domingo, maio 13, 2012

Marx em Maio - publicação de comentário


A publicação da minha intervenção no Congresso Marx em Maio, suscitou alguns comentários e uns deles (de HM) diferentes do habitual que  fecharam com uma sugestão de transformar o comentário em artigo no corpo deste "blog". Agradeço e aceito (tal qual me chegou) a sugestão, com duas observações:
  • esta publicação não representa concordância com tudo o que está escrito nas mensagens, e a que eventualmente voltaremos, são mais reflexões sobre o que importa (sempre) reflectir;
  • que fique muito claro que não penso que a invasão, na circulação do capital, do dinheiro fictício e creditício venha contrariar a lei da baixa tendencial da taxa de lucro... vem tentar contrariar os efeitos da lei, por isso a confirmando!  
Aqui vai:

«Que o Sérgio me permita a reprodução, e me permita também a sugestão atrevida de publicação no corpo do blog (igualmente válido para qualquer leitor), da seguinte historieta, que conhece bem, pois foi publicada como nota de rodapé num livro brilhante do “seu tempo” (salvo seja), «A troca desigual», do Arghiri Emmanuel. Discordo da tese central do livro, que não obstante me abriu muito os olhos, mas entre outras formulações e considerações notáveis, esta simples anedota diz mais e explica melhor o que é a especulação bolsista do que muitas elocubrações teóricas.
HM

Isaac e Levy são dois joalheiros instalados frente a frente na mesma rua. Um dia Isaac compra um colar de pérolas finas por dez dólares apenas. Vai-se gabar disso junto de Levy. Levy fica maravilhado. «Vende-me esse colar», suplica ele, «tinha justamente prometido um semelhante à minha mulher Rebeca, ela ficará encantada, aqui tens onze dólares». Isaac deixa-se convencer. Ao meio-dia conta o negócio à sua mulher Sara. "Às dez horas da manhã", diz ele, "comprei um colar por dez dólares, às dez e cinco revendi-o a Levy por onze dólares. Ganhei um dólar em cinco minutos".
– Imbecil, diz-lhe Sara. Cais sempre nas mesmas... Se Levy te comprou esse colar por onze dólares, é porque viu que ele valia muito mais. Trata de o ir recuperar imediatamente.
De tarde Isaac vai ter com Levy. «Levy», diz ele, «se és meu amigo, revende-me esse colar. A Sara fez-me uma destas cenas... Tens aqui doze dólares».
Levy aceita e à noite conta a Rebeca a sua aventura: «Esta manhã Isaac veio vender-me um colar por onze dólares e esta tarde voltou a comprar-mo por doze. Ganhei um dólar sem me mexer do meu balcão.»
– Imbecil, diz-lhe Rebeca. Fazes sempre das mesmas. Mas se Isaac voltou a ter contigo para te comprar esse colar por mais um dólar do que to tinha vendido, é porque entretanto descobriu que ele valia muito mais. Vai recuperá-lo.
No dia seguinte de manhã Levy põe treze dólares em cima do balcão de Isaac e retoma o colar. No dia seguinte é a vez de Isaac por 14 dólares e assim de seguida.
Algumas semanas mais tarde, o colar está a 24 dólares e encontra-se em poder de Isaac. Levy chega e põe 25 dólares em cima da mesa.
– O colar, diz ele.
– Já não há colar, responde Isaac. Ontem à noite, antes de fechar, passou uma americana, ofereci-lho por trinta dólares, ela levou-o.
Levy fica desesperado.
– Vendeste o nosso colar! Mas, desgraçado, com esse colar, sem grande pena, calmamente, ganhávamos por dia um dólar cada um. E tu vendeste-o! O nosso ganha-pão!

Quando se conta esta história em sociedade, geralmente as pessoas riem. A ideia de que se possa enriquecer sem produção nem alienação parece-lhes ridícula. Mas quando exactamente a mesma coisa se produz na Bolsa, com a única diferença de que em vez de termos um Isaac e um Levy, temos mil Dupont e mil Durant que trocam acções, as pessoas tomam isso absolutamente a sério e até estão prontas a tomar parte no jogo. O que era objectivo e imaginário no caso dos dois indivíduos tornou-se objectivo e real no caso de grande número de indivíduos.

Arghiri Emmanuel
A troca desigual, volume I, pp. 165-6,
nota de rodapé, editorial Estampa, 1973
(edição original francesa de 1972).

Sem comentários: