ou
as alegrias de um regresso a casa… e ao gato!
O nosso gato é um senhor. Sobranceiro, indiferente. Quase sempre por fora, pelos campos, não acorrendo a chamados, raramente dado a ternurices. É um gato. E um senhor.
Mas não é assim quando nos afastamos uns dias do seu convívio. Quando fazemos viagens de algum tempo que nos levam para longe da casa. E dele.
Quando assim é, o regresso mostra quanto a nossa falta foi por ele sentida.
Acorre, correndo, lança uns miados meio de boas-vindas, meio de protesto, meio de satisfação, meio (talvez…) de relato do que por cá se passou enquanto estivemos ausentes.
E não nos larga. Ronda-nos. Cerca-nos. Quase parece pedir que nos sentemos ou, melhor, que nos estiquemos num sofá.
Ao sentarmo-nos à secretárias para ver os mails e essas coisas, salta para os nossos colos, alternando os ronronares e amassamentos, os abraços à roda do pescoço da senhora dona com incursões pelo colo masculino para dar umas marradinhas por baixo do queixo, como quem quis “também senti a tua falta…”
E rápida chega a noite. Sem que ele esteja saciado da nossa presença regressada. Primeiro, impede a dona de fazer o seu tricot, porque é impossível manobrar as agulhas com um gato ao colo e reclamando carinhos. Depois, faz umas incursões ao meio dos jornais que estão a ser abertos e vistos pelo dono para se actualizar, como que para insistir na mensagem que ele também lhe é querido. Embora menos… mas paciência.
Depois, acalma-se e acama-se entre nós dois e não, como de hábito, em lugar próprio e exclusivo, faz-se novelo de onde, de vez em quando, estica uma patita para nos tocar, estende o pescoço para um afago no baixo do queixo. Deixa-se dormir como a imagem da bem-aventurança.
Quando resolvemos deitar-nos, deixamo-lo sossegadinho e fazemos todos os preparativos procurando não o perturbar no seu tranquilíssimo sono.
O caso é que, estamos nós ainda nas leituras pré-sono, o nosso gato, sentida a falta de companhia no sofá, vem, pé ante pé, espreguiçando-se, e salta para o que considera o seu lugar, no côncavo do braço da dona, amassando o sovaco.
Terminadas as leituras porque os sonos estão chegando, a dona, com cuidados e ternuras mil (conversam muito os dois, em surdina…) deposita-o aos pés de nós dois, num espaço que se abre entre as nossas pernas.
E ele fica. E assim adormecemos os três.
Mas… Mas, lá para meio da noite, o senhor gato deve lembrar-se das saudades que teve de nós, sobretudo da dona, e sobe, cama acima até se aconchegar no que deve considerar ser o seu lugar, ao lado da dona, todo esticado e volumoso.
Importa dizer, a propósito de aconchego, que a nossa (de nós três) casa é aconchegadinha, pequena, o quarto pequeno e a cama pequena porque maior não caberia no pequeno quarto. Resultado: três na horizontal e em paralelo torna-se difícil. Ela, a dona, chega-se um pouco mais para o centro esquerda da cama para dar espaço ao gato, e ele, o dono, fica, quase espalmado, entre o gato e (ela) e a parede.
Dorme-se mal nas noites de regresso a casa. Perdão, dormem mal os donos que nós somos, dorme regalado o gato nosso que ele é.
24.12.2006