Este comentário de João Ferreira tem a maior pertinência e oportunidade. A União Europeia foi-se construindo como que colocando cada vez mais apertadas algemas à soberania dos povos e seus estados. Mesmo quando estes dizem não ou que querem ficar opting-out, usam-se todas as artes e manhas para se transformar o não em nada ou para manter in quem sempre quis poder escolher ficar out.
Há que esclarecer quem pode travar este caminho que não pode senão levar a situações de enorme perigosidade! Obrigado, J.F., por tal (e tanto!) trabalho.
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- Edição
Nº2352 - 27-12-2018
Comentário
Mais dois exemplos: o euro e o PQI
Dois dos temas discutidos na última sessão
plenária do Parlamento Europeu, em Estrasburgo, são exemplares do carácter
distintivo da intervenção do PCP face à das demais forças políticas nacionais
ali representadas. Distintivo, pela perspectiva que adopta de defesa dos
interesses nacionais e, bem assim, pela apreensão da natureza de classe do
processo de integração.
1. Na discussão sobre o orçamento da UE, os deputados do PCP no PE insistiram
numa proposta já anteriormente apresentada: a da criação de um programa de
apoio aos países que voluntariamente entendam sair do euro, recuperando a sua
soberania monetária, por considerarem que essa permanência se tornou
insustentável. Este programa visa enquadrar uma saída negociada do euro, que
minimize factores de perturbação durante o processo de transição para a nova
moeda, compense financeiramente os prejuízos e impactos decorrentes da
permanência no euro e potencie os benefícios decorrente da nova situação
monetária.
A proposta, por si só, não determina nem propõe a saída de nenhum país.
Apenas permite consagrar essa possibilidade, dando-lhe o devido enquadramento,
designadamente no plano orçamental. Pois bem, para além dos proponentes, a
proposta não recolheu o apoio de nenhum dos partidos portugueses representados
no Parlamento Europeu. Ou seja, PS, PSD, CDS (que votaram contra) e BE (que se
absteve), não apenas apontam como caminho a seguir manter o País amarrado ao
euro – e à estagnação, dependência e subordinação que daí resultam – como não
admitem sequer que se preveja qualquer opção alternativa, nenhum outro caminho.
2. O Parlamento Europeu aprovou uma proposta de regulamento do Programa-Quadro
de Investigação (PQI), o chamado «Horizonte Europa». Este é o grande
instrumento de financiamento da ciência e investigação na UE, dotado, segundo
esta proposta, de 120 mil milhões de euros, para um período de sete anos.
Todavia, a distribuição dos recursos do PQI é extremamente desigual entre
países e áreas de investigação.
Durante vários anos,
Portugal foi um contribuinte líquido deste Programa. Pagou mais do que recebeu.
Ainda hoje, o grosso das verbas do PQI tem como destino as principais potências
europeias. Mesmo países como Israel (cuja indústria aeronáutica utiliza verbas
do PQI para o desenvolvimento de tecnologias com utilização militar, como
aeronaves não tripuladas, utilizadas nos ataques a Gaza), Noruega e Suíça, não
sendo membros da UE, captam mais verbas do que Portugal.
Os deputados do PCP no
PE propuseram que, em alternativa à actual gestão directa do PQI pela Comissão
Europeia e à distribuição de verbas numa base puramente competitiva, fosse
adoptado um regime de gestão partilhada, definindo envelopes nacionais que
garantissem uma alocação mínima de recursos por país, prevendo uma distribuição
equilibrada de recursos entre todos, tendo em vista a diminuição das
desigualdades ao nível das capacidades e actividades de I&D. Esta proposta
foi rejeitada, para o que contribuíram os votos de PS, PSD e CDS.
Este não é, todavia, o
único problema do PQI. Na linha dos seus antecessores, o «Horizonte Europa»
está fundamentalmente orientado para o «mercado», para a «competitividade» e
para as «prioridades estratégicas da UE», incluindo as «novas prioridades»,
como a «defesa» e a «segurança». Estas são razões que, desde há muito,
justificam críticas de amplos sectores da comunidade científica ao PQI.
No final, os deputados
do PCP rejeitaram a proposta de regulamento. PS, PSD, CDS e BE votaram-na
favoravelmente.
João Ferreira
2 comentários:
A luta contra a Europa do capital é uma luta,também, pela afirmação do respeito pelos países periféricos.Entristece e indigna a subserviência canina do PS-PSD-CDS-BE,às políticas de modelo mercantilista da UE.Bom ano,camarada.
Muito obrigado, camarada Olinda. Vai ser um ano muito difícil. Mas para ele cá estamos!
Força, camarada amiga.
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