terça-feira, agosto 10, 2010

Reflexão lenta, curta... e sempre urgente - 59

É o marxismo científico?

Este é o título de um dos cadernos O Militante - o nº 3 - de José Barata-Moura que em boa hora (ora se foi!) se decidiu editar.
São textos curtos, recuperados de outros mais extensos e já publicados, neste formato continuando e renovando uma reflexão sempre urgente sobre marxismo, e que JB-M nos proporciona com muito saber e sempre pertinente e penetrante utilidade.


Dele retiro trechos, não com intenção de resumir e fixar aquilo que convoca, na sua dimensão e proposição, a mais leitura, a sempre mais leitura, mas porque deles me estou a servir para melhor escorar posições que, por tarefa, entendo dever tomar.

«(...) Reduz-se, tranquila e esmiuçadamente, a cientificidade à mensuração de "coisas", à descrição de "factos, ou ao alinhamento de "eventos" - que por si e em si, na clausura de um horizonte protocolado de imediatez tendencial, proporcionariam de pronto a confirmação (ou a infirmação, rebuscadamente baptizada, por alguns: "falsificação") de teorias explicativas e de previsões. Não se cuida de examinar nem a respectiva conexão, nem o seu fundamento material, nem a historicidade mesma - tanto do real (que não é imediatamente convertível com o existente), quanto do nosso próprio conhecimento do real.
«Reduz-se, conversacional e congregadamente, a celebrada e enaltecida cientificidade ao "consenso" putativo, e à "sobreposição" presumível de entidades só em abstracto estabilizadas sob a designação respeitável de "comunidades científicas", quando não, algo mais enevoadamente, de main stream (ou de corrente principal, hegemónica). Não se cuida, com frequência, de examinar materialmente, e segundo um despreconceituado espectro alargado de possibilidades reais, nem a dialéctica do ser nem a controvérsia real dos saberes.
«Procura-se, em suma, retirar antecipados dividendos ideológicos de uma "epistemologia" grosseiramente simplificada, convenientemente enviesada, generosamente desatendida na sua concreção, exuberantemente servida para efeitos de remoção liminar e preventiva de quaisquer outras considerações, na eventualidade, mais perturbadoras.
«De acordo com esta panóplia de usanças - assaz disseminada, aliás, e infelizmente - a invocação do "científico" propende a funcionar mais como um ferrolho encarcerador da indagação, e da necessária demanda de esclarecimento, do que como uma chave desencadeadora da pesquisa e da vivificação, em termos de inteligibilidade, de aquilo que se vai apreendendo e aprendendo.(...)»
.
Por aqui, por estas sendas ditas da filosofia, continuaria transcrevendo, para além da leitura e da reflexão. O que me é muito necessário ler e reler, para o ensejado ir apreendendo e aprendendo, mas há que tentar acrescentar alguma coisa daquilo (de aquilo) que são os nossos/meus caminhos, os da economia.
Há que apreender, da filosofia, todo o fundamento da materialidade e toda a dimensão da historicidade. E que ser capaz de dar um pequeno, modesto, humilde, contributo que resulte da reflexão económica sobre a nossa contemporaneidade. Que, bem vistas as coisas, não existe. Porque o contemporâneo é o que foi passado e é o futuro (deste mesmo caderno: «(...) é "feituro"; pode ser feito, mas tem de ser feito»!) .
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A "cientificidade económica" tem tudo a apre(e)nder... mas também pode (tem de) ajudar!

8 comentários:

Graciete Rietsch disse...

Já li duas vezes o post que considero bastante difícil. Mas, na minha modesta interpretação, penso que muitas conclusões e afirmações qoe se pretendem veicular resultam da deturpação dos factos retirando-os do seu contexto histório e científico.
É uma análise muito simplista e não sei se correcta pois eu sou pouco conhecedora desses assuntos.
Mas os camaradas Sérgio Ribeiro e José Barata Moura são altamente especializados.

Um beijo.

Mário disse...

Se bem entendo, só se pode estar de acordo com o Camarada Barata Moura. Porém, se a um semelhante, um trabalhador como eu, lhe disser que não estou de acordo com o aumento dos salários, ainda que antepondo a luta pela repartição da riqueza, reforço ou não o discurso hegemónico?

Saudações

Mário

poesianopopular disse...

Ao ler este teu trabalho sobre o trabalho do JBM, fiquei pensando - só não aprende, quem não quer.
Obrigado camarada Sérgio!

Sérgio Ribeiro disse...

Graciete - Concordo com a dificuldade da mensagem. A exigência de mais do que uma leitura não é muito compatível com as nossas comunicações que TÊM DE SER, na maior parte dos casos, imediatas e imediatamente acolhidas. Mas estas, a que fazem ler, reler, treler (não tresler...) também são indispensáveis. E cada vez mais! Há tanto para fazer... e tanto para fazer BEM. Como dizia o Lenine: aprender, aprender, aprender sempre.
Mário - Percebo a tua dúvida... porque é nossa.
E dir-te-ia que depende das circunstâncias. E o que me parece que tem de se evitar é esvaziar de conteúdo ideológico as reivindicações e o discurso imediato. Dar a estes, sempre, um sentido didáctico, pedagógico.
Às vezes, quase sempre, mais para nós que o fazemos que para os que são os seus receptores.
poesiano popular - Pois é. E tem de se lhe dar a volta com o estímulo ao querer aprender sempre, a começar pelo saber que todas as forças do outro lado tudo fazem para dificultar a tomada de consciência.

Abreijos

Mário disse...

Árdua tarefa essa, que recordam como proposta tu e o José Barata Moura, mas, não há argumento válido que desvirtue tamanho compromisso com dito desafio. Será questão de, assumindo, humildemente, o nosso lugar no universo, empenhar o esforço (todo) necessário para defender de forma convicta um ideal contrário à imediatez condicionante do progresso. Nessa luta, penso que aspectos como o medo, nosso, do povo, de perder o controle sobre os acontecimentos que determinam a sua vida, enquanto preferem cómodamente acreditar que esta se define com o voto que defende a estagnação conhecida ou o estabelecido, é um obstáculo maior. A fragilização dos critérios é uma realidade, a recompensa por qualquer risco parece nula para a maioria, o "não", que o povo disse em 74, tem vindo a ser rentabilizado pela direita desde 75/6, havendo-se transformado num "sim" ao abrigo da renúncia imposta pelas relações de produção.
Assim, colocar o povo, e as suas contradições, como protagonista da história é prioritário objetivo dos comunistas.

Anónimo disse...

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