quinta-feira, setembro 16, 2010

Um dicionário e uma palavra – 2

A “entrada” Marxismo, no dicionário de Romeuf, da autoria de Pierre Vilar, é muito interessante. Aprende-se com ela, ainda que lida com décadas de intervalo.
Primeiro, ressalva-se a actualidade do marxismo – então e hoje – por vezes não acompanhada, aqui e ali por deficiente leitura pela actualidade de quem lê. Apesar de Pierre Vilar fazer uma leitura séria e atenta da formação do pensamento marxista, dos elementos da teoria económica e dos elementos da teoria sociológica, e do marxismo depois de Marx e Engels, que necessariamente termina (a leitura…) no começo dos anos 60 do século passado.
É todo um caderno (16 páginas) do fascículo 17 e, nesta abordagem da actualidade i) do pensamento marxista e dos elementos da sua teoria económica e ii) da leitura e avaliação desse pensamento e teoria, bem parece que é esta última que não tem em devida conta a actualidade da primeira. Vilar afirma que “Para Marx (…) nenhum fenómeno fiduciário tem sentido económico profundo”, logo acrescentando que “o mundo actual submeteu estas teses a dura prova”, embora sublinhe que “não se conclua que Marx tratou superficialmente do papel da moeda”. Há, no entanto, que lembra o que o próprio Marx escreveu, dando bem expressão ao que de mais valioso tem o marxismo, o seu permanente enraizamento na realidade e a sua abertura às futuras realidades: «Na consideração das formas universais do circuito e, em geral, em todo este Livro segundo, tomamos [o] dinheiro como dinheiro metálico, com exclusão do dinheiro simbólico, meros signos de valor que apenas formam uma especialidade de certos Estados, e [com exclusão] do dinheiro creditício, que ainda não está desenvolvido.» (pg. 124 do Tomo IV do Livro 2º de O Capital, edições avante!).
Sublinho a expressão “ainda não está”, pois é a partir de o que está, mas não deixando de prever o que venha a estar que Marx pensa e teoriza.
Cabe aos marxistas, no tempo em que estão, continuar esse exercício. De seriedade, de (/ao serviço da) humanidade. Tarefa empolgante. Que tem de ser ambiciosa e humilde.
Voltando ao Dicionário de Romeuf, e ao extenso e interessante artigo de Pierre Vilar, aproveite-se ele afirmar que «os verdadeiros discípulos de Marx tiveram menos cuidado em requintar uma teoria económica, considerada praticamente suficiente, do que em fazer da teoria sociológica de Marx um instrumento da análise política para a acção.»
Faz muito pensar esta frase! Desde logo, dizer que o "discípulo de Marx" que mais e melhor fez do marxismo um instrumento para a acção, e que foi Lenine, tem trabalho inestimável de “requinte” da teoria económica marxista; depois, dizer que, na verdade, é erro de lesa-marxismo considerar suficiente a sua teoria económica. Há que a aprofundar no confronto e na análise da realidade, e a partir dos elementos da teoria económica marxista que lhe são intrínsecos.

(já volto)

3 comentários:

duarte disse...

interessante.
reside no termo socialismo, a implicação de interacção com a sociedade. Daí nada ser imóvel, e numa constante revolução , alterar o estado e a orgánica de tudo que nos rodeia. Bastando para tal pensar no bem estar de todos.
Abraço do vale

Graciete Rietsch disse...

Embora considere o assunto apresentado bastante difícil para uma rápida percepção, julgo poder concluir que o marxismo contém em si todas as perspectivas da evolução e do futuro, sendo portanto adaptável às novas condições e necessidades que entretanto foram surgindo.
Mas isto são apenas conclusões que vou tirando da leitura dos teus posts, decerto não muito correctas.

Terei alguma razão?

Um beijo.

Sérgio Ribeiro disse...

duarte - obrigado, desenvolves a reflexão...
Graciete - e vais tirando muito bem. Correctíssimas. Há que aprender - e faço-o emcada dia e em cada leitura - que o marxismo é tudo menos estático.

Abraços