Eles estão mesmo descontrolados. Eles pensam a vida e o mundo substituindo os sentidos, que cinco seriam com mais um sexto que só alguns terão, por um único. Que é o seu umbigo. Mas são muito inteligentes, muito cultos, leram tudo o que valia a pena ler, viram têm tudo o que valeria a pena ver, ouviram tudo o que valeria a pena ouvir. E tudo filtraram pelo tal umbigo, tudo coado e transformado em opiniões definitivas e inabaláveis.
Eles têm um ódio que os une nas suas rivalidades e invejinhas recíprocas: o ódio aos comunistas. A essa gentinha (segundo eles...) que tem a ousada pretensão de transformar o mundo. Este mundo em que eles se sentem como peixinho colorido em aquário, procurando suscitar ohs! de admiração e alimentando-se das iguarias sofisticadas que o mercado criou para animaizinhos de (boa) companhia.
Viviam nababamente, instalados em mansões nestas paragens à beira Atlântico e,por vias deste, de outras terras e caminhos, fazendo tranquilamente os seus "números", depois de terem apanhado um susto lá pelos anos 74 e 75 - a que, aliás, se tinham forçado, com juvenil radicalismo, a adaptar na convicção de que as revoluções se fazem já! -, e eis senão quando um sobressalto os agita.
Eles, que tinham enterrado em definitivo seus juvenis arroubos nas pedras que ruíram de um demonizado muro, eles que, embora desconfiados, passaram certidões de óbito a um partido comunista que comunista queria continuar a ser, eles reagem, entre atarantados e peremptórios, ao que está a acontecer ao redor do aquário aquecido e iluminado.
Veio ao de cima o que dentro de si têm vindo a guardar e a acarinhar: o desprezo ou a zanga pelos outros, que os enfastiam e incomodam, e o ódio aos comunistas, que nos outros se revêm e que, como lhes é natural, querem mudar as suas desgraçadas situações de hoje sem desistirem de transformar o mundo.
E, se assustados parecem, a verborreia extravasa-os. Alguns exemplos nos entram em casa, como afirmações inteligentíssimas (embora torcendo a História) de eu, comunista não sou, ou como ardilosas construções de inimizades íntimas que falsificam a tão maltratada História.
Um ódio de classe por interpostos e servidores escribas de auto-reclamada e elogiada qualidade intelectual.
Sinto necessidade de escrever isto porque também, de vez em quando, extravasa o meu copo de paciência. E bem largo e alto ele é... ou se foi tornando.
Um títere que se assina Vasco Pulido Valente, e que tem à disposição três colunas na última página do Público, editou um vómito intitulado Os dois governos, em que tropecei, e onde li coisas que VPV bolsou sobre os comunistas, sobre Álvaro Cunhal, sobre o Partido, sobre «o "centralismo democrático", que matou milhões» (!).
Para recuperar do incómodo que a exposição de tanto ódio cego me provocou, fui passar os olhos pelo O Partido com paredes de vidro, onde há alguns trechos do capítulo A democracia interna, que se recomendaria como terapêutica se tal enfermo tivesse cura. Mas não tem!
É, só, um ódio que mete dó!
1 comentário:
Grande texto!
(pode ser que assim, a fazer o pino, ganhe juízo...)
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