molhava a frente da casa
- da casa onde talvez tenha nascido, onde terão nascido os filhos, onde reviverá a ver os netos, de onde terá saído o enterro do homem que a deixou viúva, onde espera o tempo -,
molhava e molhava e molhava à roda da casa como quem abre trincheiras.
Sem dizer uma palavra, sem levantar os olhos para o fogo.

segunda-feira, agosto 22, 2005

E agora?

E agora?
Agora nada.
Mais poemas.
Para não morrer asfixiado.
Só sei respirar por intermédio das palavras.

(José Gomes Ferreira, excerto de Lágrimas Trocadas, em Dias Comuns - IV, 27 de Maio de 1968)


Obrigado, Zé Gomes,
estás sempre pronto para dar uma ajuda... à mão de semear!

História de uma andorinha - 1


Todos os anos nos visitam. São muitas. Elegantes e simpáticas.
Por aqui vão ficando.
Fazem-nos companhia e aproveitam a pequena piscina para mergulhar e matar a sede.
Até que um dia...

(continua amanhã)

domingo, agosto 21, 2005

Não deixar (re)adormecer as consciências, hoje despertas, hoje em "carne viva"


Da porta de minha casa-na tarde de 20.08.05

Não pode ser! Isto é um pesadelo.
Mas é um pesadelo que vivemos acordados, assustados, a ver as chamas a lamberem as encostas logo ali à frente, a ouvir o crepitar que parece que é mesmo aqui ao lado, a respirar o ardido, este tecto de sombra e cinza que sobre nós caiu… e nós molhando ao redor das casas como se não foose secar logo depois. Mas, ao menos!, a fazermos alguma coisa para termos a ideia de que estamos a fazer alguma coisa. Agora!

A indignação é grande. Como se chegou a isto?
Como se abandonou a lavoura e os campos, como não se ordenou a floresta, como não se limparam as matas e os quintais, como se permitiu que assim se construísse, como se consente que se ateiem fósforos impunemente, como nos desleixámos tanto? Todos!
Denuncio uma política que criou condições para o que está a acontecer, denuncio especulações que aproveitam das tragédias, acuso, na minha insignificante mas insubstituível indignação, os responsáveis.
Mas não se pense que quero denunciar e acusar com um endereço pré-fixado. Não!
A responsabilidade é de todos mas não como forma de, por ser de todos, não ser de ninguém.
E se é de todos a responsabilidade, esta é a oportunidade de se falar às consciências de todos. Dos governos, centrais e locais, dos bombeiros, das “defesas civis”, dos indivíduos – isto é, de cada um de nós – para que todos se interroguem, nos interroguemos, se tudo fizeram/mos para prevenir o que podia e devia ter sido previsto. Este é o momento, porque estão despertas as consciências, vivas, algumas em carne viva.

Indo mais concretamente a um aspecto. Que não de somenos.
Ourém está na ponta de um distrito. É a triste exemplificação da ausência de regionalização e de descentralização. Quando a coordenação é fundamental, quase diria vital, Ourém é o último concelho a ser coordenado, entregue à sua sorte, por Santarém, e é o primeiro a ser esquecido por Leiria, à espera do que não vem ou chega tarde.

Há tanto para corrigir!

sexta-feira, agosto 19, 2005

Aforismos gatais (com foto) - 1

quanto mais me gatas
mais gosto de ti

quarta-feira, agosto 17, 2005

"Guerreiro" repousa...


... aos pés de sua dona.

segunda-feira, agosto 15, 2005

Abrindo gavetas... para arejar

Um texto que nelas, nas gavetas, estava muito sossegadinho,
com a data de 16 de Agosto de 2003:

“As netas francesas

As netas francesas
e as velhas avós do Zambujal
a comerem borrego no salão paroquial

As netas francesas
com o umbigo à vista
... e outras belas coisas nunca vistas.

As velhas avós do Zambujal,
no Zambujal, hoje como sempre!
Mas, hoje, sem lenço,
calçadas,
alindadas,
cheirando ao Chanel
da última prenda,
recém-chegada com os já de partida.

O perfume ficará,
no Zambujal,
junto ao sorriso,
triste,
das velhas avós,
que ficam,
outra vez – talvez a última –,
sós!

O perfume ficará,
nas velhas avós do Zambujal,
como recordação,
das netas francesas
de umbigo à vista
... e outras belas coisas nunca vistas
no salão paroquial,
onde estamos todos,
a comer borrego,
na festa do Zambujal."


E, hoje, apenas (?!) três anos passados, os umbigos à mostra das netas francesas já não despertam qualquer reacção… e algumas avós, não as velhas avós do Zambujal que tão poucas começam a ser, já os umbigos mostram.

Sinto que o mundo mudou muito nestes três anos!

Ou quem mudou muito fui eu?!

sábado, agosto 13, 2005

O jardim em frente da Câmara



... para (cor)responder a um comentário de um Pedro (que julgo saber quem é e saúdo).

E para matar saudades, também!

Entre o Central e a Belle Epoque

Não resisto a transcrever este post colocado no blog da CDU-Ourém (CDUporOURÉM):


As conversas são sempre sobre o mesmo tema!

Hoje, por volta do meio dia, dizia um:

- Ontem, dei-me ao cuidado de medir a temperatura destas pedras e estava a 75 graus...

Logo ouvimos de um segundo:

-Isto é um autêntico "jardim das sombras virtuais"...

Já estavámos a chegar à Praça Mouzinho de Albuquerque, e alguém moderava:

- Vocês queixam-se... a praça tem sombra 10 horas por dia!... das 9 da noite às 7 da manhã...

quarta-feira, agosto 10, 2005

Não há fogo que não acabe!

(com a devida vénia a Tabacaria)

Em tempos, há muitos anos, o comandante Joaquim da Silva (Chucha) dizia-me, em conversa amiga e descontraída, que nunca encontrara um fogo que não tivesse acabado. De vez em qunado. lembro-me dessa conversa e frase, que pode encerrar e ilustrar quase uma filosofia de vida.

Nestes dias de brasa, de novo ela veio à tona, acompanhando a recordação de velhos amigos, como o comandante Joaquim e o comandante José Maria Pereira (Zico), que - com os eus homens e tantos também velhos amigos - me ajudaram a ter uma grande admiração e orgulho pelos nossos bombeiros. É verdade que já não são o que foram, mas porque souberam transformar-se no que são; já não são (só) a associação voluntária, amadora, de "carolice", porque se tornaram numa instituição.

A admiração e o orgulho mantém-se, e saúdo o comandante Julito e os homens que compõem a corporação.

Os incêndios continuam a ter um fim. Mas o que importa é lutar para que não tenham começo e para que, a não se conseguir evitar que as causas que (ainda) não se controlam os desencadeiem, que não haja condições para que se propagem e provoquem dramas e tragédias entre os mais desfavorecidos, os desprotegidos, os esquecidos. Os do costume.

Mas não temos ilusões. É uma luta muito dura, porque confronta uma política há muito se concretiza, que desvaloriza a economia produtiva, os produtores, que abandona as regiões "não rentáveis", as actividades que não contribuem para a acumulação do capital financeiro.

terça-feira, agosto 09, 2005

A velha negra

(Foto de Jean Saint Martin)

O Tempo

O tempo!
O tempo passou
e deixou traços, cicatrizes, rugas.
O tempo!
O tempo passou
e ficou ternura, sageza, serenidade.
O tempo!
O tempo passou
e guardou tudo no corpo cansado,
nos olhos só entreabertos,
na boca desdentada,
no sorriso bom,
na cabeça bela e branca,
no pergaminho histórico que é uma velha negra.
Mountolive

domingo, agosto 07, 2005

sábado, agosto 06, 2005

A história da Rua da Murteira - Fontaínhas da Serra

A história da Rua da Murteira
(de serventia a rua e o caminho às avessas)

Era uma vez uma serventia. Por ela passavam os vizinhos na prática de uma boa convivência e respeitando hábitos ancestrais. Por ela se faziam mais curtos os percursos das fainas, se tocava o gado, se cruzavam e saudavam as gentes.
Assim foi durante tempos – anos, décadas, nalguns casos séculos – e, de tanto caminhadas, certas serventias se tornaram caminhos, de tão pisadas, começaram a ser terra de todos e não dos que seus donos tinham sido e aos outros as abriram.
Um dia, por decisão dos eleitos autárquicos, o caminho que era conhecido por uma designação popular (ou por mais que uma) passou a ter nome oficial, com registo “civil” e “baptismo” de placa toponímica. Foi em Assembleia de Freguesia, em 24 de Setembro de 1989 que a rua nasceu, com o registo 4005, com o nome de Rua da Murteira e com os seus limites fixados. Com direito a placa identificadora.
O tempo passou – o tempo nunca deixa de passar… e, neste caso, os anos somam já mais de década e meia, e entretanto mudou o século e o milénio.
Poucos benefícios terá tido a rua, mas recebeu iluminação pública, e por ela se ia à e vinha da missa, se chegava ao cemitério, se alcançava o centro da povoação, das Fontaínhas. Como antes se fazia pela serventia, depois pelo caminho, agora pela rua. Pela rua iluminada. Pública. De todos.
Eis que, estranhamente, parece que a Câmara teve dúvidas e quis saber se a rua era rua, se o caminho fora caminho, se a serventia fora serventia. E perguntou à Junta.
A Junta, em vez de responder com a decisão que a freguesia tomara há 16 anos, com o nome – se julgasse necessário, com a fotografia da placa toponímica que não nasceu ali mas ali foi posta –, talvez acrescentando alguma manifestação de estranheza pela pergunta, em vez disto, a Junta foi perguntar às pessoas. E com as respostas que recebeu, deu a sua resposta à Câmara.
Na sequência desta estranha consulta, muros altos, ao que parece mais altos que o que licenciado fora, foram levantados até aos limites da rua e, a seguir, foi cortada a rua com o prolongamento desses muros fechando um espaço e impedindo que a rua continuasse rua.
Como se não bastassem os muros, fora dos muros levantados, máquinas escavaram-se e encravaram-se grandes pedregulhos no que tinha sido passagem de pessoas para que nem até ao muro as pessoas pudessem chegar-se e, muros adentro, remexeu-se a terra agredindo-a na epiderme e onde mergulham raízes, retiraram-se os candeeiros de iluminação pública, que públicos eram. Perante quem, tendo poder delegado por eleição, impotente se mostrou.

Como foi isto possível? Como é isto possível?
Como é possível que uma serventia que se tornara caminho e que, de caminho, se transformara em rua, tenha feito o sentido contrário da história?
Como é possível que se tenha ignorado o que rua era, que se tenha cortado o que caminho tinha sido, que tenha deixado de ser – e de ter – serventia de todos o que como serventia nascera?
Como é possível que tenha passado à condição primeira, de propriedade e uso apenas de um, o que era público há tanto tempo que se perde na memória dos tempos, e que tem nome e registo de rua há mais de década e meia?

Espero que se venham a conseguir algumas respostas para estas questões, e para outras que por detrás destas estão, e se encontrem formas de repor o sentido da história e da História (a repetição e a maiúscula são propositadas!) na Assembleia de Freguesia Extraordinária que sexta-feira, dia 5 de Agosto, se vai realizar na Atouguia.
(publicado no NO de 5 de Agosto de 2005)

sexta-feira, agosto 05, 2005

O País está a arder!

O País está a arder!

Como nos anos anteriores. Mais que nos anos anteriores

E as pessoas apenas têm um pensamento: os incendiários e a justiça que não funciona.
E a prevenção?, e os guardas florestais que deixaram de existir na privatização das funções públicas – “nas celuloses não há incêndios… têm a sua guarda privada!" –?, e quem apoia os pequenos proprietários, na educação, no esclarecimento, no que só pode ser feito em cooperação?

O País está a arder e a desgraça cai sobre os mais desprotegidos.
Como sempre.
Que sofrem – e muito sofrem! – com resignação e indignação…
Com indignação para com os incendiários e para com a justiça, com resignação porque a culpa está (também) ao lado e não a vêem.
É preciso continuar, incansavelmente, a avisar toda a gente.
É a nossa luta. Contínua, incansável.
A política não são as manobras totalmente ausentes de ética do senhor Soares, do senhor Cavaco, do senhor Sampaio, do senhor Alegre, do senhor. Sócrates, do senhor Mendes, do senhor Ribeiro (e Castro!) e de todos esses senhores, não são as lutas pelo poleiro, qualquer ele seja, não são as entrevistas absolutamente irrisórias com alguns destes senhores como com o senhor Lopes em muitas e muitas páginas da revista do Expresso.

Raízes

quarta-feira, agosto 03, 2005

Saudades de Justine

1º "comunicado"

1
Ourém precisa de mudança
no poder autárquico.

Desde 1976 que os oureenses têm delegado esse poder, que é seu e foi conquistado com o 25 de Abril, primeiro no CDS, depois, no PSD, ao longo dos anos com alguma participação, ao nível dos executivos, do PDC e do PS. O PCP, nas coligações eleitorais FEPU, APU ou CDU, também teve eleitos, quer em freguesias, quer na Assembleia Municipal, sem alguma vez ter tido responsabilidades nos executivos.
Muitos oureenses que reflectem sobre o concelho, sobre a “sua terra”, e exprimem as suas opiniões têm vindo a manifestá-las de forma crescentemente crítica relativamente a quem detém o poder, e revelam a consciência dessa necessidade e desse desejo de mudança.

Alguns oureenses desejam essa mudança…
… mas não todos, nem a maioria dos oureenses, como o comprovam os sucessivos resultados, em quaisquer que sejam os actos eleitorais, mantendo uma confortável maioria para o PSD e CDS/PP.
A CDU considera que no concelho de Ourém foi laboriosamente entretecida uma rede de influências e de clientelismo que faz com que a maioria dos oureenses esteja muito grata por todos os benefícios que o tempo – e o 25 de Abril – lhes trouxe aos eleitos dos partidos que têm sido poder, como se fossem sua dádiva, e receie todos os malefícios se outros partidos vierem a ser os detentores desse poder. Por exemplo, para a população idosa, as conquistas sociais, que tão dificilmente se conseguem promover e manter contra uma política de direita, seriam benesses oferecidas pelos eleitos desses partidos e perder-se-iam se outros fossem os eleitos… pelo que voto só pode ser no PSD ou no CDS/PP.
É o mundo ao contrário!
Como contribuir, então, para o esclarecimento, num meio fechado e manipulado, que leve à tomada de consciência que, por sua vez, provoque a mudança necessária?
A CDU, sem a obsessão de tomar seja que poder for, mas sempre disponível para ser poder onde quer que sejam escolhidos candidatos seus, entende que a única via é a do esclarecimento contínuo, da verdade como único método, do contacto e do respeito pelas populações, sempre dizendo quem somos, ao que vimos, o que faríamos se eleitos tivéssemos. E assim tem sido sempre.

A CDU é uma coligação de dois partidos, o PCP e o Partido Ecologista os Verdes, com uma associação cívica, a Intervenção Democrática, e integra todos os independentes que a ela se queiram juntar por estarem de acordo com os programas relativos a cada uma das eleições. O projecto autárquico da CDU é conhecido, e temos provas dadas, como é o caso em concelhos vizinhos do concelho de Ourém.
No nosso espaço cabem todos os que queiram partilhar uma experiência de luta, pela liberdade, pela democracia, pelo ambiente, por um projecto autárquico que vale pelo que tem feito, por vezes apesar dos esforços para o diminuírem e desvalorizarem, e que tem orgulho em se dar a conhecer.

Por isso, a CDU candidata-se.
Em Ourém, com o objectivo de recuperar mandatos e de recolocar Sérgio Ribeiro na Assembleia Municipal, onde é consensual que faz muita falta, também com o objectivo de contribuir, no mínimo, para uma vereação em que haja oposição!
(de 29 de Março de 2005)

Deste tempo me lembro/(de tantos tempos já fui!)

Deste tempo me lembro
(De tantos tempos já fui!)


Deste tempo me lembro.
Neste tempo vivi.
Este tempo também eu sou.

(De tantos tempos já fui!)

Deste tempo, desta praça, destas quintas-feiras,
deste mercado, desta gente eu fui e sou.
Desta gente que nós fomos e somos.

Panelas, “amontolias”, formas para queijo.
Gente!
Homens de barrete e jaleco, mulheres de lenço e xaile
(alguns e algumas descalços e descalças).
Burricos a servirem de montaria… e de companhia.
Era a vila nova. de Ourém. Vila viva às quintas-feiras.

E para casa, nas aldeias ao redor, se levavam as sardinhas,
que da Nazaré vinham
e para toda a semana se mercavam;
de salmoura se guardavam
que até à quinta-feira da semana que logo viria
era preciso que chegassem.

Nalgumas das casas,
em muitas casas,
era preciso partir e repartir;
o homem ficava com o melhor bocado,
que ele era quem partia e repartia
ainda que fossem as mãos da mulher
que partissem e repartissem,
porque era ele quem trabalhava de sol a sol
como se não fosse de sol a sol o trabalho da mulher,
que fazia a lida da casa,
que tratava do gado e da horta,
e cozia o pão
e fazia a vindima
e organizava a descamisada,
e ainda tempo lhe tinha que sobrar
para ajudar o “sê home” nas fainas que
(dizia-se...)
dele seriam.

Descalços andavam os gaiatos.
Descalços e ranhosos.
Pés nus,
frios,
magoados,
feridos,
depressa duros,
crostas,
calejados,
preparados para as pedras e as silvas
a caminho das escolas
onde escolas havia, e só para aqueles que às escolas iam.

Depois,
depois foi o salto,
a fuga para as Franças e Araganças,
a recusa da estagnação,
da resignação,
da pobreza,
do cerco,
da guerra,
do que não se queria que continuasse
mesmo sem se saber o que não se queria
e também sem se saber o que se queria
a não ser que era preciso ir, que era vital partir.

E como os tempos mudaram!
Como sempre fizemos,
as mulheres e os homens de todos os tempos:
mudamos os tempos!



Deste tempo me lembro
(De tantos tempos já fui!)



Vivi atravessando estes tempos que fomos e somos.
Deste tempo me lembro.
E gosto de o lembrar como tempo vivido.
Com saudade. Com nostalgia.
Mas olhando-o de frente.
Com os olhos de hoje.
Com os olhos dos homens e das mulheres
de hoje e de amanhã.

Por tantos sítios tenho andado

Cuchila Alta - Uruguai - 2004/2005
sempre à procura... (das teclas?)

de outros séculos velho

muitos ventos me empurraram
e aqui cheguei

de outros séculos venho

tantos ventos me empurraram
e aqui estou

de outros tempos venho

outros ventos me empurraram
e aqui cheguei!