terça-feira, dezembro 08, 2020

Reflexões lentas - com vacina(s) no mercado

 Sem em nada diminuir a gravidade da situação derivada do surto epidémico, chega a ser grotesco o espectáculo dos interesses privados (e de quem tem de os salvaguardar… ó da guarda!) a lidar com o real problema, e a rir até às lágrimas com o aproveitamento dele feito por bons profissionais do humor como Ricardo Araújo Pereira, que deve estar com enorme audiência.

A alternativa saúde-economia é uma falsa questão que esconde a verdadeira, que é a que se pode equacionar (acho eu!) com o dilema saúde pública-ganância de privados.

Vivemos num tempo e espaço em que, na correlação de forças sociais dominam os interesses privados, de classe e de grupos, não sendo, de modo nenhum, despicienda a força do colectivo, sindical e político, da outra força da correlação (embora desconhecida, ou não consciente, por muito das massas que a compõem).

A maneira como chega aos receptores da informação quase obsessiva que se fornece, no meio de anúncios a que só dá ganas de fugir até porque são produto de uma verdadeira devassa dos nossos gostos ou tendências (algumas que se procuram combater) ilustra… o mercado em que uma parte do mundo e de gente se tornou e se pretende que todo o mundo (e toda a gente) o seja!

Mas o que mais impressiona – e assusta! – é que tudo é mercado para quem domina a correlação de forças (e a informação que serve quem a domina), e nesse tudo se incluem as vacinas, esse produto tornado miraculoso antes sequer de existir no mercado… e mercantilizável.

Quantos milhões de milhões já se movimentaram em jogos de bolsa, em publicidade enganosa, em compras antecipadas e sem garantia se existirá(ão) o(s) produto(s) e se cumpre(m) os necessariamente exigentes requisitos relativamente à saúde pública?

 Cito (ou re-cito) Álvaro Cunhal no prefácio a O caminho para o derrubamento do fascismo, edição de 1997, sobre o IV Congresso do PCP, de 1946:

O capitalismo ter-se-ia superado a si próprio. Teria deixado de ser capitalismo, para ser agora «economia de mercado». Já não haveria capitalistas mas «empresários». Seria um «capitalismo civilizado», sem classes antagónicas, um capitalismo sem proletários, sem luta de classes, nem natureza de classe de governos e políticas, seria uma sociedade nova definitiva e final constituída por cidadãos conscientes, cordatos e mutuamente solidários, aceitando, assinando e cumprindo «pactos de regime», «pactos sociais», «pactos» e mais «pactos» pelos quais os cidadãos trabalhadores (agora dizemos nós) aceitariam renunciar a direitos fundamentais e vitais. Ou seja, ser explorados pelos cidadãos capitalistas e os cidadãos capitalistas continuar a explorar os trabalhadores e a justificar-se perante a opinião pública através dos seus fantasiosos teorizadores.”.

É certo que nem em todo o lado será, há populações bem numerosas em que o surto epidémico e a vacinação não foram oportunidade de negócio. Mas dessas situações e lugares nada ou pouco (só o impossível de calar) se fala, embora andem nas "bocas" deste "nosso" mundo por outras e perversas razões, como as de manobras militares ameaçadoras em sua intenção por não se terem submetido ao mercado globalizado.

1 comentário:

Justine disse...

Texto que ficaria bem, e deveria ser publicado, em todos os jornais da nossa praça - só não se esclarecia quem não quisesse!