Terminará hoje o prazo para o Governo entregar, na Assembleia da República, a sua proposta de Orçamento de Estado para 2011.
Como muito bem lembrou ontem um ex-ministro da economia de Guterres, que se dedicou a outros negócios - ou que se dedicou, em exclusividade, ao negócio -, não é o Governo que condiciona a Assembleia mas a Assembleia que deve condicionar o Governo.
Não foi exactamente assim que terá dito, mas esta era a ideia, mostrando que não esqueceu de tudo o que aprendeu por outras Escolas, e que se traduz no facto de ser a Assembleia da República que aprova (ou não) a proposta de Orçamento e não o Governo que aprova o que quer que seja da Assembleia da República.
Parece um pormenor com ares de questão processual de somenos?
Pois não o é. E a prova é que antes do 25 de Abril, o Orçamento (Geral) do Estado era da exclusiva responsabilidade do Governo, não tendo de passar pela Assembleia Nacional. O Governo apresentava à Assembleia uma Proposta de Lei de Meios, com o que intentava que viessem a ser as linhas gerais da política no ano seguinte, a Assembleia Nacional aprovava (claro!) essas intenções, e o Governo fazia o seu Orçamento (Geral do Estado), sem qualquer outro condicionalismo que não fosse o de, teoricamente, respeitar as linhas gerais adoptadas pela Lei de Meios.
Era assim. A mudança não foi apenas formal. O centro de decisão deslocou-se para onde estão os eleitos, e deverão ser os eleitos a aprovar o Orçamento de Estado, sob proposta do Governo. E se a Assembleia Nacional não tinha um pingo de democracia e só servia de faz-de-conta, depois de 1976, a Assembleia da República passou a ser, no papel (constitucional), o local onde os representantes do povo que os elege decide sobre o orçamento enquanto instrumento da política.
Estou a escrever sobre ficção? Não. É sobre democracia, tal como plasmada em Constituição da República Portuguesa. Mas, como dizia o título de um livro já com muitas décadas, na prática a realidade é outra. Bem pouco democrática.
ainda sairá mais qualquer coisa
3 comentários:
Claríssimo, o teu texto.
Entretanto, apesar de a história não se repetir, hoje existe quem pretende esvaziar, na prática, essa mesma discussão e aprovação. Hoje, depois de terem adulterado a discussão e aprovação do Orçamento do Estado, depois de terem tornado este documento num opaco amontuado de folhas e quadros, depois de impedirem a fiscalização e identificação dos projectos do Plano de Investimento e Despesas de Desenvolvimento da Administração Central, não desistem da pretensão de limitar a discussão política da actividade do Estado e do seu financiamento.
Já não bastava a cedência ao visto prévio de Bruxelas (ou Berlim), este ano, pela primeira vez desde o 25 de Abril, desde a aprovação da Constituição de República, o OE não será aprovado na especialidade em Plenário da AR. Este ano, o plenário da AR apenas votará o documento na generalidade e na globalidade final. Este ano, um Grupo Parlamentar não poderá votar na epsecialidade o OE. Eu sei que o mesmo já acontecia com uma boa parte. Mas, o financiamento do Estado (a fiscalidade) era votada na epsecialidade em Plenário.
Com a desculpa de ninguém perceber o que estava a fazer, com a preocupação do impacto nas TV, a maioria, incluindo o BE, deu mais um passo no retrocesso democrático... Para não lhe chamar outra coisa...
Como caminhamos a passos largos para o 24 de Abrul!!!!!!
Temos que continuar a cantar, com muita força, a canção "Levanta-te, meu Povo, não é tarde"
Um beijo.
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