sábado, janeiro 28, 2006

O que não mudou em S. Tomé - 4

Entre 1958 e 2005/6 o que é que os meus olhos e o meu sentir (os de então e os de agora, os mesmos que outros são) viram e sentiram não ter mudado em S. Tomé?
Sobretudo a gente, o povo.
Das crianças, que são povo, já falei, das crianças falarei sempre, mas agora falo da gente adulta, do povo que tão depressa deixou de ser criança.
Este povo de S. Tomé, o de hoje e o de há 50 anos, não morre de fome. De muitas doenças morrerá, e cedo morre, mas de fome não. Morre de paludismo, de cólera, mas de fome não.
Assim era e assim é. E os hospitais que então havia nas roças - em cada roça, um hospital! - não eram para lhe impedir a morte pela fome ou qualquer morte prematura. Era para poderem estar em condições de trabalhar nos dias seguintes.
É um povo de mistura de gentes. De gentes vindas de Angola, para escravos serem e depois libertos, de gentes vindas de Cabo Verde, como contratados sem contrato terem a não ser o dever de colherem e prepararem o cacau para ser exportado. Há quem diga que também de gentes que já por cá estavam e resistiram quanto puderam a serem... descobertas pelos que abriram caminhos marítimos para estas e outras terras acharem, e gentes descobrirem e serem descobertos. Sim, que conhecerem e darem-se a conhecer é outra coisa.
Povo de escravos libertos e de contratados sem contrato é um povo alegre, acolhedor, capaz de revolta, talvez nunca de revolução. Gostei muito, há 50 anos como agora, de (tentar) conversar com eles, de homem para homem. Nem sempre é fácil a conversa quando tão diferentes as circunstâncias fizeram os homens que tanto precisam de conversar. De homem para homem que o mesmo é dizer de mulher para mulher ou de mulher para homem ou de homem para mulher. De ser humano para ser humano!

Conversa com "badio" (natural de Santiago, Cabo Verde) há décadas em S. Tomé, para onde veio como "contratado".

(Os meus vizinhos e amigos oureenses reparem que trago vestida uma t-shirt da Casa de Ourém...)

1 comentário:

Anónimo disse...

Quarenta e oito anos te separam de uma viagem cheia de recordações e muitas emoções!
Quatro décadas! Tantas transformações, mudanças, convulsões!Revoluções!
A paisagem permanece intocável. Grandes árvores, belíssimos troncos sofrendo mutações com o desgaste do tempo, altas palmeiras, só abatidas pela força da natureza, mulheres de hoje dão um belo colorido aos lavadouros nos rios, de ontem!
O povo é sempre o mesmo! Humilde, simpático, imaginativo e trabalhador!
Mas há também a doença, a ruína, a falta de empreendimento, o desinteresse político.
S. Tomé tem matéria-prima, para poder crescer!
Para que serviu a descolonização? Onde está a libertação deste Povo?
Muita coisa mudou, claro! Seria injusta se não o dissesse. Mas em trinta anos, mais poderiam ter feito! Na cultura, educação, habitação, no progresso económico, em tantas outras vertentes!
Muito poucos usufruíram do bom que a independência, lhes havia ter proporcionado. Se fome não passa este belo país, o mesmo não se pode dizer de Angola, Guiné, Moçambique e tantos outros!
Países de excelentes escritores, pintores, homens de bem! Mas de muito má administração política!
Grande injustiça!
É pena o povo não merecia!

(como sempre lindas fotos)

GR