08 DE FEVEREIRO DE 2019
Para
os países alinhados com Washington já não se trata apenas de violar
grosseiramente a democracia. Os governos que seguem de braço dado com a
administração Trump enveredaram pela carreira do crime.
John Bolton, Mike Pompeo e Mike Pence, antes do início
de uma conferência de imprensa
na Casa Branca,
7 de Junho de 2018. CréditosAndrew Harnik/AP / MPN News
Houve ocasiões – raras – em que os
principais governos da União Europeia se distanciaram do comportamento boçal,
truculento e neofascista da administração norte-americana gerida por Donald
Trump. É certo que as razões nem eram louváveis, uma espécie de escrever
direito por linhas tortas porque contrapor à política de fortaleza comercial de
Washington o neoliberalíssimo «comércio livre» global, que serve meia dúzia de
grandes conglomerados económico-financeiros, não é propriamente um
comportamento honroso.
Ainda assim, essa situação foi
suficiente para os que fazem política e comunicação navegando à vista nas vagas
do oportunismo situacionista tentarem fazer crer que entre Washington e alguns
dos principais aliados existiam saudáveis divergências, recomendáveis pelo
facto de «parecer mal» estarem associados aos desmandos trumpistas.
Porém, o que tem de ser tem muita força,
a realidade impôs os factos, as máscaras caíram, o globalismo ditou as suas
leis, embora já periclitantes, e deixou de haver lugar para disfarces.
A harmonia entre Washington e os aliados
restabeleceu-se quando foi preciso por mãos à obra e cuidar do que interessa a
quem manda: o domínio sobre as matérias-primas e a vantagem militar planetária
para, em última instância, assegurá-lo.
Bastou o aparecimento de provas de que a
superioridade militar da NATO e respectivas ramificações pode estar em causa;
eis que entra na ordem da actualidade uma disputa mais cerrada pelas riquezas
naturais do mundo – e logo a boçalidade e o desprezo militante de Trump por
qualquer coisa que tenha a ver com democracia e direitos humanos deixaram de
ser problema.
A harmonia chegou com os psicopatas
Esbateram-se os limites, desapareceu a
vergonha. Se o caminho mais eficaz para garantir a sobrevivência do «nosso
civilizado modo de vida» é o recurso à autocracia, então que seja, desde que o
discurso oficial assegure as melhores intenções democráticas e humanistas.
Mesmo que a harmonia entre a NATO e a
gestão do Pentágono, a comunhão de ideais entre quem manda na União Europeia e
a administração de Washington se tenham restabelecido no momento em que, depois
de muitos tumultos e convulsões, a equipa que traça a doutrina Trump seja agora
um sólido núcleo de psicopatas.
John Bolton, o conselheiro de Segurança
Nacional do presidente; Michael Pompeo, o secretário de Estado, por inerência o
titular dos Negócios Estrangeiros; Michael Pence, o vice-presidente, formam um
triunvirato de fascistas com provas dadas em carreiras onde o recurso ao
terrorismo político, declarado ou clandestino, nunca foi um problema.
Se lhes associarmos as figuras de um
comprovado assassino e fora-da-lei como Elliott Abrams, agora escolhido como
enviado especial para gerir o golpe na Venezuela; e de um expoente da
«supremacia branca» como Steve Bannon, que corre mundo unindo as hordas
fascistas, xenófobas, populistas e nacionalistas para manter a pressão, de modo
a que o neofascismo seja a solução e nunca um problema, teremos um quinteto de
psicopatas à altura de Trump, de tal modo que torna o próprio presidente descartável.
União Europeia ao lado de Trump contra a Venezuela
União Europeia ao lado de Trump contra a Venezuela
Pois foi precisamente na hora da estabilização do fascismo e da sociopatia como doutrina norte-americana que a NATO e a União Europeia – com o governo de Portugal fazendo questão de destacar-se – decidiram prestar-lhe vassalagem. Certamente não foi para que o governo português encarreirasse na esteira do terrorismo político e da guerra nuclear que os portugueses votaram.
Para os devidos efeitos e para memória
futura registemos o desprezo assumido pela equipa de
António Costa em relação à democracia, aos direitos humanos, à paz e ao direito
internacional. Não existe outra interpretação possível do apoio ao
golpe contra a Venezuela; não há hipótese de concluir outra coisa do
alinhamento pleno com a NATO nos caminhos da guerra nuclear que estão a ser
abertos por Washington.
É terrorismo, não é democracia
Aquilo que está a acontecer na
Venezuela, e que tem proactivamente a mão do governo de Portugal, é terrorismo,
é tentação fascista, é jogar com a vida de milhões de pessoas.
Não se trata apenas da entronização como
«presidente interino» de um arruaceiro que os Estados Unidos treinam e pagam há
15 anos para servir como instrumento numa operação de golpe de Estado. Juan
Guaidó é um entre vários que se formaram numa escola de terrorismo na Sérvia
financiada pelos Estados Unidos, conhecida como Otpor/CANVAS1, para organizar «revoluções
coloridas» e mudanças de regime em geral, de que são exemplos casos como o da
Ucrânia, Geórgia, Egipto, Líbia, Síria, Honduras, Paraguai, Brasil.
E não se trata igualmente do recurso ao
pretexto das supostas «irregularidade» e «ilegitimidade» das eleições
presidenciais de Maio do ano passado, que decorreram segundo normas
democráticas comprovadas por entidades independentes e de reconhecida
idoneidade que acompanharam todo o processo. Ao contrário do que fizeram, por
exemplo, o secretário-geral da ONU, António Guterres, e a alta comissária
europeia, Federica Mogherini, que recusaram os convites para serem ou enviarem
observadores, partindo do princípio de que as eleições seriam fraudulentas
muito antes de se realizarem.
O que está verdadeiramente em causa como
consequência do comportamento das personalidades, entidades e organizações que
apoiam a estratégia de mudança de regime montada pela equipa de psicopatas de
Trump é a tragédia que paira sobre todo o povo venezuelano – comunidade
portuguesa obviamente incluída.
Uma tragédia anunciada, uma vez que os
promotores da operação tiveram o cuidado de não deixar margem de recuo. A
parada é alta e todo o processo foi montado de modo a que não haja outra saída
que não seja a destruição da Revolução Bolivariana, sufragada em mais de uma
vintena de consultas populares legítimas realizadas durante os últimos 20 anos.
Solução: banho de sangue
Ora a capitulação do governo de Nicolás
Maduro – que não tem de se demitir ou de convocar eleições porque a
Constituição, a única lei pela qual responde, não o obriga – só pode ser
alcançada por estas vias: golpe militar interno, agressão estrangeira directamente
pelos Estados Unidos ou por procuração (Brasil, Colômbia e Argentina estão
prontos), ou colapso absoluto do Estado devido às sanções, extorsão e roubo
de que os bens do povo venezuelano são vítimas – a começar pelas 31 toneladas de ouro
de que entidades bancárias estrangeiras se apropriaram abusivamente,
também com responsabilidade do Banco Central Europeu, para que conste.
Sejam quais forem os caminhos seguidos
pelos responsáveis do golpe, o resultado será um banho de sangue com extensão
imprevisível. Esse é o preço que Estados Unidos e aliados estão dispostos a
pagar para deitarem as mãos aos 300 mil milhões de barris de petróleo
venezuelano – as maiores reservas mundiais conhecidas – às poderosas reservas
de ouro, nióbio, tântalo e outros elementos e metais preciosos.
Não há pretextos e máscaras que sirvam
para a ocasião. O que, através do golpe, os Estados Unidos, a União Europeia e aliados
puseram em andamento foi a compra que um valiosíssimo lote de riquezas naturais
e estratégicas pago com sangue humano, na quantidade que for precisa.
Afinal, tal como no Iraque, na Líbia, na Síria ou Afeganistão.
O caminho para a guerra nuclear
A fuga para a frente com o objectivo de
garantir a sobrevivência do neoliberalismo, conduzida pelo gang de
tiranos sociopatas de Washington, não hesita, como se vê, perante a repugnante
e desumana traficância em curso na Venezuela.
Fuga essa que começa a adquirir
velocidade própria numa outra direcção até aqui vedada pelos mais
compreensíveis instintos de sobrevivência colectiva: a da guerra nuclear.
Não há outra leitura para a decisão
norte-americana de abandonar o Tratado de Armas de Médio Alcance (INF2), assinado há 30 anos pelos
Estados Unidos e a União Soviética.
Não há outra leitura do apoio a essa
posição manifestado pela NATO e pelo sempre «bom aluno», o governo de Portugal.
Os pretextos invocados para o abandono
do Tratado são falsos ou, no mínimo, desconhecidos. Nem os Estados Unidos nem a
NATO apresentaram, até ao momento, qualquer prova de que a Rússia estaria a
violar esse acordo. Em paralelo, também não se regista qualquer interesse,
tanto dos dirigentes norte-americanos como da NATO – e da comunicação social
com eles sintonizada – em aceitarem os convites de Moscovo para
visitarem os locais onde supostamente estariam a ser construídas as armas que
violam o Tratado.
Ao invés, a parte russa já divulgou
provas de que os Estados Unidos estão a produzir
armas proibidas pelo Tratado há pelo menos dois anos.
É objectivo dos Estados Unidos instalar
os novos mísseis em países europeus como a Itália, a Alemanha e a Holanda, onde
também está prevista a disponibilização de bombas nucleares de nova geração3.
Torna-se evidente que o recurso a essas
bombas implica a existência de mísseis vocacionados para transportá-las – e daí
a quebra do Tratado INF.
Deduz-se, pois, que pelas cabeças
doentes e sanguinárias de figuras como Bolton – que pretende enviar Maduro para
Guantánamo – Pence e Pompeo passa, de facto, a ideia de vir a utilizar essa
nova combinação de mísseis de médio alcance com armas nucleares de «potência
reduzida» e tendo a Europa como um dos cenários de operações. Pelo que os
países europeus sintonizados com os tiranos sociopatas de Washington não
desprezam apenas a vida dos venezuelanos, mas também a dos seus próprios povos4.
Já não se trata apenas de violar
grosseiramente a democracia. Os governos que seguem de braço dado com a
administração Trump enveredaram pela carreira do crime.
4 comentários:
Os meteorologistas têm-se enganado muito: pode ser que amanhã não chova em Caracas!
Um abraço latino-americano
É verdade.
A vida é cheia de surpresas. E algumas boas...
Mas que está frio, está.
E não chove em Santiago (de Cabo Verde), nem faz frio!
Abraços calorosos.
Informei-me, e apesar de não ser surpresa, é muito assustador!
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