segunda-feira, março 01, 2021

Esquerdas e luta de classes, segundo ABarreto

páginas de um quase diário: 

Começo por pegar na “lição” de António Barreto que passou a ter o privilégio de as dar ao sábado no Público (ou têmo-lo nós, leitores, de as recebermos).

O grande sociólogo (mais de um metro e oitenta tem ele), há três semanas seguidas anda às voltas e reviravoltas com as esquerdas (As duas esquerdas, Saudades da luta de classes e Ainda as duas esquerdas).

No 1º artigo, o douto autor deixou escapar uma lagrimazita pelo “afastamento dos governos de iniciativa presidencial e de unidade nacional” para que se estava mesmo a ver que seria, ele, personalidade indicada, e entrega-se à dissertação sobre a inevitabilidade de um debater (de bater) sobre as alianças políticas, num tripé, como as mesas da bruxaria: esquerda, direita, bloco central.

E logo avança com o seu vaticínio: “a decisão pertencerá sobretudo à esquerda, ao PS em particular” e, assim postas as cartas na mesa, o que importa ao sociologador é se, havendo “duas ou mais esquerdas”, se elas decidirão (ou o PS em particular) unidas ou separadas.

Colocada deste modo a situação e sendo estes os protagonistas da sua evolução, António Barreto disserta sobre quais as esquerdas, o que as define e divide, ou seja, quais as condições para as unirem ou separarem.

Tudo é fácil para AB, o C de conclusão, definitivo, é “o essencial da política, como a liberdade e a democracia”… e Barreto não se poupa e diz-nos o que é liberdade e o que é democracia, não admitindo que sejam outras coisas que não as que ele define.

E aí está o engulho, pois nem todas as correntes de pensamento - político, económico, cultural, social - aceitam que liberdade e democracia sejam palavras-dogma com definição única e barreta.

Para ele-Barreto, liberdade não é, não pode ser, de nenhum modo se aceita que seja consciência da necessidade, o que implicaria debater o que é consciência e o que é necessidade; para ele-Barreto, democracia exclue – como ele escreve, peremptório – «As variantes adjectivas, democracia “cultural”, “social” ou “económica”, por exemplo, são outras coisas. Em geral, fantasias.»

É de mestre (de obras feitas)!...

Para Barreto, democracia é só a política e mais nenhuma, o resto são meras variantes adjectivas, fantasias.

A partir desta base, há a esquerda democrática e a que não o é, e merece uma chusma de adjectivos e de “mimos” que nada têm a ver com intenções e realidades mas com caricaturas a traço grosso e feio.

Dá ideia que no artigo intermédio, António Barreto teve um sobressalto.

Mas foi alarme falso, pois se é verdade que se dedica a anatematizar o que outros (que não ele) chamam “causas fracturantes”, diversões de causas que se centram nas relações entre o capital e o trabalho, não se percebe muito bem como coexiste a sua saudade “de combates em redor da organização do Estado, da defesa nacional, da paz e da guerra e da segurança colectiva”, as suas saudades “dos tempos em que se lutava por valores essenciais da política, do trabalho e do emprego, dos direitos dos trabalhadores e dos patrões” (sei lá que mais… ele escreve e assina), saudades do que, no artigo anterior, colocara em fantasias, em variantes adjectivas de democracia.

Para o 3º artigo (por agora…), António Barreto traz o título Ainda as duas esquerdas… quer dizer, deixa de insistir em várias, são duas: a democrática e a não democrática (sendo ele o passador de atestados).

Explica-se explicitamente que a esquerda democrática é a do PS (mário-soarista)… mas nem sempre porque, às vezes salta-lhe o pé p’rá chinela, ou seja, vai na conversa da esquerda não democrática.

Tim-tim por tim-tim:

«Na sua melhor tradição (mário-soarista), os socialistas opõem-se aos métodos revolucionários, à violência, ao terrorismo, à colectivização, à destruição da iniciativa privada, à opressão da Igreja, ao monopólio do Estado na educação e na saúde, à aniquilação das Força Armadas e a formas de governo não democráticas e não parlamentares (uff!, exemplos escolhidos a dedo)».

«Mas também sabem que nas esquerdas há muito fortes tendências exactamente contrárias (isto é: violência, terrorismo… e toda a demais lista de malfeitorias, segundo AB), com especial inclinação para destruir o mercado livre e a iniciativa privada , cm um estranho afecto por formas “populares” de governo, com obsessão do monopólio do Estado e com uma absoluta aversão pelo investimento privado.»

«Estão ainda conscientes de que as esquerdas radicais têm uma concepção elástica dos direitos fundamentais, sobretudo dos direitos cívicos e políticos; assim como têm convicções condescendentes sobre a guerra civil e a luta de classes, a violência e o terrorismo (se este for de esquerda, das minorias, de tudo quanto é anticapitalista e antiamericano…) contrárias às tradições socialistas(…)»

… e continua em rol, devendo espumar…, com referências ao despotismo tropical latino-americano, às ditaduras militares africanas e asiáticas e etc., mas confesso cansaço…

Só ainda quero fazer uma rectificação indispensável: escreve ABarreto «quando, há seis anos, António Costa decretou o “fim do tabu”, isto é dispôs-se a governar com aliança com as esquerda radicais…» falseia descaradamente (por decreto?) o facto histórico de, há seis anos, ter sido Jerónimo de Sousa que afirmou que o PS só não seria governo se não quisesse, quando António Costa cumprimentava os “vencedores” e Cavaco Silva dava, a estes “vencedores”, o poder de formarem governo, que a Assembleia da República lhes não reconheceu.  

 Mas, como é evidente, referir a verdade história contrariaria o começo da caracterização de que ABarreto parte, neste artigo, para a reconfiguração da política portuguesa: «... O imobilismo comunista…»

 Imobilismo? Engana-se (se é que é engano...) quem tem saudades da luta de classes.

Há quem faça essa luta (e há 100 anos!) e recomendar-se-ia revisão de matéria dada a quem tem sociologia como formação e/ou cartão de visita.

1 comentário:

Olinda disse...

Mas que grande barrete!Caberá nalguma cabeça?Bjo