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Edição Nº2174 - 30-7-2015
No Dia dos Avós
O passado domingo, dia 26 de Julho, foi o Dia dos Avós
pelo menos em Portugal e no Brasil, tendo a data sido escolhida, ao que consta,
em consequência de o dia ser também consagrado a Joaquim, santificado por ter
sido avô de Jesus graças à extraordinária gestação de sua filha, Maria. Não será
uma razão e um vínculo parental exageradamente fáceis para o comum das gentes,
nem geralmente o são as vidas dos santos e a sua projecção nos diversos
quotidianos, mas é claro que não é isso que importa: o 26 de Julho é o Dia dos
Avós em Portugal, aliás apenas desde 2003, e pronto. Tanto que pelo menos a TVI,
talvez recordando-se um pouco dos bons velhos tempos em que era o canal de
assumida inspiração cristã no quadro televisivo português, dedicou à efeméride
cerca de uma hora no seu TVI24, acessível por cabo, decerto confiando em que os
netos portugueses que apenas têm acesso aos quatro canais abertos se lembrassem
dos seus avós sem que para tanto fossem ajudados pela televisão. De resto, não
há motivo para descrer em que a inspiração dos céus possa servir também para
recordar estas pequenas coisas, ela que, infelizmente, não parece que lembre as
coisas grandes, fundamentais, às cabeças dos que têm a estrita obrigação de
nunca as esquecer. Passemos. Para registar que na TVI24 foram entrevistadas pelo
jornalista Henrique Garcia duas senhoras avós de excelente aspecto, com formação
universitária e de nível cultural decerto acima da média portuguesa que, como se
sabe, é baixinha de um modo geral e não apenas entre as avós. Sem nada que
especialmente as recomendasse foram, sem dúvida, duas entrevistas agradáveis. E
assim a TVI festejou, com perdão da palavra que é excessiva, o Dia dos Avós no
Portugal de 2015.
Os que não têm tempo
Acontece, porém, que isto dos avós portugueses aqui e
agora é assunto que na verdade exige muito mais do que a consagração de um dia
em cada ano, como uma espécie de desobriga pascal transferida para os calores do
estio pouco ou nada celebrada na TV ou fora dela. Como a própria televisão por
vezes nos vai permitindo saber e como o nosso encontro pessoal com a realidade
nos revela, a generalidade dos avós portugueses é talvez o sector social mais
vergastado pela impiedade do Governo Passos Coelho e também o mais indefeso. Os
avós, isto é, os velhos, assistem impotentes a que os pais dos seus netos sejam
despojados do posto de trabalho que permitia a manutenção de uma vida familiar
sustentável; vêem os netos a serem condenados a um quotidiano de privações
várias que muitas vezes inclui a fome e noutras vezes passa pelo recurso a
esmolas que pouco ou mal disfarçam a humilhação que implicam; desesperam-se ao
verificarem que as suas pensões assaltadas por taxas e impostos não bastam para
salvar os netos das privações e os filhos das múltiplas desgraças que são
lançadas sobre eles por quem quer, pode e manda. Os avós portugueses são, hoje,
o elo mais impotente de uma sinistra cadeia de infelicidades contra a qual já
pouco ou nada podem porque são avós, isto é velhos, e além do mais o desapreço
pelos velhos é um dos mandamentos não escritos mas cumpridos nesta sociedade
«pragmática» e desinibida, isto é, sem remorso nem vergonha. Os avós são, como
regra geral, os que estão marcados para sofrer e menos municiados para a defesa
do modesto minimundo que puderam construir com enormes custos pessoais ao longo
de décadas. Por tudo isto, que está muito longe de ser tudo, bem se justificava
uma generalizada celebração, séria e consciente, do Dia dos Avós, na televisão e
fora dela. Melhor: bem se justificava multiplicar essa celebração pelos
trezentos e sessenta e cinco dias do ano. Para que, enfim, à generalidade dos
avós portugueses fosse prestada não apenas a carinhosa homenagem que merecem,
mas também o socorro de que talvez a larga maioria deles, por motivos directos
ou indirectos, necessite. Socorro que é urgente e inadiável. Porque os velhos
não têm tempo. Para esperar.
Correia
da Fonseca
1 comentário:
Este paîs,nao ê para velhos!Bjos
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