quarta-feira, julho 11, 2012

Sobre o contributo de Marx para o marxismo… uma questão de números!

A reflexão sobre o tema “o contributo de Marx para o marxismo” como que me apanhou no percurso de uma mais larga e permanente (e infindável…) reflexão a partir de leituras de Marx. Que há décadas vou fazendo, nunca sistematizadamente, nunca com veleidades de investigação.
Foi o Congresso Marx em Maio que me levou à publicação de tal reflexão, em várias versões. Escorado nas leis (ou regularidades) da composição orgânica do capital e da baixa tendencial da taxa de lucro, sublinhei a existência, no Livro Terceiro de O Capital, de um capítulo – o XV em tradução francesa, e o XIV em tradução italiana, que me acompanham há décadas – em que se enumeram os “factores que se opõem à baixa da taxa de lucro” (tradução do francês) ou “causas antagónicas” (tradução do italiano), que seriam seis.
Não se tratando de investigação aprofundada mas tão-só de reflexão a partir de, e sofrendo de duas debilidades – uma, pessoal, de não saber alemão; outra, alheia embora solidária, de não estar ainda publicado o Livro Terceiro em edições avante!, com o rigor e a credibilidade que lhe emprestam a tradução de Barata-Moura –, baseei-me no volume das oeuvres choisies das Editions Galimard, de 1966, para referir 5 desses factores e sobre eles… continuar a reflexão, não sem que confrontasse a edição italiana (da Newton Compton Italiana), trazida de Milão, clandestinamente há mais de 40 anos.
 
Porque recordo isto? Porque, na minha reflexão, a edição francesa de que me servi apenas refere 5 “factores” e, na edição italiana, há ainda texto, que é claramente um acrescento (é preciso lembrar que o Livro Terceiro resulta de trabalho de Engels sobre manuscritos deixados por Marx. e foi publicado bem depois da sua morte) e conclui com uma 6ª “causa antagónica” que começa por dizer “poder-se-ia ainda juntar, aos cinco pontos examinados antes, este outro, que todavia não se pode tratar a fundo” (minha tradução do italiano).
São estas razões (se o são…) porque, por minha conta e risco, apenas considerei 5 “factores”.
Terei cometido a imprudência de, no texto publicado no avante! com base na comunicação ao Congresso Marx em Maio (e só aí!) ter atribuído um número ordinal (o 6º) a um novo “factor” que pretende  contrariar a baixa da taxa de lucro. No entanto, não atribuo qualquer gravidade a essa (chame-se-lhe) “imprudência” pois, se é verdade que o numero está ocupado (aumento do capital por acções), o está precariamente e, para mais, apenas apontando para o que, não sendo relevante em 1864/65 (data do manuscrito), tanto o é, noutra formulação, em 2012, e justifica a referência e o estudo de um novo factor além dos 5 estudados por Marx nos seus manuscritos.
Faço este esclarecimento para que não fiquem dúvidas a partir da eventual leitura de dois artigos muito próximos no avante! que aparentemente se contradizem pois, num (de 17.05), eu atribuo o ordinal 6º (com um ponto de interrogação colocado entre parênteses que a redacção, no sub-título, não adoptou…) ao novo “factor” que viria contrariar a baixa tendencial da taxa de lucro (confirmando-a) e, num outro artigo (de 05.07) interessante e oportuno, de António Vilarigues (Algumas notas sobre o óbvio), se escreve que “Marx enuncia os seis factores que podem contrariar essa lei tendencial”, que são enumerados, socorrendo-se da edição de O Capital das Editions Sociales de 1969.

Estará tudo certo… desde que, obviamente, esclarecido!

3 comentários:

Graciete Rietsch disse...

Importante, importante é saber entender e esclarecer o que se escreve e saber localizá-lo no tempo pois, como neste blogue eu julgo já ter lido, o que ontem era luxo, hoje pode ser necessidade.O importante é adaptar os pricípios à realidade.Acho que também já li isso no teu blogue.
E já agora, a propósito de quem diz que a classe operária já não existe, gostava de referir aqui a referência elogiosa que ouvi no úitimo prós e contras( deve ser o único que ouvi totalmente) aos OPERÁRIOS PORTUGueses que trabalham no CERN, por parte de um cientista português responsável pela extraordinária descoberta do muito provável "bosão de Higgs".

Um beijo.

Anónimo disse...

Confesso que não gosto nada desta enumeração em factores. Maneira demasiado esquemática, não exaustiva e mal arrumada com que o Marx, num texto de rascunho, pretendeu realçar alguns dos principais aspectos que, no seu tempo, contrariavam a baixa tendencial da taxa geral de lucro.

Demasiado esquemática, porque enumerados assim, parcelarmente, perturbam a compreensão global, mais aprofundada, que os ata a todos na explicação de como actuam através do aumento da taxa de exploração e/ou da diminuição da composição orgânica do capital na oposição ao declínio tendencial da taxa geral de lucro (além de que a mera enumeração como factores antagónicos destrói o profundo sentido dialéctico de que se actuam no sentido da alta da taxa de lucro, agindo como contra-tendências, também têm implicações no sentido da baixa, contribuindo para a tendência).

Não exaustiva, porque existem outras formas importantes de contrariar a baixa. Para não ir mais longe, meramente a título de exemplo, basta ver o cap. 4 deste mesmo livro III, “Influência da rotação sobre a taxa de lucro”.

Mal arrumada, porque os factores são de natureza diferente (mais teóricos ou mais empíricos), de importância muito desigual e alguns podem-se reduzir a outros. Por exemplo, a “redução do salário abaixo do valor” poderia ser tomada como caso especial do “aumento do grau de exploração do trabalho”. A exposição é perfeitamente legítima e compreensível quando se pretende desenvolver, além do factor “geral” do aumento da exploração, o factor “particular” da diminuição do salário abaixo do valor, mas torna-se bastante desajustada quando, fora do contexto da exposição, se enumeram os factores de modo independente e, numa aparência enganadora, em pé de igualdade.

A taxa de lucro, a este nível de generalidade, é dada, na sua expressão em valor, pela razão entre a mais-valia criada e o capital, constante e variável, investido. É interferindo nestes três termos – mais-valia, capital constante e capital variável – e na relação entre eles que as contra-tendências actuam. Sempre a este nível de abstracção, uma pequena manipulação aritmética da expressão da taxa de lucro mostraria, com proveito para a análise, que é, na verdade, através de alterações na taxa de mais-valia (relação entre a mais-valia e o capital variável) ou na composição orgânica do capital (relação entre o capital constante e o capital variável) que as (cinco) contra-tendência actuam.

Uma última observação sobre o “6º factor”. É, em minha opinião, inadequado apresentá-lo hoje em dia com a mesma designação que o Marx utilizou para título no rascunho da sua explicação. Porque a essência da questão não é a forma accionária do capital, que continuando a constituir veículo de concentração de capitais, até pode hoje em dia, pela eliminação monopolista de capitais mais fracos, de menor composição orgânica, contribuir para diminuir a taxa geral de lucro (e não para contrariar essa diminuição).

A essência da questão é que a insuficiência da mais-valia globalmente extraída para remunerar os grandes capitais a taxa de lucro mais satisfatória obriga a que alguns sectores se conformem com taxas de lucro menores ou até, no limite, que trabalhem com prejuízo. Escusado será dizer que esse papel fica, frequentemente e especialmente no caso limite referido, relegado para os sectores públicos da economia. É na consideração deste “sexto factor”, bem como na análise geral da sobreacumulação do capital desenvolvida nesta parte do Livro III, que se filiam directamente, na sua fundamentação económica, as ideias posteriormente desenvolvidas pelos marxistas em torno da noção de “capitalismo monopolista de Estado”, a intervenção do Estado no favorecimento dos monopólios capitalistas, nomeadamente na defesa das suas taxas de lucro.

HM

Sérgio Ribeiro disse...

Graciete - Mais uma vez, vens estimular-me a continuar neste contacto, melhor diria tarefa. Obrigado

HN (anónimo?) - Este comentário é para ser lido e relido. Não simplifico dizendo que estou de acordo, ou que, aqui e ali, tenho reservas e dúvidas. Trata-se de uma reflexão séria, e fico compensado por aqui a ter, neste cantinho. Para continuar a estudar. E a fazer, do estudo, o seguimento adequado ao comentário.
Algumas das observações já as fizera para mim, como a relativa à "redução do salário abaixo do valor" que exige entrar com a consideração das necessidades tal como Marx aponta (e só aponta) no Livro II. E esta questão das necessidades...
Bem... adiante e as saudações gratas